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Este capítulo aborda os aspectos metodológicos que embasam nossa análise. Trata-se da operacionalização dos conceitos dos estudos sobre jornalismo, identidade e práticas que foram trabalhados nos dois últimos capítulos. Faz também da descrição de nossa trajetória metodológica, das escolhas que consideramos mais apropriadas, tendo em vista o estudo da identidade dos jornalistas-intelectuais. Iniciaremos o capítulo apresentando os métodos e técnicas utilizados na pesquisa. A seguir discutiremos os critérios de seleção do corpus da pesquisa, agendamento e realização das entrevistas. Finalizaremos falando sobre a edição e tratamento do material.

3.1 – Histórias de vida

Embora o objetivo desta tese tenha sido, desde o início, a análise das identidades dos jornalistas-intelectuais, a escolha sobre o modo de abordar e tratar esse problema mudou no decorrer da pesquisa. Após as primeiras leituras (Ianni, 1998; Ortega & Humanes, 2000; Ringer, 2000) buscamos situar a identidade do grupo a partir da construção de uma categoria tipológica, definida a partir de alguns critérios objetivos em torno do que seriam as características e a função social dos intelectuais. Construído o tipo ideal, trataríamos de enquadrar a identidade do grupo e defini-lo como os jornalistas-intelectuais. Situados dentro dessa perspectiva, a coleta e a interpretação dos dados feita a partir de entrevistas serviria apenas para confirmar nossos pressupostos teóricos83.

A partir de investigações teóricas e metodológicas, abandonamos a pretensão de compreender a identidade desse grupo de fora para dentro e definimos a interação como locus em que ela é negociada, articulando sua dimensão subjetiva e social. Tendo isso como pressuposto, fomos em busca do melhor método aplicado à análise de nosso objeto. Consideramos que o estudo da identidade dos jornalistas-intelectuais deveria se centrar na forma como eles geriam seus estatutos por ocasião da apresentação de si e nas relações com outros atores ligados ao mundo social. Essas características sugeriram que adotássemos uma

83 O fundamento epistemológico desse tipo de abordagem é identificada com a proposta hipotético-dedutiva da teoria sobre refutabilidade nas ciências sociais do positivismo lógico popperiano, o qual tivemos acesso. Sobre o assunto, ver: POPPER, K. Conjecturas e Refutações (O Progresso do Conhecimento Científico). Brasília: Ed. UnB, 1980

abordagem etnográfica, trabalhando em profundidade um material que, em alguma medida, remetesse a questões identitárias.

Duas outras questões também pareceram importantes para o desenvolvimento dos nossos objetivos. A reputação adquirida por esses atores não correspondia exatamente à idéia engendrada no espaço jornalístico como a de uma “trajetória de sucesso”. Por isso, era preciso analisar como o indivíduo organizava sua carreira profissional no mundo dos jornalistas. Além disso, precisávamos entender como essa identidade dialogava com as transformações históricas que atingiam o meio jornalístico e intelectual. Tais questões nos levaram a trabalhar também com uma dimensão temporal na análise do processo de negociação das identidades. Ao buscarmos conciliar todos esses objetivos, escolhemos o método das histórias de vida (life-histories) aplicado ao estudo dos jornalistas-intelectuais.

Desenvolvidas durante o período da idade de ouro da sociologia em Chicago (Becker, 1997), as histórias de vida são um dos mais versáteis métodos das ciências sociais (Connel & Wood, 2002). Elas garantem flexibilidade de interpretação de um conjunto de dados, sem a necessidade de adaptá-los às amarras de um modelo hipotético dedutivo (Blumer, 1982).

As histórias de vida não são consideradas como dados do ponto de vista da vertente positivista-funcionalista das ciências sociais. Mas também não devem ser consideradas autobiografias convencionais e muito menos ficção (Becker, 1997). Elas partem da pequena história do narrador (entrevistado) para lançar luz sobre uma transformação social. Enfatizam, assim, a forma como o indivíduo modela a sociedade, ao mesmo tempo em que é modelado por ela (Heniz & Krüger, 2001; Laville & Dionne, 1999; McCall & Wittner, 1990).

Heniz & Krüger (2001) explicam que as histórias de vida podem ser analisadas a partir de dois métodos de pesquisa. O primeiro é a vertente norte-americana que enfatiza os documentos pessoais (diários, correspondências, entre outros) e os métodos etnográficos (entrevistas informais, observação participante). Já os pesquisadores europeus preferem a coleta de narrativas orais, como entrevistas e os documentos necessários à reconstrução histórica de um fenômeno social ou cultural.

