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3.1. A A MAZÔNIA COMO A MBIE NTE L IMITANTE

3.1.5. As Críticas ao Debate Protéico

A partir da década de 1980, vários autores começaram a expressar sua discordância quanto ao determinismo ecológico que vinha dominando as explicações sobre a ocupação humana da Amazônia. Beckerman (1979 e 1991) discordava principalmente da hipótese da limitação protéica proposta por Gross, criticando dois pontos principais: a suposta falta de proteína animal na Amazônia e a suposição de que a população amazônica já teria atingido seu equilíbrio por volta de 1500. Para o autor, as populações humanas amazônicas estavam em crescimento quando os primeiros europeus chegaram à América, e a utilização de parâmetros etnográficos contemporâneos (tamanho de assentamento, grau de sedentarização, etc.) teria levado a suposições incorretas. Na verdade, as populações pré-conquista teriam sido vítimas de duas fortes pressões seletivas – as epidemias do Velho Mundo e a predação euro-americana. Apesar de parecer plausível que os padrões contemporâneos de assentamento estivessem ligados a questões de subsistência, assentamentos pequenos, móveis e dispersos poderiam representar, na verdade, vantagens adaptativas contra caçadores de escravos, seringueiros, fazendeiros, garimpeiros, e doenças contagiosas. Neste sentido, conquista européia poderia ter tido uma ação seletiva sobre as populações amazônicas, removendo preferencialmente as concentrações populacionais maiores e mais densas (Beckerman 1979 e 1991).

Mesmo que esses fatos não pudessem ser comprovados historicamente, Beckerman (1979) acreditava que considerar a hipótese da proteína animal como fator limitante era infundada, já que a floresta tropical permitiria o acesso à proteína vegetal, mesmo que a qualidade desta, em termos de aminoácidos, fosse inferior. Para aquele autor (op.cit.), é bastante provável que no período pré- contato a maior parte dos povos amazônicos garantisse sua subsistência com proteína vegetal, uma vez que, devido aos vastos contingentes populacionais existentes, a caça e a pesca sozinhas não garantiriam sua sustentabilidade. Somente após a tremenda perda populacional sofrida pós- conquista, teria se tornado possível obter proteína de alta qualidade através da caça. Além disso, o fato de existirem extinções locais de fauna associadas a ocupações humanas, isto não estabeleceria uma relação direta de causalidade, já que animais inteligentes e com alta mobilidade, como porco-do- mato e anta, poderiam ter aprendido a evitar as proximidades de assentamentos humanos Beckerman (1979).

Sponsel (1986) acredita que numa região tão grande, diversa e complexa como a Amazônia, dificilmente um único fator limitante teria força explicativa em todas as situações. Parece mais provável que exista uma hierarquia de fatores limitantes operando em diferentes combinações, dependendo da cultura considerada, do ecossistema local e de suas histórias. Este autor (op.cit.) traz uma ampla revisão sobre o debate adaptativo na Amazônia.

Uma das pesquisadoras mais críticas à influência exercida pelo determinismo ecológico sobre as pesquisas antropológicas, arqueológicas e ecológicas, na Amazônia, é a arqueóloga americana Anna Roosevelt. Para Roosevelt (1991) o uso da categoria ecológica de floresta tropical úmida de interflúvio, como o principal habitat funcional da região, foi um dos responsáveis pela reconstituição incorreta da evolução cultural humana na Amazônia. O fato de as populações indígenas pós-contato ocuparem áreas pobres em recursos teria feito com que os modelos evolutivos propostos projetassem o modelo etnográfico para a pré-história, interpretando-o como uma adaptação à floresta tropical úmida pobre em nutrientes, desconsiderando a riqueza dos biomas amazônicos (Roosevelt 1989, 1991 e 1994).

