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O que faz a pertinˆ encia

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Nesta terceira parte a ˆenfase ´e sobre os axiomas pr´oprios de ZF, bem como os requisitos para a fundamenta¸c˜ao de certos ramos da matem´atica que encontram ampla aplicabilidade.

§16. O primeiro axioma pr´oprio de ZF. Os axiomas pr´oprios de ZF se referem explicitamente ao predicado bin´ario , no sentido de como ele se relaciona com conectivos l´ogicos, quantificadores l´ogicos e a igualdade. Segue nesta e nas pr´oximas Se¸c˜oes a lista de todos os postulados pr´oprios de ZF.

Cada axioma pr´oprio tem um nome: Extensionalidade,Vazio,Par,Potˆencia, Uni˜ao,Separa¸c˜ao,Infinito,Regularidade eSubstitui¸c˜ao. Uma varia¸c˜ao de ZF ´e discutida mais adiante, chamada de ZFC. Ela conta com os mesmos axiomas de ZF e um postulado a mais chamado deEscolha.

Segue o primeiro postulado pr´oprio de ZF.

ZF1 - Extensionalidade: ∀x∀y∀z((z∈x⇔z∈y)⇒x=y).

Os termos de ZF s˜ao chamados de conjuntos. A origem hist´orica do termo conjuntoderiva da interpreta¸c˜ao pretendida de que ZF deve capturar pelo menos parte das ideias originais de Georg Cantor, autor de um corpo do conhecimento chamadoMengenlehre(teoria de conjuntos, em tradu¸c˜ao livre do alem˜ao).

O Axioma da Extensionalidade de ZF afirma o seguinte: sexeys˜ao conjuntos que compartilham os mesmos elementosz, ent˜aox´e idˆentico ay.

De um ponto de vista intuitivo, o Axioma da Extensionalidade estabelece que um conjuntox´e identificado ´unica e exclusivamente pelos conjuntos z tais que z∈x, ou seja, por seus elementos. A rec´ıproca do Axioma da Extensionalidade ´

e teorema, como se percebe a seguir.

Teorema 3. ∀x∀y∀z(x=y⇒(z∈x⇔z∈y)).

Demonstrac¸˜ao: Sabemos quez∈x⇔z∈x´e teorema (cuja demonstra¸c˜ao pode ser exibida usando apenas os axiomas l´ogicos de ZF e Modus Ponens). Logo,z∈x⇔z∈x´e consequˆencia de qualquer premissa (Proposi¸c˜ao 4), em particular, x = y. Logo, x = y (z x z x) ´e teorema (Proposi¸c˜ao 6). Mas, de acordo com a substitutividade da igualdade, pode-mos substituir qualquer ocorrˆencia livre dexporyna f´ormulaz∈x⇔z∈

x, de modo que a nova f´ormula ´e teorema. Logo,x=y⇒(z∈x⇔z∈y) ´

Aplicando novamente temos∀y∀z(x=y (z ∈x⇔z ∈y)). Aplicando Generaliza¸c˜ao mais uma vez temos ∀x∀y∀z(x= y (z x⇔ z y)). Isso conclui a prova.

Ou seja, o Axioma da Extensionalidade, em parceria com o Teorema 3, esta-belece que a f´ormula x=y ´e equivalente a afirmar que xey compartilham os mesmos elementos. Essa ´e uma informa¸c˜ao de extraordin´aria importˆancia sobre o predicado bin´ario de pertinˆencia. Tal predicado ´e necess´ario e suficiente para identificar um conjunto.

§17. Quantificador !. Antes de prosseguir com os demais postulados de ZF, ´e ´util introduzir uma nova abrevia¸c˜ao metalingu´ıstica.

SejaAuma f´ormula de ZF. Logo,

!x(A(x))...xy(A(y)y=x)

A abrevia¸c˜ao!x(A(x)) se lˆe ‘existe um ´unicoxtal queA(x)’. A ideia intuitiva ´

e simples: existe umxtal que A(x) e, para qualquery tal queA(y), temos que y=x.

Existem outras formas para definir o quantificador !. Mas o conceito dado acima basta para nossos prop´ositos.

§18. Existem Conjuntos? O Axioma da Extensionalidade n˜ao garante a existˆencia de conjuntos. Apenas garante que, se existirem conjuntos, sabemos como identific´a-los a partir da pertinˆencia . O primeiro postulado a garantir que pelo menos um conjunto existe ´e o que se segue.