Em nossa análise trabalharemos com o método europeu das histórias de vida. Na verdade, alguns aspectos do método norte-americano seriam de difícil operacionalização quando aplicados ao nosso objeto. Primeiro, a decisão de trabalhar com um corpus de jornalistas-intelectuais vivos inviabiliza o uso de documentos pessoais. Como são jornalistas cuja atividade e a reputação não se limitam à atuação nas redações, seria também complicado realizarmos uma pesquisa etnográfica tradicional, de observação participante, pois não há um cenário específico de pesquisa, nem uma rotina profissional a ser rigorosamente observada.

Além disso, as questões de gestão estatutária que nos interessam no estudo da identidade do grupo não poderiam ser tão bem examinadas numa análise etnográfica do cotidiano dessas pessoas. Ouvir o que elas tinham para contar, a maneira como se apresentavam, como faz o método europeu das histórias de vida, parecia-nos mais interessante para os objetivos desta pesquisa.

Outra vantagem do método europeu sobre o norte-americano reside no fato de que o primeiro não faz uso do anonimato. Ao omitirem a identidade dos sujeitos pesquisados, os etnólogos correm o risco de enfatizar a sua visão durante as análises, suprimindo a autoridade das pessoas observadas (McCall & Wittner, 1990). Além desse viés autoritário, o anonimato poderia impedir que evidenciássemos um dos pontos essenciais para a compreensão dos jornalistas-intelectuais: sua reputação social. Aliás, seria difícil esconder a identidade dessas pessoas, pois, no momento em que mencionássemos eventos da sua vida profissional, elas seriam facilmente reconhecidas. Finalmente, para analisar a questão da reputação não poderíamos nos limitar apenas à questão processual, à forma como ela é negociada na sociedade. Era preciso também relacionar esses processos a uma representação social concreta, saber como todas essas negociações identitárias sugerem um nome e um status partilhado pelo pesquisador e pelos leitores como o de jornalistas-intelectuais.

Além das questões tratadas acima, Becker (1997) aponta outras vantagens do uso desse método narrativo das histórias de vida. São elas:

I) Ele permite fazer um contraponto individual a uma teoria social que se mostre inadequada (o funcionalismo dos estudos sobre identidade no jornalismo, por exemplo);

II) Auxilia áreas de pesquisa tangenciais;

III). Fornece uma visão do lado subjetivo de processos institucionais muito estudados (as mudanças no meio jornalístico e intelectual);

IV) Fornece detalhes a uma área de estudos que se tornou estagnada;

V) Dá sentido à noção de processo como um fenômeno observável de interação mediada84;

VI) Permite que os sujeitos investigados falem para o restante da sociedade.

McCall & Wittner (1990: 46) explicam que as histórias de vida explicitam ao pesquisador o caráter ideológico do conhecimento. “Elas nos forçam a examinar nossas assunções, incorporar mais atores aos nossos modelos e geram conceitos mais inclusivos para

84 “Sociólogos gostam muito de falar em ‘processo em curso’ e coisas parecidas, mas seus métodos geralmente os impedem de ver os processos sobre os quais falam tão desembaraçadamente” (Becker, 1997: 109).

compreender as complexidades atuais das instituições sociais e da mudança social85”. Permitem ainda que o pesquisador compreenda melhor as ações empreendidas pelo sujeito, a partir do olhar que ele coloca sobre sua biografia (Heniz & Krüger, 2001; Becker, 1997).

Por outro lado, o uso do método das histórias de vida coloca o problema da articulação entre o indivíduo e a sociedade, entre as instâncias micro e macro-sociológicas. Ou seja: como explicar a ordem institucional a partir de um corpus reduzido e sem validade estatística? Ao situar as histórias de vida a partir da perspectiva do interacionismo simbólico, McCall & Wittner (1990) explicam que tanto a cultura como as estruturas emergem por meio da atividade das pessoas, no momento em que elas tentam coletiva ou individualmente resolver problemas comuns em situações concretas. Assim, ao relatar uma história, as pessoas partilham, na verdade, das soluções coletivas e dos sentidos atribuídos às suas experiências sociais adquiridas através de interações. Para articular essas instâncias, durante a análise de uma história de vida, devem ser consideradas as ações individuais, as regras institucionais e as estruturas históricas. “A abordagem contemporânea do curso da vida examina a interação entre constrangimentos estruturais, regulamentos e regras institucionais, sentidos subjetivos e também decisões feitas no decorrer do tempo86” (Heniz & Krüger, 2001: 33).

