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Considera¸ c˜ oes finais

No documento 6accdæ13eff7i319n4o4qrr4s8t12vz (páginas 173-190)

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Nesta parte discutimos sobre alguns assuntos complementares.

§67. Logaritmo como isomorfismo entre grupos. Na vis˜ao do polic´efalo Nicolas Bourbaki, matem´atica ´e o estudo de trˆesestruturas-m˜ae:

alg´ebricas,

topol´ogicas e

de ordem.

Grosso modo, estruturas alg´ebricas se referem a conjuntos munidos de opera-¸

c˜oes, como adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao entre reais. Estruturas topol´ogicas s˜ao aquelas que tratam de no¸c˜oes sobre ‘vizinhan¸ca’, ‘proximidade’. Tais conceitos podem ser formulados atrav´es de conjuntos munidos detopologias. Finalmente, estru-turas de ordem s˜ao conjuntos munidos de rela¸c˜oes de ordem (parcial, total, entre outras).

Apesar de, hoje em dia, esta ser uma vis˜aod´emod´e (at´e porque a teoria de conjuntos de Bourbaki conta com formula¸c˜ao diferente da teoria ZF), ela pode ser uma primeira aproxima¸c˜ao interessante para uma ampla vis˜ao sobre matem´atica. C´alculo diferencial e integral padr˜ao, por exemplo, pode ser percebido como uma combina¸c˜ao dessas trˆes grandes estruturas. No entanto, resultados de c´alculo diferencial e integral podem ser observados pelo prisma de uma ´unica dessas estruturas. Da´ı o exemplo abaixo, o qual promove uma avalia¸c˜ao puramente alg´ebrica sobre logaritmos.

Magmas, monoides, grupos, an´eis, corpos e espa¸cos vetoriais, entre muitos outros exemplos, s˜ao estruturas alg´ebricas bem conhecidas. Exploramos breve-mente o conceito degrupo e sua rela¸c˜ao com logaritmos.

Um grupo G ´e uma tripla ordenada G = (g, ⋆, e) que satisfaz os seguintes axiomas:

G1: g̸=;

G2: :g×g→g´e uma fun¸c˜ao; abreviamos(a, b) =ccomoa ⋆ b=c;

G3: e∈g;

G4: ∀a(a∈g⇒(a ⋆ e=e ⋆ a=a));

G6: ∀a(a∈g⇒ ∃b(b∈g∧a ⋆ b=b ⋆ a=e)); abreviamosbcomoa1. Por abuso de linguagem, ´e usual se referir ao conjunto g como grupo. Neste contexto, ´e comum autores afirmarem que um grupo ´e um conjuntogmunido de uma opera¸c˜ao bin´ariae de um elemento privilegiadoe, que satisfaz os axiomas acima listados. Adotamos aqui o mesmo abuso de linguagem, de agora em diante.

Do ponto de vista intuitivo, os axiomas G1G6 dizem o que se segue.

G1: todo grupo g´e um conjunto n˜ao vazio;

G2: o grupo g ´e munido de uma opera¸c˜ao bin´aria fechada em g, ou seja, para quaisquer elementosaebdeg,a ⋆ b´e um elemento deg; do ponto de vista da linguagem de ZF,´e t˜ao somente uma fun¸c˜ao com dom´ıniog×g e co-dom´ıniog;

G3: o elemento privilegiadoepertence ao grupog;

G4: o elemento privilegiado e´e neutro `a direita e neutro `a esquerda,

relati-vamente `a opera¸c˜ao;

G5: a opera¸c˜ao ´e associativa;

G6: todo elementoado grupogadmite um sim´etrico `a direita e um sim´etrico

`

a esquerda, relativamente `a opera¸c˜ao.

De maneira mais resumida, um grupog ´e um conjunto n˜ao vazio, munido de uma opera¸c˜ao bin´aria fechada e associativa, com elemento neutro e elementos sim´etricos. A fun¸c˜aode um grupo ´e comumente chamada dea¸c˜ao do grupo.

