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Correlatores de base conjuncional

4. ANÁLISE DE DADOS

4.1.1 Correlatores de base conjuncional

Os correlatores alternativos espelhados ou...ou e nem...nem, encontrados em nossa análise, originaram-se diacronicamente, como veremos, da conjunção ou e nem respectivamente. Esses correlatores são tradicionalmente apresentados nas gramáticas tradicionais, como já dissemos, como conjunções coordenativas. Autores como Rocha Lima (1999) e Cunha e Cintra (2001), por exemplo, os apresentam apenas como uma repetição das conjunções ou e nem.

No entanto, veremos, a seguir, que esses correlatores não são apenas uma repetição das conjunções já existentes, já que apresentam valores semânticos e pragmáticos diferenciados em relação à sua conjunção de origem.

4.1.1.1. Construções com ou...ou

Como era previsto, já que as gramáticas de um modo geral apresentam a conjunção ou como a mais utilizada pelos usuários da língua no plano semântico da alternância, as construções alternativas espelhadas com ou...ou confirmaram-se como as correlatas alternativas prototípicas em nosso corpus.

Dos 146 tokens, 63 ocorrências (quase 44% das construções), em nossa análise, são encabeçadas por ou...ou, confirmando, assim, sua prototipicidade em relação aos outros correlatores alternativos, provavelmente por ser um correlator mais curto, mais leve em relação à sua quantidade de massa fônica e pela maior facilidade de processamento em relação aos outros types. Observemos o exemplo a seguir:

PRÓTASE APÓDOSE

(4) As forças assadistas parecem estar nos tomando a dianteira, deixando a Síria com duas

opções:

ou continua, na maior

parte, sob o domínio do tirano

ou cai nas mãos dos

fundamentalistas mulçumanos que

hoje controlam praticamente todas as

forças da rebelião.

Revista Veja on-line, ed.22/05/2013, p.29

Nesta ocorrência, observamos que o item ou...ou imprime na construção uma noção semântica de alternância típica das construções alternativas. Além disso, percebe-

se que a disjunção apresentada é exclusiva, já que uma opção exclui a outra. A Síria deve escolher entre uma opção ou outra: ou continua sendo dominada ou cai nas mãos dos fundamentalistas. A interpretação exclusiva fica ainda mais evidenciada pela porção textual que precede a prótase correlativa (“deixando a Síria com duas opções”) (grifo nosso).

A manifestação de uma interpretação exclusiva nas construções com ou...ou foi observada em todas as estruturas encabeçadas por este par de correlatores, ou seja, os 63 tokens instanciados apresentaram a leitura de exclusão.

De acordo com Barreto (1999), a conjunção ou originou-se da conjunção latina aut, sendo formada a partir de um elemento adverbial au, acrescido da partícula

ti. A autora afirma que havia no latim três formas para indicar a disjunção: aut, vel e ve.

No entanto, aut era a mais empregada e a única que passou às línguas românicas, sendo utilizada para indicar a disjunção ou alternância entre dois termos, “quer se excluíssem, quer fossem equivalentes ou indiferentes a uma eleição”. (BARRETO, 1999 p. 193).

A autora ressalta, ainda, que nos textos do século XIII, a conjunção ou aparecia sempre como membro da correlação alternativa e afirma que a gramaticalização da conjunção ocorreu ainda no latim. Vejamos:

Latim > Português

au + ti > aut ou

adv. conj. conj. item do discurso

alternativa alternativa

Segundo Barreto (1999, p.443), em seguida, ocorreu no português a discursivização, e a conjunção passou a alternar elementos do discurso. A conjunção ou, repetida, segundo a autora, constitui a correlação com ou...ou que alterna itens lexicais, sintagmas ou sentenças. A conjunção correlata originou-se da conjunção latina aut...aut que também apresentava uma interpretação exclusiva. Essa informação de Barreto (1999) pode indicar que o valor semântico de exclusão observado por ou...ou permaneceu como uma persistência de sua palavra de origem, a conjunção aut...aut.

Alguns autores já haviam ressaltado, em trabalhos anteriores, o caráter tipicamente exclusivo apresentado por ou...ou. Assim como Barreto (1999), Pezatti e Loghin-Thomazi (2008) corroboram essa questão.

Sendo assim, de acordo com as autoras, quando ficou reconhecido que há no português apenas uma forma para indicar inclusão e exclusão, ficou estabelecido que apenas o contexto poderia determinar se seria uma disjunção inclusiva ou exclusiva. Assim, Pezatti e Loghin-Thomazi (2008, p. 899) afirmam que, a partir disso, estabeleceu-se uma “teoria oficial sobre as sentenças disjuntivas”, que pode ser resumida como o seguinte: “o sistema do Português teria mantido uma só partícula disjuntiva (ou)..., que é usada para expressar dois sentidos diferentes (o inclusivo e o exclusivo)... aos quais se chega operando sobre o contexto.”