O estudo das histórias de vida pode ser realizado a partir de diferentes técnicas de pesquisa qualitativa. Para o nosso estudo selecionamos as entrevistas, a pesquisa documental e o uso do diário de campo como as formas de coleta do material de análise. A descrição e a justificativa sobre essas técnicas serão feitas logo abaixo.

3.1.1 – Uso de entrevistas

Nossa principal técnica de coleta de dados é o uso das entrevistas semi-estruturadas realizadas ao vivo junto aos jornalistas-intelectuais selecionados. Comparada a outras técnicas de pesquisa – o questionário, por exemplo – a entrevista possui a desvantagem de apresentar dados pouco uniformes e de difícil sistematização. Por outro lado, as informações coletadas ganham profundidade (Laville & Dionne, 1999). Essa característica qualitativa da entrevista é fundamental para os nossos objetivos de pesquisa, dada a complexidade subjacente aos estudos sobre identidade. Em muitos casos, mais do que obter dados homogêneos e de fácil

85 Tradução do autor de: “They force us to examine our assumptions, incorporate more actors into our models and generate more inclusive concepts for understanding the actual complexities of social institutions and social change”.

86 Tradução do autor de: “Contemporary life-course approach examines the interaction between structural constraints, institutional rules and regulations and subjective meanings as well decisions over times”.

tabulação, era importante permitir que os entrevistados organizassem subjetivamente suas trajetórias.

Segundo Gil (1987), a técnica da entrevista não se limita a recolher dados relevantes sobre um assunto, mas busca captar sentimentos, crenças e desejos. Por isso, não se deve tratar o ato da entrevista como um procedimento formal, institucionalizado em torno dos papéis de entrevistador-entrevistado. Becker (1997) explica que o ideal, nesses casos, é convencer a pessoa de que a sua fala não é tão importante. O sociólogo atenta ainda para a necessidade de o pesquisador usar sua experiência pessoal durante a entrevista, partindo em alguns casos para medidas não-convencionais para provocar as pessoas a ponto de fazer com que digam coisas que, de outro modo, guardariam para si.

A entrevista deve, portanto, ser vista como uma interação. Ela não é um incidente neutro de coleta de dados. Trata-se, na verdade, de construções da realidade, ocasiões em que o entrevistado busca fabricar significados à sua experiência tendo em vista o seu interlocutor:

Se alguém observa as entrevistas não como dados, mas como locais interativos para a construção de significados, o papel do entrevista deixa de ser totalmente passivo e neutro. Independente de planejarmos – e independente de gostarmos –, as narrativas do entrevistado são influenciadas pela interação social que se desenrola na entrevista e pela atitude do entrevistado em relação à interpretação da narrativa87 (Järvinen, 2003: 225-226).

Uma entrevita representa processos de interpretação das situações presentes e passadas. Ao falar, o entrevistado ordena e reconstrói sua experiência, buscando criar esquemas coerentes de narração e interpretação dos fatos. Esse trabalho de remodelagem depende do contexto da interação em que “novos significados alteram o conteúdo e o valor da situação de base evocadas” (Bosi, 2006: 66). Ao mesmo tempo, as narrativas refletem as estratégias dos atores para lidar com tais incidentes e as suas tentativas de se apresentarem como um tipo específico de pessoa. Por isso, a entrevista é certamente um processo de negociação identitária entre entrevistadores e entrevistados (Järvinen, 2003).

87 Tradução do autor de: “If one regards interviewers not as recording but as interactive sites for meaning making the interviewer’s role cannot be totally passive and neutral. Whether planned or not – and whether we like it or not – the interviewer’s narratives are influenced by the social interaction going on in the interview, and by the interviewer’s attitude towards and interpretation of the narrative”.

3.1.2 – A pesquisa documental

Graças à reputação associada ao nosso objeto, a coleta de informações sobre a trajetória dos jornalistas-intelectuais pôde contar ainda com uma importante ferramenta de pesquisa: o uso de fontes documentais. Em nosso caso, podemos dividir essas fontes em dois grupos. O primeiro abrange entrevistas, biografias e reportagens publicadas sobre a vida e a obra dos entrevistados. Foi possível recolher esse material em jornais, revistas, livros, Internet (nos páginas pessoais desses jornalistas, Wikipedia e varreduras feitas via Google) e artigos acadêmicos.

