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Efeito da hipóxia aguda no sistema neuroendócrino

No documento FACULDADE DE MOTRICIDADE HUMANA (páginas 38-41)

CAPÍTULO 2: REVISÃO DA LITERATURA

2. Respostas fisiológicas à altitude

2.3. Efeito da hipóxia aguda no sistema neuroendócrino

As limitações impostas pela exposição à altitude simulada ou natural, variam consoante o tempo de exposição e com a agressividade do estímulo hipóxico imposto.

Em resposta à agressão imposta ao organismo, o sistema nervoso central (SNC) e o sistema SNA respondem em conformidade e modelam as respostas ventilatória e cardíaca para que a homeostasia do sistema seja reposta.

Em altitude moderada o SNA desempenha um papel importante no controlo reflexo dos diversos mecanismos fisiológicos; na altitude severa, é o SNC que atuará como mediador dos processos reflexos que controlam a atividade cardíaca e ventilatória (Amann e Kayser, 2009), por meio da informação enviada para o cérebro, pelos baroreceptores e quimioreceptores periféricos (Purves et al., 2001).

O SNA é importante no controlo da oxigenação dos tecidos em situações de alteração da homeostasia interna do organismo, uma vez que controla os mecanismos involuntários e vitais fundamentais (funções vegetativas), como a contração da musculatura lisa das vísceras e dos vasos sanguíneos, a secreção glandular e os ritmos cardíaco e respiratório. Esta função reguladora, de uma forma geral, é executada por dois conjuntos distintos de nervos que controlam os mesmos órgãos de forma antagónica, o SNS e o sistema nervoso parassimpático (SNP).

A realização de exercício ao nível do mar e uma exposição à altitude (i.e., repouso e exercício), são estímulos passíveis de promover uma alteração da homeostasia dos sistemas cardiovascular e ventilatório. Ambos os estímulos promovem um aumento do drive simpático (Richalet, Mehdioui, et al., 1988; Marshall, 1994, 1998) como forma de repôr a homeostasia. Amann e Kayser (2009) sugerem que o SNA desempenha um papel importante na regulação e recuperação da homeostasia dos diversos sistemas do organismo.

Para Haditsch et al. (2015) a alteração da RVH é o principal mecanismo responsável pelo aumento da atividade simpática, tal como, da atividade renal e do hipotálamo.

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O aumento da RVH irá estimular o funcionamento da atividade do sistema endócrino (Fulco e Cymerman, 1988) e será o agente regulador da produção de hormonas (i.e., catecolaminas, insulina, dopamina, hormona do crescimento, eritropoietina, entre outros) que modularão a atividade dos diversos sistemas fisiológicos (Ganong, 1999).

É um facto aceite que a altitude simulada ou natural aumenta a libertação de hormonas, tanto na condição de repouso (Niess et al., 2003), como em exercício (Beidleman et al., 2006). As catecolaminas são um exemplo, na condição de repouso (Berger et al., 2011; Panjwani et al., 2006) e durante o exercício submáximo (Strobel et al., 1996; Hopkins, S. R. et al., 2003), mas em padrões diferentes, de acordo com Mazzeo et al. (1991). Este grupo de investigadores verificou que, após uma exposição aguda à hipóxia, a concentração de noradrenalina não se altera, a concentração de adrenalina é maior (na condição de repouso) e durante o exercício submáximo, a concentração de adrenalina aumenta no tempo, tal como, a concentração noradrenalina no plasma que aumenta 45 minutos após o fim do exercício e com valores superiores aos do exercício realizado ao nível do mar.

O aumento da concentração de catecolaminas na circulação faz com que exista um aumento da atividade do SNS, com implicações na atividade dos β recetores cardíacos, que induzem um aumento da resposta cardíaca (Wilmore e Costill, 2004). Este facto pode ser verificado em alguns estudos, que através da inibição da atividade dos β recetores cardíacos, por toma de drogas denominadas de β bloqueadores, têm como objetivo determinar qual a importância da ação das catecolaminas e do SNS no controlo da atividade cardíaca e ventilatória, durante o exercício submáximo em hipóxia (Wolfel et al., 1998; Valentini et al., 2012). Wolfel et al. (1998) observaram uma depressão da atividade cardíaca que se traduziu numa FC mais baixa, após a toma dos fármacos com os princípios ativos referidos anteriormente. Por outro lado, Valentini et al. (2012) observaram uma diminuição do fluxo ventilatório concomitante com uma melhoria no desempenho, durante a realização de um teste progressivo máximo em hipóxia, numa amostra de indivíduos sedentários.