Segundo Roosevelt, as diferenças entre os modos de vida das populações pré e pós-contato podem ser explicadas, principalmente, pelos novos contextos demográficos, geográficos, econômicos e sócio-políticos das populações nativas da Amazônia. Apesar das abordagens ecológicas na antropologia amazônica terem centrado suas interpretações no ajuste das populações e de seus padrões culturais ao ambiente natural, essas populações também tiveram que se adaptar a contextos demográficos, econômicos e políticos diversos. Desde a conquista, os padrões demográficos, que são um fator crucial no manejo de recursos, mudaram substancialmente. Muitas áreas experimentaram drásticas reduções populacionais, muitos grupos foram extintos, e a maior parte da

população que ocupava as várzeas desapareceu. O fato da distribuição geográfica das populações nativas ter se alterado tanto após a chegada dos europeus, explica porque as adaptações pré- conquista deveriam ser significativamente distintas das atuais (Roosevelt 1989).

Achados arqueológicos ocorridos nas últimas décadas, na Amazônia, têm mostrado que a ocupação humana não só é bastante antiga, como foi muito intensa. Além disso, há evidências de que a subsistência, a densidade demográfica e a organização social mudou várias vezes ao longo dos séculos. Roosevelt (1989 e 1994) identificou quatro “estágios” de manejo pré-histórico dos recursos na Amazônia, cujas características estão resumidas na Tabela 3.2. Cada um desses “estágios” hipotéticos de uso dos recursos naturais parece estar relacionado a um aumento populacional significativo, de acordo com os registros arqueológicos, apesar dos padrões variarem.

Tabela 3.2 – Populações humanas pré-históricas da Amazônia definidas de acordo com as estratégias de manejo dos recursos e subsistência (Roosevelt 1989) Tipo de

manejo Período de Ocupação Subsistência Vestígios

Paleoíndios Caçadores- coletores nômades Provavelmente antes de 10.000 AP

Não completamente identificada. Provavelmente viviam dos recursos da fauna e da flora de floresta tropicais secas, florestas de galeria, pântanos e savanas. Desde caça especializada de animais terrestres e grandes animais aquáticos, até coleta de amplo espectro de fauna de menor parte e plantas.

Material pré-cerâmico em cavernas, abrigos e sambaquis. Similaridades entre artefatos de algumas áreas sugerem deslocamentos de longa distância, troca, ou comunicação.

Primeiras ocupações sedentárias

Entre ca. 8.000 e 3.000 AP, concordando com as datações para os sambaquis do sudeste brasileiro.

Ocupação sedentária por caçadores-coletores intensivos ou agricultores incipientes, com base numa vasta gama de recursos aquáticos e vegetais

Sambaquis com restos fluviais e marítimos em antigos terraços fluviais e praias no Baixo Amazonas. Ex: Taperinha, na região de Santarém.

Primeiros horticultores

Início em 3.000 AP Primeira ocupação por horticultores ceramistas sedentários, cujo tipo de subsistência mais se aproxima das atuais sociedades indígenas. Horticultura baseada em raízes tuberosas, pesca e caça. Estratégia de subsistência baseada na maximização da fauna como fonte protéica e na horticultura como fonte calórica. Este sistema possui paralelos com os atuais: importância do cultivo de raízes, a fauna fornece proteína, ênfase simbólica nos animais, assentamento em aldeias relativamente pequenas e esparsas.

Sítios relativamente raros e pequenos, funcionalmente indiferenciados. Primeiros artefatos cerâmicos elaborados da América do Sul, com figuras animais e geométricas. Sítios nas barrancas dos rios e lagos atuais, maiores que os anteriores, indicando uma certa estabilidade no assentamento. Ex: Parmana (médio Orinoco) e Yarinacocha. Cacicados

agrícolas Desde 1.000 AP até a conquista pelos europeus Mudanças significativas ocorreram no tamanho e na organização das sociedades indígenas em algumas áreas da Amazônia (margens dos grandes rios, deltas, sopés de montanhas), dando origem aos cacicados. Economias baseadas principalmente em culturas como o milho ou gramíneas nativas, utilizadas tanto como fontes de proteína como de carbohidratos. Em Marajó há evidências de estratificação social e utilização da fruta do açaí, de sementes de tucuma e árvores como Inga spp. e Sterculia. Construção de grandes obras para controel das águas, agricultura, habitação, transporte e defesa. Algumas sociedades eram guerreiras e expansionistas. Artefatos altamente elaborados, com imagens humanas além dos animais