Exemplos: (i) Seja R+={r∈R|r >0}. Logo, (R+,·,1) ´e um grupo, se · ´e a multiplica¸c˜ao usual entre n´umeros reais; neste caso, estamos interpretandogcomoR+,como·, eecomo 1.

(ii) (R,+,0) ´e um grupo.

(iii) (ω,+,0) n˜ao ´e um grupo, se + for a adi¸c˜ao usual entre naturais. Com efeito, axioma G6 n˜ao ´e satisfeito. Por exemplo, o natural 2 n˜ao admite sim´etrico relativamente `a opera¸c˜ao +.

Definic¸˜ao72. Sejam

G= (g, ⋆, e) e G = (g, ⋆, e)

grupos. Dizemos queh´e umisomorfismo entre os grupos GeG sssh:g→g ´

e uma bije¸c˜ao tal que

h(a ⋆ b) =h(a)h(b) para todos aeb pertencentes ag.

Ou seja, isomorfismos entre gruposg eg ao bije¸oesf :g→g que mant´em invariantes as a¸c˜oes dos grupos envolvidos. Intuitivamente falando, tanto faz se operarmosa ⋆ be ent˜ao aplicarmoshpara obterh(a ⋆ b), ou aplicarmoshsobre a e b para, somente ent˜ao, operarmos h(a) h(b), obtemos sempre o mesmo resultado.

O pr´oximo teorema revela que logaritmo ´e um isomorfismo entre grupos.

Teorema 112. Se a >0ea̸= 1, ent˜ao a fun¸c˜aologa define um isomorfismo entre os grupos

(R+,·,1) e (R,+,0).

Demonstrac¸˜ao: De acordo com o Teorema 110, loga(m·n) = loga(m) + loga(n). Al´em disso, loga´e uma bije¸c˜ao loga:R+R.

Moral da hist´oria: Do ponto de vista de teoria de grupos, ⟨R+,·,1 e

R,+,0s˜ao indiscern´ıveis. Em particular, 0 e 1 s˜ao algebricamente indiscern´ıveis do ponto de vista do isomorfismo do ´ultimo teorema. Uma vez que sabemos que, entre os reais, 0̸= 1, o ´ultimo teorema mostra que os n´umeros reais s˜ao muito mais do que simples estruturas alg´ebricas de grupo. ‘Filtrar’ logaritmos sob a ´

otica de opera¸c˜oes alg´ebricas como adi¸c˜ao e multiplica¸c˜ao entre reais, pode nos tornar ‘daltˆonicos’ a respeito dos reais.

§68. Newton-Raphson. Seja f : RR uma fun¸c˜ao diferenci´avel tal que existem valores em um intervalo [a, b] onde f(x) muda de sinal. A existˆencia de pelo menos um c [a, b], tal que f(c) = 0, ´e garantida pelo fato de f ser cont´ınua. Isso ´e consequˆencia do Teorema do Valor Intermedi´ario, mencionado muito brevemente na Se¸c˜ao 57.

Supor que existe apenas um c [a, b] tal que f(c) = 0. Logo, podemos introduzir o m´etodo de Newton-Raphson, se certas condi¸c˜oes forem atendidas. Para detalhes, consultar um bom livro sobre an´alise num´erica.

Sexn ´e uma entrada def(xn),xn+1´e obtido da seguinte maneira: f(x

n) = f(xn)0 xn−xn+1, ondef denota df

dx.

A justificativa para essa ´ultima igualdade em destaque ´e o fato de quef(xn) ´

e o coeficiente angular de uma reta definida pelos pontos (xn, f(xn)) e (xn+1,0) deR2. Logo, xn−xn+1= f(xn) f(xn). Finalmente, xn+1=xn f(xn) f(xn).

A f´ormula acima descreve o algoritmo conhecido como m´etodo de Newton-Raphson.

Observar que, sef(xn) = 0, ent˜aoxn+1=xn, para todonnatural.

Observar tamb´em que, sef(xn) = 0, o m´etodo de Newton-Raphson n˜ao ´e aplic´avel.

Exemplo: Como calcular a raiz quadradaxde um n´umero reala≥0? Por um lado temos x=

a. Logo,x2 =a, o que implica que o valor x deve satisfazer a equa¸c˜ao

x2−a= 0.

