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11. As percepções e significações dos alunos

11.1 Contextualização dos produtos da intervenção e a experiência dos alunos

Os produtos apresentados são os produzidos pelas turmas da 2ª etapa B e 4ª etapa, do segundo semestre de 2017 da E.C.0312. A escolha das turmas se justifica por serem as turmas que foram acompanhadas por mim no processo. Serão aqui apresentados os textos coletivos produzidos sobre “O que é museu” pelas turmas, antes e depois da visita ao museu. O propósito é analisar se a intervenção trouxe novas percepções dos estudantes a respeito da cultura, museu e memória.

Os textos elaborados na atividade “O que é museu”, que antecedeu a visita a CAIXA Cultural Brasília, teve como objetivo sintetizar as opiniões dos alunos sobre o que conhecem sobre museu. A aula teve o propósito de discutir quais as concepções dos educandos sobre as instituições, quais museus conheciam, e também apresentar novas tipologias de museus, com o princípio de trazer novas visões sobre os museus para sala de aula.

O texto produzido pela 2ª etapa B apresenta-se em formato de tópicos, foram registradas pelos colegas do GENPEX com as falas individuais dos educandos. Os relatos demonstram o contato que os educandos tiveram com o museu, e as percepções sobre ele.

Quadro 3 – Texto Coletivo da 2ª Etapa B MUSEUS

TÊM COISAS VELHAS QUE CONTAM HISTÓRIAS.

TÊM COISAS ANTIGAS.

GUARDAM COISAS DA MEMÓRIA.

UMA LEMBRANÇA DO SR. EDMAR: A VISITA AO MUSEU DO PRESIDENTE JUSCELINO KUBITSCHEK.

VILMAS CONTA QUE JÁ FOI 4 VEZES AO MUSEU.

TRÊS NO MUSEU NACIONAL E UMA NO MUSEU DO MEMORIAL JK. VIU ESTÁTUAS, MULHERES. NÃO PODE TOCAR EM NADA. NÃO PODE TIRAR FOTO COM FLASH.

NO PARANOÁ NÃO TEM MUSEU, POR CAUSA DA ESTRUTURA DA CIDADE.

Fonte: Atividade aplicada pelo GENPEX.

12 Os produtos utilizados para a análise estão disponíveis no Diário de Bordo produzido no segundo semestre de 2017 por Karina Lie Sato Inatomi, como parte das atividades desenvolvidas na disciplina de Projeto 4 – Fase 1, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília.

Já o texto da 4ª etapa apresenta aspectos trabalhados em sala de aula, e também o registro da memória dos alunos em relação aos museus que conhecem:

Quadro 4 – Texto coletivo da 4ª Etapa OS MUSEUS

UM MUSEU É UM LOCAL QUE TEM ANIMAIS EMPALHADOS, GENTE, MÚMIAS, CAVEIRAS, FARAÓS, ÍNDIOS E CAVALOS.

ELES GUARDAM A HISTÓRIA E A ARTE DE UM POVO E DA HISTÓRIA DA HUMANIDADE. TEM UM MUSEU NA ESTRUTURAL QUE GUARDA MUITAS COISAS VELHAS, IMAGENS, ARMAS E OUTRAS COISAS.

EM BRASÍLIA TEM O MUSEU JK, MEMORIAL DOS POVOS INDÍGENAS LOCALIZADO NO EIXO MONUMENTAL. EM CORRENTINA NA BAHIA UM MUSEU COM MÓVEIS ANTIGOS.

NO PIAUÍ TEM UM MUSEU QUE ANTIGAMENTE ERA UM CINEMA DOS TRABALHADORES, ONDE CONTA A HISTÓRIA DOS TRABALHADORES, DE ONDE ELES VIERAM.

NA VISITA AO MUSEU DA CAIXA, NÓS ACHAMOS QUE VAMOS ENCONTRAR QUADROS, OBRAS DE ARTE E A HISTÓRIA DE BRASÍLIA.

Fonte: Atividade aplicada pelo GENPEX.

Em ambos os textos se percebe a presença da fala “é lugar de coisa velha”, “tem coisas velhas”. É um senso comum que se atribuí aos museus. Porém, percebe-se também a presença das palavras história e memória, como instituições que guardam e preservam fatos relativos as lembranças da sociedade, ou seja, essas “coisas velhas” que se referem, são registros da cultura produzida pelos que são ali representados. Como muitos não conheciam um museu, são formadas hipóteses sobre a instituição.

Posterior a visita, que foi realizada no final do mês de outubro, os alunos foram submetidos novamente a atividade questionando sobre “O que é museu”. A atividade começou pedindo para que cada aluno, com uma palavra definisse a experiência no museu.

Essas palavras foram utilizadas na elaboração do texto coletivo.

Figura 4 – Brainstorm com palavras sobre a visita ao museu – 2ª etapa B

Foto de Karina Inatomi.

Para recolher as palavras tivemos os relatos dos alunos, inclusive de alunos que não foram para a visita.

