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Doenças infecto-contagiosas: prevalências elevadas nos reclusos

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 70-76)

2.16 Indicadores clínicos e de risco de contágio

2.16.2 Doenças infecto-contagiosas: prevalências elevadas nos reclusos

Os serviços clínicos dos estabelecimentos prisionais realizam habitualmente análises ao sangue aos reclusos quando entram no sistema prisional. Relativamente às análises para detectar o vírus do HIV ou das Hepatites B e C, estas só são realizadas aos reclusos com o seu consentimento. Os reclusos declararam, na sua maioria, (76,9%) ter realizado análises ao sangue para saber se são ou não portadores do vírus HIV (Figura 2.18). Valor que não surpreende quando se sabe que a maioria dos reclusos consente na realização dessas análises. Quanto aos 22,9% de reclusos que declara não ter realizado este tipo de análise, não se pode deduzir que tenha sido por não terem dado o seu consentimento já que também se sabe que não é a todos os reclusos que lhes é sugerida a realização de análises ao HIV/SIDA.

50 Nesta pergunta os valores apresentados não somam 100% e são calculados em relação aos que

disseram que tomavam medicação já que se trata de uma pergunta com possibilidade de resposta múltipla. Os reclusos podem tomar em simultâneo diferentes tipos de medicação, por exemplo, comprimidos para dormir e anti-depressivos.

Figura 2.18

Declaração de ter realizado análises ao HIV/SIDA (%)51

76,8

22,9 0,3

Sim Não Não sabe

No caso das análises às hepatites (Figura 2.19), os valores encontrados são bastante semelhantes aos anteriores, 76,8% dos reclusos declara ter realizado análises ao sangue para detecção deste tipo de doenças infecto-contagiosas.

Figura 2.19

Declarações de ter realizado análises às Hepatites (%)52

76,8

22,9 0,3

Sim Não Não sabe

Indicadores preocupantes de prevalência de doenças infecto-contagiosas foram detectados. Dos que fizeram análises para saber se tinham HIV/SIDA, e que responderam qual tinha sido o resultado, 16,3% declaram que esse resultado era positivo (Figura 2.20). Trata-se de um valor muito mais elevado do que aquele que se verifica no total da população53, mas que parece convergir com valores do mesmo tipo

referentes à população toxicodependente em tratamento na rede pública nacional54.

51 Base=2057; Casos válidos=1890. 52 Base=2057; Casos válidos=1791.

53 Em Portugal, em 1999, a incidência de casos de SIDA foi de 88,3 casos por milhão de habitantes (Estatísticas da Saúde, 1999), ou seja, aproximadamente 1 (0,88) em cada 10000 portugueses é portador de HIV/SIDA. Valores de prevalência desta doença extremamente elevados foram portanto encontrados na população reclusa já que em cada 100 reclusos que declararam resultados de análises 16 indicaram ser seropositivos.

54 “Os dados do SPTT sobre a infecção pelo VIH na população toxicodependente que solicitou tratamento

pela primeira vez em 2000, apontam para 14% de indivíduos seropositivos no conjunto dos casos que apresentaram os resultados dos testes, percentagem inferior à registada em 1999 (18%)” (IPDT, 2001).

Note-se que o número de reclusos que respondeu a esta questão (1377) é inferior ao que respondeu ter feito testes sobre o HIV/SIDA (1890), verificando-se assim uma retracção de cerca de 27%. Refira-se ainda que os 16,3% do conjunto dos que fizeram análises e declararam resultados positivos em relação ao HIV/SIDA, baixam para 11% quando se tem em conta o total dos reclusos inquiridos (2057). Contudo, se juntarmos os que não responderam a esta pergunta ou não sabem (172 indivíduos), com os que declararam não ter realizado análises (432 indivíduos) e com os que declararam que as fizeram mas não responderam quais os resultados (513 indivíduos), obtém-se um número de reclusos muito elevado (1117 indivíduos, ou seja, 54,3% do total da amostra) em relação aos quais se desconhece a situação relativamente à prevalência de HIV/SIDA. Pelo que se pode admitir que a situação seja ainda mais preocupante do que a que foi claramente assumida pelos reclusos.

Figura 2.20

Declarações de resultados das análises ao HIV/SIDA (%)55

16,3

82,9

0,8

Positivo Negativo Aguarda resultados

Relativamente à prevalência de Hepatite B, nota-se que dos reclusos que realizaram análises ao sangue, 9,7% declarou resultados positivos para este tipo de doença (Figura 2.21). Valor que poderá ser ainda maior porque, tal como aconteceu para o HIV/SIDA, é significativo o número de casos dos que não responderam a esta pergunta ou não souberam responder, dos que não fizeram análises ou dos que tendo-as efectuado não declararam os resultados (801 indivíduos, quando os que responderam foram 1256).

Figura 2.21

Declarações de resultados das análises à Hepatite B (%)56

9,7

89,4 0,9

Positivo Negativo Aguarda resultados

Para além dos valores encontrados de resultados positivos, pode ainda observar-se que quase metade dos reclusos (45,4%) declarou não possuir a vacinação completa da Hepatite B, 42,4% responderam que tinham completado a vacina, e 12,2% afirmaram não saber (Figura 2.22).