ZF2 - Vazio: ∃x∀y(y̸∈x).

Observar atentamente o quantificador existencial acima, bem como a maneira como ele opera em ‘parceria’ com o quantificador universal. Este postulado ga-rante aexistˆencia de um conjuntoxtal quenenhum conjunto y pertence a ele. O pr´oximo teorema ilustra como os postulados de ZF trabalham em ‘parceria’ uns com os outros.

Teorema 4. O conjuntoxdo Axioma do Vazio ´e ´unico.

Demonstrac¸˜ao: O Axioma da Extensionalidade pode ser reescrito como ∀x∀y∀z((z̸∈x⇔z̸∈y)⇒x=y).

Ver Teoremas 7 e 12 da lista de 16 teoremas da Se¸c˜ao 9, para saber como provar essa ´ultima f´ormula.

Ou seja, a f´ormula acima ´e teorema de ZF. Sejaxo conjunto cuja existˆ en-cia ´e garantida pelo Axioma do Vazio, i.e., para todoz temos quez ̸∈x. Supor que existe outro conjunto y (ou seja, y ̸= x) que tamb´em satisfaz o Axioma do Vazio. Logo, para todo z temos z ̸∈ y. Isso significa que

∀z(z ̸∈ x⇔ z ̸∈y). Mas, de acordo com o Axioma da Extensionalidade (na forma como est´a reescrito acima), isso implica emy=x().

O s´ımbolo usado ao final da demonstra¸c˜ao acima ´e o que se chama de contradi¸c˜ao(neste caso, a contradi¸c˜ao sinalizada pelo s´ımbolo´ey ̸=x∧y=x). Uma vez que P ∨ ¬P ´e teorema para qualquer f´ormula P, se ¬P garante uma contradi¸c˜ao, ent˜aoP deve ser teorema. Uma vez que a nega¸c˜ao da tese acima produz uma contradi¸c˜ao, ent˜ao deve valer a tese como teorema. A tese em quest˜ao pode ser escrita formalmente como se segue:

!x(∀y(y̸∈x)).

Caso o leitor n˜ao saiba, a express˜ao ‘i.e.’ usada na ´ultima prova ‘id est’ que, em latim, se traduz como ‘isto ´e’.

Um exerc´ıcio interessante para o leitor ´e escrever formalmente o Teorema 4 usando apenas os quantificadorese, de acordo com a Se¸c˜ao 17. Obviamente, o que legitima tal demonstra¸c˜ao ´e a hip´otese de que ZF ´e consistente (ou seja, a hip´otese de que n˜ao existe f´ormulaAtal que ambasA e¬A s˜ao teoremas de ZF), algo que at´e hoje n˜ao se sabe se ´e o caso.

Como j´a dito anteriormente, o teorema P ∨ ¬P ´e conhecido como Princ´ıpio do Terceiro Exclu´ıdo. Este legitima as demonstra¸c˜oes reductio ad absurdum (redu¸c˜ao ao absurdo, em tradu¸c˜ao livre do latim): se a nega¸c˜ao de uma tese (a qual ´e t˜ao somente uma f´ormula) implica em contradi¸c˜ao, ent˜ao a tese ´e teorema. Uma vez que acabamos de provar que conjunto vazio ´e ´unico, este ´e uma constante de ZF. Por conta disso ´e usual a ado¸c˜ao de um s´ımbolo especial para tal constante: . Ou seja,

∀y(y̸∈ ∅).

Aqui cabe uma observa¸c˜ao de car´ater hist´orico, filos´ofico, matem´atico e did´ ati-co. A experiˆencia em sala de aula revela que muitos alunos encontram dificuldade para compreender e aceitar a t´ecnica de demonstra¸c˜ao por redu¸c˜ao ao absurdo. Pois bem, isso n˜ao ´e exclusividade de alunos. Alguns matem´aticos, justamente por conta de suas experiˆencias profissionais, tamb´em criticam essa t´ecnica de demonstra¸c˜ao.