Relatos históricos e grandes sítios de “terra preta” com vários metros de profundidade, e vastas áreas alteradas pela construção de tesos e outras construções na paisagem. Ex: Caramutins (Marajó), com 10 km2; Parmana e Aterro dos Bichos

O padrão contemporâneo das sociedades indígenas seria muito semelhante ao dos primeiros horticultores amazônicos. Mas, apesar das semelhanças – sistema horticultor baseado no cultivo de mandioca, na fauna como fonte protéica, na importância dos animais no mundo simbólico, e o assentamento em aldeias relativamente pequenas e dispersas – não existe continuidade temporal entre essas sociedades. O modo de vida dos primeiros horticultores desapareceu e foi substituído pelos cacicados agrícolas, só readquirindo importância após os deslocamentos e as imensas perdas populacionais pós-conquista. Para Roosevelt (1993), o sistema de subsistência horticultor parece ser adaptativo em condições de baixa densidade populacional e falta de competição intensiva por recursos e terras. Seu sucesso está em garantir uma produção abundante de calorias através da agricultura, de forma que a fauna pode ser utilizada apenas como fonte protéica. Seu desaparecimento, durante o período de expansão populacional na pré-história recente, parece estar relacionado à impossibilidade de produzir proteína em um nível trófico mais baixo, através da agricultura. Para dar este passo, os horticulturalistas teriam que ter optado pelo plantio de sementes, como o milho, por exemplo, ao invés de raízes tuberosas. Este teria sido o passo dado pelas aldeias das várzeas do Amazonas e do médio Orinoco, dando origem aos grandes cacicados (Roosevelt 1993).

O plantio do milho teria possibilitado a existência de um excedente de proteína que permitiu a sedentarização e a posterior evolução social. Achados de Roosevelt no sítio arqueológico de Parmana (Venezuela) fizeram-na concluir que houve um rápido crescimento populacional no mesmo período em que o milho foi introduzido nessas aldeias, o que teria coincidido também com a emergência dos cacicados (Carneiro 1995). Estes achados são corroborados pelos relatos históricos dos viajantes europeus: sociedades com uma organização sócio-política baseada numa hierarquia estratificada, composta por chefes locais e regionais, nobres, comuns, servos, fazendeiros e escravos capturados. Suas economias eram complexas e de grande escala, e incluíam a produção agrícola de raízes e sementes, através dos sistemas de mono e policultura, caça intensiva, pesca e estocagem de alimento. Roosevelt (1993) trouxe uma descrição dos cacicados que ocupavam as várzeas e o estuário do Amazonas à época da conquista. Todavia, o plantio anual intensivo era extremamente custoso em termos de mão-de-obra e, após a catástrofe populacional do contato, as sociedades remanescentes teriam retornado ao cultivo de raízes, simplificando os sistemas políticos. Assim, os modos de vida contemporâneos podem ser vistos como adaptações não só às condições ambientais, mas também às mudanças demográficas e nas relações com a sociedade ocidental (Roosevelt 1993).

Apesar de Roosevelt fazer uma tentativa de superar a velha dicotomia várzea x terra firme e o determinismo ecológico presente na interpretação da ocupação humana da Amazônia, alguns autores fazem críticas nesse sentido a seu trabalho. Carneiro (1995) acredita que, na verdade, Roosevelt não conseguiu banir os fatores ecológicos de sua interpretação. Para ele, apesar de

Roosevelt advogar para si o pioneirismo da hipótese dos cacicados amazônicos, outros autores já haviam discutido essa possibilidade anteriormente, incluindo o próprio autor, Betty Meggers e D. Lathrap. Para Carneiro (1995), os recursos aquáticos disponíveis no rio Amazonas e no Orinoco seriam mais do que suficientes para sustentar grandes populações nas suas várzeas e permitir a sedentarização, sem que houvesse a necessidade de recorrerem ao milho. A formação dos cacicados nas várzeas e sua ausência nos interflúvios seria mesmo explicada pela circunscrição ambiental (ver acima).

