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4.2 A TIVIDADES DESENVOLVIDAS PELA PESQUISADORA

4.2.1 Contação da história

A primeira atividade realizada com o grupo de crianças foi a de contação da história em Libras pela OS. A pesquisadora já havia conversado previamente com ela sobre o livro escolhido. Durante a contação a professora surda foi sinalizando toda a história. Sempre que podia fazia alguma relação com algo presente na sala de aula, como uma figura, ou objeto. Como exemplo, quando se fala da espera da mãe pelo filhote, a professora aponta para o calendário que tem na sala, sinalizando que a mamãe pata estava esperando há alguns dias.

Esse fato do calendário ficou muito marcado para as crianças, todas elas fizeram referência a ele no texto, ou no desenho. Vale a pena ressaltar que não tinha nenhuma figura de calendário no livro, mas a interpretação da professora ao contar a história fez com que eles utilizassem a imagem para representar a figura da pata fazendo o tricot. Eles utilizaram a figura do calendário por conta da professora. Mas, não significa que entenderam, ou que fizeram a relação da espera para o nascimento do patinho. Vale ressaltar que a imagem da pata fazendo tricot simboliza de forma humanizada a preparação da mãe para a chegada do bebê, preparando o enxoval. Temos ainda a imagem do pato usando óculos, o que ainda humaniza a ave na história.

Após a contação feita pela PS, a pesquisadora orientou as crianças a um de cada vez recontar a história, do jeito que tinham entendido. Foram feitas filmagens de cada criança, a PS auxiliou a pesquisadora a traduzir os vídeos.

A seguir, a partir das imagens do livro, apresentamos em português escrito o que cada criança sinalizou para contar a história.

Eric (7 anos):

PATO FEIO

OUVIR NASCER

FEIO CHORAR

FEIO CHORAR TRISTE

Daiane (9 anos):

FEIO

MAMÃE PAPAI OVO COSTURAR

UM PATO FEIO TRISTE

PATO FEIO TRISTE SEPARAR

Kamila (12 anos):

PATO FEIO

MAMÃE PAPAI FELIZ MAMÃE COSTURAR ROUPAS

NASCER PATINHO FEIO PAPAI IRMÃO RIR PATINHO FEIO

PATINHO FEIO EMBORA TRISTE

ENCONTRAR PATINHOS FELIZ CRESCER REI

Nesta atividade pode-se perceber que as três crianças trouxeram os elementos como a PS os apresentou, tais como a forma de exposição do livro (apoiado no quadro negro) e da contação da história focando na imagem.

A partir do contato com as crianças já durante as observações, foi percebido que elas se encontravam em processo de aquisição da LS, ou seja, ainda não apresentavam fluência nessa língua, talvez pelo tempo de exposição a esta, pois, não tinham mais que três anos de frequência no centro, local onde se deu o contato com a LS. Assim, a contação por parte das crianças parece

se concentrar na representação da figura e não propriamente na narrativa, que se caracteriza pela sequência temporal.

Pode-se afirmar através dos registros da atividade que alguns sinais que a professora surda utilizou na contação da história como bonito e pensar não foram utilizados pelas crianças talvez por não conhecerem ou não fazer parte do vocabulário delas. Os sinais mais utilizados como “mamãe”, “papai”, “pato” e “feio” foram utilizadas várias vezes pela PS

e também pelas crianças.

Segundo Araújo39 (p. 96), “Cada indivíduo fará uma leitura de acordo com sua perspectiva de vida, em maior ou menor grau de aprofundamento, de acordo com sua experiência. A compreensão não é imediata e garantida”. Fica claro nessa atividade a falta de experiência das crianças com o livro estudado, as falas delas representam a fala da PS. O livro foi trabalhado com o grupo uma única vez, o que não é suficiente para um aprofundamento dos fatos e compreensão da história.

Entre as três crianças Kamila é a que demonstrou, através da contação de história e das demais atividades, o uso da narrativa, o que mostra compreensão da sequência dos fatos. Vale lembrar que dentre as três crianças ela era a única que não tem perda bilateral profunda, segundo a PO ela também era a que tinha um melhor conhecimento da LS e era a mais velha.

Tanto Eric como Daiane fizeram uma relação imagem/palavra em relação ao texto. Eric utiliza em sua contação de história as palavras pato, feio, ovo, feio, chorar que foram sinais que a PS utilizou. Já Daiane em alguns momentos utiliza mais de um sinal para cada figura, demonstrando um início de narrativa. Pode-se perceber que as duas crianças seguiram o discurso da PS, sendo ela a referência que tiveram do texto.

Podemos perceber que na página do livro, que mostra o patinho triste, a história remete a ideia do passar do tempo, mostrando as quatro estações do ano. E a situação do patinho feio parece não mudar, pois, ele ainda aparece com expressão de tristeza. A professora surda quando contou a história não percebeu esse fato ou não quis entrar em detalhes, pois não abordou com as crianças tal situação. Uma imagem que também pode não estar clara para qualquer leitor no sentido de passagem de tempo, por sua vez as crianças devem ter utilizado a interpretação da PS. Portanto, a imagem ficou reduzida à expressão de tristeza do patinho.

A partir dos dados acima podemos afirmar a necessidade de interação do professor surdo com os alunos sobre o livro. É necessário o recontar e falar sobre o texto para que haja partilha e construção de conhecimento. Esta partilha pode levar dias até que o conteúdo do livro, assim como seus personagens possam ser explorados. Mas não foi o que aconteceu neste caso. Não houve interação entre a PS e as crianças após a contação da história, assim, não houve um processo conjunto de construção da narrativa, o que limita a recontagem em especial com surdos ainda não fluentes na Libras.

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