• Nenhum resultado encontrado

1 DA CORRUPÇÃO TRANSNACIONAL À TRANSNACIONALIDADE ANTICORRUPÇÃO: A

2.3 COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL: PORTA PARA UMA JUSTIÇA SEM FRONTEIRAS

228

WEBER. Cooperação internacional penal: conceitos básicos. 2015. p. 35.

229

WEBER. Cooperação internacional penal: conceitos básicos. 2015. p. 35.

230

A cooperação jurídica internacional assume novos contornos, em consonância com a dinâmica global e os vetores fundamentais de proteção humana, sobretudo no que concerne ao combate ao crime de caráter transnacional.

No âmbito do processo penal internacional, a cooperação jurídica se reveste de caráter ainda mais amplo, no sentido de abarcar técnicas cooperativas que se desenvolvem em atos de toda a persecução penal, isto é, tanto na fase pré- processual, quanto na esfera processual231.

Fato é, que na atualidade, a cooperação jurídica se manifesta enquanto fenômeno que não se limita à jurisdição estatal. Ademais, as técnicas cooperativas operam não apenas no âmbito interjurisdicional, mas também entre variados sujeitos globais, como agências administrativas ou órgãos intergovernamentais232.

A cooperação jurídica internacional representa técnica de extrema relevância para a persecução penal, na medida em que os atos administrativos ou investigativos resultantes do intercâmbio cooperativo poderão ser submetidos à admissibilidade e valoração judicial enquanto prova processual.

Em uma era marcada pela difusão de atos, pessoas e comunicações pelo mundo globalizado, os atores e recursos envolvidos em atos corruptivos, frequentemente, estão localizados além das suas fronteiras nacionais e respectivas jurisdições dos órgãos de persecução criminal. Por essa razão, os instrumentos cooperativos transnacionais anticorrupção possibilitam maior eficácia na persecução penal e no combate à impunidade dos infratores, por meio da interação entre instituições anticorrupção nas esferas local, internacional e supranacional233.

Nesse contexto, os debates envolvendo a aplicação do direito transnacional, em especial em matéria penal, possuem relação direta com o direito transnacional anticorrupção. Observa-se, nesse cenário, a tendência à harmonização de normas de combate à corrupção e a generalizada adoção de instrumentos multilaterais com o mesmo escopo, conforme afirma Kevin E. Davis:

231

ABADE. Análise da coexistência entre carta rogatória e auxílio direto na assistência jurídica internacional. 2015. p. 7.

232

GALÍCIA, Caique Ribeiro. Crime e globalização: reflexões sobre crimes transnacionais e a cooperação jurídica internacional na contemporaneidade. Revista Eletrônica de Direito Processual- REDP. Rio de Janeiro. Ano 12. Volume 19. Número 1. Janeiro a Abril de 2018. p.55. Disponível em: <www.redp.uerj.br> Acesso em: 18 abr. 2019.

233

DAVIS, Kevin E.; JORGE, Guillermo; MACHADO, Maíra R. Transnational Anticorruption Law in Action: Cases from Argentina and Brazil. Law & Social Inquiry. Vol 40, Issue 3, Summer 2015. p. 665.

These debates about the fairness, efficacy, and legitimacy of transnational and international law, and especially international criminal law, have direct application to transnational anticorruption law. The concern about legality is muted by the fact that norms against corruption largely have been harmonized because of the widespread adoption of multilateral instruments such as the OECD Convention and, more recently, UNCAC234.

O direito transnacional representa fundamental instrumento de combate à corrupção, na medida em que as instituições domésticas de uma única jurisdição possuem, isoladamente, capacidade limitada de atuação. As fronteiras políticas dos Estados representam, de fato, limitações ou mesmo óbices ao exercício da jurisdição penal na persecução ou processamento de eventos que transpassam a esfera nacional235.

Por outro lado, as entidades internacionais ou transnacionais são dotadas de recursos eficazes para alcançar o propósito comum de combater a corrupção. Sendo assim, urge a necessidade de uma verdadeira união de esforços em torno do eixo de interesse comum de cooperar no combate aos atos corruptivos. Nesse sentido:

In this context, the institutional complementarity theory is based on two foundational claims: (1) local institutions have limited capacity to address political corruption (2) foreing institutions bring to the table valuable resources that local institutions are unable to match. These premises support the conclusions that transnational law enforcement will enhance the effectiveness of local anticorruption institutions or, in other words, local and foreing institutions will be complements. In any event, it will reduce corruption.236

É nesse sentido que a cooperação jurídica internacional emerge como resposta adequada e necessária para combater a disseminação da criminalidade transfronteiriça, por meio da conjunção de esforços e colaboração entre os Estados e demais sujeitos regulamentadores que integram a comunidade da aldeia global, enlaçados pelo escopo comum de promover o acesso à justiça e de combater práticas delituosas com ramificações plurilocalizadas237.

Denise Alves Abade nota que a cooperação entre os Estados não desrespeita ou mitiga a sua soberania, mas, na verdade, reforça o poder popular e a

234

DAVIS; JORGE; MACHADO. Transnational Anticorruption Law in Action: Cases from Argentina and Brazil. Law & Social Inquiry. 2015. p. 668.

235

ABADE, Denise Neves. Direitos fundamentais na cooperação jurídica internacional: extradição, assistência jurídica, execução de sentença estrangeira e transferência de presos. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 31.

236

DAVIS; JORGE; MACHADO. Transnational Anticorruption Law in Action: Cases from Argentina and Brazil. Law & Social Inquiry. 2015. p. 668.

237

ABADE. Direitos fundamentais na cooperação jurídica internacional: extradição, assistência jurídica, execução de sentença estrangeira e transferência de presos. 2013. p. 33.

independência do Estado, na medida em que constitui uma soberania compartilhada

expandida238. Migra-se do direito internacional de coexistência para o direito internacional de cooperação239.

A redefinição dos contornos da soberania estatal perpassa, necessariamente, a incorporação da cooperação internacional como paradigma de atuação dos Estados e demais sujeitos transnacionais no contexto da governança global. Nesse sentido, Anne- Marie Slaugther240:

Em resumo, os estados não podem mais governar efetivamente sendo deixados sozinhos e isolando os outros Estados. A proposição inversa é igualmente verdadeira, embora talvez mais surpreendente: os Estados só podem governar eficazmente cooperando ativamente com outros estados e reservando coletivamente o poder de intervir nos assuntos de outros estados. O mundo de fato virou de cabeça para baixo; não é de admirar que o conceito de soberania precise ser redefinido. [tradução nossa]

A postura cooperativa da comunidade internacional opera a partir da governança global, travando diálogos no âmbito do pluralismo regulatório da agenda política mundial. Como resultado desses debates entre os corpos comunicantes, são produzidos objetos e instrumentos normativos que regem matérias específicas.

Essencialmente, a cooperação jurídica internacional, em especial sobre matéria penal, consagra “um conjunto de regras que rege a facilitação do direito de

acesso à justiça penal, por meio da colaboração entre Estados”241.

Os canais de comunicação utilizados, os instrumentos cooperativos e o conteúdo da cooperação prestada pelos corpos comunicantes da comunidade internacional integram a tipologia da cooperação que será analisada a seguir242.