No in´ıcio do s´eculo 20, Luitzen Egbertus Jan Brouwer n˜ao aceitava a t´ecnica de demonstra¸c˜ao por redu¸c˜ao ao absurdo. Uma vez que ela ´e sustentada pelo Princ´ıpio do Terceiro Exclu´ıdo, na vis˜ao de Brouwer a f´ormulaP ∨ ¬P s´o pode ser teorema se existir uma demonstra¸c˜ao paraP ou uma demonstra¸c˜ao para¬P, de modo que qualquer demonstra¸c˜ao de uma n˜ao pode depender do ‘fracasso’ de outra, por conta de uma contradi¸c˜ao. Provar que a nega¸c˜ao¬P de uma teseP

implica em uma contradi¸c˜ao, n˜ao garante queP ´e teorema, segundo a postura filos´ofica de Brouwer. Com efeito, se a nega¸c˜ao de uma tese ´e uma contradi¸c˜ao, apenas foi provado que tal nega¸c˜ao da tese ´e uma contradi¸c˜ao, nada al´em disso. Por conta dessa vis˜ao, este conhecido matem´atico holandˆes rejeitava a l´ogica cl´assica usada hoje para edificar ZF.

Para apresentar uma proposta em oposi¸c˜ao `a l´ogica cl´assica, Brouwer intro-duziu a L´ogica Intuicionista, na qual o Princ´ıpio do Terceiro Exclu´ıdo n˜ao ´e teorema.

Hoje em dia existem diversos sistemas formais que empregam l´ogica intuicio-nista, incluindo uma vers˜ao intuicionista de ZF [4]. Essa ´ultima referˆencia ´e um livro n˜ao publicado de John Bell, mas gratuitamente dispon´ıvel em pdf na internet. At´e onde sabemos, n˜ao h´a livros p´ublicados sobre o tema.

Outro exemplo ´e a An´alise Infinitesimal Suave. Esta ´ultima permite desen-volver uma forma de c´alculo diferencial e integral na qual todas as fun¸c˜oes s˜ao cont´ınuas, algo que n˜ao ocorre no C´alculo Diferencial e Integral Padr˜ao (ver Defini¸c˜ao 59). Al´em disso, demonstra¸c˜oes por redu¸c˜ao absurdo n˜ao s˜ao aplic´aveis em an´alise infinitesimal suave. Se o leitor estiver interessado, no livro de John Bell [3] h´a uma excelente e sucinta exposi¸c˜ao sobre o tema, onde derivadas e integrais podem ser definidos sem a necessidade de limites. No c´alculo padr˜ao derivadas e integrais s˜ao casos especiais de limites.

No entanto, a motiva¸c˜ao de Brouwer era meramente filos´ofica, apesar de hoje encontrar grande repercuss˜ao em matem´atica e at´e mesmo f´ısica te´orica. Neste livro adotamos l´ogica cl´assica.

Em l´ogica cl´assica o Princ´ıpio do Terceiro Exclu´ıdo ´e teorema. Portanto, demonstra¸c˜oes por redu¸c˜ao ao absurdo podem ser empregadas para a obten¸c˜ao de teoremas. Essas informa¸c˜oes devem ajudar o leitor a perceber que existem muitas formas para desenvolver matem´atica. Neste livro apenas tangenciamos uma dessas formas, a qual ´e a mais usual.

Garantir a existˆencia de um ´unico conjunto em ZF, a saber, o vazio, ´e insufi-ciente para a pr´atica matem´atica. Logo, precisamos de mais postulados.

ZF3 - Par: ∀x∀y∃z∀t(t∈z⇔(t=x∨t=y)).

O Axioma do Par garante a existˆencia de outros conjuntos z (chamados de pares) al´em de(observar o quantificador existencial∃z).

O Axioma do Par diz o seguinte: dadosxey,existe z cujos elementos s˜aox ouy. Por exemplo, uma vez que ´e garantida a existˆencia do conjunto vazio , o Axioma do Par garante a existˆencia de um z tal que t ∈z se, e somente se, t=∅ ∨t= (aqui os termos xey do Axioma do Par assumem os valores e

). Neste caso o Axioma da Extensionalidade garante que z ̸=, uma vez que

∅ ∈zmas∅ ̸∈ ∅.

Neste momento se mostra ´util a introdu¸c˜ao de s´ımbolos auxiliares metalin-gu´ısticos novos: {e}(chamados de chaves).

Sez´e um par com elementos xey, denotamos isso por z={x, y}, desde que=y. Sex=y, escrevemos z={x} ou z={y}.

O Axioma da Extensionalidade garante que{x, y}={y, x}. Se o parz conta com um ´unico elemento, ele ´e chamado de singletonouunit´ario.

Exemplo: Sejam x = e y = . Logo, z = {∅}. Neste caso z ´e um singleton.

