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Vicentini e Lugli (2009), ao abordarem a trajetória da formação docente no Brasil durante o período da Primeira República (1889 -1930), afirmam que não se pode falar na existência de um único modelo de formação de professores, uma vez

que as diferenças sociais e econômicas interferiram diretamente nesse processo. Salientam, porém, que o elemento comum a todas as escolas foi o Curso Primário Complementar,33 que marcou a formação de professores em todo o território brasileiro.

Se, com a criação da Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1924, emergiram os debates acerca de uma renovação da educação, somente na década de 1930, sob o governo Vargas, é que teve início a homogeneização das regras a que o ensino em todo o país estaria submetido. No entanto, uma década mais tarde, com a promulgação da Lei Orgânica do Ensino Normal, Decreto-Lei n. 8.530, de 02/01/1946, buscou-se dar uma organização nacional à formação de professores.

Cabe destacar que entre os anos de 1931 e 1935, Anísio Teixeira exerceu o cargo de diretor de Instrução Pública do Rio de Janeiro, criando o Instituto de Pesquisas Educacionais e uma nova modalidade de organização da Escola Normal: o Instituto de Educação, que se estendeu para todos os estados brasileiros. Para Saviani (2005), a criação do Instituto de Educação do Distrito Federal foi um momento decisivo na trajetória histórica da formação docente, pois junto ao Instituto funcionava uma escola-laboratório, onde era possível experimentar, pesquisar, avaliar e refletir sobre a prática pedagógica e os métodos de ensino.

A Escola Normal passou a ter caráter profissionalizante, exigindo dos alunos ingressantes o ginásio completo, o que possibilitou, gradativamente, o aumento da escolaridade das mulheres. Desse período em diante, além da preparação para o magistério primário, foi possível consolidar também o magistério secundário, visto que a mulher passou a frequentar o ensino superior, principalmente em cursos que habilitavam para a docência.

De acordo com Saviani (2005), com a criação da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e da Universidade do Distrito Federal, em 1935, o Instituto de Educação Paulista e a Escola de Professores do Distrito Federal foram incorporados, respectivamente, às mesmas, o que acabou por influenciar a criação dos cursos de Pedagogia e de Licenciatura na Universidade do Brasil e na USP, no ano de 1939, cabendo aos cursos de Licenciatura formarem professores em disciplinas específicas dos currículos das escolas secundárias e aos cursos de Pedagogia formar os professores das Escolas Normais.

33 Ver em VICENTINI E LUGLI (2009).

A partir de 1946, o Ensino Normal se dividiu em dois ciclos, sendo que o primeiro ciclo, com duração de quatro anos, era responsável pela formação de regentes de ensino primário, correspondia ao ginásio e funcionava em Escolas Normais Regionais, enquanto o segundo ciclo, previsto para acontecer em três anos, voltava-se à formação do professor primário, acontecendo nas Escolas Normais e nos Institutos de Educação.

O currículo do curso de formação de professores primários, da mesma forma que no Distrito Federal, centrava-se exclusivamente nas disciplinas pedagógicas, distribuídas em três seções: Educação (1ª seção): psicologia, pedagogia, prática de ensino, história da educação; Biologia Aplicada à Educação (2ª seção): fisiologia e higiene da criança, estudo do crescimento da criança, higiene da escola; Sociologia (3ª seção): fundamentos da sociologia, sociologia educacional, investigações sociais em nosso meio. Estava definido o modelo a ser adotado progressivamente por outras unidades da Federação, configurando-se as grandes linhas que informariam a organização dos cursos de formação de professores até a Lei 5.692/71. (TANURI, 2000, p. 73-74).

De acordo com Tanuri (2000, p. 78), a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases 4.024/61 “[...] não trouxe soluções inovadoras para o ensino normal, conservando as grandes linhas da organização anterior, seja em termos de duração dos estudos ou divisão dos ciclos.” Já a Lei 5.692/71, em decorrência da profissionalização obrigatória do ensino do segundo grau, “[...] transformou-a [Escola Normal] numa das habilitações desse nível de ensino, abolindo de vez a profissionalização antes ministrada em escola de nível ginasial” (p. 80).

Em vista disso, as Escolas Normais cederam espaço para o surgimento da Habilitação Específica de 2º grau para o exercício do Magistério de 1º grau (HEM). Para Saviani (2005), muitas deficiências ficaram evidentes na nova estrutura curricular, na formação do professor, bem como na oferta do curso, o que desencadeou a criação, pelo governo federal, em 1982, do Centro de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM), tendo como meta a “revitalização da Escola Normal”. Afirma o mesmo autor, também, que, concomitantemente a esse processo, a partir de 1980, foi atribuída aos Cursos de Pedagogia a formação de professores para a Educação Infantil e para as Séries Iniciais do ensino de 1º grau (Ensino Fundamental).

Segundo Vicentini e Lugli (2009), as décadas de 1950 e 1960 foram marcadas pelo crescimento acelerado do Ensino Normal e pelas críticas feitas aos critérios de equiparação para os cursos particulares e públicos de formação de professores, bem como ao currículo da Escola Normal. No entanto, se por um lado isso oportunizou a escolarização feminina, por outro ocasionou críticas quanto à má qualidade do ensino ministrado nos Cursos Normais e, consequentemente, da formação dos professores, acarretando, nas mais variadas regiões do Brasil, um crescente desprestígio do Ensino Normal. Ressaltam elas, ainda, que entre os anos de 1960 e 1970 destacou-se o crescimento dos cursos de Pedagogia por todo o país e houve críticas com relação às condições dessa expansão.

A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, artigo 62, houve um novo direcionamento na formação de docentes, estabelecendo-se o seguinte:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de Licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, LDB, 1996, p.24).

Analisando as mudanças e/ou permanências com relação às diretrizes da educação nacional, contidas nas Leis n. 4.024/61, 5.692/71 e 9.394/96, percebe-se que muito se avançou com relação ao desejo de melhorar o ensino no Brasil. Pergunto: como o conjunto de políticas públicas empreendidas nesse processo histórico se fez sentir nas vivências e histórias de vida dos(as) professores(as) entrevistados(as)?

2 DANDO VOZ AOS SUJEITOS DA PESQUISA

Los seres humanos leen e interpretan su propia experiencia y la de los otros en forma de relato. (BOLÍVAR; DOMINGO; FERNANDEZ, 2001, p. 21).

Este capítulo tem por objetivo dar voz aos professores-sujeitos da pesquisa. Assim, a partir das narrativas, apresento “Quem são esses(as) professores(as)”, pontuando aspectos relacionados com suas vivências enquanto alunos(as) das décadas de 1930 a 1960, bem como suas trajetórias de vida enquanto docentes. Coloco em relevo suas experiências pessoais, procurando compreendê-las e pensá- las dentro de um contexto mais amplo da educação.