Logo, a raiz quadradaxdea´e um zero da fun¸c˜aof :RRdada por f(x) =x2−a.

O m´etodo de Newton-Raphson garante que podemos obter aproxima¸c˜oes com precis˜ao arbitr´aria parax=

a. A fun¸c˜ao recursiva ´e dada por xn+1=xnx2n−a

2xn

,

sendox0̸= 0 uma estimativa inicial para a raiz quadrada dea. A fun¸c˜ao recursiva pode ser reescrita como

xn+1=2x 2 n 2xn x2n−a 2xn . Logo, xn+1= xn+ a xn 2 .

Observar que esta ´e a mesma sequˆencia introduzida na Se¸c˜ao 37, no caso em que x0 ´e um n´umero racional. Naquela Se¸c˜ao h´a exemplos ilustrativos da sequˆencia recursiva acima para valores dex0 = 2 ex0= 5 com o prop´osito de obter aproxima¸c˜oes racionais para x=

2. Uma curiosidade hist´orica ´e que a equa¸c˜ao

xn+1= xn+

a xn 2

reproduz com fidelidade oM´etodo Babilˆonico para o C´alculo de Raiz Quadrada, concebido h´a mais de quatro mil anos. Obviamente os matem´aticos babilˆonicos n˜ao eram capazes de justificar o m´etodo acima por meio de c´alculo diferencial e integral, uma vez que este s´o foi concebido no s´eculo 17. Mas eles empre-gavam exatamente a mesma ideia: aproxima¸c˜oes de ra´ızes quadradas por m´edias aritm´eticas.

O exemplo acima pode ser estendido para a obten¸c˜ao de aproxima¸c˜oes de x= m

a, ondem´e um inteiro positivo maior do que 1: xn+1=

(m−1)xn+ a

xm1

n

m .

Ou seja, m´edias aritm´eticas demtermos (notar que todos osmtermos ocorrem no numerador) podem ser usadas para obtermos aproxima¸c˜oes de m

a, ideia essa que, aparentemente, jamais passou pela cabe¸ca dos pensadores do Imp´erio Babilˆonico.

A representa¸c˜ao decimal dessas aproxima¸c˜oes permite estabelecer um crit´erio de parada em fun¸c˜ao do n´umero de casas de precis˜ao desejada. No entanto, este m´etodo n˜ao exige quex0seja racional ou que f seja polinomial. Logo, pode ser

aplicado a fun¸c˜oesf envolvendo exponenciais, logaritmos, senos, co-senos, entre outras (incluindo composi¸c˜oes n˜ao triviais), desde que (entre outras condi¸c˜oes) sejam localmente diferenci´aveis em um intervalo aberto onde h´a um zero def.

A seguir mostramos como usar o M´etodo de Newton-Raphson para calcular aproxima¸c˜oes deπcom qualquer precis˜ao desejada.

Um dos zeros de seno ´e justamente π, conforme discuss˜oes na Se¸c˜ao 55. Portanto, para obter aproxima¸c˜oes de π, basta aplicar o M´etodo de Newton-Raphson, uma vez que seno ´e uma fun¸c˜ao diferenci´avel.

Sef :RR´e uma fun¸c˜ao dada porf(x) = sen(x), ent˜ao xn+1=xnsen(xn)

cos(xn), uma vez que a derivada de seno ´e co-seno.

O que est´a faltando para aplicar o m´etodo recursivo acima ´e umasemente x0. A partir dex0 e da sequˆencia recursiva acima ´e poss´ıvel obterx1,x2,x3 etc.

Podemos usar, como fonte de inspira¸c˜ao, alguma referˆencia hist´orica. Afinal, ´

e divertido conciliar matem´atica com hist´oria. Por exemplo, de acordo com Arquimedes de Siracusa,π´e algum valor entre

223 71 e 22 7 , ou seja, entre 3,140845070422535 e 3,142857142857142, com precis˜ao de 15 d´ıgitos ap´os a v´ırgula.

