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Uso de cocaína desce e inícios de consumos na prisão reduzidos

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 124-131)

4.2 Consumos de drogas nas prisões: padrões de continuidade

4.2.2 Uso de cocaína desce e inícios de consumos na prisão reduzidos

Podem ainda analisar-se, através do Quadro 4.5, as declarações relativas ao ter deixado de consumir cada uma das substâncias na prisão. De salientar que as substâncias que mais se declararam consumir na prisão (cannabis, heroína e cocaína), embora pareça contraditório, são também as que apresentam valores mais elevados quanto a terem deixado de ser consumidas, nomeadamente, a cocaína.

120 Base=1322; Casos Válidos: Cannabis=1205; Heroína=1146; Cocaína=1110; Fármacos=999;

Quadro 4.5

Declarações perante consumos de drogas antes e na prisão no total dos que declararam alguma vez na vida ter consumido121

Substâncias Declarou consumos na prisão (%) Consumiu em local indeterminado122 (%) Deixou de consumir na prisão (%) Nunca consumiu na vida (%) Total (%) Cannabis 66,1 8,6 21,7 3,6 100,0 Heroína 48,5 9,1 26,5 15,9 100,0 Cocaína 37,3 10,1 37,0 15,6 100,0 Fármacos 50,6 3,1 12,4 33,9 100,0 Anfetaminas 15,3 5,8 20,5 58,4 100,0 Ecstasy 14,0 6,1 17,1 62,8 100,0 Outras substâncias (n=904) 10,2 2,4 6,6 80,8 100,0

Também de salientar que o início de consumos no interior dos estabelecimentos prisionais é um fenómeno de pouca relevância, assumindo sempre valores menores do que 5% para todas as substâncias no conjunto dos inquiridos que declararam alguma vez na vida terem consumido drogas, à excepção dos fármacos que rondam os 18% (Quadro 4.6), o que mostra que os estabelecimentos prisionais recebem uma população muito específica com percursos anteriores de consumos de drogas os quais se tornam, na maioria das vezes, determinantes para a própria reclusão. Para a esmagadora maioria dos indivíduos, o contacto inicial com as drogas está muito longe assim de ocorrer no meio prisional.

121 Base=1322; Casos Válidos: Cannabis=1205; Heroína=1146; Cocaína=1110; Fármacos=999;

Anfetaminas=948; Ecstasy=938; Outras substâncias=904.

122 É conveniente explicitar como se construiu esta categoria. Na pergunta 32 inquiriram-se os reclusos

acerca dos seus consumos de drogas por substância (nunca consumiu, consumia antes da prisão e continuou, consumia antes da prisão e deixou de consumir na prisão, iniciou consumos na prisão). Se a maioria respondeu directamente nestas opções de resposta, houve alguns reclusos que não as preencheram, mas à frente numa outra pergunta assumiram consumos. Tratava-se das chamadas perguntas de controlo que permitem verificar a congruência das respostas. Ora, nestes casos minoritários em que não havia respostas à pergunta 32, obteve-se informação a partir das declarações de consumos no último ano e/ou no último mês. Quando não havia qualquer indicação de onde se encontrava o indivíduo há um ano ou um mês, por exemplo, por não ter declarado a data de entrada na prisão ou esta ser inferior ao período em que declaravam consumos, temos uma declaração que não se sabe em que local ocorreu, o designado “Consumiu em local indeterminado”, que não se pode obviamente adicionar aos consumos na prisão.

Quadro 4.6

Declarações de consumos de drogas na prisão no total dos que declararam alguma vez na vida ter consumido (%)123

Declarou consumos na prisão Substâncias Consumiu antes e continuei ou voltei a consumir na prisão Consumiu pela 1ª vez na prisão Afirma não consumir na prisão, mas consome Total Cannabis 43,4 4,4 18,3 66,1 Heroína 28,9 4,9 14,7 48,5 Cocaína 17,2 3,1 17 37,3 Fármacos 22,6 17,9 10 50,6 Anfetaminas 5,8 1,6 7,9 15,3 Ecstasy 4,6 1,3 8,2 14,0 Outras substâncias 2,2 2,2 5,8 10,2

Os números apresentados de consumos de drogas na prisão são valores mínimos. Em primeiro lugar, como já se referiu, houve um conjunto de reclusos – “consumidores em local indeterminado”, cerca de 10%, para o conjunto das várias substâncias – que afirmou consumir drogas, há pelo menos 1 ano, mas não indicou há quanto tempo estava preso ou essa data era inferior aquela em que indicava consumos. Em segundo lugar, houve inquiridos que não responderam à questão sobre os consumos de drogas na prisão. E em terceiro lugar, deve recordar-se ainda que houve recusas à participação no estudo sendo assim presumível que no conjunto dos que se recusaram ou não responderam à questão estejam indivíduos que não quiseram assumir consumos de drogas na prisão.