Figura 2.22

Vacina completa da Hepatite B (%)57

42,4

45,4 12,2

Sim Não Não sabe

Ainda em relação aos indicadores de prevalência de doenças infecto-contagiosas, o valor mais preocupante é o relativo à declaração de resultados positivos de Hepatite C, que atinge os 26,9% dos que declararam ter feito análises (Figura 2.23). Esta patologia surge muito associada aos consumos de drogas, nomeadamente da heroína ou da cocaína, tal como acontece com o HIV/SIDA. O carácter altamente contagioso da Hepatite torna-a uma doença ainda mais perigosa no contexto prisional, pelo que a elevada taxa de prevalência referida se revela muito preocupante. Este foi, aliás, o indicador que apresentou valores mais elevados no conjunto das doenças infecto- contagiosas analisadas.

56 Base=1375 (os que fizeram análises); Casos válidos=1256 (os que responderam à questão). 57 Base=2057; Casos válidos=2014.

Figura 2.23

Declarações de resultados das análises à Hepatite C (%)58

26,9

72,3

0,8

Positivo Negativo Aguarda resultados

Novamente aqui, pode afirmar-se que este é um valor mínimo já que 762 reclusos ou não responderam, ou não fizeram análises ao sangue ou não declararam qual tinha sido o seu resultado. Claro que não se pode concluir que o conjunto daqueles em relação aos quais se desconhece a informação, sejam potenciais portadores de Hepatite C, dado que como se disse no início a transmissão deste vírus está muito associada a comportamentos específicos. Vale a pena ainda salientar que não será certamente por acaso que o valor dos que declararam que fizeram análises e não indicaram o seu resultado é muito superior no caso do HIV/SIDA (513 indivíduos) do que nas Hepatites B (119 indivíduos) e C (80 indivíduos). Pode estar aqui em causa um efeito de retracção quanto à declaração dos resultados do HIV/SIDA.

Uma outra doença infecto-contagiosa sobre a qual interessava saber a prevalência na população reclusa era a tuberculose. Assim, para o conjunto da amostra, 4,9% dos reclusos declararam ter ou já ter tido tuberculose. Valor semelhante (5,2%) são os que desconhecem qual a sua situação relativamente a esta doença, e a larga maioria dos reclusos (89,9%) declararam não ter ou nunca ter tido tuberculose na vida.

Embora se esteja perante um valor relativamente baixo em comparação com as outras doenças infecto-contagiosas já analisadas, não deixam de ser preocupantes estas declarações já que a tuberculose é uma das patologias com maior risco de contágio. Tem também de se ter em conta que nesta questão a referência é o total dos reclusos e não um qualquer subconjunto representando assim um valor absoluto muito semelhante ou superior ao dos outros indicadores. Sabe-se também que entre os indivíduos seropositivos ou casos de SIDA, é hoje em dia, cada vez mais frequente

que esta doença assuma contornos de multi-resistência aos fármacos existentes, e por este motivo, seja também uma patologia longe de ter um tratamento bem sucedido.

Figura 2.24

Declarações de ter ou já ter tido tuberculose? (%)59

4,9

89,9 5,2

Sim Não Não sabe

O Quadro 3.14 sintetiza as situações já apresentadas nas figuras anteriores (Figuras 2.20; 2.21; 2.23 e 2.24), salientando-se o número absoluto de reclusos que revelaram resultados positivos às análises para despiste do HIV/SIDA, Hepatites B e C e Tuberculose. Claro que se se tiver em conta o conjunto da amostra, as declarações de resultados positivos descem para todas as doenças infecto-contagiosas analisadas.

Quadro 2.14

Declarações de resultados positivos das análises e de “ter ou já ter tido tuberculose”

Declarações de resultados positivos a análises Resultados positivos (números absolutos) n Em relação ao total dos que

declararam resultados de análises60 % Em relação ao total dos inquiridos % HIV/SIDA 224 16,3 10,9 Hepatite B 122 9,7 5,9 Hepatite C 348 26,9 16,9 Tuberculose 99 4,9 4,8

Pelas declarações dos resultados às análises ao HIV/SIDA, Hepatites e ao despiste de Tuberculose foi possível apurar que do total de indivíduos que revelaram resultados positivos, 565 são portadores de pelo menos uma destas doenças infecto-contagiosas, isto é 27,5% do total da amostra.

Foi ainda possível apurar situações em que os inquiridos declararam ser portadores de mais do que uma doença infecto-contagiosa: 101 casos de HIV/SIDA e Hepatite C; 49 casos de HIV/SIDA e Hepatite B e Hepatite C; e 12 casos de HIV/SIDA e Hepatite B e

59 Base=2057; Casos válidos=2014.

Hepatite C e Tuberculose, ou seja, 4,9%, 2,4% e 0,6%, respectivamente do total da amostra.

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 70-76)