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Controle acionário e eficácia da adoção de práticas de governança corporativa

3 DESENVOLVIMENTO DAS HIPÓTESES E MODELO CONCEITUAL

3.4 Controle acionário e eficácia da adoção de práticas de governança corporativa

Além de influenciar a adoção de práticas de governança corporativa, o tipo de controle acionário pode afetar a eficácia destas práticas. Bebchuk e Hamdani (2009) argumentam que a busca por padrões de governança corporativa deve ser substituída pelo desenvolvimento de metodologias separadas para avaliar a governança em empresas com e sem acionista controlador, e que estas metodologias devem ser aplicadas para comparações em níveis de país e de empresa.

Em empresas sem acionista controlador, mecanismos de monitoramento e incentivo gerencial devem ser mais eficazes em alinhar interesses de acionistas e gestores. Em empresas com acionista controlador, normalmente há uma sobreposição entre o acionista controlador e os principais órgãos da administração (conselho de administração e diretoria executiva), o que reduz a eficácia de mecanismos de monitoramento e de incentivo gerencial. Nestas empresas espera-se que sejam priorizadas práticas que protegem os interesses dos acionistas minoritários, sob pena de penalizar-se acionistas minoritários (RENDERS; GAEREMYNCK, 2012).

Como exemplo do possível efeito do tipo de controle acionário sobre a eficácia de mecanismos internos de governança corporativa, pode-se citar a remuneração dos executivos, um mecanismo de incentivo gerencial. Em empresas sem acionista controlador, a política de remuneração dos executivos é tida como um mecanismo de alinhamento de interesses entre gestores e acionistas (HASSEN; EL OUSKDI; OMRI, 2015). Em empresas com acionista controlador, a sobreposição do acionista controlador e da gestão reduz o papel da remuneração executiva como alinhamento de interesses (CORE; HOLTAUSEN; LARCKER, 1999). Ao contrário, a remuneração de gestores ligados aos acionistas controladores pode ser utilizada para usufruto de benefícios privados do controle (PINTO; LEAL, 2013).

A pesquisa empírica tem focado no efeito da identidade e os direitos de voto e de fluxo de caixa do acionista controlador sobre a eficácia das práticas de governança corporativa (ABDALLAH; ISMAIL, 2017; ANDERSON; REEB, 2003, 2004; CONNELLY;

52 LIMPAPHAYOM; NAGARAJAN, 2012; LEI; LIN; WEI, 2013; YEH; WOIDTLE, 2005). O efeito do tipo de controle acionário sobre a eficácia das práticas de governança ainda é pouco analisado. Desender et al (2013) encontraram evidências, em empresas europeias, de que a independência do conselho de administração e o acúmulo de cargos de presidente do conselho de administração e diretor-presidente têm relação mais forte com os honorários de auditoria em empresas com controle disperso, sugerindo que o controle acionário funciona como um substituto à independência do conselho de administração. Renders e Gaeremynck (2012), ao também analisar empresas europeias, identificaram que a adoção de práticas de governança corporativa tem um impacto positivo mais forte sobre o valor da empresa quando os acionistas majoritários têm mais oportunidades de expropriar, com elevados direitos de voto e excesso de direito de voto em relação a direitos de fluxo de caixa. O autores também observaram que a adoção de práticas de governança corporativa mitiga o efeito negativo de um grave conflito principal-principal sobre o valor da empresa (RENDERS; GAEREMYNCK, 2012).

