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Considerações iniciais sobre o gênero resenha

4 COMPREENDENDO O GÊNERO RESENHA CRÍTICA

4.1 Considerações iniciais sobre o gênero resenha

Em um primeiro momento, precisamos delimitar algumas características do gênero resenha crítica, não na tentativa de rotulá-lo, mas na intenção de reconhecê- lo dentro de uma infinidade de gêneros discursivos. Em uma primeira análise, entende-se resenha como a descrição detalhada que compreende a apresentação das propriedades de uma obra – espécie de descrição física do objeto. Acrescentam- se a isso propriedades como: a descrição das qualificações do autor - quando pertinente -; o resumo; a crítica em tom avaliativo; a apresentação do quadro de referências que o autor utilizou4; assim como o público a quem a obra se destina

(MARCONI; LAKATOS, 2012; MEDEIROS, 2014).

Ainda nessa ideia de “conceituação”, de acordo com Sousa (2017, p. 14, grifo nosso), o gênero resenha

[...] se utiliza de argumentos, enquadrando-se na descrição, avaliação e argumentação, porque o sujeito produtor tem a missão de elucidar de forma ética e transparente as críticas na apreciação da obra, esclarecendo aos interlocutores a finalidade do texto-base, capaz de construir argumentos que levem o leitor a conhecer, sinteticamente, a obra resenhada [...].

Logicamente, podemos afirmar que o gênero resenha crítica contém uma organização geral: descrever, avaliar e argumentar. De acordo com Bezerra (2001), após analisar 30 resenhas produzidas por alunos de um curso de graduação em Teologia, há quatro processos textuais envolvidos, de forma geral, na produção do

4 Neste caso ao se tratar de resenha de obras literárias, filosóficas, sociológicas ou de qualquer outra área de conhecimento.

gênero resenha: a) introduzir a obra; b) sumarizar a obra; c) criticar a obra; d) concluir a análise da obra. Para cada um desses processos, haveria subprocessos.

Desse modo, podemos concluir que a ação de resenhar exige do produtor textual uma série de habilidades. Uma delas, que vale a pena destacar, é a de resumir o conteúdo apreciado, porquanto envolve o processo de retextualização, além de que “O resumo seria a representação reduzida do texto a resumir [...]” (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 88) e a atividade de resumir não se reduz à aplicação de regras simples,

[...] deve ser considerado um gênero que leva ao extremo a atitude metalinguística em face de um texto, em que é preciso reconstruir a lógica enunciativa, sendo a situação escolar de comunicação, precisamente, aquela que solicita a demonstração da capacidade para essa atitude (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 88).

O autor destaca o contexto escolar como situação comunicativa, porém o resumo pode ser inserido em outros contextos comunicativos, como em conversa informal, em um post nas redes sociais, dentre outras situações não previsíveis. Em muitas dessas situações, exige-se do falante uma opinião a respeito do que se falou, isso implica no seu posicionamento.

Surge, então, de algumas situações de uso da linguagem, a necessidade de emitir um juízo de valor caracterizando o texto como resumo crítico ou resenha crítica. É como se fossem o mesmo gênero, porém apresentam composição e aspecto temático diferentes. Ao enunciador, cabe mobilizar um conjunto de habilidades para que o texto seja construído adequadamente. Beacco e Darot (1984, apud MACHADO, 1996, p. 142), após analisarem resumos e críticas cinematográficas, “distinguem entre três tipos de operações discursivas aí realizadas pelo enunciador: descrever, apreciar e interpretar, cujas ocorrências podem guiar a diferenciação entre tipos diferentes de textos.”.

Em relação à composição do gênero resenha crítica, segundo Machado (1996), deve-se acrescentar, à ideia de apresentar o “produto” resumido, a “apreciação”, considerada o julgamento pessoal do autor (da resenha), que se efetua sobre um determinado objeto, levando-se em conta um sistema de valores hierarquizados.

Além dessas marcas, a realização da apreciação caracterizar-se-ia ainda por apresentar elementos como os seguintes: unidades lexicais dotadas de conotações pejorativas ou valorativas; unidades de quantificação ou de

comparação a outros objetos; verbos relativamente sinônimos que remetem ao campo das atitudes psicológicas ou de reações emocionais (MACHADO, 1996, p.143).

Na resenha crítica, “a justificativa estaria sempre presente, estabelecendo- se, assim, uma relação entre os dados e o julgamento.” (MACHADO, 1996, p.144). Em contrapartida, nos textos resumidos mais curtos, “a avaliação poderia aparecer sem qualquer tipo de justificação.” (MACHADO, 1996, p.144). O processo de escrita da crítica envolve uma articulação de ideias com marcas de julgamento, encaminhando o texto para um julgamento global.

