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Contribuição do ligante asfáltico à resistência à formação de trincas por origem térmica

2 Capítulo

2.6. Relação entre as propriedades reológicas dos ligantes asfálticos e o desempenho de pavimentos

2.6.4. Contribuição do ligante asfáltico à resistência à formação de trincas por origem térmica

As trincas de origem térmica são um dos principais mecanismos de ruptura de pavimentos asfálticos em regiões de clima frio. Este tipo de defeito ocorre no pavimento na forma de trincas transver- sais regularmente espaçadas, que podem atingir até 3 m uma da outra e alcançar aberturas superiores a 20 mm após alguns anos. A menos que sejam seladas, a água infiltra no pavimento e reduz sua capaci-

dade estrutural. Além disso, à medida que se desenvolvem, as trincas afetam a qualidade de rolamento e, em estágios avançados, podem levar à falência estrutural do pavimento ANDERSON et al., 2001).

As trincas de origem térmica são o resultado de tensões desenvolvidas nas camadas do pavimento devidas à retração térmica provocada pelo resfriamento. Embora as trincas possam ser gera- das por ciclos de variação de temperatura de curta duração em climas relativamente moderados, as trin- cas devidas a baixas temperaturas em regiões de clima frio representam o mecanismo predominante de ruptura do pavimento. Durante um ciclo de resfriamento, retrações da camada asfáltica são restringidas pelo atrito com as camadas subjacentes do pavimento que ou estão a temperaturas mais elevadas ou so- frem menor retração por causa de um menor coeficiente de retração térmica (BAHIA e ANDERSON, 1995).

Estas restrições ao deslocamento geram tensões de tração que, se não relaxadas pela mo- vimentação da camada asfáltica, irão exceder a sua resistência à tração e causar trincas. O nível de ten- sões de tração geradas depende da rigidez do ligante asfáltico e da sua capacidade de relaxar tensões por dissipação de energia em deformação permanente. Tradicionalmente, as trincas de origem térmica têm sido correlacionadas com a rigidez dos ligantes asfálticos medida ou estimada sob determinados tempos de carregamento. A rigidez, no entanto, não reflete a capacidade de alívio de tensões do ligante asfáltico. Para poder aliviar tensões, um material deveria ser capaz de se deformar facilmente sob as tensões aplicadas e ter um pequeno componente elástico em sua resposta (BAHIA e ANDERSON, 1995).

Ao se conduzir um ensaio de fluência do ligante asfáltico no reômetro de viga à flexão, a ri- gidez, S(t), e a taxa de relaxação, m(t), podem ser determinadas na faixa de temperaturas baixas do pavimento. Ao se medir a taxa de relaxação, é possível avaliar a capacidade de um ligante asfáltico em relaxar tensões. Valores altos de S(t) refletem maiores valores de tensão que são geradas por uma dada deformação de origem térmica (retração) e valores altos de m(t) refletem uma maior taxa de fluência e, consequentemente, uma maior taxa de relaxação (BAHIA e ANDERSON, 1995).

S(t) e m(t) são, no entanto, funções do tempo de carregamento e, assim, um tempo de car- regamento precisa ser definido para simular o fenômeno de formação de trincas de origem térmica. Na literatura, tempos de carregamento variando de 3.600 e 20.000 s têm sido relacionados com trincas de origem térmica. Entretanto, tempos de carregamento dessa ordem de grandeza não são aplicáveis a ensaios de laboratório. Para reduzir o tempo de ensaio, o princípio de superposição tempo-temperatura é usado para realizar ensaios para temperaturas maiores, mas para tempos de carregamento menores.

Durante o SHRP, os estudos de propriedades sob baixas temperaturas indicaram que os fatores de equivalência tempo-temperatura são aproximadamente os mesmos para a maioria dos ligantes asfálticos. Esta constatação foi usada para calcular o incremento de temperatura para reduzir o tempo de carregamento de 7.200 s, o mais comumente recomendado na literatura, para um tempo de carregamen- to de 240 s. Foi verificado que um incremento de 10ºC na temperatura é equivalente a uma diminuição do tempo de carregamento de 7.200 s para aproximadamente 60 s (BAHIA e ANDERSON, 1995).

A lógica associada com as medidas de propriedades a baixas temperaturas é que, ao esta- belecer um limite máximo para S(t), o nível de tensões desenvolvidos no pavimento é limitado, e ao esta- belecer o limite mínimo para m(t), a taxa de relaxação é mantida acima de certo limite. A Figura 2.34 (BAHIA e ANDERSON, 1995) apresenta valores de S(60) versus m(60) para diversos ligantes asfálticos, de diferentes origens e propriedades físicas, envelhecidos no PAV. O envelhecimento por oxidação pro- voca aumento de S(t) e diminuição de m(t). A Figura 2.34 revela a grande faixa de variação dos valores de taxa de relaxação para um dado valor de rigidez e vice-versa.

Figura 2.34. Relação entre rigidez e taxa de relaxação, a 60 s, para ligantes asfálticos envelheci- dos no PAV. [Adaptado de Bahia e Anderson (1995)]

Um outro fator recentemente descoberto, relacionado ao comportamento dos ligantes asfálti- cos a baixas temperaturas, é o endurecimento físico (BAHIA e ANDERSON, 1993). Este endurecimento se dá pelo aumento em S(t) e diminuição em m(t) que ocorre como resultado de retração volumétrica ao longo do tempo. Este fenômeno é causado pelo desvio do equilíbrio dinâmico por causa do atraso do ajuste mole- cular decorrente das mudanças térmicas durante o resfriamento do material dentro da sua faixa de tempera- tura de transição vítrea. O fenômeno lembra o envelhecimento físico, relacionado à cristalização das parafi- nas. Foi verificado, para diversos ligantes asfálticos, que o envelhecimento físico aumenta S(t) de 50 a 100% em 24 h. Suas conseqüências sobre as propriedades das misturas asfálticas e sobre o desempenho dos pavimentos ainda não são conhecidas. Portanto, o Superpave especifica a medida de valores de S(60) e m(60) a 1 h e 24 h para se obter uma indicação do potencial de endurecimento de um ligante asfáltico.

Para comparar resultados de fluência com medidas convencionais, a Figura 2.35 apresenta resultados de penetração a 4ºC versus S(60) e m(60) medidos a –10ºC. Para um valor de S(60) de 100

MPa, os ligantes asfálticos podem apresentar valores de penetração variando de 1 a 10 (0,1 mm). Simi- larmente, para um valor de m(60) de aproximadamente 0,35, os ligantes asfálticos podem apresentar valores de penetração variando de 0 a 13 (0,1mm). Os dados da Figura 2.35 são uma clara indicação da incapacidade do ensaio de penetração em representar propriedades reológicas fundamentais dos ligantes asfálticos sob baixas temperaturas (BAHIA e ANDERSON, 1995).

Figura 2.35. Relações entre valores de rigidez e taxa de relaxação, a 60 s, –10ºC, e de penetração, a 4ºC. [Adaptado de Bahia e Anderson, 1995]