O segundo, grupo abrange documentos redigidos pelos próprios jornalistas- intelectuais. Recorremos às obras que expressam suas visões sobre sua própria vida, sobre seu trabalho intelectual e sobre o jornalismo. Segundo Miceli (2001: 349), tais fontes:

retêm a marca dos interesses, dos valores e das estratégias dos grupos sociais a que se referem. Elas são produtos de uma simbolização mediante a qual esses grupos manifestam sua existência material, política e intelectual (...), são parte integral do repertório de imagens que o grupo veicula e gere sua identidade.

Por isso, adicionamos ao nosso corpus trabalhos acadêmicos, livros-reportagem memórias, autobiografias e mesmo romances que tratam da vida dessas pessoas, valores, visões de mundo sobre o jornalismo e o trabalho intelectual. Uma lista detalhada dessas obras se encontra na primeira parte das referências bibliográficas.

3.1.3 – Diário de campo (fieldnotes)

A utilização de diários de campo remete geralmente às pesquisas etnográficas baseadas em observação participante. O fato das entrevistas com os jornalistas-intelectuais serem consideradas como momentos de interação simbólica justifica o uso desse recurso. De fato, foi possível registrar parte das significações atribuídas pelo pesquisador à fala dos entrevistados, dentre elas as impressões subjetivas sobre essas pessoas, sua forma de se portar e se expressar. Algumas dessas impressões nem sempre ficam registradas na gravação e sua recuperação foi de grande utilidade, sobretudo na descrição de nossa trajetória metodológica (seção 3.3) e durante as análises dos capítulos V e VI.

Além das impressões obtidas durante a entrevista, foram registrados ainda outros aspectos do processo de coleta dos depoimentos. Eles abrangem os contatos preliminares para

o agendamento dos encontros, a descrição de nossas impressões sobre o entrevistado, o local, o teor e o ‘clima’ das conversas. Os registros contidos no diário de campo permitiram, nesse caso, reconstruir textualmente a experiência do pesquisador durante a pesquisa de campo (Wolfinger, 2002).

Finalmente, foram realizadas ainda anotações das conversas informais feitas com o gravador desligado. Embora nem sempre pudessem ser utilizadas textualmente na análise (ou, quando foram, tivemos de recorrer ao anonimato), essas interações, reconstruídas, forneceram informações complementares que permitiram compreender questões sobre a identidade dos entrevistados, que em alguns casos não apareciam nas gravações.

3.1.4 – Dados complementares

Complementado a análise focada no grupo de dez jornalistas-intelectuais, foram coletados também alguns dados relativos à inserção da categoria no ambiente jornalístico e cultural brasileiro. Foram realizadas entrevistas por e-mail com os responsáveis por dois reconhecidos espaços de divulgação e aferição da produção intelectual: o projeto Sempre um

Papo88, capitaneado, desde 1986, pelo jornalista Afonso Borges, e as Rodas de Leitura, coordenado pela professora e poetisa Suzana Vargas e que funcionou de 1988 a 2001. Trata- se de ocasiões em que escritores, jornalistas ou professores são convidados a falar para uma platéia reduzida sobre um tema ligado à atualidade ou à sua produção intelectual. Ser convidado para esses eventos é certamente um atestado de legitimidade intelectual. Nessas entrevistas, abordamos tanto questões ligadas ao meio intelectual brasileiro como indagações diretas sobre a identidade e o papel dos jornalistas-intelectuais (ver Anexos III e IV).

Por sugestão de Alberto Dines, um dos jornalistas-inteletuais que compõem o nosso

corpus, fizemos uma visita à redação da Revista Piauí no Rio de Janeiro, onde entrevistamos o diretor de redação Mário Sérgio Conti. Também, por sugestão de Dines, conversamos, por e-mail, com o jornalista Sérgio Villas Boas, fundador do Instituto Texto Vivo. Nas duas ocasiões falamos sobre o conceito de jornalismo literário, tema tratado brevemente no capítulo VII.

3.2 – Construção do corpus: o problema de definição do intelectual

Uma das questões mais delicadas desta pesquisa refere-se à construção do corpus de análise. Que sujeitos deveriam ser analisados como representativos do grupo de jornalistas- intelectuais? Partindo de um primeiro olhar sobre o objeto, tínhamos em mente que deveriam ser jornalistas cuja prática, e, sobretudo, reputação, estaria também associada à imagem do intelectual. Embora a definição do que é um jornalista poderia ser problematizada, a existência de um conjunto de convenções capazes de definir os colaboradores do mundo social do jornalismo (algumas, inclusive, codificadas sob a forma de teorias e leis) nos permitiram operacionalizar com razoável clareza esse primeiro pertencimento. O problema estava justamente em definir o que chamamos de intelectual.