Exemplo: Sejam x= ey ={∅}. Logo,z ={∅,{∅}}. Com efeito, a existˆencia de´e garantida pelo Axioma do Vazio, enquanto a existˆencia de{∅}´e garantida pela aplica¸c˜ao do Axioma do Par no exemplo anterior. Observar que, de acordo com o Axioma de Extensionalidade,{∅,{∅}}=

{{∅},∅}.

O emprego de chaves{e}como novos s´ımbolos auxiliares motiva uma nota¸c˜ao alternativa para o conjunto vazio, a saber, {}. Apesar desta ser uma nota¸c˜ao bastante comum na literatura, ela n˜ao ´e empregada aqui.

Teorema 5. Sex´e um conjunto unit´ario e x=y, ent˜ao y ´e unit´ario.

Demonstrac¸˜ao: Sex´e unit´ario,∃a(x={a}). Supor que y n˜ao ´e unit´ario. Logo, existe pelo menos um elemento t em y tal que t ̸=a. Logo, t ̸∈x. Logo, o Axioma da Extensionalidade garante que=y.

O Axioma do Par garante a existˆencia de uma infinidade de conjuntos. Basta aplic´a-lo repetidas vezes a partir do conjunto vazio. No entanto, cada um dos conjuntos obtidos a partir de Par e Vazio conta com, no m´aximo, dois elementos. Para fins de fundamenta¸c˜ao da pr´atica matem´atica isso ´e muito pouco. Da´ı a necessidade de mais postulados! Mas, antes de seguirmos com novos axiomas, segue uma defini¸c˜ao muito ´util: par ordenado.

Definic¸˜ao3. (a, b)...{{a},{a, b}}(Kuratowski).

Na defini¸c˜ao abreviativa acima n˜ao est´a sendo introduzida qualquer abrevia¸c˜ao metalingu´ıstica para uma f´ormula de ZF, mas uma abrevia¸c˜ao metalingu´ıstica para um termo denotado por (a, b). Obviamente tal manobra pode ser adaptada para a seguinte forma:

t= (a, b)...t={{a},{a, b}} ou

t= (a, b)...xy(xtytaxayby), sendotobtido por repetidas aplica¸c˜oes do Axioma do Par.

Observar que (a, b) ´e um conjunto, uma vez queaebs˜ao conjuntos. O termo (a, b) ´e chamado depar ordenado. Esse nome se justifica pelo pr´oximo teorema.

Teorema 6. (a, b) = (c, d)se, e somente se,a=c eb=d.

Demonstrac¸˜ao: Uma vez que o teorema ´e dado por uma bicondicional, a

demonstra¸c˜ao ´e dividida em duas partes. A conjun¸c˜ao do final de ambas as partes ´e exatamente o teorema.

Parte. De acordo com a defini¸c˜ao de Kuratowski, (a, b) ={{a},{a, b}}

e (c, d) = {{c},{c, d}}. Se a=c eb =d, o Axioma da Extensionalidade garante que (a, b) = (c, d).

Parte. Essa segunda parte da demonstra¸c˜ao deve ser dividida em duas poss´ıveis situa¸c˜oes: (i) o caso em que a = b e (ii) o caso em quea ̸=b. Se a= b, temos que (a, b) = (a, a) = {{a}}. Logo, o par ordenado (a, b) ´

e unit´ario. Mas o Teorema 5 garante que (c, d) ´e unit´ario. Logo, (c, d) =

{{c}}, sendo c=d. Logo, {{a}}={{c}}. O Axioma da Extensionalidade garante que a=c. Neste caso b =d´e consequˆencia da transitividade da igualdade. O restante da demonstra¸c˜ao fica a cargo do leitor interessado.

Exemplo: O par ordenado (∅,{∅}) ´e diferente do par ordenado ({∅},∅). Com efeito,

(∅,{∅}) ={{∅},{∅,{∅}}}

e

({∅},∅) ={{{∅}},{∅,{∅}}}.

Apesar de ambos os conjuntos compartilharem um elemento em comum, a saber,{∅,{∅}}, o termo{∅}pertence ao primeiro par ordenado mas n˜ao ao segundo. Logo, o Axioma da Extensionalidade garante que (∅,{∅})̸= ({∅},∅).

