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Consumo máximo de oxigénio e ambientes hipóxicos

No documento FACULDADE DE MOTRICIDADE HUMANA (páginas 49-53)

CAPÍTULO 2: REVISÃO DA LITERATURA

2. Respostas fisiológicas à altitude

2.7. Consumo máximo de oxigénio e ambientes hipóxicos

O V̇O2máx tem sido comumente utilizado na fisiologia do exercício como uma forma de

mensuração e prescrição do exercício e como meio de caracterização de diferentes populações (Wagner, 1996; Vandewalle, 2004) através da quantificação da potência aeróbia dos indivíduos (di Prampero, 2003; Levine, 2008; Ferretti, 2014; Mitchell et al., 1958; Howley et al., 1995; Hoppeler e Weibel, 1998, 2000). Na medicina desportiva ou na prática clínica tem sido utilizado como forma de assessorar no diagnóstico e prognóstico em diversas populações e patologias (Sartor et al., 2013).

Juntamente com o 𝑉̇O2 no limiar lático e a eficiência (Joyner e Coyle, 2008; Hagberg e Coyle,

1983), o V̇O2máx é um dos fatores que afeta diretamente o desempenho desportivo (Joyner e

Coyle, 2008; Bassett e Howley, 2000). O limiar lático e o V̇O2máx são fatores queinteragem

entre si, determinando o consumo de oxigénio (V̇O2), ou seja, a capacidade que os atletas têm

de transportar O2 do ar ambiente para a mitocôndria muscular, para metabolizar esse O2 como

forma de gerar energia, na forma de trifosfato de adenosina (AΤP) (Wagner, 2010a). Por outro lado, a eficiência relaciona a energia que pode ser gerada a partir da manutenção de um determinado 𝑉̇O2 e é um indicador do trabalho muscular que se produz por meio da

transformação da energia obtida a partir do ar ambiente.

A capacidade que as células musculares têm para suster determinado trabalho está inteiramente relacionada com a capacidade que o sistema cardiorrespiratório tem em difundir o O2 para o músculo (Bassett e Howley, 2000), sendo que, quanto maior for essa capacidade

melhor será o desempenho aeróbio dos indivíduos (Ventura et al., 2003; Losnegard et al., 2013).

Os valores do 𝑉̇O2 em repouso são idênticos, em indivíduos sedentários e em atletas

treinados, mas não em esforços máximos, onde atletas treinados possuem valores elevados de V̇O2máx (Joyner e Coyle, 2008; Levine, 2008), devido a um maior 𝑄̇ que provém de um

músculo cardíaco maior, com mais capacidade para relaxar e armazenar sangue no ventrículo direito, o que lhe permite deter um maior volume diastólico final e uma maior capacidade de ejeção de sangue. Por outro lado, permite preservar a pressão arterial em esforços intensos, de alta intensidade, que provocam um aumento da volémia e do transporte de O2, para

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suportar o incremento da formação de AΤP proveniente do metabolismo oxidativo (Levine, 2008; Baggish e Wood, 2011).

O V̇O2máx é atingido durante o exercício físico extenuante que envolve grandes grupos

musculares e traduz a capacidade que o coração tem para gerar um aumento do 𝑄̇, um aumento da Hb total, um aumento do fluxo sanguíneo muscular e da extração de oxigénio muscular (O2ext) e, em alguns casos, na capacidade pulmonar de oxigenar o sangue (Bassett

e Howley, 2000; Saltin e Strange, 1992). Este conceito está ligado aos limites paramétricos da equação de Fick (Levine, 2008; Ferretti, 2014; Wilmore e Costill, 2004):

𝑉̇𝑂2 = 𝑄̇ × 𝑎 − 𝑣̅ 𝑂2 𝑑𝑖𝑓𝑓 (Wilmore e Costill, 2004),

onde o 𝑉̇O2 é o produto do 𝑄̇ (produto da frequência cardíaca (FC) pelo volume sistólico

(VS) pela diferença arteriovenosa a-𝑉̅O2diff.

O O2máx corresponde à máxima taxa de utilização de O2 e representa uma participação

integrada dos sistemas envolvidos na convexão e difusão do O2 do meio ambiente até ao

tecido muscular, o sistema pulmonar (com convexão do ar nas vias aéreas e a difusão alvéolo- capilar) e o sistema cardiovascular (convexão do sangue e difusão capilar-tecido muscular) (Bassett e Howley, 2000).

O conceito de que existe um limite máximo para o O2máx data das investigações de Hill

(1923) e desde então tem vindo a ser estudado. Contudo, parte da comunidade científica defende uma visão mais central e outra uma visão mais periférica dos fatores limitantes. De acordo com Basset e Howley (2000) a capacidade de difusão pulmonar, o débito cardíaco máximo e a capacidade de transporte de O2 pelo sangue podem ser classificados como fatores

centrais que podem limitar o exercício; os fatores periféricos, relacionam-se com a capacidade do tecido muscular utilizar o O2 na refosforilação do ATP.