Observando agora a distribuição das declarações de inícios de consumos de drogas e de deixar de consumir na prisão por dimensão do estabelecimento prisional pode constatar-se que é nos maiores estabelecimentos prisionais que se continua mais a consumir substâncias ilícitas (Quadro 4.7).

Quadro 4.7

Declarações de inícios e quebras de consumos de drogas na prisão por dimensão do estabelecimento prisional no total dos que declararam alguma vez na vida ter consumido124

123 Base=1322; Casos Válidos: Cannabis=1205; Heroína=1146; Cocaína=1110; Fármacos=999;

Anfetaminas=948; Ecstasy=938; Outras substâncias=904.

124 Base=1322.

Cannabis Heroína Cocaína Consumiu

pela 1ª vez consumir na Deixou de prisão

Consumiu

pela 1ª vez Deixou de consumir na prisão

Consumiu

pela 1ª vez consumir na Deixou de prisão Substâncias Dimensão do EP n % n % n % n % n % n % Pequena 5 4,5 22 20 4 3,7 38 35,5 4 3,7 44 41,1 Média 5 1,5 73 23 11 3,7 95 31,7 4 1,4 123 41,8 Grande 43 5,5 166 21,4 41 5,5 171 23,1 26 3,7 244 34,4

Vejamos agora as declarações referentes aos consumos no último mês e no último ano, por substância, relativamente ao total dos inquiridos. Constata-se que o consumo da cannabis no último mês é assumido por cerca de ¼ da população reclusa, valor que sobe para a casa dos 40% no último ano (Figura 4.12). Logo de seguida, a heroína é a substância que obteve maior número de declarações de consumo no último ano e no último mês, respectivamente, por 33% e 15,5% dos reclusos. Ainda de registar as declarações de consumo relativas à cocaína para os mesmos períodos que, embora com valores mais baixos, alcançam cerca de ¼ da população reclusa no último ano e apenas 7,2% para o mês anterior à data da aplicação do questionário. De ressalvar que no conjunto de todas as substâncias os valores apresentados em forma de declaração de consumos sofrem reduções consideráveis no que respeita à comparação dos dois períodos (último ano e último mês). Isto pode ser explicado não tanto pela existência de uma redução efectiva de consumos, mas devido ao facto dos indivíduos se retraírem a assumir práticas ilícitas no contexto da prisão num tempo muito próximo ao da aplicação do questionário. Um ano é um horizonte temporal mais longínquo, propício a uma atitude menos defensiva, como se verifica, aliás, através da maior declaração de consumos relativamente a este período.

Figura 4.12

Declarações de consumos no último mês e no último ano relativamente a cada substância no total dos reclusos inquiridos (%)125

24,0 43,8 15,5 33,0 7,2 26,3 13,5 23,1 1,5 9,7 1,3 9,6 0,9 5,1 0 10 20 30 40 50 60

Cannabis Heroína Cocaína Fármacos Anfetaminas Ecstasy Outras

substâncias

no último mês no total dos reclusos inquiridos no último ano no total dos reclusos inquiridos

Veja-se igualmente, para as diferentes substâncias, a proporção das declarações no último ano e no último mês no conjunto dos indivíduos que afirmaram já ter consumido

125 Base=2057; Casos Válidos: Cannabis=1205; Heroína=1146; Cocaína=1110; Fármacos=999;

drogas ao longa da vida (Figura 4.13). Os consumidores de cannabis que declaram ter consumido esta droga no último ano perfazem um total de 78%, os consumidores que declararam consumir heroína nesse período são 70% e os que declaram ter usado cocaína são os que o fazem menos sendo 58%. Relativamente ao último mês, também aqui se torna evidente a diminuição da proporção das declarações de consumo relativamente às que se afirmam para o último ano pelas razões anteriormente expostas. É novamente a tríade cannabis, heroína e cocaína, para além dos fármacos, que mais se declara consumir nestes períodos, como de resto se vem constatando.

