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5.1. Conclusões

A aplicação do submodelo permitiu comprovar uma clara predominância do uso do espaço em zonas previamente identificadas como propícias à alimentação, nomeadamente florestas de folhosas, pastagens, zonas abertas que limitam as áreas florestais, galerias ripícolas e estradas limitadas por áreas florestais, uma vez que o comportamento dos morcegos, apresentado pelo submodelo, se aproxima do comportamento real. Verificou-se que estes tipos de habitat apresentaram índices de atividade mais elevados, nomeadamente quando se analisaram os períodos de tempo de permanência por unidade de área utilizada.

A relevante mobilidade de N. leisleri, referida em diversos estudos sobre esta espécie (Walsh & Harris, 1996; Waters et al., 1999, Szentkuti, 2006), foi também evidenciada pelos resultados ao nível da distância máxima percorrida em relação ao abrigo e principalmente a partir das informações referentes às áreas vitais. Os resultados destes dois fatores surgiram de uma forma emergente a partir de um conjunto de interações entre os indivíduos e a paisagem virtual, sendo que ambos se aproximam a valores obtidos noutros estudos com metodologias distintas (Waters et al., 1999, Szentkuti, 2006). A correlação positiva entre a área usada de cada habitat e o tempo despendido nessa mesma área, parece reforçar o conceito de mobilidade associado a esta espécie, o que também sucede com a elevada quantidade de habitats diferentes que se encontram presentes nas áreas vitais, determinadas a partir do método do polígono convexo mínimo (Mohr, 1947). De facto, a aplicação de uma regressão múltipla, mostrou que uma maior disponibilidade e consequente uso de florestas de resinosas, florestas de folhosas e habitats identificados como outros usos, implica uma maior mobilidade, patente no incremento das dimensões da área vital dos indivíduos. Por outro lado o recurso a zonas de limite florestal como habitat de alimentação parece ter um efeito oposto, ainda que menos significativo, levando à diminuição das dimensões desta área.

No que diz respeito à mortalidade, é possível concluir que a velocidade do vento apresenta uma influência preponderante na ocorrência deste tipo de evento. Neste sentido, foram registados maiores índices de mortalidade para velocidades do vento inferiores a 4 m/s, sendo que este valor constitui uma mera aproximação às indicações dos estudos de Arnett et al. (2008) e Amorim (2009) para a velocidade do vento a partir da qual ocorre uma diminuição considerável da atividade de quirópteros. Desta forma verificou-se que a redução significativa da mortalidade em situações em que se simularam velocidades do vento mais elevadas ( ≥ 4 m/s), prende-se com uma diminuição da atividade dos indivíduos, de facto a relação entre as variáveis

meteorológicas e a atividade de quirópteros tem sido referida por diversos autores (Vaughan et al., 1997; Erickson et al., 2002; Cryan & Brown, 2007; Kunz et al., 2007a; Arnett et al., 2008). No modelo esta diminuição da atividade foi simulada por um aumento do número de morcegos que permanece no abrigo, mas na realidade pode passar apenas por uma menor utilização das zonas de maior altitude que geralmente apresentam ventos mais fortes (Stull, 1988). Esta relação entre a mortalidade e os padrões temporais de atividade está também patente nas diferenças significativas que se verificaram relativamente aos dois períodos de atividade característicos desta espécie, sendo que se registaram eventos de mortalidade mais frequentes na primeira emergência para alimentação, caracterizada por um período de tempo maior que o da segunda fase de caça.

Por outro lado, alguns fatores testados parecem não apresentar influência na mortalidade em parques eólicos. As diferenças de mortalidade para as duas classes de temperatura testadas não foram significativas, tendo-se constatado que apenas dois aerogeradores (AG7 e AG8) se encontram a altitudes suficientemente superiores às das restantes estruturas deste tipo presentes no parque, para em condições específicas apresentarem temperaturas mais baixas. O facto das áreas onde estes dois aerogeradores se encontram, apresentarem em determinadas situações específicas, condições climáticas adversas à atividade de quirópteros, não parece apresentar uma influência nos padrões globais de mortalidade no parque.

A presença de abrigos onde a partilha do mesmo espaço ocorre por pequenos aglomerados de indivíduos, não constituiu um fator com influência na mortalidade, visto não se terem verificado diferenças significativas relativamente às situações em que os abrigos eram ocupados por apenas um indivíduo. Ainda relativamente ao abrigo, f oi possível apurar a ausência de relação entre o uso do solo em que este se encontra e os índices de mortalidade, tendo-se no entanto verificado que o mesmo não se passa relativamente à distância entre o abrigo e o aerogerador mais próximo. De facto, constatou-se uma clara relação entre o aumento da frequência dos eventos de mortalidade e a proximidade do abrigo ao aerogerador mais próximo, sendo que o registo de fatalidades de indivíduos com abrigo a uma distância ao aerogerador mais próximo, superior à média global de todos os indivíduos (3,46 km), foi considerado residual. Este facto encontra-se relacionado com as distâncias máximas ao abrigo que esta espécie tende a apresentar, sendo que neste estudo se verificaram valores na ordem dos 3,95 km, ou seja, ligeiramente inferiores aos 4,2 km e 4,7 km obtidos por Waters et al. (1999) e Szentkuti (2006), respetivamente.

