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SUMÁRIO

1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ASSUNTO

Dados a limitação da disponibilidade dos recursos naturais e o impacto que a prática da engenharia impõe ao meio ambiente, a tendência atual nos diversos projetos de engenharia — sob a impulsão da atividade dos diversos órgãos ambientais — é a consideração dos preceitos da sustentabilidade como variáveis de maior relevância na concepção dos referidos projetos. A sustentabilidade pode ser definida como toda política destinada a minimizar o impacto da atividade humana no decorrer natural da vida. Ela visa garantir as mesmas condições e chances de existência para as gerações futuras diante da possibilidade da escassez dos recursos naturais. Por isso, é altamente requerido que os preceitos da sustentabilidade sejam levados em conta para criar harmonia e manter o equilíbrio entre as três dimensões principais da atividade humana: a dimensão social, a dimensão econômica e a dimensão ambiental.

De acordo com Jailon et al. (2009) e Yuan et al. (2011) citados por Nagalli (2014), nas últimas décadas, os resíduos de construção e demolição (RCD) vêm recebendo atenção crescente por parte de pesquisadores e construtoras porque os mesmos estão se tornando um dos principais agentes de poluição ambiental. O impacto causado pelos RCDs influencia diretamente o equilíbrio entre as três dimensões da atividade humana precitadas. O gerenciamento condizente destes resíduos é o meio adequado para a redução deste impacto. Em geral, um gerenciamento eficiente passa primordialmente através das políticas de não gestão, da minimização, da reciclagem e do descarte adequado.

No que diz respeito à avaliação de estruturas existentes, na tentativa de redução do impacto da atividade que esta avaliação representa, as políticas de não gestão e minimização são suscetíveis de serem eleitas como as mais eficientes. Uma avaliação adequada evitará que reformas desnecessárias sejam propostas, a rigor, evitará que uma estrutura ainda em condições de ofertar segurança aos usuários seja demolida descartando com isso a possibilidade de geração de

resíduos sólidos. Para que soluções adequadas sejam levantadas no final da avaliação de uma estrutura existente, é importante que todas as variáveis aleatórias que envolvem o processo sejam consideradas. Isso é possível quando critérios e procedimentos objetivos para a caracterização destas variáveis são disponibilizados de maneira a nortear o trabalho dos profissionais diretamente envolvidos com a avaliação.

Uma forma eficaz de garantir uma boa prática do processo de avaliação pode ser a calibração de normas e especificações técnicas exclusivas para a avaliação de estruturas existentes baseando-se nos princípios da Confiabilidade Estrutural. Se isso já é uma realidade no mundo afora, o Brasil ainda carece de tais documentos no âmbito do principal órgão de normatização do país, Associação Brasileira de Normas Técnicas, em sigla ABNT.

No entanto, um dos grandes problemas enfrentados pelos engenheiros de estruturas na atualidade é a tomada de decisão quanto ao desempenho de estruturas existentes com vistas à sua adequação ao uso proposto, reabilitação ou mesmo demolição. Relatos mostram que decisões inapropriadas, quanto ao desempenho de estruturas existentes, têm sido tomadas a partir do uso de suportes técnicos desenvolvidos para outros fins, por exemplo, aqueles desenvolvidos para o projeto de estruturas novas. Bartlett (2001) relatou as controvérsias envolvendo a aplicabilidade das recomendações normativas destinadas ao dimensionamento de novas estruturas no processo da avaliação de estruturas existentes.

Todavia, existem diversos trabalhos de pesquisadores renomeados e normas técnicas estrangeiras e internacionais que abordam a questão da avaliação probabilística da segurança de estruturas existentes. Como exemplo, a norma do “American Concrete Institute” ACI 318 (ACI, 2014) no seu capítulo 27, aborda a questão da avaliação da resistência em estruturas existentes quando há dúvidas sobre a qualidade dos materiais de construção empregados, quando há evidências de um erro de construção e se a estrutura deve passar por um outro uso não previsto ou quando a estrutura ou parte dela parece não satisfazer as recomendações da referente norma. Apenas para os casos precitados, a mesma fornece diretivas para a investigação da segurança através da avaliação analítica da resistência ou da avaliação da resistência através de ensaios.

