6. RESULTADOS E DISCUSSÃO DADOS DOS QUESTIONÁRIOS
6.2. Contexto do Portfólio
Para permanecer competente ao longo de sua vida, o profissional terá que incorporar inovações, tais como habilidades de autoaprendizagem; abertura para aceitar ideias de outros profissionais e capacidade para mudar de atitude e comportamento quando necessários. O portfólio possibilita a incorporação dessas habilidades a partir da reflexão, percepção das lacunas de aprendizagem e diálogo com o mentor.
HERNÁNDEZ e Cols (2000) argumentam que uma prática inovadora (neste caso, o portfólio) nunca começa do zero, sua origem está vinculada à percepção de que a avaliação anterior não estava conseguindo ofertar os resultados esperados. Portanto, uma inovação necessita de um grupo de referência que a impulsiona, baseando-se no conhecimento prévio da necessidade da mudança. Acrescenta-se que o clima de comunicação e o envolvimento emocional que se estabelece entre os participantes desempenham papel relevante para o sucesso.
Uma inovação também tem uma história, não é algo estático, passa por fazes de confronto de pontos de vista e representações que evoluem com o tempo. O fato de o portfólio ter sido prematuramente abolido, com certeza, influenciou no seu ciclo vital. No começo, uma inovação pode ser vivenciada como uma imposição, que só deixa de sê-lo, se tiver conexão com a consciência da necessidade dos envolvidos. O processo de inovação será enriquecido se for permeado por um feedback sistemático, que contribui para a dinamização da inovação e pela reflexão permanente sobre a prática para melhorar sua compreensão, desvendar os elementos críticos e minimizá-los o quanto possível.
6.2.1 Processo de Implantação do Portfólio[Belem22]
Muitos estudantes (45%) disseram que a implantação não ocorreu de maneira adequada:
Quando começamos, não sabíamos direito o que era o portfólio e qual a necessidade de trabalhar com ele. Sabia apenas que era um método de avaliação pessoal. E 3
Poucas informações foram fornecidas, o que deixou a estrutura a ser seguida mais livre, a nosso cargo. E 8
Em minha opinião, o processo de implantação não foi adequado, visto que os alunos necessitaram de maiores informações antes de iniciarem o projeto. Como resultado, não conseguimos usufruir de todos os benefícios que o portfólio viria nos trazer. Mas, sem dúvidas, se trata de um poderoso instrumento de avaliação. E 20[Belem23]
A mentora afirmou:
A implantação não foi adequada, faltaram maiores orientações aos estudantes. M
Comenta Junqueira (2005, p.24):
De fato, para que o portfólio seja efetivo no desenvolvimento e avaliação de competências, alguns elementos foram (...) promotores do seu sucesso, sendo eles: a apresentação minuciosa do portfólio, provendo claras orientações sobre os procedimentos, o formato e o conteúdo; o detalhamento dos objetivos e a razão de seu uso, combinando aprendizagem e avaliação; a interação entre estudante e mentor e o suporte para o desenvolvimento do portfólio; o formato flexível centrado no estudante e o seu uso como uma atividade integrada as outras atividades educacionais.
Quando à orientação para trabalhar com o portfólio, curiosamente, os discentes afirmaram:
Foram realizadas palestras sobre os objetivos do portfólio e as orientações mais específicas foram fornecidas pelo mentor. E 5
Fui orientado quanto à importância de uma avaliação formativa e de uma visão crítica das atividades desenvolvidas durante minha formação acadêmica. E 7
... deveríamos registrar nossas impressões sobre nossas atividades acadêmicas e refletir sobre o processo educacional e o impacto deste sobre nós. E 19
Os depoimentos podem evidenciar que, apesar da preparação por meio de palestras realizadas pelo Coordenador do Curso Médico e pela Coordenadora da Avaliação, disponibilização de literatura e orientações dos mentores, era preciso criar um clima de comunicação e envolvimento emocional entre os participantes, para que percebessem a importância da avaliação e se sentissem “atores”, lidando de maneira mais prazerosa e efetiva com o portfólio.