Outra referˆencia hist´orica ´e a B´ıblia Sagrada. No Primeiro Livro de Reis, Cap´ıtulo 7, Vers´ıculo 23, lˆe-se o seguinte:

Fez o tanque de metal fundido, redondo, medindo quatro metros e meio de diˆametro e dois metros e vinte e cinco cent´ımetros de altura. Era preciso um fio de treze metros e meio para medir a sua circunferˆencia. A vers˜ao acima, entre dezenas de tradu¸c˜oes feitas para a l´ıngua portuguesa em nosso pa´ıs desde o final do s´eculo 19, ´e do sitebibliaon.com.

Logo, de acordo com a palavra de Deus, traduzida para o portuguˆes por evang´elicos embibliaon.com,

π=13 +

1 2

4 + 12 = 3.

No entanto, obviamente o metro n˜ao era unidade de medi¸c˜ao adotada 2700 anos atr´as. No texto original em hebraico cl´assico o tanque tem dez c´ubitos curtos de diˆametro e trinta c´ubitos curtos de circunferˆencia, o que novamente corresponde a

π=30 10 = 3.

H´a, na literatura especializada em hist´oria b´ıblica, extensas discuss˜oes sobre o c´ubito curto e o c´ubito longo, entre outras dezenas de unidades de medi¸c˜ao empregadas no Antigo Testamento. Por sorte, por´em, o que nos interessa aqui ´

e a propor¸c˜ao de valores. Logo, afirmar que o Primeiro Livro de Reis estabelece queπ= 3, ´e uma tese segura, com pouco espa¸co para debate.

Observar que sen(3) ´e um real estritamente positivo, o qual pode ser calculado com precis˜ao arbitr´aria a partir do truncamento da s´erie de potˆencias discutida na Se¸c˜ao 52. Al´em disso, sen(227) ´e um real negativo, que pode ser calculado da mesma maneira. Neste caso, π est´a em algum lugar do corpo totalmente ordenado dos n´umeros reais, entre a estimativa b´ıblica 3 e uma das aproxima¸c˜oes de Arquimedes, 227.

Apesar da proposta sagrada n˜ao ser t˜ao precisa quanto a estimativa de Ar-quimedes, escolhemos ela como sementex0, para fins de uma avalia¸c˜ao superficial do desempenho do M´etodo de Newton-Raphson.

Logo,

x0= 3,000000000000000 x1= 3,142546543074278 x2= 3,141592653300477 x3= 3,141592653589793

x4= 3,141592653589793

Com apenas quatro itera¸c˜oes, conseguimos uma aproxima¸c˜ao deπcom quinze d´ıgitos ap´os a v´ırgula. O crit´erio de parada ´e o fato de que, com uma precis˜ao de quinze d´ıgitos, existen natural tal que xn+1−xn = 0,000000000000000. Esse valor n ´e 3. Logo, o processo recursivo ´e interrompido em x4. Esse exemplo ajuda a ilustrar a eficiˆencia do M´etodo de Newton-Raphson.

§69. M´etodo de Euler. M´etodos num´ericos implement´aveis em m´aquinas n˜ao servem apenas ao prop´osito de determinar zeros de certas fun¸c˜oes reais dife-renci´aveis. ´E poss´ıvel tamb´em estimar fun¸c˜oes que sejam solu¸c˜oes aproximadas de equa¸c˜oes diferenciais.

Sejax:RRuma fun¸c˜aox(t) real tal que d2x dt2 =α, sendoαum n´umero real qualquer. Logo,

dx dt =αt+β, sendoβ∈R. Portanto, x(t) =αt 2 2 +βt+γ, ondeγ∈R.

Se usarmostpara mapear tempo em segundos ex(t) para mapear posi¸c˜ao em metros de uma part´ıcula emR, dependente de tempo, temos que

d2x dt2 =α

´

e aacelera¸c˜ao constante da part´ıcula em metros por segundo por segundo, e dx

dt ´

e a suavelocidade instantˆanea em metros por segundo. Observar quex(0) =γ. Logo,γ pode ser usada para mapear posi¸c˜aox0 metros no instante 0 segundos. Al´em disso, dx dt t=0=β,

o que significa que podemos usarβ para mapear velocidade instantˆaneav0 no instante t = 0. Logo, β = v0 e γ =x0 s˜ao condi¸c˜oes de contorno da equa¸c˜ao diferencial

d2x dt2 =α.