Além do ACI 318 (ACI, 2014) que é em princípio uma norma calibrada para o projeto de estruturas novas, o “American Concrete Institute” disponibiliza o ACI 562 (ACI, 2013) destinado exclusivamente à avaliação de estruturas existentes. No seu escopo, o ACI 562 (ACI,

2013) define os limites aos quais um reparo e uma reabilitação podem ocorrer em concordâncias com a norma de projeto original sem abrir mão das disposições nele contidas. Com isso, o mesmo fornece recomendações que vão além das diretivas de investigação da resistência in loco presentes no capítulo 27 do ACI 318 (ACI, 2014). Desta maneira, o ACI 562 constitui um instrumento completo para guiar o trabalho do avaliador desde as investigações iniciais até as análises finais e o projeto de intervenções de reparos.

Por analogia, a NBR 6118 (ABNT, 2014) que é equivalente ao americano ACI 318, no que diz respeito a estruturas existentes, apenas prescreve no seu item 12.4.1 o coeficiente de ponderação (𝛾𝑐) para a resistência determinada por meio de testemunhos extraídos. Esta é a única referência explícita desta à avaliação de estruturas existentes dado que, em geral, os testemunhos são requeridos na avaliação de estruturas acabadas. As recomendações para extração, ensaio e análise de testemunhos são fornecidas pela NBR 7680-1 (ABNT, 2015) quanto a determinação da resistência à compressão. No entanto, não se faz referência aos procedimentos de avaliação e outras condicionantes relevantes no tocante às estruturas existentes.

Estima-se que a falta de detalhes, na normalização brasileira, a respeito de procedimentos de avaliação e tratamento estatístico explicito das diferentes variáveis envolvendo a caracterização de estruturas existentes, pode constituir dificuldades para profissionais envolvidos com a avaliação de estruturas existentes.

Pelo exposto, torna-se natural afirmar que a sociedade brasileira carece de recomendações normativas e especificações técnicas exclusivamente destinadas à avaliação de estruturas existentes. Tais recomendações são calibradas com base nas ferramentas da confiabilidade estrutural. Por este fato, este trabalho visa trazer à atualidade a problemática da avaliação da segurança de estruturas existentes no âmbito nacional. Concomitantemente, faz-se uma apresentação do que há de mais atual nesta prática através de extensa varredura de documentos normativos e resultados de pesquisas disponíveis no mundo afora. Intenta-se chamar a sensibilidade dos profissionais quanto aos conceitos relacionados à resistência característica à compressão do concreto. Por isso, foi feita a simulação da confiabilidade de estruturas existentes considerando a influência da resistência à compressão do concreto em virtude de sua variabilidade nestas estruturas.

Uma das etapas primordiais na calibração de uma norma técnica é a definição do objetivo a atingir. Segundo Melchers (2001), embora distintos métodos existam e possam ser utilizados na calibração de normas e especificações técnicas, a consistência com o desenvolvimento de normas técnicas atuais sugere que regras para a avaliação de estruturas existentes devam se basear em uma mesma filosofia. Isto significa que tais métodos devem no mínimo ser consistentes com o formato dos fatores parciais (LRFD do inglês – Load and Resistance Factor Design) ou então com o método probabilístico. Para estes métodos, o objetivo a atingir na calibração de uma norma geralmente se dá em termos do índice de confiabilidade alvo (alvo).

Uma importante questão é a definição do índice de confiabilidade alvo a ser utilizado no processo de calibração de estruturas existentes que contemple a realidade e prática profissionais da engenharia brasileira.

Portanto, os resultados obtidos através da simulação evocada acima serão dados em termos de índices de confiabilidade baseados nas prescrições da NBR 6118 (ABNT,2014) e naquelas do ACI 562 (ACI, 2013). Estes índices de confiabilidade serão comparados aos valores de 𝛽𝑎𝑙𝑣𝑜 recomendados pelo fib MC 2010 (CEB-FIP, 2011) para a calibração de normas técnicas para estruturas existentes.