Estes estudos reforçam a importância do SNS no controlo da atividade cardíaca e ventilatória e na reposição da homeostasia geral do organismo.

Podemos então considerar o aumento da concentração de catecolaminas como um indicador fiável que nos permite controlar as alterações dos mecanismos responsáveis pela modificação da atividade cardíaca, durante o exercício submáximo em hipóxia (Moore et al., 1986).

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Outros autores também associam o aumento da concentração de catecolaminas a outros fenómenos, nomeadamente, o aumento da adrenalina, o incremento do lactato arterial (i.e., repouso e exercício) (Mazzeo, et al., 1991) e ao aparecimento de sintomas relacionados com o mal agudo de montanha (AMS), na exposição à altitude simulada (Kamimori et al., 2009). O sistema nervoso central (SNC) também é afetado na exposição à altitude. Um inadequado aporte de O2 ao cérebro ativa múltiplos sensores de oxigénio no cérebro, que operam uma

resposta adaptativa dos neurónios ao stress hipóxico imposto pela altitude e que consiste na alteração do padrão metabólico, tornando a participação do metabolismo anaeróbio mais preponderante o que, por sua vez, induz uma diminuição da sensibilidade neuroquímica dos terminais das sinapses (Sharp e Bernaudin, 2004).

Koeller et al. (1988) sugerem que o SNC desempenha um papel importante na regulação da FC, já que a condição de hipoxemia cerebral estimula a atividade do SNC e induz uma redução da atividade do SNP e um aumento da atividade do SNS devido, em parte ao incremento da estimulação da atividade dos β recetores que promovem um aumento da FC. A regulação da atividade cardiovascular realizada pelo SNC é realizada pela estimulação dos recetores α adrenérgicos que controlam o processo de vasoconstrição e regulam a atividade do SNS (Ganong, 1999). O estímulo da atividade dos recetores α na medula irão reduzir a atividade simpática e aumentar a atividade parassimpática (Golanov e Reis, 1996; Reis et al., 1994).

Por outro lado, durante o exercício submáximo em altitude simulada a inibição da atividade dos β recetores simpáticos e parassimpáticos não altera o comportamento da FC e do Q̇, facto que pode ser comprovado no estudo de Hopkins et al. (2003) que submeteu dois grupos de indivíduos sedentários (grupo de controlo e grupo submetido a tratamento com fármacos β bloqueadores) a um protocolo de exercício de carga constante, em diferentes intensidades e em altitude simulada. Devido à elevada concentração de catecolaminas derivadas do exercício em hipóxia, os autores concluíram que os recetores α desempenham um papel importante no controlo da atividade cardíaca, o que reforça a importância do SNC no controlo da atividade cardíaca.

A atividade do SNC é, em parte, regulada pela concentração de dopamina circulante, um percursor natural das catecolaminas, que tem como função estimular o funcionamento do SNC. Os estudos de Panjwani et al. (2006) e Kon et al. (2015) comprovam esta afirmação.

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Panjwani et al. (2006) observaram um aumento da concentração de dopamina circulante e da concentração de cortisol, durante a primeira hora de exposição à altitude natural, em repouso, por outro lado, Kon et al. (2015) durante a realização de sprints repetidos com uma duração de 30 segundos, em altitude simulada, verificaram um aumento da concentração de catecolaminas na circulação, da concentração de insulina e da hormona de crescimento, no final do exercício e até 180 minutos após o término deste.

A exposição a um episódio hipóxico também acarreta uma série de respostas inflamatórias e imunes, de acordo com Lundby et al. (2004), que incluem o aumento da concentração plasmática de citocinas, nomeadamente, as interleucinas, o fator de necrose tumoral alfa e a proteína C reativa, todas elas relacionadas com o mal de altitude (Hagobian et al., 2006). Outras respostas importantes do sistema endócrino têm sido reportadas, mas variam com o tipo de altitude a que estamos expostos. Em alta altitude existe um aumento da produção de metabólitos derivados das purinas (ácido úrico, a hipoxantina e a xantina) (Lou et al., 2014) e em altitude moderada, diminui a produção da hormona antidiurética (Claybaugh et al., 1978; Haditsch, et al., 2015), que induz uma diurese (Swenson et al., 1995; Hildebrandt et al., 2000) e uma redução do volume plasmático (Haditsch, et al., 2015).

Pode-se então assinalar que existe uma consequência direta da exposição à hipóxia natural e simulada, na condição de repouso e durante o exercício submáximo, no SNC, no SNA e no sistema endócrino.

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