Quadro 5 – Quadro de relatos da 2ª etapa B EDITE “Os colegas falaram que foi ótimo.”

EDMAR “Achei legal. Fui muito bem recebido, não tem como agradecer”

“O diferente é questionável” – relato sobre as fotografias da exposição

“A água passava paz, e o campo de flores também” – sobre a exposição da Karina Dias

“A evolução do estudo e a experiência fazem a diferença. Devemos desfrutar cada coisa” – sobre a perspectiva de mudança que a ida do museu trouxe para sua vida

VILMAR “Maravilhoso”

“Achei muitas coisas bonitas. As águas em movimento, as montanhas” – sobre a exposição Karina Dias, falando que faz referência à natureza

AMÁLIA “Gostei da visita. Agradece por ser recebida, pelo carinho e dedicação” – Falou da relação de troca que a UnB promove. Achou que a experiência do museu foi interessante.

“Lembrei que essa foto foi a minha da atividade. Me lembra meu Nordeste, do Piauí” – sobre uma das fotos da exposição do Sebastião Salgado

ERNIR “Bom e divertido”

“Achei bonito. Me lembrou os antigos exames de mama” – sobre a exposição

Bienal de Novos Artistas

GERALDA “Vi coisas que nunca tinha visto. Muito bom, foi inédito”

MAURICÉIA “Muito divertido”

“A mulher e a paisagem me lembrou o campo” – sobre a exposição Karina Dias

SALETE “O campo de flores, o caminhar da mulher, transmitia tranquilidade, liberdade, me lembrava a infância, quando eu vivia no campo” – sobre a exposição Karina Dias

PROFª IVANA “Vi coisas bizarras” – exposição Roger Ballen

CRISTIANO “Gostei das montanhas com gelo, dos lagos, do movimento” – sobre a exposição Karina Dias

“Nunca tinha ido, foi a primeira vez. Temos que respeitar tudo, ter cuidado.

Sem experiência não podemos falar sobre, agora eu conheço” – sobre a perspectiva de mudança que a ida do museu trouxe para sua vida

JOAQUIM “Se vamos para os lugares, aprendemos algo” – sobre a perspectiva de mudança que a ida do museu trouxe para sua vida

CLEONICE “Não gostava de arte, mas vindo no museu eu passei a gostar. Mudou a percepção. Agora a arte trouxe uma reflexão, uma nova visão” – sobre a perspectiva de mudança que a ida do museu trouxe para sua vida

Fonte: Atividade aplicada pelo GENPEX.

A partir dos relatos foi elaborado o segundo texto coletivo, relativo a visita a CAIXA Cultural Brasília.

Quadro 6 - Texto coletivo após a visita – 2ª etapa B UMA NOITE NO MUSEU

EU ACHAVA QUE O MUSEU ERA SÓ PARA GUARDAR COISAS ANTIGAS E QUE ERA TODO ESCURO.

HOJE EU ACHO QUE O MUSEU É UMA CAIXA DE MEMÓRIAS

SOBRE A MEMÓRIA DO PARANOÁ, A LURDES É UMA PESSOA ESPETACULAR E MERECE UM LUGAR NO MUSEU.

NÃO GOSTAVA DE DE ARTE PORQUE NÃO CONHECIA, MAS AGORA EU CONHEÇO E GOSTO.

QUERO CONHECER OUTROS ESPAÇOS COM OS COLEGAS, PORQUE COM A TURMA É MAIS LEGAL.

FOI A PRIMEIRA VISITA A UM MUSEU QUE FIZEMOS A NOITE. A PRIMEIRA DE MUITAS QUE VIRÃO!

Atividade aplicada pelo GENPEX.

Com os alunos da 4ª etapa fizemos a mesma atividade referente às palavras, porém partimos direto para a elaboração do texto. As turmas da etapa final têm mais facilidade na elaboração de textos e sistematização de ideias em frases completas, o que torna o processo de escrever um texto mais rápido. A síntese de ideias da turma foi a seguinte:

Quadro 7 – Texto coletivo após a visita – 4ª etapa UMA NOITE INESQUECÍVEL

A SAÍDA DA ESCOLA FOI MUITO ANIMADA.

CHEGAMOS AO MUSEU CHEIOS DE EXPECTATIVAS E FOMOS RECEBIDOS PELA KARINA.

PRIMEIRO VISITAMOS A EXPOSIÇÃO DO SEBASTIÃO SALGADO. VIMOS MUITOS QUADROS, UM MAIS INTERESSANTE QUE O OUTRO. ALGUNS MOSTRAVAM COISAS TRISTES E OUTROS TRAZIAM LEMBRANÇAS.

VIMOS UMA EXPOSIÇÃO DE VÍDEOS QUE TROUXE MUITA TRANQUILIDADE.

FOI A PRIMEIRA VEZ DE MUITOS EM UM MUSEU E FOI MUITO INTERESSANTE.

