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Continuidade e autoperpetuação – A modificabilidade, uma vez instalada, tende a

CAPÍTULO 2 – FEUERSTEIN E A TEORIA DA MODIFICABILIDADE COGNITIVA ESTRUTURAL (MCE)

3. Continuidade e autoperpetuação – A modificabilidade, uma vez instalada, tende a

permanecer por toda a vida, o que sugere que o ser humano é modificável em qualquer fase da sua existência.

Outros aspectos importantes da teoria da modificabilidade cognitiva estrutural a considerar são seus beneficiários, suas implicações pedagógicas e as condições necessárias para a eficácia da aprendizagem mediada.

Beneficiários da MCE – Qualquer indivíduo, seja ele superdotado ou com

dificuldades de aprendizagem. Estes últimos receberão não só um apoio afetivo como também a ajuda necessária para que ocorra uma modificabilidade cognitiva de qualidade. Dos indivíduos com baixo rendimento cognitivo, apenas aqueles com problemas decorrentes de suas etiologias, serão pouco ou nada beneficiados.

Implicações pedagógicas – A crença no potencial cognitivo humano nos conduz a

uma aceitação das diferenças individuais e ao uso de uma abordagem que se coadune com tais princípios, provocando uma atitude otimista frente às dificuldades de aprendizagem encontradas e levando o mediador a combater posicionamentos derrotistas, tais como: “Fizemos tudo e não dá”, “Não vale a pena, para que tentar?”, “Não foram feitos para aprender”.

Condições necessárias para a eficácia da aprendizagem mediada – Acima de tudo,

acreditar que é possível contribuir para modificar o potencial cognitivo de qualquer indivíduo e que a modificabilidade cognitiva é interdependente de uma mudança emocional tanto do

mediado quanto do mediador. Sendo o fator afetivo tão importante quanto o cognitivo para a MCE, procura-se oferecer ao aluno uma atmosfera envolvente e uma abordagem que atenda não apenas às suas áreas fortes como às fracas, ampliando umas e modificando outras. É igualmente relevante perseverar em busca da concretização dos objetivos pedagógicos, procurando desenvolver currículos alternativos, nos quais tarefas sejam estruturadas e processos de informação e interação seqüencializados, a fim de implementar sistemas de reforço e sociabilização. Compreende-se, portanto, que a crença na modificabilidade cognitiva associada a uma ênfase na mediação são princípios básicos da MCE.

Defendendo tais princípios, Feuerstein afirma que existem dois tipos de abordagem: a direta e a mediada. A primeira é baseada na fórmula S-O-R (estímulo-organismo/resposta) de Piaget. De acordo com esta abordagem, o organismo (aprendiz) aprende ao interagir diretamente com o estímulo ambiental, produzindo então uma resposta. Tal autor considera esta abordagem incidental e afirma que ela não é suficiente para assegurar uma aprendizagem efetiva. Por isso, Feuerstein desenvolveu a fórmula S-O-R de Piaget transformando-a em S-H-O-H-R, na qual H é o mediador humano. O mediador assume, então, o papel de facilitador da aprendizagem ao se interpor entre o organismo e os estímulos, auxiliando o aprendiz a interpretar e dar sentido a tais estímulos.

A abordagem mediada é, portanto, intencional e, segundo Feuerstein, é vital para assegurar uma aprendizagem eficaz, porque o mediador pode adequar os estímulos às necessidades dos aprendizes, ajudando-os a percebê-los no tempo e seqüência adequados ao seu processamento e internalização.

É isso que ocorre, por exemplo, quando a mãe, ao interagir com a criança, desde os primeiros contatos, promove a mediação de significados, de intencionalidade e de transcendência ajudando a criança a compreender o mundo a sua volta e a ser compreendida por outros indivíduos. A mãe, ou alguém que esteja desempenhando seu papel na vida da

criança, é considerada por Feuerstein como um mediador estruturante. Tal mediador contribui não só para o desenvolvimento da estrutura cognitiva, como também para a formação da estrutura emocional da criança. Por isso, a sua ausência produz o que Feuerstein denomina de “privação cultural”, ou seja, a carência na transmissão de conhecimentos e de valores da cultura da qual o indivíduo faz parte, dificultando e retardando o desenvolvimento cognitivo do aprendiz.

Embora enfatize a aprendizagem mediada, Feuerstein não desconhece que também se aprende através da exposição direta aos estímulos externos. Esse autor acredita, no entanto, que um indivíduo só se beneficia da aprendizagem direta, quando o seu nível cognitivo já está maduro e desenvolvido. Portanto, uma criança depende da mediação humana para desenvolver seu potencial cognitivo, conforme menciona Gomes (2002, p. 83): [...] “a herança biológica apenas se manifesta em um organismo humano imaturo quando ele é exposto à interação com outro organismo humano já desenvolvido.”

Complementando o pensamento de Feuerstein a esse respeito, Gomes salienta a importância da mediação como forma de preparar o indivíduo para usufruir dos benefícios da aprendizagem direta, afirmando que há uma relação importante entre as duas formas de aprendizagem. Deduz-se, portanto, que para um indivíduo cognitivamente maduro, a aprendizagem mediada e a direta se complementam, pois esse aprendiz já tem condições de usar a sua metacognição a fim de ampliar seus conhecimentos e desenvolver ainda mais seu potencial de aprendizagem.

2.2. EXPERIÊNCIA DE APRENDIZAGEM MEDIADA (EAM)

Feuerstein criou a EAM na década de 50 para explicar as diferenças de predisposição

para a aprendizagem entre indivíduos. Foi observado em Israel, por exemplo, que alguns imigrantes se beneficiavam do contato direto com a nova cultura, conseguindo se adaptar aos estímulos e exigências da sociedade onde ora viviam. Outros, porém os denominados

“desprovidos culturalmente”, eram pouco ou nada beneficiados com a exposição à cultura estrangeira, ficando marginalizados.

Investigando as causas desse fenômeno, Feuerstein compreendeu que os desprovidos culturalmente não internalizaram a sua própria cultura. Esse fato ocorria devido a dois fatores: 1) exógenos – condições ambientais que levaram os pais e/ou grupos de colegas a não oferecerem mediação ou transmissão cultural; 2) endógenos – disfunções fisiológicas que impossibilitaram que a mediação penetrasse o sistema mental, evitando que desenvolvessem os instrumentos cognitivos necessários para aprenderem a aprender. Essas deficiências diminuíram a flexibilidade dos indivíduos, fazendo-os precisar de uma maneira especial e intensa de experiência de aprendizagem mediada.

Para intervir no auxílio e superação de tais deficiências, Feuerstein elaborou doze critérios de mediação detalhados a seguir.

2.2.1. Critérios de Mediação