Outra maneira de examinarmos o problema acima ´e atrav´es da substitui¸c˜ao de

dx

dt porv(t), uma fun¸c˜ao de velocidade instantˆanea. Logo, ddt2x2 =α´e equivalente a

dv dt =α.

A forma integral dessa ´ultima equa¸c˜ao diferencial ´e Z vF v0 dv= Z tF t0 αdt. Logo,vvF v0 =αttF

t0. Logo,vF −v0=α(tF −t0), o que implica em vF =v0+α(tF−t0).

Se substituirmost0por 0 etF port, temos a mesma igualdade dx

dt =αt+β, ondeβ=v0 evF =dxdt.

A forma integral da ´ultima equa¸c˜ao diferencial ´e Z xF x0 dx= Z tF t0 (αt+β)dt. Logo,xxF x0 = (αt22+βt)tF t0. Isso implica emxF−x0=αtF2 2 +βtFt02 2 −βt0. Logo, x(t) =αt 2 2 +βt+x0, se substituirmost0 por 0 etF port.

No contexto de mecˆanica cl´assica [9], oestado de uma part´ıcula sujeita `as leis de Newton pode ser representado por um par ordenado

(x(t), v(t))

(posi¸c˜ao e velocidade em cada instante de tempo t), se a part´ıcula tiver uma massa constante em rela¸c˜ao a tempo. A ideia intuitiva ´e simples: o estado da

part´ıcula deve descrever onde a part´ıcula est´a e em qual velocidade se encontra a cada instante de tempo.

Suponha que uma part´ıcula com massa m constante (em rela¸c˜ao ao tempo) mude seu estado (x(t), v(t)) de acordo com a Segunda Lei de Newton:

F(t) =mdv dt,

onde F(t) ´e uma fun¸c˜ao que descreve for¸ca total sobre a part´ıcula. A forma integral desta equa¸c˜ao diferencial ´e

Z vF v0 mdv= Z tF t0 F(t)dt.

Sendo m uma constante em rela¸c˜ao a t, a integral do lado esquerdo pode ser facilmente calculada a partir do Teorema Fundamental do C´alculo. Mas a integral do lado direito da igualdade ´e algo bem diferente, pelo fato de depender da fun¸c˜ao-for¸caF(t).

Se F(t) for uma fun¸c˜ao constante, a aplica¸c˜ao do Teorema Fundamental do C´alculo ´e vi´avel, uma vez que fun¸c˜oes constantes admitem primitivas dadas por fun¸c˜oes elementares.

Existe vasta variedade de fun¸c˜oes elementares F(t) que admitem primitivas dadas por fun¸c˜oes elementares, como polinomiais, trigonom´etricas, exponenciais e logar´ıtmicas. No entanto, nem sempre isso ocorre. Por exemplo,

F(t) =e−t2, F(t) = 1 lnt e F(t) = e −t t

s˜ao fun¸c˜oes elementares que n˜ao admitem primitivas elementares. Para detalhes, consultar o Algoritmo de Risch [26].

Para casos envolvendo fun¸c˜oes elementares que n˜ao admitem primitivas ele-mentares, uma op¸c˜ao ´e o emprego de m´etodos num´ericos a partir de fun¸c˜oes recursivas. OM´etodo de Euler ´e o mais elementar para esse prop´osito.

O M´etodo de Euler foi concebido por Leonhard Euler no s´eculo 18 (ou seja, muito antes do advento de tecnologias digitais) para oferecer solu¸c˜oes aproxima-das de equa¸c˜oes diferenciais nas quais ocorrem uma derivada de primeira ordem mas nenhuma derivada de ordem superior, desde que uma condi¸c˜ao de contorno seja dada.

