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O consumo é um termo que vem sendo bastante discutido na contemporaneidade. Os estudos sobre o consumo são complexos e as teorias sobre ele vêm sofrendo modificações no decorrer dessa trajetória. Essas modificações podem ser observadas tendo por base duas visões que merecem destaque sobre a teoria do consumo: a visão utilitarista e a visão do consumo simbólico4.

De acordo com a visão utilitarista, os consumidores são vistos como racionais, que procuram satisfazer suas necessidades tendo por base a sua renda e o preço dos produtos. Nessa visão, o que o consumidor observa é a utilidade do produto e enfatiza a produção dos mesmos. Dessa forma, valoriza a utilidade do produto e para adquiri-lo, faz de acordo com a sua renda, verificando os benefícios que ele vai ter ao consumir aquele produto e o quanto vai disponibilizar financeiramente para isso.

A partir dessa visão, a sociedade tem pouca influência sobre o desejo do consumidor, como afirma Slater (2002) as preferências dos indivíduos são constituídas de modo privado, os indivíduos calculam os melhores meios de maximizar a satisfação de desejos. Os indivíduos não se baseiam no “olhar” da sociedade diante do que ele está consumindo, mas na sua própria vontade e possibilidade financeira.

Através da visão utilitarista, o consumidor nos é apresentado como indivíduo bastante centrado, que não sofre influência na sua decisão de compra, apenas satisfaz uma necessidade. Nesta visão o homem terá necessidades e buscará satisfazê-las e ele é capaz de identificar suas necessidades, a melhor forma de satisfazê-las e de ficar satisfeito com suas escolhas (BAUDRILLARD, 2003).

No entanto, novas perspectivas vão ganhando espaço na sociedade contemporânea, e o consumo toma outros rumos que não vislumbram apenas a visão utilitarista. De acordo com

Firat (1991), o projeto pós-moderno tem revertido a ênfase e a ordem das coisas. O projeto central não é mais a produção, mas sim o consumo. E complementa que o consumo se tornou um meio de auto-realização, auto-identificação, um meio de se produzir bem com a própria imagem. Não há mais a culpa de consumir em detrimento a produzir, e gastar já não é mais “pecado”. Leão (2007) vai além,

(...) o consumo - e não a produção - se torna o motor das sociedades e, assim, as pessoas passam a ser mais “importantes” para estas enquanto consumidores e não mais enquanto trabalhadores, o que faz com que as relações sejam orientadas- ou melhor, vividas- sob a ética do consumo. (LEÃO, 2007, p.40)

O consumo assume um papel fundamental na sociedade contemporânea, pois como afirma Slater (2002, p.14), “ao consumirmos rotineiramente, construímos identidades e relações sociais a partir de recursos sociais (...)”. E afirma ainda que os consumidores tomam decisões de quem são e querem ser e usam “bens, serviços e experiências adquiridos para realizar esses projetos de identidades”.

Com isso, podemos destacar a visão do consumo simbólico, que, ao contrário da visão utilitarista, que está focada na utilidade do produto e no individual, centra-se nas características simbólicas dos produtos e no social. A partir disso, é importante perceber a evolução do consumo, que passou da necessidade de adquirir um produto para adquirir conceitos, no qual os produtos deixam de ter apenas uma utilidade para significar algo. Assim, observa-se que o valor de utilidade do produto cede lugar para as características simbólicas que ele representa, que ele exprime. O consumidor passa a se posicionar e se identificar pelo que consome (FIRAT, 1991).

De acordo com Leão (2007, p.40), o consumidor não pode mais ser visto como aquele que “busca a relação satisfatória de custo versus benefício, mas sim as experiências adquiridas através do próprio consumo e do significado que este passa a desempenhar em suas relações”.

O consumo passa a ter significado, não apenas o consumir para suprir uma necessidade, mas consumir como ato de “significar” na sociedade.

Segundo Baudrillard (2003), a identidade moderna é melhor compreendida por meio da idéia de consumo. Para ele, escolhemos uma identidade para nós mesmos na vitrine do mundo social pluralizado; deparamos reflexivamente com ações, experiências e objetos como parte da necessidade de construir e manter a própria identidade.