No entanto, os autores afirmam que esta teoria é equivocada por não terem considerado a repetição de ou, ou seja, ou...ou. Com isso, as autoras ressaltam que, no português, diferentemente do latim, a repetição não indica uma “mera variação estilística ou enfática”, mas uma oposição dos sentidos expressados pelas conjunções latinas. Ou seja, ou...ou é utilizada apenas para indicar a exclusão.

A disjunção exclusiva é apontada como uma particularidade de ou...ou por outros autores. Neves (2000), por exemplo, também afirma que as disjunções com ou ora podem indicar inclusão, ora exclusão, destacando também que a disjunção com ou...ou sempre será exclusiva.

Em relação à frequência de ou e ou...ou, Pezatti e Loghin-Thomazi (2008, p. 900) ressaltaram, ainda, que a forma ambígua (A ou B) é a forma não marcada no português falado no Brasil e que a forma exclusiva (ou A ou B) é a forma marcada. Sendo assim, as autoras concluem que ou...ou é menos produtivo, justamente pelo fato de significar apenas exclusão.

Diante de tais constatações, tornou-se inevitável para a nossa análise, como já citamos, a observação de algumas construções com ou, não correlatas, apesar de esse não ser o foco de nossa pesquisa. Sendo assim, foram analisadas 24 construções coordenadas com ou.

A análise demonstrou que, dos 24 tokens observados, 8 apresentaram uma leitura exclusiva e 16 apresentaram uma leitura inclusiva, como observamos nos exemplos seguintes:

e) - Envio de dados: para evitar que o adolescente divulgue dados como endereço, telefone ou número de cartão de crédito, o programa embaralha os caracteres sempre que o usuário tenta enviar ou publicar nas redes sociais informações predefinidas pelos pais como privadas.

Revista Veja on-line, ed. 02/01/2013-pág. 88

Neste token, observamos que a disjunção é inclusiva, pois o usuário não consegue nem enviar nem publicar informações privadas, ou seja, as duas ações são discursivamente consideradas. Neste caso, observamos que a conjunção ou poderia até mesmo ser parafraseada pela conjunção e, tipicamente inclusiva. Vejamos:

e’) - Envio de dados: para evitar que o adolescente divulgue dados como endereço, telefone ou número de cartão de crédito, o programa embaralha os caracteres sempre que o usuário tenta enviar e publicar nas redes sociais informações predefinidas pelos pais como privadas.

Já no token a seguir, o ou apresenta uma leitura exclusiva. Observemos:

f) Resta saber se agora prevalecem os novos projetos desses que estão voltando ao Brasil ou as velhas ideias daqueles que permaneceram aqui invadindo reitorias, promovendo utopias de almoços grátis, depredando bancos e lojas, fazendo de tudo, menos estudar.

Revista Veja on-line, ed. 14/12/2013- pág. 51

Neste token, observamos que temos duas alternativas excludentes: ou os velhos projetos ou as velhas bases. Sendo assim, o ou é exclusivo.

Observamos em nossos dados que o ou, apesar de ter demonstrado tanto uma leitura inclusiva, quanto uma leitura exclusiva, apresentou preferência pela inclusão. Já ou...ou apresenta somente uma leitura exclusiva. Há um forte indício de especialização no uso desses itens na língua.

Constatamos, assim, que o valor de exclusão particular apresentado pelas estruturas alternativas não é simplesmente veiculado pela presença de outro ou. Para que haja uma construção correlata ou...ou, além da presença de correlatores (um par), é necessário haver o valor de exclusão.

Sendo assim, a hipótese de que uma coordenada alternativa é diferente de uma construção correlata alternativa é fortalecida, pois apresentam, além da forma diferenciada, valores semânticos distintos. Entre outros termos, a construção coordenada e a correlata apresentam forma e função diferentes, por isso devem ser

vistas como construções particulares que servem a contextos comunicativos específicos.

Vejamos, a seguir, mais uma ocorrência encontrada do type ou...ou:

PRÓTASE APÓDOSE

(5) Temos de enfrentar esse leão, não há tempo a perder. O que está sendo feito em educação

em nosso país é da pior qualidade, e, aparentemente, os

ministros que passam pela educação,

ou não tem apoio para fazer

as mudanças necessárias

ou lhes falta a

devida dose, de atitude estadista.