Ainda de acordo com Machado (1996), a crítica cinematográfica conta com outro procedimento que seria a

[...] utilização de elementos lexicais dotados de conotações positivas ou negativas, corresponde ao processo de atribuição de propriedades através da aspectualização, enquanto as avaliações relativas a objetos diferentes correspondem ao processo de tematização de uma das partes do todo e de sua aspectualização (MACHADO, 1996, p.144).

É possível perceber que há toda uma composição organizacional sobre o gênero resenha. São estas particularidades que a difere de outros gêneros correlatos como o resumo crítico. O resenhista mobiliza muitas habilidades para compor seu texto e construir uma crítica com força argumentativa. O último processo mobilizado pelo autor de uma resenha é a interpretação que se caracterizaria

[...] por poder ser marcada diretamente por verbos ou por nominalizações do tipo de "interpretar" ou "interpretação", ou por poder apresentar-se indiretamente. Neste caso, o enunciador pode utilizar diferentes estratégias, tais como: atribuir ao diretor do filme determinadas intenções que, na verdade, são o resultado de sua interpretação; mostrar a interpretação em curso, pelo emprego de perguntas (retóricas ou não) que colocam em evidência a construção da interpretação; utilizar modalidades que marcam a incerteza possível sobre a significação produzida pela atividade do sujeito cognitivo. (MACHADO, 1996, p.145).

Para a construção da resenha, é importante o processo de inferências e de deduções, ou seja, o autor resenhista precisa ser capaz de ler nas entrelinhas, criar suposições, articular ideias implícitas na obra, projetar expectativas. Portanto, o processo de escrita de uma resenha mobiliza um conjunto de habilidades, daí a necessidade de o escritor desenvolver uma série de competências linguísticas para a sua composição.

A resenha é um instrumento de muita relevância social e acadêmica, pois permite ao sujeito compilar informações e emitir juízo de valor sobre o que leu/assistiu/apreciou, além de permitir a ampliação do seu repertório cultural. “Trabalhar com o gênero resenha é ensinar a argumentar, resumir, descrever e avaliar outros discursos em sala de aula.” (SOUSA, 2017, p.16). Sendo que

Argumentar, descrever e relatar faz parte da interação humana, na produção de conhecimentos que sinalizem os percursos comunicativos da linguagem, porque entre persuadir e convencer há outras finalidades possíveis no desenvolvimento reflexivo entre os agentes do discurso, já que a boa argumentação se pauta no respeito à capacidade cognitivo-argumentativa de quem produz a interação. Logo, o ato de resenhar se insere num processo dialógico produzido por outrem na garimpagem reflexiva das finalidades sintetizadoras da escrita na comunicação humana (SOUSA, 2017, p.16, grifo nosso).

Deste modo, entendemos a resenha crítica como um processo que mobiliza inúmeras habilidades em nossos alunos, desenvolve competências sociodiscursivas, promove conhecimento, além de colocá-lo como autor e como um gerenciador de vozes sociais. Vale salientar a importância de alguns elementos peculiares à resenha de filme, como o título, a ficha técnica e a inserção de um cartaz.

Tais elementos se apresentam ao redor do texto, seriam então chamados de elementos paratextuais, pois, segundo o Dicionário de Análise do Discurso, “o paratexto é uma das cinco formas das relações transtextuais do texto descritas por Genette (1982)”. Muniz-Oliveira (2006, p.271), também citando Genette (1981), define paratextualidade como “relação de um texto aos elementos que estão à sua volta, como o título, o subtítulo, o prefácio de um livro, a epígrafe de um texto ou de um livro, a ilustração, os comentários marginais.”.

Em Charaudeau & Maingueneau (2012), o paratexto seria os elementos que circundam o texto, como o nome do autor, as notas, enfim, todos os itens que se organizam em dele. Consideramos muito relevante a inserção de um título à resenha, bem como da ficha técnica do autor da resenha e da nota do crítico. Levando isso em consideração na nossa análise, dividimos os aspectos paratextuais e os textuais com a finalidade, apenas, de tornar mais clara a nossa discussão sobre os resultados. Consideramos que todos estes elementos compõem o gênero discursivo resenha, dito isso, fica evidente que a nossa divisão é apenas didática. No tópico a seguir, discutiremos a resenha como um gênero da esfera escolar.