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3 O ESTUDO PIONEIRO DE WILLIAM LABOV, DESENVOLVIDO NA ILHA DE

5.4 A CONSTITUIÇÃO DA AMOSTRA

Os dados que constituem essa amostra foram obtidos em dois corpora: no PORTVIX e em um grupo de controle composto de gravações de conversas casuais sem que o falante tivesse conhecimento prévio do evento. A seguir discorreremos sobre cada um dos corpora:

5.4.1 A constituição do PORTVIX

O PORTVIX corresponde a banco de dados do português falado na cidade de Vitória, elaborado por gravações de entrevistas orais, tendo como orientação a abordagem da metodologia laboviana, em situação de entrevista entre dois entrevistadores e entrevistado.

Seguindo esse modelo, que busca obter um maior número de dados com o máximo de qualidade, com vistas a representar a comunidade linguística pesquisada, as entrevistas do PORTVIX foram efetuadas obedecendo a etapas, conforme veremos adiante. Cabe informar que a intenção sempre foi a de minimizar, cuidadosamente, o paradoxo do observador, buscando, dessa forma, atingir o vernáculo, a fala distensa, com o mínimo de interferência do observador, em outras palavras, atingir a fala casual, o correlato da fala espontânea, na situação de entrevista, segundo Labov (2008, p. 111).

Na etapa inicial das entrevistas, houve a realização de, pelo menos, dois contatos entre entrevistador e entrevistado. Em um primeiro momento, os pesquisadores levantaram os

dados gerais do informante, perguntando o nome, o grau de escolaridade, endereço. Depois, houve a elaboração de um roteiro de entrevistas. Finalmente, estas foram efetuadas, por intermédio de perguntas semidirigidas, nas quais os informantes discorriam sobre vários temas, realizando, assim, diferentes tipos discursivos, como narrativos, descritivos, dissertativos, receitas, relatos de vida, entre outros.

De acordo com Yacovenco (2002, p. 107), para a coleta de dados do Projeto PORTVIX foram feitas (46) quarenta e seis entrevistas, controladas pelas variáveis sexo, faixa etária e nível de escolaridade dos informantes, cujas características comuns eram as de serem naturais de Vitória, de terem pais capixabas e de residirem sempre nesta cidade. As entrevistas foram distribuídas da seguinte maneira:

(idade) 07-14 15-25 26-49 + de 50

(sexo) H M H M H M H M

Ensino fundamental 4 4 2 2 2 2 2 2 20

Ensino médio 3 3 2 2 2 2 14

Ensino Universitário 2 2 2 2 2 2 12

Número total de informantes a serem entrevistados 46

Quadro 10 - Distribuição das células sociais.

Para se desenvolver um estudo sobre a variação, uma das principais etapas está relacionada à coleta dos dados, que deve ser obtida na situação real do discurso, inserida no contexto social em que se manifesta. A escolha dos dados ocorre usando-se o método de gravações de entrevistas orais com falantes de uma comunidade. Para captar a língua usada em determinada comunidade, a melhor modalidade linguística é aquela em que o falante não monitora a sua fala, permitindo, assim, chegar ao vernáculo, ou seja, a uma fala distensa em que o falante presta o mínimo de atenção à sua própria fala. Entretanto, tem-se uma situação contraditória, denominada por Labov como paradoxo do observador, porque “o objetivo da pesquisa linguística na comunidade deve ser descobrir como as pessoas falam quando não estão sendo sistematicamente observadas” (Labov, 2008, p. 244), porém, para se coletarem os dados, é necessário que o pesquisador esteja em uma situação direta de interação com o informante e essa proximidade pode prejudicar o caráter natural da fala.

As entrevistas do PORTVIX foram feitas em etapas, conforme explicado anteriormente, de acordo com as orientações apontadas pela teoria dos estudos labovianos. Além disso, foram usados todos os procedimentos a fim de se minimizarem os aspectos do paradoxo do

observador. Mas, mesmo seguindo a metodologia laboviana, ocorreu a seguinte situação: em

observação empírica, intuitiva, dos falantes de Vitória, percebia-se a presença recorrente de

cê, mas ao se fazer a análise quantitativa de parte dos dados do corpus do Português Falado na

Cidade de Vitória (PORTVIX) observou-se um número elevado do pronome você.