FINALIZAMOS O PASSEIO COM UM LANCHE GOSTOSO E GOSTARÍAMOS DE MAIS VISITAS COMO ESSA.

Atividade aplicada pelo GENPEX.

Fato interessante é o destaque que os alunos deram a exposição “Tempo-paisagem”, da artista Karina Dias, uma exposição de arte contemporânea, com o suporte de vídeos-arte e fotografias. A exposição chamou atenção por retratar temas da natureza, onde os alunos associaram com a vida no campo que tiveram, antes de vir a Brasília. O foco da visita estava em ver a exposição “Êxodos”, fotografias de Sebastião Salgado, que também foi de agrado dos estudantes. Muitos se viram retratados nas imagens.

Por meio das percepções pós-visita, verifica-se que houve uma mudança de concepção sobre o que é museu, principalmente sobre o que o museu expõe. Não viram apenas coisas velhas. Abriram-se ao novo. Aprenderam sobre arte e a experimentaram.

Diante do exposto, a experiência dos alunos trouxe mudanças de concepção sobre museu. Não somente sobre os museus, mas sobre a arte e o uso de recursos da educação não-formal para o processo de ensino-aprendizagem deles. Alvares (2006, p.19) apresenta que os alunos da EJA costumam ter certa resistência inicial às aulas de Artes, porém são receptivos a situações de aprendizagem.

Ao trabalhar com os alunos a uma sequência didática que propôs a ida ao museu como uma ferramenta de aprendizagem, os alunos ficaram mais receptivos a atividade. Em anos anteriores a escola já havia promovido visitas a museus, porém no turno da manhã em dia de sábado. O quantitativo de alunos foi baixo, devido a ser um dia que os alunos estão trabalhando ou desenvolvendo suas atividades domésticas. Colocar a atividade no horário da aula, ou seja, no turno noturno propiciou que mais alunos participassem da intervenção, mesmo aqueles que tinham resistência ao processo.

Tal resistência justifica-se por apresentarem certa dificuldade em decodificar as mensagens presentes e acessar esses bens simbólicos presentes nos museus. Tal afirmação faz parte do estudo de não-público de museus, desenvolvido pelo IBRAM/MinC, do ano de 2012, onde se considera como

Em outras palavras, há segmentos sociais que não compreendem a ida ao museu como algo “necessário” em suas vivências estéticas e culturais, isto é, não possuem a disposição, o habitus requerido para a frequentação desta instituição cultural (BOURDIEU; DARBEL, 2003). Seriam, portanto, indivíduos despossuídos dos meios simbólicos necessários para a fruição dos bens culturais musealizados, os quais são adquiridos pela educação familiar e escolar, isto é, pela transmissão de capital cultural mediante práticas pedagógicas formais e informais, e não-formais (INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS, 2012, p.3, grifo nosso).

A experiência com o museu, visto como uma prática pedagógica que uniu o ensino formal e o não-formal (oferecido pela instituição), trouxe novas concepções para os alunos, inclusive em como pode haver práticas de ensino fora da sala de aula e dos conteúdos dos livros didáticos. A fala do aluno Cristiano traz isto: “Nunca tinha ido, foi a primeira vez.

Temos que respeitar tudo, ter cuidado. Sem experiência não podemos falar sobre, agora eu conheço”.

A sequência didática oferecida aos alunos propiciou um novo olhar sobre o museu.

Aproximou os alunos da instituição que muitos viam-se distantes. A ideia de utilizar da ida ao museu, não como um passeio, mas como uma intervenção pedagógica, ampliou a ideia de que

o uso de recursos fora da escola fazem parte de um planejamento pedagógico, e do processo de ensino-aprendizagem dos estudantes.

A construção de textos coletivos, os diálogos promovidos, o trabalho final, que foi o livro com o relato de cada aluno sobre o que levaria ao museu, demonstra o resultado de um semestre de intervenção efetiva. Ouvir dos alunos que a experiência de ir ao museu foi inovadora, interessante e única, nos traz a percepção que ela não dever ser a primeira a ser realizada, ou até mesmo tornar-se corriqueira a utilização de instituições que promovem a educação não-formal e informal no contexto da escola.

Dependendo de como forem conduzidas essas oficinas de memória, com fotos ou com visitas ao patrimônio, ao museu, as possibilidades de viver uma rica experiência da memória poderão ser múltiplas. Além do cuidado em escolher os lugares de memória, os instrumentos, os materiais, as fotos, etc., será necessário escolher, planejar os objetivos formadores que, como educadores, pretendemos obter. Discutir esses objetivos com os educandos. Preparar os ânimos para mais do que uma visita ao museu ou ao palácio: para visitar-nos a nós mesmos (ARROYO, 2017, p.2011).

Problematizar tal questão, tratando que devemos pensar sempre em valorizar os sujeitos da EJA, como sujeitos produtores de cultura, conhecimento e sujeitos de memórias. A sequência didática aproximou os estudantes de um campo em que eles se viam distantes, trouxe novas visões, ampliou-se o capital cultural dos sujeitos.