No Brasil, os estudos concentraram-se na eficácia de mecanismos específicos de governança. Andrade, Bressan e Iquiapaza (2014; 2017) identificaram que a existência de acordo de acionistas reduz a relação entre o percentual de conselheiros externos e o valor da empresa, quando comparadas com empresas sem acordos de acionistas. Para os autores, o acordo de acionistas está funcionando como um mecanismo de alavancagem do poder de voto dos acionistas controladores. Brandão e Coelho (2017) analisaram a sensibilidade da remuneração executiva ao desempenho e identificaram que, em empresas com acionista controlador, o valor de mercado da empresa tem relação negativa com a remuneração dos executivos, ao passo que esta relação se apresentou positiva em empresas sem acionista controlador. Ermel e Monte (2018), por outro lado, embora tenham encontrado evidência de que o tipo de controle acionário está relacionado à remuneração gerencial, não identificaram diferença na relação entre esta remuneração e retorno sobre ativos quando investigaram os diversos tipos de controle acionário.

A quarta hipótese de pesquisa trata o efeito moderador do tipo de controle acionário sobre a relação entre a adoção de práticas de governança corporativa e indicadores de eficácia da governança corporativa. À luz da abordagem contingencial da governança corporativa, testou-se a hipótese de que o tipo de controle acionário afeta a eficácia da adoção de práticas de governança corporativa (AGUILERA et al., 2008; DESENDER et al., 2013). Quando se analisa o nível de adoção de práticas de governança corporativa, espera-se que sua eficácia seja

53 maior em empresas cujos conflitos de agência sejam mais acentuados (RENDERS; GAEREMYNCK, 2012).

Hipótese 4: O tipo de controle acionário afeta a relação entre a adoção de práticas de governança corporativa e indicadores de desempenho empresarial

Os argumentos teóricos e as evidências empíricas apresentados na construção das hipóteses 2 e 3 sugerem que o controle compartilhado reduz a eficácia da adoção de práticas de governança corporativa. Teoricamente, o controle compartilhado contribui para a redução de conflitos entre acionistas e gestores e entre acionistas controladores e acionistas minoritários (BAGLIONI, 2008). A literatura empírica, por sua vez, tem apontado que a presença de controle compartilhado apresenta relação positiva com o valor de mercado da empresa brasileira (CARVALHAL, 2012; LEAL; SILVA, 2008; SILVA; LANA; MARCON, 2018). Nesse contexto, espera-se que o controle compartilhado atue como um substituto de outros mecanismos internos de governança corporativa, o que torna a adoção de práticas de governança corporativa menos necessária.

Hipótese 4a: O controle compartilhado está relacionado à menor eficácia da adoção de práticas de governança corporativa

Em empresas com controle majoritário, por outro lado, a eficácia das práticas de governança corporativa deve ser maximizada, por dois motivos principais. Em primeiro lugar, a presença de um acionista majoritário eleva os conflitos com acionistas minoritários (YOUNG et al., 2008) e não exclui a possibilidade de conflitos com gestores (LEI; LIN; WEI, 2013). Por este motivo, além das práticas relacionadas à proteção dos acionistas minoritários, as práticas de monitoramento, incentivo gerencial e transparência também devem ser eficazes. Em segundo lugar, o conflito de agência nestas empresas deve ser mais severo, uma vez que acionistas controladores têm maior variedade de caminhos para extrair benefícios privados de controle, como transações com partes relacionadas e remuneração fixa elevada para gestores ligados ao acionista controlador (BEBCHUCK; HAMDANI, 2009).

Hipótese 4b: O controle majoritário está relacionado à maior eficácia da adoção de práticas de governança corporativa

54 Em comparação com controle compartilhado e majoritário, o controle disperso potencializa conflitos do tipo agente-principal, o que deve elevar a eficácia de práticas de monitoramento e incentivo gerencial e de transparência da gestão (BEBCHUK; HAMDANI, 2009). Entretanto, a inexistência de acionista controlador deve reduzir a eficácia de práticas de proteção aos direitos de acionistas. Neste contexto, embora que em menor medida do que em empresas com acionista majoritário, espera-se efeito moderador positivo do controle disperso sobre a relação entre a adoção de práticas de governança corporativa e indicadores de desempenho empresarial.

Hipótese 4c: O controle disperso está relacionado à maior eficácia da adoção de práticas de governança corporativa