Apesar de todas as críticas levantadas às hipóteses de fatores limitantes à ocupação humana na Amazônia, existe um ponto com o qual a maior parte dos autores concorda (Lathrap 1968, Carneiro 1970, Steward 1949, Meggers 1984 e 1987, Roosevelt 1989) a várzea e a terra firme apresentam oportunidades e limitações distintas à ocupação humana, sendo que a primeira foi capaz de sustentar os maiores assentamentos humanos da pré-história recente. Este padrão de ocupação é explicado, em geral, pela relativa fertilidade do solo e pela facilidade de acesso aos recursos da fauna aquática, em relação à terra firme.

Todavia, apesar da fertilidade, a várzea é um ambiente de alto risco, que apresenta desvantagens para a ocupação humana: impossibilidade de se cultivar ao longo de todo o ano devido às inundações periódicas; inundações extremas ocasionais que recobriam mesmo os terrenos mais altos; e, na região estuarina, as variações diárias da maré (Carneiro 1995, Denevan 1996)5. Muitos

autores acreditam que a incerteza existente nas várzeas quanto às cheias faria com que as sociedades aí estabelecidas não pudessem depender exclusivamente deste ecossistema para a agricultura. De alguma forma, a terra firme também seria utilizada para o plantio (Carneiro 1995).

Denevan (1996) sugeriu um modelo de complementaridade entre a várzea e a terra firme, que busca superar a velha dicotomia. As várzeas de fato forneceriam um substrato ideal para o plantio da mandioca e do milho, além de acesso aos recursos pesqueiros. Todavia, nem mesmo as estratégias de estocagem de alimento dos cacicados poderiam garantir a alimentação de grandes populações durante períodos prolongados de cheia, ou durante cheias excepcionalmente grandes, o que só seria possível através da existência de recursos vindos da terra firme. Para o autor (op.cit.), os assentamentos pré-históricos ribeirinhos teriam se localizado principalmente nas barrancas que separam o terreno aluvial recente da várzea amazônica dos terrenos mais antigos do Terciário e do

5 A riqueza da biomassa vegetal das várzeas atrai inúmeros herbívoros e insetívoros que constituem uma importante

fonte de proteína para as populaçõ es humanas. A pesca é a principal fonte de proteínas. A maior parte das populações contemporâneas de várzea são caracterizadas na maior parte dos casos por um uso extensivo, ao invés de intensivo, dos recursos, utilizando apenas uma parte do potencial da região. As populações da várzea do baixo Amazonas também têm, normalmente, um acesso a uma área maior de floresta de terra firme que as populações do alto

Amazonas, onde a precipitação mais intensa e os meandros dos rios limitam a área de terra não inundável (Moran

Pleistoceno (terra firme), e não na várzea propriamente dita. Esta estratégia permitiria a utilização dos recursos de ambos os ecossistemas (Porro 1995, Denevan 1996, Petersen et al. 2001). Mesmo que os solos destas áreas de contato – as barrancas – não fossem tão produtivos quanto o das várzeas, isso seria compensado pela ausência de risco de inundação e pela facilidade de defesa, graças a sua altitude relativamente elevada (Denevan 1996). O modelo de Denevan (1996) combina a agricultura itinerante de terra firme com outras estratégias (jardins domésticos, culturas mais intensivas e manejo agroflorestal), dada a dificuldade tecnológica da agricultura (machados de pedra) em garantir, sozinha, a subsistência de grandes contingentes populacionais (Denevan 1992). Denevan (1996) trouxe uma revisão dos dados arqueológicos, históricos e agrícolas que sustentariam a hipótese de complementaridade entre várzea e terra firme.