A defini¸c˜ao de par ordenado, introduzida por Kazimierz Kuratowski, motiva nova nomenclatura. Qualquer par obtido pelo Axioma do Par ´e chamado de par n˜ao ordenado. Isso porque, por exemplo, {∅,{∅}} = {{∅},∅} (apesar de (∅,{∅}) ̸= ({∅},∅)). Neste contexto, pares ordenados s˜ao casos particulares de pares n˜ao ordenados. O que permite estabelecer relevˆancia na ‘ordena¸c˜ao’ de um par ordenado ´e o fato de ZF ser uma teoria com igualdade. Essa foi a ideia genial de Kuratowski!

A defini¸c˜ao de par ordenado n˜ao foi uma conquista f´acil em l´ogica-matem´atica. Detalhes em [28].

§19. Potˆencia, uni˜ao arbitr´aria e uni˜ao finit´aria. Os axiomas do Vazio e do Par n˜ao garantem a existˆencia de conjuntos suficientes para a pr´atica matem´atica. Logo, precisamos de novos postulados. Mas, antes disso, as se-guintes defini¸c˜oes s˜ao ´uteis.

Definic¸˜ao4. i: x y ... t(t x t y); lemos x y como ‘x ´e subconjunto dey’ ou ‘xest´a contido emy’;

ii: x⊂y...xyx̸=y; lemosxy como ‘x´esubconjunto pr´oprio dey’;

iii: x̸⊆y...¬(xy);

iv: x̸⊂y...¬(xy).

Ou seja,x´e subconjunto deysss todo elementotdex´e elemento dey. Al´em disso,x´e subconjunto pr´oprio dey sssx´e subconjunto dey ex´e diferente de y.

Exemplos: (i){∅} ⊆ {∅,{∅}}; (ii){∅} ⊂ {∅,{∅}};

(iii){∅,{∅}} ̸⊆ {∅}; (iv){∅} ⊆ {∅}; (v){∅} ̸⊂ {∅}.

Teorema 7. Todo conjunto ´e subconjunto de si mesmo.

Demonstrac¸˜ao: Formalmente, o teorema estabelece que ∀x(x x). De acordo com a Defini¸c˜ao 4, devemos provar que

∀x∀t(t∈x⇒t∈x).

Mas t ∈x⇒t x´e teorema em ZF (de acordo com Teorema 1). Logo, aplicando Generaliza¸c˜ao duas vezes, temos∀x∀t(t∈x⇒t∈x).

Em particular, foi provado acima que∅ ⊆ ∅. No entanto, o pr´oximo teorema mostra que vazio n˜ao ´e subconjunto apenas dele mesmo.

Teorema 8. O conjunto vazio ´e subconjunto de qualquer conjunto.

Demonstrac¸˜ao: Formalmente, o teorema estabelece que∀x(∅ ⊆x). Supor que¬∀x(∅ ⊆x). Logo,∃x(∅ ̸⊆x). Logo, existettal que t∈ ∅ ∧t̸∈x. . Mais uma vez redu¸c˜ao ao absurdo foi usada como t´ecnica de demonstra¸c˜ao, uma vez que empregamos aqui a l´ogica cl´assica. A ideia intuitiva da prova acima ´e a seguinte. Supor que a tese n˜ao ´e teorema, ou seja, n˜ao ´e teorema a afirma¸c˜ao de que o conjunto vazio ´e subconjunto de todo e qualquer conjunto. Isso ´e equivalente a afirmar que existe pelo menos um conjuntoxtal que n˜ao ´

e subconjunto de x. Mas isso, de acordo com a defini¸c˜ao de subconjunto, ´e equivalente a afirmar que existe pelo menos umtque pertence a de modo que t n˜ao pertence a x. N˜ao obstante, ´e um conjunto que n˜ao admite elemento algum. Logo, a nega¸c˜ao da tese garante uma contradi¸c˜ao (a existˆencia de umttal quet∈ ∅, sendo que nenhumt pertence a vazio). Logo, o Princ´ıpio do Terceiro Exclu´ıdo (um dos teoremas de ZF) garante que a tese ´e necessariamente teorema. Uma confus˜ao frequente entre aprendizes de matem´atica reside na diferen¸ca entre e. O ´ultimo teorema ´e uma ´otima oportunidade para evitar tal des-conforto desnecess´ario. Basta observar que ∅ ̸∈ ∅, uma vez que termo algum pertence a vazio. No entanto, ∅ ⊆ ∅, uma vez que vazio ´e subconjunto de qualquer conjunto, incluindo, obviamente, o pr´oprio vazio. Ambas as f´ormulas

∅ ̸∈ ∅

e

∅ ⊆ ∅

s˜ao teoremas de ZF. Isso implica que as f´ormulas∅ ∈ ∅e∅ ̸⊆ ∅n˜ao s˜ao teoremas de ZF.