.

Revista Veja on-line, ed. 18/12/2013-pág. 48

Também no token (5), o correlator ou...ou estabelece alternância exclusiva entre duas sentenças, confirmando, como já foi dito, o valor exclusivo particular apresentado pela construção alternativa correlata. Ao falar das atitudes dos ministros, o autor do texto apresenta duas razões distintas e incompatíveis para o fracasso da educação nacional: falta de apoio ou atitude estadista.

Verificamos também na análise deste type que todas as construções com ou...ou apesentaram a interdependência típica das construções correlatas. Vejamos:

PRÓTASE APÓDOSE

(6) Moda é um equilíbrio entre criatividade e comércio: Quem não é capaz de conciliar os dois

aspecto,

ou arranja alguém para cuidar

dos negócios,

ou se conforma em

trabalhar para a marca de outro

estilista

Revista Veja on-line, ed.03/07/2013- pág. 104

Podemos observar, a partir do token citado, que há entre as correlatas com ou...ou uma forte ligação e que uma não funcionaria sem a outra. Observamos que há a criação de uma expectativa na prótase, funcionando como uma preparação para enunciação que irá ocorrer na apódose, reforçando a interdependência entre as cláusulas, assim como é característico da correlação. A relação estabelecida entre prótase e apódose ressalta a interdependência presente entre as construções, tal como asseverado anteriormente por Rodrigues (2007).

Em relação à ordem, observamos que as construções com ou...ou apresentaram maior possibilidade de inversão. Vejamos:

Tabela 5 - Ordem das constuções com ou...ou Possibilidade de inversão Qnt. % + inversão 42 66,7 - inversão 21 33,3 Total 63 100%

Verificamos que dos 63 types instanciados, 42 apresentaram maior possibilidade de inversão. Vejamos, a seguir, alguns exemplos de construções com ou...ou encontrados nos dados com maior e menor possibilidade de inversão, respectivamente.

Revista Veja on-line, ed.06/03/2014, pág.60 Nessa ocorrência, observamos maior possibilidade de inversão sem maiores alterações da primeira informação veiculada, ou seja, se trocássemos a ordem das orações (ou se faz algo privado ou se faz algo público), não alteraríamos muito a informação original.

No entanto, observamos nos dados que algumas dessas construções apresentaram menor possibilidade de inversão, sendo motivadas iconicamente por fatores diversos, como já afirmado por Neves (2000), fato que é desconsiderado pelas gramaticas tradicionais. Vejamos:

PRÓTASE APÓDOSE (8) O resultado é que os intermediários precisam melhorar ou passam a agregar novos valores, ou são extintos.

Revista Veja on-line,ed. 22/05/2013,pág.15

PRÓTASE APÓDOSE

(7) Ao mesmo tempo, o governo tenta aprovar uma lei que abre à iniciativa privada o investimento

em portos. Tem de acabar a contradição no Brasil de que

Essa ocorrência (08) apresenta menor possibilidade de inversão, pois, se alterássemos a ordem das partes da construção alternativa, teríamos maior prejuízo semântico da informação inicial. É aparente que a segunda parte da construção ou são extintos é uma consequência da primeira ou passa a agregar novos valores e, como consequência, normalmente vem depois da causa, e não anteriormente. Não poderíamos, neste caso, portanto, inverter a ordem das cláusulas.

A questão da possibilidade de inversão ou não da prótase e da apódose revelou- se como um fator fortemente associado à questão da sobreposição semântica. Vejamos esse fator:

Tabela 6 - Sobreposição semântica das construções com ou...ou

Sobreposição semântica Qnt. %

Sem sobreposição 42 66,7

Com sobreposição 21 33,3

Total 63 100%

De fato, algumas construções com o type ou...ou apresentaram também sobreposição de valores semânticos, pois além da disjunção alternativa/exclusiva que se colocou como marca de prototipicidade desse tipo de construção, pôde-se observar um valor condicional em alguns casos. Observemos:

PRÓTASE APÓDOSE

(9) Um, dois, três, quatro, cinco mil, ou para a roubalheira, ou paramos o Brasil.

