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A partir do que foi escrito neste trabalho, percebe-se a necessidade de discussão acerca da adoção de um modelo de financiamento, ou inclusão de ferramentas de financiamento, que supra a necessidade histórica de corrigir as disfunções do sistema atualmente utilizado. O grande cerne parece ser a aproximação dos eleitores de seus representantes, sendo cara à democracia o distanciamento entre esses atores.

No que tange às modificações realizadas pela minirreforma de 2017, primeiro deve- se reconhecer que houve clara evolução da legislação eleitoral em diversos pontos, dentre os quais destaco dois. O primeiro diz respeito à adoção do instituto de financiamento coletivo, por meio de sítios especializados na internet, o crowdfunding, ao ordenamento jurídico brasileiro, o que incentiva e facilita a participação de um número maior de eleitores no financiamento de seus candidatos, ampliando o número de doadores de pequenas quantias, em vez de concentrar as doações de grandes quantias por poucos doadores mais abastados.

O segundo ponto que merece destaque trata da regulamentação em lei de um teto fixo para os gastos de campanha, de forma igual para todos os partidos que competem para um mesmo cargo em uma mesma circunscrição. Essa regulamentação ultrapassou a fase que se poderia chamar de uma auto-regulamentação, que na prática não inibia em nada a influência negativa dos recursos privados, para implementar um meio mais eficaz de equilibrar a disputa eleitoral.

No entanto, apesar da referida evolução, deve-se salientar como ponto negativo a alteração da legislação para criar o FEFC, elevando demasiadamente o aporte de recursos públicos no financiamento de campanhas no Brasil. Em razão da redução dos recursos privados gerada pela vedação de doações de pessoas jurídicas, decidida pelo Supremo Tribunal Federal, os legisladores buscaram alternativas para suprir a lacuna de recursos, buscando, de forma equivocada, suprir esse “vazio” com a alteração do sistema normativo de forma tendente a um sistema exclusivamente público.

Embora tenhamos extraído no capítulo 2 deste trabalho que a existência de financiamento é importante para subsidiar os custos da democracia, sendo necessária a existência de opções de financiamento público, notadamente para que se efetive o princípio da igualdade nas eleições entre todos os cidadãos em disputa, não é conveniente que haja uma contribuição pública tão acentuada como a dirigida ao FEFC. Ainda quanto ao FEFC, os percentuais fixados como critério de distribuição dos recursos do fundo público deveriam ter privilegiado um pouco mais o critério equitativo, de forma a oportunizar o fortalecimento de

novas forças políticas, em oposição ao excessivo favorecimento dos partidos tradicionais. No que tange a uma proposta viável de modelo a ser adotado no Brasil, deve-se buscar soluções para dois problemas centrais: a rejeição social em relação ao aumento de recursos públicos em campanhas eleitorais e a dificuldade de desenvolver uma cultura de financiamento privado de pessoas físicas, de forma pulverizada, a curto prazo. Buscando alternativas para tais problemas, parece ser impossível estabelecer um modelo perfeito e acabado para ser implementado no Brasil, haja vista que não é razoável retirar das campanhas políticas a possibilidade de arrecadar subsídios privados, de forma súbita, em um país sem a cultura do financiamento privado ideológico por pessoas físicas. Daí porque o tema financiamento de campanhas no Brasil tenha uma natureza tão mutável e esteja em constante debate.

Em razão disso, a fim de superar o impasse entre os legisladores no que tange à adoção de um sistema de financiamento exclusivamente público ou exclusivamente privado, a solução que proponho é adotar o que Spek intitulou de sistema de financiamento híbrido43,

dando a opção ao candidato de escolher no início da campanha entre o sistema privado ou o sistema público. Caso opte pelo sistema privado, o candidato segue as regras já existente acerca da arrecadação de recursos privados, respeitando o teto de gastos e a proibição de doações de pessoas jurídicas, sem, no entanto, ter acesso a recursos públicos. Porém, deverá ser estabelecido um teto de gastos com valores mais módicos, objetivando campanhas eleitorais mais simples, além de estabelecer um teto de doação de pessoa física em valor fixo que seja baixo o suficiente para não comprometer a igualdade nas eleições. Isso porque a regra atualmente em vigor no Brasil, que adota o teto de doações com base em um percentual sobre os rendimentos do doador, deixa a brecha para que um pequeno número de ricos doadores financiem as campanhas de candidatos, criando com estes os mesmo vínculos escusos que se buscou evitar com a vedação de doações de pessoas jurídicas.

Já para aqueles que optarem pelo financiamento público, terão acesso a recursos públicos, sem poderem receber qualquer tipo de subsídio privado. Tais recursos públicos deverão ser distribuídos entre os partidos em disputa optantes pelo financiamento público, assegurando a este o equivalente a 50% do teto estabelecido para os optantes do sistema

43 SPEK, Bruno. Três ideias para oxigenar o debate sobre o dinheiro e a política no Brasil. Em Debate, Belo Horizonte, v.2, n.3, p. 6-13, mar. 2010. Disponível em:

<http://www.academia.edu/4109726/Bruno_Wilhelm_Speck_Tr%C3%AAs_id%C3%A9ias_para_oxigenar_o_d ebate_sobre_dinheiro_e_pol%C3%ADtica_no_Brasil>. Acesso em: 10 de maio de 2018.

privado. A vantagem, nesse caso, é que, embora esses partidos possam ter menos recursos para utilizar na campanha, poderá concentrar seus esforços na comunicação com o eleitor e não na obtenção de doadores.

Já quanto ao optante do sistema privado, embora tenha o ônus de buscar doadores, poderá potencializar sua arrecadação, porém, para isso, deverá estabelecer uma comunicação mais estreita com os eleitores e potenciais doadores justificando a escolha do uso de recursos privados.

A vantagem desse modelo, que não se confunde com o sistema misto utilizado hoje no Brasil, é a flexibilidade em optar por um ou outro sistema, criando um modelo aberto, que seja gradual, que fomente o desenvolvimento cívico dos cidadãos, pulverizando as doações privadas entre as pessoas físicas, e, principalmente, diminuindo gradativamente o aporte público, sem no entanto deixar o financiamento de candidatos dependente de subsídio financeiro empresarial ou de ricos doadores.

Dito de outro modo, cria-se um ambiente de fomento de doações privadas, sem, no entanto, descapitalizar as novas forças políticas que não tenham tanta visibilidade para obter recursos privados suficientes, estabelecendo um sistema gradual, que culmine, a longo prazo, na redução do uso de recursos públicos, mas arrecadando recursos privados de forma transparente e ideológica. Isso acarretará uma maior liberdade para o parlamentar ou chefe do executivo tomar suas decisões políticas, orientado por suas responsabilidades programáticas, sem influência do poder econômico.

Ressalta-se que para que qualquer norma de financiamento de campanhas tenha efetividade, é necessário que haja meios para controlar sua aplicação. Assim, o papel da Justiça Eleitoral no âmbito administrativo é de suma importância para que qualquer modelo adotado tenha suas regras respeitadas, notadamente quanto aos limites de arrecadação impostos.

Concluindo, como já aludido, a relação entre dinheiro e política está em constante debate, sendo instável qualquer modelo que se adote. No entanto, é importante que continuemos buscando o aperfeiçoamento da legislação, tendo como norte a efetivação da democracia e do pluralismo político. Só assim os eleitores e os candidatos serão plenamente livres e iguais.

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