No entanto, vários estudantes expressaram sua adesão ao uso do portfólio:
Considero que foi um importante instrumento de avaliação, que permitiu uma abordagem ampla sobre as diversas questões relacionadas ao ensino e aprendizagem. O processo de implantação foi adequado, gradual e de forma elucidativa. E 5
Apesar de relativamente trabalhoso, o portfólio pode ajudar na formação acadêmica e pessoal, uma vez que auxilia no desenvolvimento de autocrítica, criação e cumprimento de metas. E 17[Belem24]
Para Hernández (2000 p.165), A função do portfólio se apresenta assim como facilitadora da reconstrução e reelaboração, por parte de cada estudante, de seu processo ao longo de um curso ou de um período de ensino.
6.2.2 Percepções sobre o portfólio
... para mim não foi tão efetivo devido minha falta de dedicação e porque já sou muito incentivado à autoavaliação em minha formação pessoal. E 2
Apesar de ter alguns pontos positivos, acho desnecessário o portfólio. E 13
O mentor fala da importância de se fazer o portfólio devido às situações futuras, em que o mesmo será indispensável, mas os acadêmicos não aceitam trabalhos que não têm aplicação imediata. E 14
Para 10 %, em certas situações, é importante, em outras não:
Foi um trabalho, por vez, necessário e, por outras ocasiões, desnecessário. Enquanto documento de interação mentor - acadêmico e reflexivo tinha um bom crescimento, tanto de conhecimento como a evolução de se escrever e refletir sobre as experiências adquiridas no meu próprio crescer. E 10
Em partes, como quando não ocorre o feedback para o estudante do que foi mudado ou transformado. E 17
75 % dos estudantes não se posicionaram.
Na percepção da mentora:
Os estudantes registraram reflexões objetivas e pertinentes às atividades desenvolvidas. M
6.2.2.1 Pontos positivos do portfólio:
Curiosamente, todos ressaltaram pontos positivos do portfólio:
• Acompanhamento do desempenho acadêmico
Acompanhamento do desempenho: E 7; E 8; E 15;
Documentar / registrar pontos da vivência de aprendizagem e documentar as experiências vivenciadas e as habilidades adquiridas para se recordar a posteriori: E 2; E 17
• Possibilitar a avaliação
Desenvolvimento de autocrítica: E 1; E 18;
Ressaltar pontos fortes e fracos: E 4; E6;
Desenvolvimento de senso crítico: E 6
Reconhecimento de limitações e deficiências: E 2; E 3; E 7; E 20
Permitir se conhecer melhor: E 5;
Possibilidade de uma nova ferramenta de avaliação e registro de notas: E
12; E 13
• Superação de dificuldade
Traçar objetivos para melhor desempenho: E 10
Superação de lacunas: E 7; E 10; E 14; E 20
Mudança de estratégia de aprendizagem, quando necessário: E 2; E 8
• Espaço de comunicação
Espaço de diálogo: E 5
Estímulo da relação interpessoal acadêmico/ mentor: E 3
Oportunidade para expressar sentimentos: E 19
Diminuir a timidez: E 3;
Oportunidade para reivindicar: E 19
Demonstração de preocupação por parte dos docentes em relação à participação ativa do estudante no curso: E 6
Suporte emocional essencial para um curso desgastante como medicina: E 5
• Crescimento pessoal e profissional
Favorecer a proposta de mudança de vida: E 2
Adequação do tempo para as atividades: E 7
Saber criticar e ser criticado: E 10
Desenvolvimento de reflexão: E 1; E 11; E 16
Capacidade de síntese e de sistematização: E 4
Exercitar a leitura e desenvolvimento da escrita: E 10; E 18; E 10; E 20
Para a mentora,
O principal ponto positivo seria o acompanhamento individual do estudante, propiciando a identificação de deficiências ou potencialidades, e... a partir daí estabelecer estratégia, que possam motivá-lo a preencher estas lacunas. M
Moulin (2001) considera o portfólio adequado ao processo de avaliação contínua, integral e abrangente dos saberes.