Outra possibilidade discutida é que a agricultura na várzea tenha sido exageradamente enfatizada pelos modelos anteriores, e a importância dos recursos aquáticos (peixes, peixes-boi, tartarugas) negligenciada. De fato, a existência de terra preta ao longo dos rios de águas claras e pretas é uma indicação de que assentamentos maiores poderiam ser sustentados por alguma combinação entre recursos aquáticos e uma agricultura de terra firme minimamente produtiva. Ou seja, a agricultura de várzea poderia ter sido mais ou menos importante para a ocupação humana na Amazônia, dependendo das condições locais (Petersen, Neves et al. 2001). Da mesma forma, já foi demonstrado que existe uma ampla gama de variação nas taxas de aquisição de proteína animal pelas populações indígenas etnográficas6 (Beckerman 1994).

A importância da heterogeneidade ambiental na Amazônia é discutida por Coomes (1992). A partir de suas pesquisas com populações ribeirinhas do rio Tahuayo, no Peru, Coomes (1992) discordou que os rios de águas pretas sejam “rios de fome”. Essas comunidades produzem o suficiente para si além de um excedente na produção agrícola, florestal e na pesca, que é comercializado no mercado. Uma análise histórica da região também mostrou que o modo de vida das populações locais não é determinado pelo ambiente, ou fixo no tempo. Ao contrário, o uso de recursos na bacia do Tahuayo tem sido definido e redefinido pelas demandas econômicas externas (borracha, peles de animais, barbasco, madeira, produtos agrícolas). Desde o fim do século XIX, os habitantes da bacia do Tahuayo tem apresentado uma variação considerável naqueles traços culturais que supostamente indicam a adaptação ao ambiente das águas pretas: mudanças no padrão de assentamento (de unidades domésticas dispersas de seringueiros a um contínuo de vilas ao longo do rio), na organização social (de hierárquica para igualitária), na produção para o mercado (de produtos florestais para produtos agrícolas), e nas relações comerciais (crédito, trocas e comércio) (Coomes

6 Dados recentes sobre alocação de tempo nessas sociedades mostram que existem dois padrões conflitantes nas

1992). Uma visita à região do Tuhuayo há 100, 50, ou mesmo 20 anos antes, em busca de respostas adaptativas a ambientes pobres, teria resultado em conclusões distintas. Para Coomes (1992), mudanças temporais podem ser melhor explicadas através das forças econômicas, sociais e políticas que mediam a relação entre cultura e ambiente, do que por diferenças ambientais regionais. A história adaptativa humana ao longo do rio Tuhuayo é muito mais complexa e dinâmica do que poderia ser retratado por um modelo de respostas às limitações ambientais dos rios de águas pretas.

Apesar de estudar as savanas amazônicas bolivianas, Erickson (2000) também mostrou que no passado pré-conquista o ambiente já havia sido altamente modificado por populações humanas, através da construção de campos elevados, represas, tesos de grandes assentamentos e estradas. Seus achados são compatíveis com as estratégias utilizadas atualmente pelas populações locais. O complexo de represas e estradas encontrados por Erickson (2000) cobre uma área de 525 km2

na região de Baures, indicando a existência de uma aqüicultura intensiva. Segundo o autor (op.cit.), as populações pré-hispânicas deveriam utilizar esta tecnologia para obter proteína animal (peixes e invertebrados de água doce) suficiente para sustentar grandes e densos assentamentos populacionais na savana. Além disso, as represas de peixe contemporâneas estão freqüentemente associadas à palmeira Mauritia flexuosa (buriti), cujos frutos são ricos em vitamina A e C, óleo e proteína. Outras partes da palmeira fornecem ainda amido, larvas comestíveis, e fibras. O complexo de represas de Baures é um exemplo da criação e manejo de uma paisagem antrópica, por populações pré-contato, destinada a regular o nível das águas nas savanas. As represas artificiais aumentavam a concentração e a estocagem de peixes vivos, garantindo água para consumo humano e melhorando os habitats para a caça. Ao invés de domesticarem as espécies, essas populações domesticaram a paisagem, possibilitando a existência de grandes assentamentos humanos no que muitos considerariam um ambiente marginal (Erickson 2000).