Revista Veja on-li,ne, ed. 03/072013- pág. 17

Observamos no token acima que há entre as construções um vínculo semântico, uma relação de causa-consequência que seria típica das construções condicionais. A

noção semântica que se imprime na construção é a seguinte: Se a roubalheira não parar, pararemos o Brasil. Percebemos, ainda, um tom de ameaça nas cláusulas, que favorece a leitura condicional. De acordo com Hirata Vale (2008), que desenvolveu um estudo a respeito do assunto em relação às construções com ou, há diversos fatores motivadores para a explicação do fenômeno. Segundo a autora:

Para receber uma leitura condicional, as orações que compõem uma construção justaposta, ou a uma construção coordenada aditiva ou

disjuntiva devem ter, entre si, um tipo de vinculo, a que se pode

chamar de causal, que leva, por sua vez, a uma ordenação icônica, que vai da causa para a consequência. (HIRATA-VALE, 2008, p. 215)

A autora ainda ressalta que a relação causal e a ordenação linear presentes nesses tipos de construções favorecem a leitura condicional nessas cláusulas. Além disso, de acordo com Fillenbaum (1986, apud Hirata Vale 2008), as orações disjuntivas, quando usadas para expressar ameaças, podem receber essa interpretação condicional. Eis o caso das nossas construções correlatas alternativas aqui presentes. A ordenação icônica citada pela autora é fator marcante em todas as alternativas condicionais aqui encontradas, como pode ser verificado na ocorrência a seguir:

PRÓTASE APÓDOSE

(10) Com a aprovação da PEC das empregadas domésticas,

alguns maridos que se preparem:

ou ajudam nas tarefas

domésticas,

ou sua esposa vai

reivindicar direitos trabalhistas.

Revista Veja-online, ed. 27/03/2013-pág 90

É evidente nesta ocorrência a impossibilidade de comutação das cláusulas sem que haja prejuízo da primeira informação desejada. Hirata Vale (2008) afirma, ainda, o predomínio desse valor condicional nas construções do tipo ou...ou aqui chamadas correlatas. A autora só não se refere diretamente à correlação como fizemos nessa análise.

Raposo et alii (2003) também mencionaram a possibilidade de as coordenadas disjuntivas veicularem um valor de condicionalidade, ressaltando, inclusive, que nesses

casos ela terá sempre uma interpretação exclusiva. Os autores acrescentaram, ainda, que, nestes casos, a primeira oração coordenada “equivalente ao antecedente da condição” é interpretada como negativa. Observemos um exemplo fornecido pelos autores:

a - Veste o casaco ou constipas-te! a’ - Se não veste o casaco constipas-te!

Verificamos que o mesmo se aplica às correlatas. Vejamos o dado (10) de nosso corpus:

b -...ou ajudam nas tarefas domésticas, ou sua esposa vai reivindicar direitos trabalhistas. Revista Veja on-line, ed. 13/02/2013, pág.55

b’ - Se não ajudarem nas tarefas domésticas, sua esposa vai reivindicar direitos trabalhistas.

As orações com sobreposição aqui evidenciadas também se encaixam na afirmativa de Neves (2000), já citada anteriormente, de que algumas construções com ou são assimétricas, ou seja, são iconicamente motivadas, embora a autora também não faça nenhuma referência às construções correlatas.

A análise dos padrões oracionais indicou que as construções alternativas com ou...ou apresentam-se, em sua maioria, em estruturas oracionais. Vejamos:

Tabela 7 - Padrão oracional das construções com ou...ou

Padrão oracional Qnt. % Oracional 48 76,2 não-oracional 15 23,8 Total 63 100%

Observamos, a partir da tabela anterior, que dos 63 tokens encontrados, 48 eram oracionais. Vejamos a seguir alguns dos dados oracionais e não-oracionais encontrados:

PRÓTASE APÓDOSE

(11) Depois da visita, Sartre somente deplorou a “desumanidade” do isolamento de Andreas Baader na

prisão.

ou o filósofo era um ingênuo

que de fato acreditava que as organizações terroristas

brasileiras de esquerda queriam derrotar a ditadura

militar para instaurar uma democracia,

ou tinha dois pesos em

uma balança defeituosa

Revista Veja on-line , ed.01/01/2014, pág. 56

Observamos que o par ou...ou correlaciona duas estruturas oracionais, ou seja, duas orações. Vejamos agora um dado de ou...ou correlacionando estruturas não- oracionais:

PRÓTASE APÓDOSE

(12) O senhor é um ser humano cheio de virtudes e comoções

que, como todos nós que estamos num hospital,

ou doentes, ou não, nos sentimos impotentes.

Revista Veja on-line, ed.22/01/2014, pág. 37

A correlação ou doentes ou não, como está claro, não é instanciada com a presença de verbos. Logo, o fenômeno da correlação alternativa também é flagrada em dados não-oracionais, algo tipicamente descartado pelas abordagens tradicionais.

A análise das sequências tipológicas revelou que todas as construções com o type ou...ou apareceram em sequências argumentativas, ressaltando o caráter argumentativo da correlação, o que foi observado por alguns autores, como Rosário (2012), dentre outros.