ZF4 - Potˆencia: ∀x∃y∀t(t∈y⇔t⊆x).

O conjuntoyacima ´e chamado depotˆencia dex. Sex´e um conjunto qualquer, sua potˆenciay(cuja existˆencia ´e garantida por ZF4) ´e o conjunto cujos elementos s˜ao todos os subconjuntostdex. O Axioma da Extensionalidade garante que a potˆenciayde qualquer conjuntox´e ´unica (mais um teorema que sugiro ao leitor demonstrar). Por conta disso, usualmente a potˆenciay dex´e denotada por

y=(x).

Em particular, se c´e uma constante de ZF, ent˜ao (c) tamb´em ´e uma cons-tante de ZF.

Exemplos(i) Sex=, ent˜ao(x) ={∅}; (ii) se x={∅}, ent˜ao(x) ={∅,{∅}}; (iii)({∅,{∅}}) ={∅,{∅},{{∅}},{∅,{∅}}}.

Observar que, sextemnelementos, ent˜ao(x) tem 2nelementos (um simples problema de an´alise combinat´oria). No exemplo (iii) acima, o conjunto{∅,{∅}}

tem dois elementos, enquanto({∅,{∅}}) tem 22 elementos, ou seja, 4.

Aqui cabe uma observa¸c˜ao. Essa conta 2n, para o n´umero de elementos da potˆencia de um conjunto com n elementos, est´a sendo feita aqui no contexto da metalinguagem usada para falarmos sobre a linguagem-objetoSusada para edificar ZF. No entanto, ´e poss´ıvel qualificar com precis˜ao o que ´e o ‘n´umero’ de elementos de um conjunto. Isso se faz a partir da no¸c˜ao decardinalidade de um conjunto. No entanto, este ´e outro assunto que escapa de nossos prop´ositos para um texto meramente introdut´orio. Para detalhes sobre cardinalidade de um conjunto, ver [17]. Para um estudo muito mais avan¸cado sobre o tema, ver [19].

Gra¸cas aos quatro primeiros axiomas de ZF, podemos garantir agora a exis-tˆencia de uma infinidade de conjuntos, incluindo aqueles que contam com 2n

elementos (2,4,8,16,...).

O pr´oximo ´e o Axioma da Uni˜ao.

ZF5 - Uni˜ao: ∀x∃y∀z(z∈y⇔ ∃w(z∈w∧w∈x)).

Chamamosydeuni˜ao arbitr´aria dos termoswque pertencem axe denotamos isso como

y= [

w∈x

w.

Em outras palavras, dado um conjuntox, os elementos dey (cuja existˆencia ´

e garantida por ZF5) s˜ao os termos zque pertencem aw, para cadawque per-tence ax. Novamente o Axioma da Extensionalidade garante que, para cadax,

a uni˜ao arbitr´ariay=S

w∈xw´e ´unica.

Exemplo: Sejax={∅,{∅},{{∅}},{∅,{∅}}}. Logo,S

w∈xw={∅,{∅}}. Sex={r, s}, denotamos abreviadamenteS

w∈xwcomo r∪s. Neste caso, a uni˜ao arbitr´aria ´e chamada deuni˜ao finit´aria.

Teorema 9. Sex´e o par{r, s}, ent˜ao ∀t(t∈r∪s⇔(t∈r∨t∈s)). A prova deste ´ultimo fica a cargo do leitor interessado.

Teorema 10. Uni˜ao finit´aria tem elemento neutro, ´e associativa e ´e

comu-tativa.

Formalmente, o teorema acima estabelece que

∀x(x∪ ∅=x), ou seja,´e o elemento neutro mencionado,

∀x∀y∀z(x∪(y∪z) = (x∪y)∪z) e

∀x∀y(x∪y=y∪x),

respectivamente. As demonstra¸c˜oes desses resultados ficam a cargo do leitor interessado. Se o leitor demonstrar o Teorema 9, a demonstra¸c˜ao deste ´ultimo se torna praticamente imediata a partir da lista de 16 teoremas da Se¸c˜ao 9.

