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Considerações gerais sobre o dano moral

3 COLISÃO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS QUE SE RELACIONAM AO

4.1 Considerações gerais sobre o dano moral

Inicialmente, cumpre fazer considerações básicas acerca deste instituto que constantemente é objeto das demandas judiciais envolvendo ofensas causadas pelos comentários dos comediantes.

Existem diversas definições na doutrina para o que venha a ser considerado dano moral.

Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2003, p. 55) o definem como “lesão de direitos cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro”.

Yussef Said Cahali é outro que entende o dano moral como resultado da lesão. Assim conceitua Cahali (2011, p. 28): “Dano moral, portanto, é a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão patrimonial. Seja dor física – dor-sensação, como a denominada Carpenter – nascida de uma lesão material; seja a dor moral – dor-sentimento, de causa imaterial.”

A reparação em virtude do dano moral sofrido tem previsão no rol dos direitos fundamentais constantes nos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal:

(...)

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

(...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O Código Civil de 2002 consagra, em seu artigo 186, a autonomia do dano moral em relação ao dano patrimonial, possibilitando ao ofendido pleitear ação de reparação por danos morais: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Alguns doutrinadores consideram que a expressão “dano moral” não é a expressão tecnicamente mais correta para fazer referência à lesão causada. Pablo Stolze e Rodrigo Pamplona (2003, p.55) consideram que seja mais correto a expressão imaterial ou dano extrapatrimonial.

É necessário ressaltar que, ultrapassada toda a análise a favor da conclusão pela ilicitude do fato, eivado de dolo ou culpa, o dano moral não se configura automaticamente. É necessário a demonstração do efetivo dano ensejador de indenização. Conforme ensinamento de Chaves e Rosenvald (2013, p.622):

Dispõe o art. 402 do Código Civil que, "salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar". Esta norma se conecta aos artigos 186 e 927 do Código Civil, para ressaltar que no direito civil a inexistência do dano é óbice à pretensão de qualquer espécie de reparação.

Como explica Agostinho Alvim, "ainda mesmo que haja violação de um dever jurídico e que tenha existido culpa e até mesmo dolo por parte do infrator, nenhuma indenização será devida, uma vez que não se tenha verificado prejuízo. Essa regra decorre dos princípios, pois a responsabilidade, independentemente de dano redundaria em mera punição do devedor, com invasão da esfera do direito penal". A configuração do ato ilícito independe do dano, todavia, o ilícito sem dano não é objeto de reparação, seja em sede de ato ilícito contratual – pelo inadimplemento -, ou pela prática do ato ilícito extracontratual que redundará em responsabilidade civil.

No mesmo sentido, aponta Cavalieri (2008, p. 78):

Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos.

Quanto ao dever de indenizar, o Código Civil dispõe: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

A reparação de dano por prejuízo de imagem da pessoa somente é cabível quando a prova da lesão de imagem ou do desprestígio da pessoa for completa, inequívoca e convincente. Não se pode confundir, para efeitos de danos morais, o sentimento de dor profunda com o ódio, a ira ou a cólera. É indispensável a demonstração cabal e inequívoca do gravame sofrido. Rui Stoco, em “Responsabilidade Civil e a sua Interpretação Jurisprudencial” (RT, 2ª ed., p. 57), ensina acerca do dano moral:

“Como asseveram Mazeaud e Mazeaud, a questão da prova se apresenta em termos muito simples, quando se trata de mostrar o prejuízo. Torna-se até escusado dizer que ao prejudicado é que cumpre provar o alegado o dano.

Segundo Aguiar Dias “o que o prejudicado deve provar, na ação, é o dano, sem consideração ao seu ‘quantum’, que é matéria de liquidação. Não basta, todavia, que o autor mostre o fato de que se queixa, na ação, seja capaz de produzir o dano, seja de natureza prejudicial. É preciso que prove o dano concreto, assim entendida a realidade do dano que experimentou, relegando para a liquidação a avaliação de seu montante.”

Nesse sentido, é entendimento jurisprudencial pacífico do Superior Tribunal de Justiça que não basta a ocorrência de qualquer contratempo ou perturbação para gerar uma indenização por dano moral. A esse respeito, apontam-se os recentes decisórios da Corte Superior de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AQUISIÇÃO DE REFRIGERANTE CONTENDO INSETO. DANO MORAL. AUSÊNCIA. 1. A simples aquisição de refrigerante contendo inseto em seu interior, sem que seu conteúdo tenha sido ingerido ou, ao menos, que a embalagem tenha sido aberta, não é fato capaz de, por si só, de provocar dano moral.

2. "O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige" (AgRgREsp nº 403.919/RO, Quarta Turma, Relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 23/6/03).

3. Recurso especial conhecido e provido.

(STJ – REsp 747396 / DF – 4ª T. – Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 09.03.2010). (Grifou-se)

RECURSO ESPECIAL. ENCERRAMENTO DE CONTA CORRENTE. MERO

DISSABOR.DANO MORAL AFASTADO COM FULCRO NAS

PARTICULARIDADES DO CASO.

Danos morais podem surgir em decorrência de uma conduta ilícita ou injusta que venha a causar sentimento negativo em qualquer pessoa de conhecimento médio, como vexame, humilhação, dor. Há de ser afastado, todavia, quando a análise do quadro fático apresentado pelas instâncias ordinárias levam a crer que não passaram da pessoa do autor, não afetando sua honorabilidade, cuidando-se, portanto, de mero dissabor.

Recurso provido.

(STJ – REsp 668443 / RJ – 3ª T. – Rel. Min. Castro Filho, j. em 25.09.2006). (Grifou-se)

No caso específico do humor transmitido pelos meios de comunicação, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 221, reconhecendo a responsabilidade solidária do veículo de imprensa para os casos em que seja devido o pagamento de indenização por violação aos direitos da personalidade: “São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação.”

Verifica-se, portanto, que, para a configuração dos danos morais, alguns requisitos legais fazem-se inafastáveis, quais sejam a conduta ilícita, o dano e o nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo suportado. Nesse sentido, analisar-se-ão demandas judiciais de indenização por danos morais com o fito de demonstrar, na prática, as alegações e decisões que vem sendo proferidas no assunto de que se tratou.

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