De acordo com Leão et al. (2001), o consumo de produtos realizado em função dos símbolos que esses representam torna possível a formação da identidade das pessoas, dos grupos sociais bem como dos papéis que estas assumem e/ou representam na sociedade. Baudrillard (2003), por sua vez, afirma que a sociedade passa a dominar o indivíduo, muito através do mundo material dos objetos e interesses, agora essenciais não só para a satisfação das necessidades, mas também para ele ser ou encontrar uma identidade. E isso é bem utilizado pela propaganda e mídia, a qual não destaca mais só a utilidade do produto, mas o “status” que esse produto pode fornecer a quem consome, ou faz com que determinada pessoa sinta-se parecida com o (a) garoto (a) propaganda. Estes, geralmente, são pessoas famosas e conceituadas, cuja imagem desperta no consumidor desejos de similaridade, de ter um mesmo status. Por exemplo, se uma propaganda de perfume utiliza David Beckham como garoto propaganda, os homens que se identificam com ele ou querem parecer com ele, podem vir a consumir o produto para terem a sensação de serem charmosos, interessantes, bem cuidados.

Baudrillard (2003) afirma que o produto deve ter algum significado em relação ao sistema de valor. Vale ressaltar que isso se dá no âmbito cultural, pois algo só tem valor se for considerado por um grupo ou sociedade como portador de tal atributo. Caso contrário, não provocaria a mesma reação ou teria o mesmo conceito de valor, perdendo assim a sua referência. Para Slater (2002, p. 69), “o conceito de cultura diz respeito a valores que surgem

do modo de vida de um povo, que dão a esse povo solidariedade e identidade e que julgam com autoridade o que é bom ou mal, real ou falso (...)”.

Parece-nos fundamental destacar essa relação de cultura e consumo, uma vez que esses dois conceitos se integram por um depender do outro. Para Baudrillard (2003), é através de formas de consumo culturalmente específicas que produzimos e reproduzimos culturas, relações sociais e, na verdade, a sociedade. A cultura dos indivíduos indica o valor que determinado produto pode ter naquele contexto social. Um exemplo claro disso é que na índia comer carne de vaca é um absurdo, uma vez que esse animal é considerado sagrado, tem seus valores culturais. Para nós brasileiros o significado desse animal é outro, e consumi-lo não quer dizer que é um “atentado” à sociedade. Isso acontece com vários outros produtos, que diante de determinada cultura podem apresentar conceitos e valores diferentes do que apresentam em outra cultura.

Assim, a cultura de uma sociedade interfere na forma de consumo. Segundo Baudrillard (2003), o postulado da racionalidade formal, que na economia determina a relação do indivíduo com o objeto é simplesmente transferido para a relação do indivíduo com o grupo. Diferentemente do que se observa na visão econômica, na qual o foco era a individualidade, na sociedade contemporânea o que faz o indivíduo integrar este ou aquele grupo, esta ou aquela camada social é o consumo. Já não é mais a religião ou política que dão as diretrizes para o indivíduo, mas sim o próprio ato de consumir. De acordo com Baudrillard (2003), os significados e rituais de consumo demarcam, portanto, as categorias e classificações que constituem a ordem social.

Para Miranda et al. (2001), todo objeto comercial tem caráter simbólico: o ato de comprar envolve a avaliação do seu simbolismo. Os autores ressaltam que “o ponto central do simbolismo, para a interpretação da realidade social e a natureza dos sistemas simbólicos, é o compartilhar pelos membros da cultura comum, é o próprio processo de

socialização” (MIRANDA et al, p.4). Assim, podemos destacar que uma pessoa, ao consumir determinado produto, está comunicando a sociedade algo sobre o que ela é ou o que ela quer parecer ser. Deixamos de consumir produtos e consumimos signos, assegurando uma identidade e uma posição social exclusivamente através do signo-mercadoria (BAUDRILLARD, 2003).

A partir dessas discussões, observamos a dimensão do consumo de signos na sociedade contemporânea e o processo de desconstrução e construção de identidades a partir dessa dimensão. Assim, o consumo de signos passa a ser peça chave na construção da identidade, e para nosso objeto de estudo, o metrossexual, o consumo parece ser fundamental para a construção dessa identidade e definição do seu lugar na sociedade.

3 Aspectos metodológicos

Neste capítulo trataremos dos procedimentos metodológicos, que serão discutidos em quatro seções: orientação paradigmática e tipo de pesquisa, método de coleta de dados, construção do corpus de pesquisa e método de análise de dados.

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