Figura 4.13

Declarações de consumos de drogas no último mês e no último ano no total dos que afirmaram consumir pelo menos uma vez na vida cada substância (%)126

43,0 78,0 33,0 70,0 16,0 58,0 42,0 72,0 8,0 51,0 8,0 56,0 10,0 60,0 0 20 40 60 80 100

Cannabis Heroína Cocaína Fármacos Anfetaminas Ecstasy Outras substâncias no último mês no total dos consumidores declarados por substância

no último ano no total dos consumidores declarados por substância

Também continua a constituir modo preferencial de consumos para um expressivo grupo de reclusos, a ingestão das diferentes substâncias alternadas ou simultaneamente, traduzindo-se assim, na existência de policonsumos de drogas na prisão (Quadro 4.8).

126 Estes dados têm como bases de referência os indivíduos que declararam consumos alguma vez na

vida por substância excluindo as não respostas que em alguns casos adquirem valores elevados (base=1322; casos válidos: cannabis=1162; heroína=964; cocaína=937; fármacos=660; anfetaminas=394; ecstasy=349; outras substâncias=174).

Quadro 4.8

Declarações de policonsumos de drogas na prisão por substâncias

Substâncias

Proporção das declarações de policonsumos na prisão no total dos que declararam alguma vez na vida ter consumido drogas

(base=1322)

Proporção das

declarações de policonsumos na prisão

alguma vez na vida no total dos reclusos

inquiridos (base=2057)

N % %

Cannabis, Heroína e Cocaína 313 23,6 15,2

Heroína e Cocaína 359 27,0 17,5

Cocaína e Cannabis 349 26,3 16,9

Heroína e Cannabis 452 34,0 22,0

As mudanças de práticas relativamente aos policonsumos que se faziam em meio livre dizem respeito essencialmente à diminuição da consumo alternado da cocaína com outras substâncias. Como se viu é este tipo de droga que se consome menos no interior dos estabelecimentos prisionais.

Note-se agora a frequência declarada, no último mês, de consumos das diferentes substâncias na prisão. É relativamente à heroína que se observa maior declaração de consumos regulares já que 37,1% dos reclusos que declararam frequências de consumo de heroína no último mês, afirmam fazê-lo todos os dias. São 31,3% os que o fazem várias vezes por semana, o que indicia a existência de uma expressiva percentagem de reclusos a vivenciarem um estado de dependência desta substância. Já em relação à cocaína e à cannabis a frequência dos consumos assume uma tendência de maior ocasionalidade. Mesmo assim dos consumidores de cannabis e cocaína que declararam ter usado estas substâncias no último mês com alguma frequência, cerca de ¼ afirmam tê-lo feito todos os dias. O consumo de cannabis traduz um padrão de maior regularidade que o de cocaína, sendo no primeiro a percentagem mais elevada na frequência de várias vezes por semana, enquanto que no segundo, pelo contrário a moda se situa em uma ou duas vezes por mês.

A eleição das três substâncias atrás referidas fica também comprovada quando se analisam as declarações sobre a frequência dos consumos como se pode ver na figura seguinte (Figura 4.14).

Figura 4.14

Frequência de consumos de drogas no último mês por substância (%)127

Substâncias

Todos os

dias Várias vezes por semana Uma vez por semana

Uma ou duas vezes por mês Cannabis 24,5 35,6 12,2 27,7 Heroína 37,1 31,3 9,6 27,7 Cocaína 28,9 18,5 17,8 34,8 24,5 35,6 12,2 27,7 37,1 31,3 9,6 27,7 28,9 18,5 17,8 34,8 0 10 20 30 40 50

Cannabis Heroína Cocaína

Todos os dias Várias vezes por semana Uma vez por semana Uma ou duas vezes por mês

Comparando as frequências declaradas de consumos de drogas antes e na prisão pode observar-se na Figura 4.15 que uma grande maioria dos reclusos afirma consumir menos vezes em reclusão do que em meio livre (73%). Existe ainda um segundo grupo de reclusos que declara consumir mais vezes na prisão (17,8%) e um terceiro que afirma não ter tido nenhuma alteração nas frequências de consumo quer antes da reclusão quer na prisão (9,2%).

Figura 4.15

Comparação de frequências de consumos habituais de drogas antes e na prisão (%)128

73 9,2 17,8 0 20 40 60 80 100

Mais vezes do que na prisão

As mesmas vezes que na prisão

Menos vezes que na prisão

Concluída a análise dos resultados relativamente ao tipo de substâncias consumidas nas prisões, passa-se agora à apresentação dos dados respeitantes aos consumos injectáveis na prisão e às práticas de injecção declaradas pelos reclusos inquiridos.

127 Base=1322; Casos Válidos: cannabis=466; Heroína=291; Cocaína=135. 128 Base=1322; Casos Válidos=768.

No documento Drogas e prisões em Portugal (páginas 124-131)