No caso ilustrado acima, podemos reescrever a forma diferencial F(t) =mdv

dt

como uma equa¸c˜ao adiferen¸cas finitas na qual uma derivada ´e tratada de fato como uma raz˜ao entre n´umeros reais, como mostrado abaixo. Por conta disso, o

M´etodo de Euler fornece apenas uma solu¸c˜ao aproximada da equa¸c˜ao diferencial. Neste caso, temos:

mvn+1−vn

τ =F(tn), sendo quetn+1=tn+τ, ondeτ´e opasso de integra¸c˜ao num´erica. Logo,

vn+1=vn+τ F(tn)

m e tn+1=tn+τ.

A partir de uma condi¸c˜ao de contorno F(t0) e um passo de integra¸c˜ao τ adequadamente escolhido, em princ´ıpio ´e poss´ıvel obter pontos (tn, vn) que cor-respondem a uma restri¸c˜ao de uma aproxima¸c˜ao da primitiva deF(t), uma vez que qualquer m´aquina somente ´e capaz de processar uma quantia finita de in-forma¸c˜oes .

H´a generaliza¸c˜oes do M´etodo de Euler, como os M´etodos de Runge-Kutta. Recomendamos ao leitor que procure informa¸c˜oes sobre o tema.

§70. Modelos de ZF. Como enfatizado na Se¸c˜ao 1, a linguagemSde ZF ´e desprovida de semˆantica. Apesar das vantagens j´a discutidas sobre essa carac-ter´ıstica, h´a dificuldades inerentes a ZF que exigem algum tipo de considera¸c˜ao de car´ater semˆantico.

Como j´a foi dito, matem´aticos s˜ao ca¸cadores de teoremas n˜ao triviais. Neste contexto, considere o seguinte fato:

ZF−{Axioma do Par}Axioma do Par.

O que est´a escrito acima ´e o seguinte: na teoria formal ZF−{Axioma do Par}

(a qual conta com todos os postulados de ZF, exceto o Axioma do Par) o Axioma do Par ´e teorema.

Para provar isso, basta usar o Esquema de Substitui¸c˜ao aplicado a um conjunto xqualquer de ZF. Com efeito, basta usar uma f´ormula que selecione dois termos de x e, desse modo, se obt´em um par. Afinal, o pr´oprio x ´e elemento de um conjunto cuja existˆencia ´e garantida pelo Axioma da Potˆencia.

Resumidamente, o que foi provado acima ´e que o Axioma do Par ´e desneces-s´ario. A teoria formal axiom´atica ZF− {Axioma do Par}´e equivalente a ZF, no sentido de que todos os teoremas de uma s˜ao teoremas da outra. Por conta disso, muitos autores simplesmente omitem esse postulado em certas formula¸c˜oes de ZF e ZFC.

Logo, ´e natural questionar se fenˆomeno an´alogo ocorre com outros axiomas de ZF e ZFC. Afinal, matem´aticos querem genuinamente conhecer essa teoria formal.

No entanto, n˜ao ´e t˜ao f´acil assim responder se outros postulados podem ser simplesmente omitidos, mantendo todos os teoremas. O Axioma da Escolha ´e um exemplo hist´orico bem conhecido.

A primeira pessoa a trazer alguma luz sobre o tema foi Kurt G¨odel, apesar de Abraham Fraenkel e Andrzej Mostowski terem apresentado resultados rela-cionados ao Axioma da Escolha para uma varia¸c˜ao de ZF conhecida como ZFU. G¨odel criou ummodelo de ZF, hoje conhecido comoL, ou, universo constru-t´ıvel de G¨odel. Para isso ele precisou qualificar qual ´e um poss´ıveluniverso de discurso Lde ZF.

Em outras palavras, uma vez que os axiomas de ZF empregam quantificadores l´ogicos, o que podem significar f´ormulas como

‘para todox, isso ou aquilo acontece’ ?

O que ´e ‘para todo’ ? Obviamente, esse ‘para todo’ n˜ao pode incluir objetos como elefantes ou cal¸cas desbotadas. ´E neste momento que um modelo de ZF cumpre o papel de estabelecer um poss´ıvel universo de discurso para uma teoria como ZF.