A visão central dá maior ênfase aos processos fisiológicos de mobilização do O2 do ar

ambiente para a corrente sanguínea, à sua perfusão para as zonas periféricas e difusão para o interior das células (Levine, 2008; Wilmore e Costill, 2004; Rud et al., 2012) estando, deste modo, muito dependentes do 𝑄̇ máximo e da CaO2 máxima: 𝑄̇ × C𝑎O2 (Ferretti et al., 1992;

Ferretti, 2014; Mortensen et al., 2005; Gonzalez-Alonso e Calbet, 2003).

Alguns estudos sugerem que o exercício que utiliza pequenos grupos musculares implica um maior aporte de O2, comparativamente ao exercício que envolve todo o corpo, podendo

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2002; Saltin, 1985). De acordo com alguns investigadores o 𝑄̇ é o principal fator que limita o 𝑉̇O2máx no exercício, no entanto, em exercício que envolva pequenos grupos musculares

pode não ser tão determinante (Richardson e Saltin, 1998; Richardson, et al., 1999).

Por outro lado, os investigadores que apoiam a visão periférica têm-se debruçado sobre os aspetos intracelulares que ocorrem após o O2 entrar na célula muscular para a produção de

AΤP pela via oxidativa, e sobre os processos neuromotores que processam o fluxo de cálcio e promovem as contrações musculares (Levine, 2008; Wilmore e Costill, 2004). Nesta perspectiva, a quantidade dos enzimas oxidativos na mitocôndria pode ser considerado um fator limitante pois quanto maior a sua quantidade maior será o V̇O2máx (Wilmore e Costill,

2004).

Para autores como Wasserman, as duas visões não são antitéticas porque a resposta fisiológica ao exercício representa precisamente a integração destes elementos centrais e periféricos, que serão mais relevantes em diferentes contextos. Por exemplo, em altitude natural e simulada, os fatores limitantes podem estar mais relacionados com a componente ventilatórias, ao nível do mar, o exercício pode ser mais limitado pela componente cardiovascular.

O 𝑉̇O2máx é significativamente afetado pela alteração da FiO2 e/ou PiO2 (vide figura 1), seja

na exposição a uma hipóxia normobárica (Fukuda et al., 2010; Wehrlin e Hallen, 2006; Martin, D. e O'Kroy, 1993; Peltonen et al., 2001) ou na exposição hipobárica (Calbet, et al., 2003a; Ogawa et al., 2005), tanto numa exposição aguda como numa exposição crónica, apresentando um decréscimo linear com o aumento da altitude (Wehrlin e Hallen, 2006).

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Figura 1- Decréscimo percentual do 𝑉̇O2máx por exposição hipobárica e normobárica à altitude simulada, obtido a partir dos artigos citados na legenda da figura.

Alguns estudos reportam que, a cada 1000 metros de ascensão em altitude, existe uma redução média de 6,3% no V̇O2máx (podendo variar entre os 4,6% e os 7,5%) (Clark, et al.,

2007; Wehrlin e Hallen, 2006), uma redução na frequência cardíaca máxima (FCmáx) em 1,9

bpm (Wehrlin e Hallen, 2006), uma redução de 7% na potência média gerada em protocolo quadrangular máximo (Clark, et al., 2007), uma diminuição da potência máxima gerada em cicloergómetro (Dekerle, et al., 2012; Ofner, et al., 2014; Gallagher, et al., 2014) e uma redução média de 14,5% na velocidade correspondente ao O2máx (Wehrlin e Hallen, 2006).

O declínio do V̇O2máx em altitudeé mais acentuado nos atletas treinados, do que em sujeitos

sedentários (Chapman, et al., 1999; Ferretti et al., 1997; Woorons et al., 2005; Mollard, et al., 2007a). Do mesmo modo, atletas treinados apresentam alterações significativas em

-35 -30 -25 -20 -15 -10 -5 0 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500 5000 ΔVO 2m áx (%) ALTITUDE (METROS)

Martin et al (1992) Mollard et al (2007) Chapman et al (1999) Terrados et al (1985) Clark et al (2007) Gallagher (2014) Mollard et al (2007) b Ofner et al (2014) Peltonen et al (1995) Peltonen et al (2001) Ponsot et al (2008) Romer et al (2007) Wherlin et al (2006) Woorons et al (2007) Gore et al (1996)

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altitudes mais baixas do que sujeitos sedentários (Terrados, et al., 1985; Chapman, et al., 1999; Mollard, et al., 2007b).

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