De fato, o conceito pode remeter a representações bastante restritas – os maître à

penser, por exemplo – ou ainda incluir todo um setor da sociedade associado ao desempenho de atividades intelectuais (Aron, 1980; Debray, 1979). Pode estar associado ao engajamento no espaço público em torno de valores abstratos ligados ao direito do Homem, como prega a definição francesa, nascida com Émile Zola. Pode também ter suas funções apropriadas pela esquerda revolucionária, como as definições leninistas e gramscianas do intelectual (Gonzáles, 1981; Máximo, 2000). Ou pode ainda remeter a representações pejorativas, associados às pessoas que negligenciaram a prática para se trancarem numa espécie torre de marfim89. Enfim, um breve olhar na diversidade de auto-definições, nascidas no corpus polemista (Aubin, 2006), mostra como esse debate é profícuo, o que explica a dificuldade em encontrar um conceito operacional para a categoria90.

Tendo em vista essa multiplicidade de conceitos e o caráter normativo subjacente a eles (Bobbio, 1997), levantamos a princípio duas alternativas para construirmos o nosso

89. Numa conversa preliminar por telefone com um possível entrevistado, soubemos que ele se opunha ao uso termo “jornalistas-intelectuais” porque dava a entender que os demais jornalistas – excluídos do meu corpus – seriam “analfabetos”.

90 Nossas investigações sobre o tema revelaram uma vasta bibliografia dedicada a uma (auto)definição da categoria, na qual podemos citas as obras de: ARON, R. ‘A alienação dos Intelectuais’. In. O Ópio dos

Intelectuais. Brasília: Ed. UnB, 1980, pp. 177-257; ARON, R.‘Fidelidade dos Renegados’. In. MELO, R (org.)

Os Intelectuais e a Política. Lisboa: Presença, 1964, pp. 275-301; BENDA, J. La Trahison des Clercs. Paris: Bernard Grasset, 1927; BOBBIO, N. Os intelectuais e o poder. São Paulo: Unesp, 1997; DEBRAY, R. Le

pouvoir intellectuel en Franec. Paris: Ramasay, 1979; DEBRAY, R. Le scribe: Genèse du Politique. Paris: Grasset et Fasquelle, 1980; GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979; MILLS, C. W. ‘A Política da Cultura’. In. MELO, R. (org.) Os Intelectuais e a

Política. Lisboa: Presença, 1964, pp. 128-145; ORTEGA Y GASSET, J. A Rebelião das Massas, 2ª Ed. Rio de Janeiro: Livro Ibero-Americano, 1962; PELLETIER, J. ‘L’intellectuel est-il mort?’. In: BRUNET, M; & LANTHIER, P. L’inscription sociale de l’intellectuel. Les Presses Universitaires de Laval / L’Hamarttan, 2000, pp. 367-374; SAID, E. W. Representaciones del intelectual. Barcelona: Paidós, 1996; SARTRE, J-P. Plaidoyer

pour ler intellectuels. Paris: Editions Gallimard, 1972. WEBER, M. Ciência e Política: duas vocações. São Paulo: Martin Claret, 2004.

corpus de análise. A primeira seria trabalhar com um conceito neutro de intelectual. Após as leituras de distintos autores que abordaram o tema, discutimos uma definição que reunisse características gerais, comuns aos diferentes tipos de intelectuais: o gramsciano, o sartreano, o weberiano, etc. Essa tentativa, apresentada em março de 2005 durante nossa defesa de qualificação, mostrou-se equivocada. Do ponto de vista epistemológico, significou cair no erro já mencionado de buscar encaixar o corpus em uma categoria abstrata, de forma que a análise das identidades resultaria em uma definição sem correspondência empírica. Além disso, em certo momento tivemos de reconhecer que é impossível trabalhar com conceitos neutros em ciências sociais na medida em que eles refletem o olhar do observador sobre a realidade91.

Como a alternativa de neutralizar essa categoria fracassou, cogitamos ignorar por completo as definições sobre os intelectuais. Dirigimos nosso olhar à idéia do intelectual como um título que é atribuído por outra pessoa, independente dos valores associados a ele.

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