As constatações obtidas nesta análise nos ajudaram a comprovar o estatuto sintático da correlação alternativa como distinto da coordenação alternativa. Como

estamos diante de dois usos diferentes, podemos reiterar que a coordenação alternativa é uma construção diferente da correlação alternativa, apesar da semelhança entre ambas. Veremos essa questão com mais detalhes posteriormente, ao longo deste capítulo destinado aos resultados, e nas considerações finais.

4.1.1.2. Construções com nem...nem

De acordo com Barreto (1992, p. 85-86), a partícula nem pode funcionar como um advérbio ou conjunção aditiva negativa correspondendo a e não, e “vem sempre precedida de sentença negativa”. Já o par nem... nem, ainda segundo a autora citada, teria valor correlativo coordenativo alternativo, no sentido de expressar uma “alternância negada”. A conjunção nem, repetida, segundo a autora, como já era empregada no latim, antes de itens lexicais, sintagmas ou sentenças, constitui a correlação alternativa nem ...nem que ocorre em português, desde o séc. XIII.

Ainda segundo Barreto (1992), a conjunção nem com valor aditivo é proveniente da conjunção latina nec e era, primitivamente no latim, um advérbio de negação. Posteriormente nec passou ao português sob a forma nem, indicando advérbio e conjunção. A gramaticalização de nem, de acordo com a autora, ocorreu no próprio latim, através da recategorização advérbio > conjunção e da sintaticização, caracterizada pela posição do item na sentença. Vejamos16:

Latim > Português

nec nem

adv. conj. aditiva adv. e conj. aditiva

negação negativa e negação negativa e

alternativa alternativa

negativa negativa

Vejamos, a seguir, um dos tokens encontrados de nem...nem.

PRÓTASE APÓDOSE

(13) A paz é um dueto, não um solo. E não tivemos ainda uma só

declaração,

nem da OLP, nem do Hamas, Muito menos do Hezbollah, que aceite o

direito de Israel existir.

Revista Veja on-line , ed.15/01/2014-,pág. 19

Notamos no token (13) acima que o correlator nem...nem estabelece a correlação alternativa negativa, entre as sentenças, assim como citado por Barreto (1992). Entretanto, reconhecemos que os limites entre alterância e adição tornam-se altamente difusos, a ponto de ser possível a postulação de uma construção alternativa- aditiva, de cunho negativo.

Segunto Santos (1990, p.72), “o uso de nem em lugar de ou tem como efeito não somente a apresentação de alternativas, mas, mais do que isso, a negação, simultânea à apresentação dessas mesmas alternativas”. Ou seja, duas alternativas são apresentadas para mostrar que elas não se realizam. Observemos outra ocorrência de nem...nem encontrada nos dados:

PRÓTASE APÓDOSE

(14) Mas sua desgraça é que não cresceu, nem perto do necessário, nem com a rapidez de que

precisava.

Revista Veja on-line, ed. 25/12/2013, pág. 60

Observamos no token citado que o correlator nem...nem estabelece a alternância negativa entre as duas sentenças, apresentando alternativas que não se realizaram, assim como afirmado anteriormente por Santos (1990). Isso é reforçado pela presença da partícula não, que antecede a prótase.

Observemos, agora, a interdependência no type nem...nem:

PRÓTASE APÓDOSE

(15) Dilma também prometeu ferrovias que não vai entregar, e águas que não vai

transpor,

nem do São Francisco, nem de lugar nenhum.

Verificamos que todos os 16 tokens encontrados apresentaram a interdependência evidenciada por Rodrigues (2007), como traço característico das construções correlatas.

Em relação à ordem, verificamos que todas as construções com nem...nem apresentaram maior possibilidade de inversão. Observemos:

PRÓTASE APÓDOSE

(16) Presidente da Petrolífera Statoil, a maior estatal da Noruega e um dos gigantes mundiais do setor, Helge Lund, 50 anos, diz coisas que podem soar inacreditáveis para um brasileiro. Primeiro: garante que não sofre pressão alguma,

PRÓTASE APÓDOSE

... narra sua mudança para São Paulo e os primeiros envolvimentos com a política e as mulheres,

ora como obsessão, ora como problema. nem do governo, nem do Parlamento,

Revista Veja on-line, ed. 13/02/2013, pág.12

Se invertêssemos a ordem dos termos (nem do Parlamento nem do governo), teríamos um enunciado muito próximo da informação original, tal como veiculada pela Revista Veja. Em outras palavras, não provocaríamos alteração substancial de significado.

As construções com nem...nem também apresentaram preferência por

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