No que concerne às características específicas dos aerogeradores e configuração espacial do parque eólico, verificou-se que os aerogeradores instalados em usos do solo

identificados como habitats preferenciais de alimentação, apresentam maiores índices de mortalidade, sendo que a disposição deste tipo de estrutura no parque eólico de Negrelo e Guilhado permitiu observar diferenças significativas entre a mortalidade registada no único aerogerador instalado fora de zonas alimentação, independentemente da classe de temperatura testada. Neste aspeto os níveis de atividade nas zonas envolventes dos aerogeradores apresentam um papel preponderante, tendo-se constatado uma correlação positiva estatisticamente significativa, que resulta do facto de uma maior utilização destes espaços levar a um incremento no risco de mortalidade. Estes resultados vão de encontro aos obtidos por Amorim (2009), com a ressalva de estes resultarem de registos ao nível do solo para algumas espécies de quirópteros com características semelhantes às de N. leislei. Verificou-se ainda uma diminuição significativa da atividade ao nível da zona envolvente dos aerogeradores com temperaturas inferiores a 10oC, e uma consequente tendência para uma redução dos índices de mortalidade nesses aerogeradores, apesar de não se terem verificado diferenças estatísticas significativas neste capítulo.

5.2. Considerações sobre o modelo e recomendações metodológicas

Em relação ao desempenho do modelo foi possível verificar que apesar das simplificações óbvias ao nível dos procedimentos que determinam o tipo de movimento de voo, e consequentemente os padrões de uso do espaço por parte dos indivíduos, ocorreu uma aproximação de diversos resultados, aos obtidos em outros estudos baseados em trabalho de campo, com foco nos comportamentos em período de alimentação de N. leisleri (Walsh & Harris, 1996; Vaughan et al., 1997 Shiel et al., 1999; Waters et al., 1999; Szentkuti, 2006). Para além desta aproximação de resultados, constatou-se uma resposta global dos indivíduos às diversas variáveis ambientais simuladas, que permite a validação da forma como se procedeu à introdução e parametrização da maioria dos dados que estiveram na base da conceptualização deste modelo. É ainda importante referir que a base do modelo desenvolvido pode permitir, de uma forma relativamente simples, a adaptação do mesmo a parques eólicos com características distintas do presente neste estudo. Pode ainda ser possível a adaptação do modelo a outras espécies de quirópteros, ou inclusivamente a elencos de espécies presentes numa determinada área, sendo para isso necessário realizar algumas alterações ao nível dos seus procedimentos.

É no entanto importante realçar que este estudo constituiu uma primeira abordagem à aplicação de um modelo baseado em agentes na análise da influência de parques eólicos sobre esta espécie de quiróptero, sobre a qual existe ainda uma considerável

escassez de informação, nomeadamente no que diz respeito à sua distribuição, padrões migratórios e tendências populacionais em Portugal. Numa futura abordagem a este processo de modelação será recomendável uma parametrização mais pormenorizada das variáveis climáticas, nomeadamente com dados mais precisos sobre as variações de temperatura ao longo da noite e uma aproximação mais detalhada à distribuição espacial da velocidade do vento em toda a extensão da área de estudo. Outro ponto a explorar poder-se-á prender com os aspetos relacionados com os padrões migratórios de N. leisleri, visto que pertence a um grupo de espécies arborícolas migradoras, para as quais se identificaram em vários estudos, picos de mortalidade em parques eólicos, durante a migração outonal (Johnson et al., 2003; Arnett, 2005; Kunz et al., 2007a; Arnet et al., 2008; Rodrigues et al., 2008; Amorim, 2009). Este aspeto não foi contemplado no modelo, devido à ausência de informações sobre os padrões migratórios para esta espécie em Portugal, sendo que esta escassez de dados se faz sentir um pouco por toda a Europa e EUA, para diversas espécies de morcegos com comportamentos migratórios (Hutterer et al., 2005; Rodrigues & Palmeirim, 2008).

Em súmula considera-se que este tipo de metodologia apresenta características únicas que a distinguem de outras formas clássicas de modelação, tornando-a uma ferramenta com enorme potencial ao nível dos planos de conservação de habitats críticos para espécies de fauna ameaçadas. A utilidade dos modelos baseados em agentes é ainda evidenciada pelo facto de estes contemplarem entidades individuais e autónomas, que ao apresentarem comportamentos adaptativos e características heterogéneas, podem permitir um conhecimento mais aprofundado dos padrões de uso dos habitats e da forma como estes indivíduos respondem a futuras mudanças no seu meio ambiente. Por outro lado, dada a complexidade dos sistemas que se pretendem simular, é necessário um vasto conjunto de dados referentes às condições ambientais, bem como às características da biologia e ecologia das espécies em estudo, o que pode constituir uma forte adversidade no processo de conceptualização e implementação dos procedimentos de modelação.

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