O que G¨odel propˆos foi um universo de discurso L minimamente necess´ario para satisfazer todos os axiomas de ZF. A ideia, intuitivamente, ´e a seguinte.

Um conjunto y ´edefin´ıvel a partir de um conjuntox se existe uma f´ormula Φ tal que t pertence ay sss t pertence ax et satisfaz a f´ormula Φ. Uma vez estabelecido o que ´e um conjunto defin´ıvel a partir de outro, ´e poss´ıvel introduzir um universo de conjuntos defin´ıveis a partir do conjunto vazio como se segue.

i: Admite-se a existˆencia de um conjunto vazio chamado deL0;

ii: Se existir f´ormula Φ que permita definir um novo conjunto a partir deL0, este novo conjunto ´e elemento de um conjuntoL1;

iii: De fato, ´e poss´ıvel definir um conjuntoxa partir deL0da seguinte forma: tpertence axssstpertence aL0e Φ (seja qual for a f´ormula Φ, neste caso muito particular); com efeito, nenhum t pertence a vazio; logo, neste caso muito especial, qualquer f´ormula funciona; logo,x´e novamente o vazio; a partir disso ´e definido o conjuntoL1cujos elementos s˜ao todos os conjuntos defin´ıveis a partir deL0, ou seja, o pr´oprioL0; em outras palavras,L1conta com um ´unico elemento, a saber,L0; escrevemosL1={L0};

iv: Se existir f´ormula Φ que permita definir um novo conjuntoxa partir de L1, este novox´e elemento de um conjunto L2; logo, os elementos de L2

s˜ao apenasL0eL1, defin´ıveis pela escolha apropriada de f´ormulas; ou seja, L2={L0,{L0}};

v: Se existir f´ormula Φ que permita definir um novo conjuntox a partir de

L2, este novox´e elemento de um conjuntoL3; logo, os elementos deL3s˜ao apenas quatro, defin´ıveis a partir de f´ormulas apropriadas para este fim: L0, L1, L2 e um conjunto que tem como ´unico elemento L1; escrevemos L3={L0,{L0},{L0,{L0}},{{L0}}};

vi: Repetimos o processo acima paraL4,L5,L6e assim por diante, at´e cobrir todos os ordinais finitos;

vii: Chamamos deLω o conjunto que satisfaz a seguinte condi¸c˜ao: um con-junto x pertence a Lω sss x pertence a algum Ln, onde n ´e um ordinal finito;

viii: Chamamos deLω+1 o conjunto dos conjuntos defin´ıveis a partir deLω; Lω+2 o conjunto dos conjuntos defin´ıveis a partir de Lω+1, e assim por diante, at´e novamente cobrir todos os ordinais finitos;

ix: Chamamos deL2ω o conjunto que satisfaz a seguinte condi¸c˜ao: um con-juntoxpertence aL2ω sssxpertence a algumLω+n, onden´e um ordinal finito;

x: Chamamos deL2ω+1 o conjunto dos conjuntos defin´ıveis a partir deL2ω; L2ω+2 o conjunto dos conjuntos defin´ıveis a partir de L2ω+1, e assim por diante, at´e novamente cobrir todos os ordinais finitos;

xi: Chamamos deL3ω o conjunto que satisfaz a seguinte condi¸c˜ao: um con-juntoxpertence aL3ωsssxpertence a algumL2ω+n, onden´e um ordinal finito;

xii: Repetimos o procedimento acima paraL4ω,L5ω, e assim por diante.

xiii: Finalmente, dizemos que um conjunto xpertence a L sssx pertence a

algumLp, ondep´e um ordinal finitonoup´e+n.

No contexto acima, um conjunto ´e qualquerxque pertence aL.

Pois bem. O que G¨odel provou ´e que todos os axiomas de ZFC s˜ao satisfeitos emL.

Por exemplo, o Axioma do Vazio ´e satisfeito gra¸cas `a existˆencia deL0, o qual ´

e um elemento deL. O Axioma do Par ´e satisfeito gra¸cas ao seguinte fato: dados xey pertencentes aL, existem Lp eLq tais quexpertence aLpeypertence a

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