Para Perrenoud (2000), a avaliação inscreve-se na relação diária entre estudante e professor, permitindo-lhes a regulação dos processos de aprendizagem, em seus progressos e dificuldades. Acompanhando o portfólio, o mentor pode conhecer o desenvolvimento do estudante e servir de mediador para as suas necessidades pedagógicas e pessoais.
Os pontos positivos superaram os negativos, como mostrado a seguir.
6.2.2.2 Pontos negativos do portfólio[Belem25]: • Dificuldade técnico-operacional
Falta de maior conhecimento para sua confecção e importância E 18
Não apresentar uma estrutura padronizada E 8
Obrigatoriedade da confecção E 1; E3; E 9; E 10; E 11; E 12; E 13; E 18
Disponibilidade de tempo E 1; E 2; E3; E 4; E 8; E 19; E 20
Disponibilidade para reunir-se com mentor, quando o estudante está sobrecarregado E 5
Ter de entregá-lo no final do semestre, época de maior ocupação com outras avaliações E 6
• Dificuldade pessoal
Ter que escrever as reflexões E 7
Exposição de problemas particulares E 14
• Inadequação do trabalho do mentor
Quando existe desinteresse do mentor E 10
Não houve integração entre mentor e estudante E 1
• Ausência de aplicabilidade
Falta de resposta concreta em curto prazo E 16; E 19
Não proporcionou transformação no curso E 17
A mentora aponta como pontos negativos:
Falta de apoio da instituição e sobrecarga de trabalho para o estudante que se queixava de falta de tempo para elaborá-lo. M
Nenhuma atividade realizada pelo homem é perfeita. O portfólio não foge à regra. Todavia, muitos pontos negativos citados são passíveis de correção, dependendo do interesse da instituição, dos mentores e dos próprios estudantes.
6.2.2.3 Sugestões para aprimoramento do portfólio[Belem26]: • Sugestões técnico-operacionais
Capacitação sobre o portfólio para estudantes e mentores E 18; E 20
Ter uma estrutura mais padronizada E 8
Conter um material com perguntas ou indagações para estimular a reflexão E 2
Ter valorização E 2; E 3; E 16
Prazo flexível para entrega E 13
Não escrever sobre as vivências E 14
Disponibilizar um feedback mais dinâmico E13; E 19
Apoio de um psicopedagogo ou psicólogo E 14
Sugestões ao mentor
Maior disponibilidade do mentor para este processo E 7
Maior interação dos mentores com outras instâncias do curso (coordenação, avaliação, tutores) E 5; E 12
Maior interação entre os mentores para propiciar soluções coletivas E 13
Deveria ser só uma interação entre mentor e estudante sem necessidade de papel.M
A mentora[Belem27] sugeriu:
Capacitação a respeito do portfólio para mentores e estudantes e que a elaboração do portfólio não fosse obrigatória. M
Contudo, a não obrigatoriedade deve ser mais bem analisada, uma vez conhecidas as vantagens do portfólio e que o estudante, na maioria das vezes, opta pela lei do mínimo esforço.
Para Luckesi (2005), os estudantes baseiam-se em testes, investindo no produto, não no processo. Ao ato de avaliar não importa que todos aprendam com qualidade, desenvolvam-se, adquiram autonomia, mas somente a classificação, não a aprendizagem.
Uma das vantagens do portfólio é a liberdade de criação, que o torna “único.” Villas Boas (2004) propõe ao estudante criar o formato do portfólio, selecionar as atividades que evidenciam suas aprendizagens, buscar atividades complementares, etc. Ao mentor, cabe ser mediador do trabalho.