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2 ANTROPOMORFISMO

2.6 CONTEMPORANEIDADE E DESIGN

O contemporâneo é marcado pela mudança na dinâmica das transformações decorridas em consequência da rápida evolução do processo de globalização das últimas décadas. A revolução tecnológica, dentro desse processo, é um dos principais responsáveis por promover uma transformação de cenários que resulta no panorama complexo do mundo atual.

Dentro do movimento de progresso tecnológico, destaca-se principalmente o incremento dos sistemas de comunicação que intensificou as possibilidades e a velocidade na troca de informações entre povos e culturas das mais distintas partes do mundo. A intensificação dos contatos culturais promovida pelo funcionamento das novas formas de comunicação resultou no surgimento de um cenário composto por contextos distintos que se inter-relacionam em um emaranhado de possibilidades de conexões que originam um universo de novas realidades constituídas pela diversidade cultural, pela multiplicidade de valores e pelo surgimento de novos sentidos, construções simbólicas, formas de expressão e linguagens.

Esse panorama anuncia grandes mudanças socioculturais que se refletem principalmente nos modos de viver, no comportamento da sociedade e na relação do homem com sua própria realidade em constante mutação. “Nunca antes na história da humanidade, tantas pessoas haviam tido a oportunidade de comprar tantas coisas”, como diz Cardoso (2012, p. 15). Se até a década de 1960 a indústria caminhava segundo as regras da produção em massa de produzir “tudo igual em grande quantidade para todos”, a indústria atual preocupa-se com a diversidade da

demanda sendo direcionada para uma produção mais flexível, de modo a atender à fragmentação do mercado consumidor.

O indivíduo moderno, guiado dentro da lógica de ordenamento e organização social promovido pelo ideal do progresso modernista, conformava-se facilmente com aquilo que lhes era oferecido. De acordo com Moraes (2010, p. 4), “previa-se que a humanidade, uma vez inserida nesse projeto linear e racional, seria guiada com segurança rumo à felicidade”. A ideia de estabilidade de emprego, de núcleo familiar consistente, toda essa estrutura de segurança oferecida pelo projeto moderno agradou a sociedade até certo ponto, como explica o autor. Com o passar do tempo essa realidade mostrou-se incoerente, visto que por um lado oferecia estabilidade, mas por outro não garantia a autonomia da população. Diante dessa situação surgiu um indivíduo cheio de anseios e expectativas, conduzido pela liberdade de escolha; que se destaca na busca pelo conforto, pelo prazer e pela realização de desejos e vontades individuais.

Esse contexto pós-moderno reflete diretamente no âmbito do design. À medida que ocorre um nivelamento da capacidade produtiva da indústria que resulta no aumento da competitividade entre empresas e da quantidade de produtos ofertados, o design entra como fator diferencial de inovação e acaba ganhando destaque. No novo cenário onde a oferta é muito maior que a demanda, “é necessário (como nunca) estimular e alimentar constantemente o mercado pela via da inovação e diferenciação do design”, como afirma Moraes (2008, p. 12).

Esse período é evidenciado pela valorização e disseminação do termo “design” e da estética, que podem ser observadas sobre duas perspectivas. Na primeira delas o termo “design” é tratado no sentido do projeto e sua dimensão estética está envolvida dentro do processo de desenvolvimento projetual. A nova realidade, no entanto, estabelece uma segunda interpretação (vulgarizada) do conceito de “design”, sendo este associado unicamente à estética, ao styling, ao “embelezamento” dos produtos, o que colocava “em cheque o conceitos de ‘estilo’ e ‘estética’ até então empregados”, como explica Moraes (2008, p. 13).

O Design também enfrenta mudanças paradigmáticas no âmbito de sua abordagem metodológica. No modernismo, o foco do projeto estava no próprio produto, ou seja, a configuração dos artefatos era definida pelo seu modo de funcionamento e as disciplinas que davam suporte ao processo de desenvolvimento eram fundamentadas a partir dessa abordagem. Tinham destaque os conteúdos de

ordem objetiva, tudo aquilo que era palpável e sustentado por interpretações sólidas. Até a abordagem do próprio indivíduo muitas vezes estava limitada à sua materialidade, servindo apenas como fonte de medidas para a geração de produtos, à exemplo da ergonomia. Essa visão, no entanto, mostrava-se incoerente face ao contexto da nova realidade que se instalava.

Moraes (2010) explica que no contexto do “cenário dinâmico”, várias realidades passaram a conviver simultaneamente e cada indivíduo carrega conjuntamente elementos de caráter individual, como suas experiências, motivações e desejos, mas também aqueles de caráter cultural, ou seja, do seu meio social. Esse novo perfil de usuário/consumidor, requer um olhar mais atento do design. Dessa forma, as metodologias passaram a compreender não somente as disciplinas de ordem objetiva, mas principalmente aquelas que envolvem aspectos subjetivos e imateriais, o que implica em mudanças na forma de projetar, de modo que o indivíduo adquire um papel importante dentro do processo.

Ampliaram-se as possibilidades de expressão e atuação do Design. Contudo, gerenciar a complexidade e dimensionar os novos elementos envolvidos no projeto, considerando o contexto contemporâneo, tornou-se muito mais difícil e é um dos grandes desafios para o Design da atualidade.

Considerando o design brasileiro diante desse contexto, Moraes (2006) observa uma afinidade entre a conformação da sociedade brasileira, múltipla e sincrética, e a configuração do atual cenário mundial promovido pelo processo de globalização. O autor explica que o Brasil, em sua formação, passou por processo que muito se assemelha ao que ocorreu no panorama mundial, e chega a chamar essa construção de “miniglobalização”.

Em tese, deveria ser muito mais fácil para o design brasileiro decodificar as mensagens produzidas pelo contemporâneo e, da mesma forma, reproduzir esse pluralismo como referência na expressão de seus artefatos. No entanto, a pós- modernidade só foi absorvida pelo país um pouco mais tarde e em um período de “baixa-estima do design” (MORAES, 2006) e da indústria local. Dessa forma, o design brasileiro pós-moderno acabou não produzindo de forma significativa.

A chegada do pós-moderno no âmbito brasileiro talvez não tenha representado a máxima expressão e valorização do Design como aconteceu na esfera mundial. Da mesma forma também não significou o total rompimento com o modelo racional funcionalista proveniente do período moderno. No entanto, vale

ressaltar que esse evento acabou inaugurando um processo de reconhecimento de uma estética brasileira, abrindo caminho para os designers locais em direção à decodificação de uma linguagem própria. O design local passa a ser mais expressivo e espontâneo, assimilando a diversidade, a pluralidade de seu contexto, gerando novas manifestações estéticas, linguagens e significados.