§20. Separa¸c˜ao. Considere as seguintes f´ormulas, conhecidas historicamente comoEsquema da Compreens˜ao. SeP(y) ´e uma f´ormula, ent˜ao

∃x∀y(y∈x⇔ P(y)).

Nos prim´ordios da teoria de conjuntos, antes do trabalho de Ernst Zermelo (um dos criadores de ZF), o Esquema da Compreens˜ao determinava que um conjunto x pode ser definido por um predicado mon´adico P(y) (ou seja, uma f´ormula com ocorrˆencias livres dey). Para cada f´ormula P temos um axioma. Da´ı o nomeEsquema da Compreens˜ao!

Ou seja, abreviadamente, o conjuntox, cuja existˆencia era garantida por uma f´ormulaP que seus elementos ydevem satisfazer, era denotado como

x={y| P(y)}

(lˆe-se ‘o conjuntoxdos elementosytais queP(y)’). Neste sentido, em particular, o conjuntoxde todos os conjuntos pode ser definido comox={y|y=y}. Com efeito, todo conjuntoy´e idˆentico a si mesmo. Afirmar quey´e um conjunto, neste contexto, equivale a afirmary∈x. Como caso especial, temos quex∈x.

No entanto, apliquemos o Esquema da Compreens˜ao para definir um outro conjuntoxda seguinte maneira:

x={y|y̸∈y}.

Neste caso, o predicado mon´adicoP(y) ´ey̸∈y. Sex∈x, ent˜aoxdeve satisfazer a f´ormula em quest˜ao. Logo, x̸∈x. Sex̸∈x, ent˜aoxdeve pertencer ax, uma

vez que satisfaz a f´ormula em quest˜ao. Logo,x∈x. Resumidamente, temos que, neste caso,x∈xex̸∈x.

Este ´e o c´elebre Paradoxo de Russell (1901), o qual mostra que o Esquema da Compreens˜ao ´e inconsistente com os demais postulados de ZF (uma vez que x∈x∧x̸∈x). Logo, o Princ´ıpio da Explos˜ao (Se¸c˜ao 12) garante que, em uma teoria formal com os axiomas ZF1ZF5 + Esquema da Compreens˜ao, qualquer f´ormula ´e teorema. Tal resultado ´e obviamente indesej´avel.

Para evitar essa antinomia, uma poss´ıvel solu¸c˜ao ´e a ado¸c˜ao do Esquema de Separa¸c˜ao de Zermelo, como se segue.

SeF(y) ´e uma f´ormula onde n˜ao h´a ocorrˆencias livres dex, ent˜ao:

ZF6F - Separac¸˜ao: ∀z∃x∀y(y∈x⇔y∈z∧ F(y)).

O conjuntoxdo postulado acima (cuja existˆencia ´e garantida pelo Esquema de Separa¸c˜ao) ´e usualmente denotado por

x={y∈z| F(y)}.

Neste contexto, a existˆencia de um conjuntox, cujos elementos s˜ao termosytais queF(y), depende da existˆencia de um conjuntoztal que os termosypertencem a z. Comumente z ´e chamado de conjunto universo, o qual pode ser qualquer conjunto cuja existˆencia ´e garantida pelos axiomas de ZF.

Novamente o Axioma da Extensionalidade garante que o conjunto {y z | F(y)}´e ´unico, desde que seja dado o conjuntoz, bem como a f´ormula F. Al´em disso, seF ´e equivalente a uma f´ormulaG (ou seja,F ⇔ G), ent˜ao

{y∈z| F(y)}={t∈z| G(t)}.

O Esquema de Separa¸c˜ao permite, entre outras coisas, definir adiferen¸caentre conjuntos: dados os conjuntosxey, a diferen¸ca entrexey ´e dada por

x−y={t∈x|t̸∈y}.

Exemplo: Sejam x={∅,{∅},{{∅}},{∅,{∅}}} ey =S

w∈xw, ou seja, y={∅,{∅}}. Logo,

x−y={{{∅}},{∅,{∅}}}.

Com efeito, os elementos dex−y s˜ao aqueles que pertencem a xmas n˜ao a y. Analogamente,y−x=; isso porquey⊆x.

O exemplo acima deixa claro que diferen¸ca entre conjuntos ´e n˜ao comutativa.

Moral da Hist´oria: Para definir um conjunto xcujos elementosy devem satisfazer a uma f´ormula F ´e necess´ario qualificar um conjunto universo z tal

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