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Consumidores, consumos de drogas, modos de utilização e programas de tratamento nas prisões:

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 146-150)

Em conclusão, quanto aos consumos de drogas, é possível afirmar que a grande maioria dos que entram no sistema prisional nos últimos anos já consumiram drogas e cometeram crimes com elas relacionados. Os que entram na prisão são ainda, de forma dominante, aqueles que iniciaram consumos muito cedo no seu percurso de vida. Prevalecem também neste subconjunto hábitos de consumo de drogas duras e produtoras de grande dependência. Os valores de consumos indicados são muito acima dos que se podem observar no conjunto da população portuguesa.

É de notar ainda que o fenómeno da forte relação das drogas com a prisão adquiriu particular visibilidade na última década. Como se conclui na pesquisa, do conjunto dos reclusos que cometeram crimes relacionados com drogas, a esmagadora maioria está na prisão há 8 anos ou menos.

Conhecer os tipos de substâncias consumidas, antes da prisão, permitiu também avaliar comportamentos posteriores. Com efeito, no conjunto dos que disseram alguma vez na vida terem consumido drogas, praticamente todos declararam consumos como a cannabis e também a esmagadora maioria revelou já ter consumido drogas produtoras de grande dependência como a heroína e a cocaína.

Por outro lado, se declarar ter alguma vez na vida consumido drogas não significa ser toxicodependente, a verdade é que do conjunto dos reclusos que afirmam ter consumido drogas quase metade declarou que já tinham entrado em programas de tratamento. Ou seja, trata-se de um subconjunto, ainda bastante expressivo, que não

só se consciencializou dos seus problemas de dependência do consumo de drogas, como procurou ajuda no sentido de os ultrapassar.

Saber se havia continuidades ou descontinuidades nas práticas de consumos de drogas em relação à entrada no sistema prisional foi também um objectivo importante da pesquisa para determinar as trajectórias e os comportamentos dos que consomem. Ora, outra conclusão relevante diz respeito ao facto de se ficar a saber que os consumos de drogas nas prisões continuam mas que diminuem e mudam as modalidades de consumo.

Verificou-se, como seria de esperar, e dados os entraves existentes à circulação das drogas na prisão, uma quebra de consumos para aqueles que já consumiam. No entanto, a maioria dos que consumiam antes da prisão continua a consumir (cerca de dois terços), sobretudo no caso da heroína e da cannabis. As quebras de consumos em relação à cocaína (para metade) são mais significativas do que em relação a outras substâncias. Por outro lado, é praticamente insignificante o número dos que se iniciam no consumo de drogas na prisão.

Também se quis saber se os que cometeram crimes relacionados com drogas, as consumiam ou não de forma habitual, e que efeitos produz a circulação, o comércio das drogas e os consumos dos outros, naqueles que entram na prisão por terem cometido crimes que nada têm a ver com drogas.

Obter estas informações permitia ainda avaliar como interagem os diferentes grupos em presença. E isto porque são as relações entre estas populações específicas – os que consomem e/ou dependem de drogas, os que as traficam, os que não estão presos por crimes relacionados com elas – que contribuem para explicar as relações que se estabelecem entre drogas e prisões.

Como vimos o número dos reclusos que dependiam de drogas é muito expressivo. Uma vez dentro do sistema prisional, o acesso a essas substâncias tem muito mais entraves. Para alimentar as suas dependências, e sujeitos à pressão interna para consumir que a própria situação prisional naturalmente exponencia, os que dependem de drogas vêem-se muitas vezes envolvidos em situações complexas.

A circulação ilícita do produto dentro da prisão, por outro lado, tem como efeito, entre outros, multiplicar o preço das substâncias em relação ao preço praticado em meio

livre. Ora esta situação pode ser para os outros dois grupos existentes nos estabelecimentos prisionais - traficantes e reclusos que não estão detidos por problemas relacionados com drogas – uma boa oportunidade de “negócio”. E embora os riscos desse negócio ilícito sejam também acrescidos, trata-se de uma população que dispõe de tempo para pensar a melhor forma de os obviar e, para quem, aliás, esses riscos são de menor importância, pela situação específica em que se encontra. As oportunidades de “negócio” podem ainda ser tentadoras até para quem pertence aos quadros da própria instituição prisional.

Temos, assim, a procura dos que consomem e/ou dependem de drogas e uma oportunidade acrescida para os que beneficiam ou passam a beneficiar do seu comércio. Sublinhe-se ainda que, pelo fechamento e pelas lógicas específicas de funcionamento do meio prisional, é muito difícil, mesmo para os reclusos que o desejem, manterem-se completamente à margem deste mundo. Há sempre cumplicidades a estabelecer, silêncios a comprar. São estas algumas das características centrais que contribuem para que se diga que o fenómeno das drogas, e muito para além do seu consumo, domina o panorama prisional.

5 Avaliações, preocupações e opiniões: o meio prisional na óptica dos reclusos

Para compreender melhor o funcionamento do sistema prisional, elaboraram-se um conjunto de perguntas que permitiram captar as avaliações dos reclusos sobre as condições de vida na prisão, os aspectos que mais os preocupam, as opiniões sobre as toxicodependências e os consumos de drogas, entre outras. São estas apreciações que se analisam no presente capítulo.

5.1 Avaliações dos reclusos: apreciações maioritariamente negativas sobre

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 146-150)