Esses cálculos iniciais foram obtidos pelo cálculo de frequência da variante da variável dependente por meio do programa computacional GOLDVARB X, que possibilitou apontar os primeiro resultados estatísticos dos dados coletados. Para este trabalho, foram analisadas 24 entrevistas, como será explicitado na página 78.

A partir desses resultados, surgiu o interesse de se gravar, de forma também sistemática, mas de modo anônimo, conversas que não se constituíssem em entrevistas, pois era intuitivamente percebido na fala de Vitória o uso frequente do item cê. A observação era de que as duas formas coexistiam e a nossa hipótese apontava para o fato de que as ocorrências transcorriam de forma equilibrada. Porém, os resultados iniciais do PORTVIX não indicavam esse fato, pois você encontrava-se estatisticamente muito acima do pronome cê. Por esse motivo, surgiu a necessidade de se constituir um corpus, diferente daquele normalmente captado em entrevistas labovianas típicas, o qual pudesse se constituir em um grupo de controle, a fim de que pudéssemos compará-lo ao PORTVIX, e, assim, confirmar ou não a nossa hipótese.

Existem situações em que o falante presta menos atenção ainda à sua fala, como aponta Labov (2008, p. 110), “por mais que o falante nos pareça informal ou à vontade, podemos sempre supor que ele tem uma fala mais informal, outro estilo no qual se diverte com amigos e discute com a mulher”. Seguindo essa linha de pensamento, julgamos pertinente fazer gravações secretas, como será explicado a seguir, para captar uma fala casual (casual speech) em que os falantes empregam um estilo menos monitorado.

5.4.2 A constituição da amostra da Fala Casual

Para a amostra desse grupo de controle, foram feitas duas gravações de conversas sem que os falantes tivessem o conhecimento prévio do evento. Nas duas situações de captação de fala, teve-se o cuidado de trabalhar somente com pessoas que fossem bem próximas do âmbito familiar e com pessoas da própria família da pesquisadora. Cabe dizer que se buscou captar uma conversa aleatória entre as pessoas, geralmente um bate-papo bastante descontraído.

É importante frisar que, ao final da gravação, os participantes foram informados que sua fala havia sido gravada. Nesse momento, também foram informados que o registro oral seria aplicado em um estudo científico sobre a ocorrência da variação você e suas variantes na cidade de Vitória.

Depois desse procedimento, foi solicitada dos falantes autorização para o uso dos dados, havendo a anuência de todos os participantes em relação ao uso do documento, a qual se encontra devidamente comprovada na gravação. Ressaltamos que, se porventura não houvesse concordância para o uso da fala por parte de algum dos envolvidos, a gravação seria apagada na presença dos falantes.

5.4.2.1 A primeira gravação do grupo de controle com a Fala Casual

O documento da primeira gravação constitui-se da fala de cinco informantes capixabas, residentes em Vitória, sendo três do gênero masculino e dois do gênero feminino. Destas, uma delas é a própria pesquisadora. Inclusive, a intuição da pesquisadora era de que ela própria pronunciava mais cê do que você, o que não se confirmou, conforme veremos adiante. Os informantes inserem-se em duas faixas etárias (entre 26 a 49 anos e mais de 49 anos) e nos três níveis de escolaridade (ensino fundamental, médio e universitário). Cabe ressaltar que, dos cinco informantes, quatro são membros de uma mesma família (mãe, dois filhos e um sobrinho) e a pesquisadora se encontra na condição de amiga dessa família.

5.4.2.2 A segunda gravação do grupo de controle com a fala casual

A segunda gravação foi feita com a própria família da pesquisadora e participaram quatro pessoas, representando gerações que vão da bisavó ao bisneto. A matriarca – 78 anos, a filha desta – 50 anos, a neta da matriarca – 33 anos e o bisneto – 7 anos. Todos os participantes são naturais de Vitória, com exceção da pesquisadora.

Neste ponto, cabe dizer que a pesquisadora se colocou como participante e observadora das duas gravações de Fala Casual. É também pertinente dizer que ela é moradora de Vitória há 39 (trinta e nove) anos, é natural de Resende (RJ), mas, aos 20 (vinte) dias de nascida, foi morar em Governador Valadares (MG), permanecendo naquela cidade até os 11 (onze) anos, quando se mudou para Vitória (ES).

Os níveis de escolaridade dos participantes são o fundamental e o universitário.