• Nenhum resultado encontrado

2. O PAPEL MACROECONÔMICO DAS FAMÍLIAS E A HIPÓTESE DE

3.2. A Inserção das Famílias numa Estrutura em Permanente Transformação

3.2.2. Os Credores das Famílias

Tendo em vista estas transformações financeiras, que sem dúvida têm impactos significativos na questão dos portfólios, cabe destacar algumas das características que envolvem o setor que financia as famílias, uma vez que, como foi destacado e será visto a seguir, o endividamento passou a ser um aspecto essencial para entender o impacto das famílias no sistema econômico desde o pós-II guerra.

Gráfico 5: Crédito ao consumidor por emissor, EUA, 1943-2010, em trilhões de dólares de 2010

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Federal Reserve, disponível em: http://www.federalreserve.gov/releases/g19/hist/cc_hist_mh.html

Com relação ao crédito ao consumidor, no gráfico 5 observa-se que o crédito bancário de curto prazo sempre foi a forma predominante de financiamento dos gastos do consumidor, apresentando tendência de crescimento, ainda que sujeito a variações cíclicas. Contudo, a partir do fim dos anos 1980, novos agentes passaram a ter relevância no mercado de crédito. Embora os bancos não tenham contraído suas operações, sua participação direta caiu relativamente, passando a corresponder a um terço do total, ao longo dos anos 1990 e 2000. A partir de 1997, cresceu a importância das companhias financeiras na concessão de crédito, que

- 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00 1,20 1943 1948 1953 1958 1963 1968 1973 1978 1983 1988 1993 1998 2003 2008

Bancos comerciais Companhias financeiras

Cooperativas de crédito Governo federal

~ 92 ~

passaram a conceder cerca de 24% do total. Cabe destacar a importância crescente de crédito securitizado ao consumo já ao final dos anos 1980, mas sobretudo a partir de 1994, quando alcançou o volume do crédito bancário. Este crédito é oriundo de várias instituições financeiras, de acordo com o Federal Reserve, pois engloba bancos e, principalmente, companhias financeiras.

Com relação ao mercado de crédito imobiliário (gráfico 6 a seguir), verifica-se, a partir da segunda metade dos anos 1980, a intensificação da oferta de hipotecas, sobretudo por agentes não tradicionais neste mercado. Entre estes, os bancos comerciais, agências federais ou relacionadas ao governo, e uma gama de novos agentes financeiros (categoria ―indivíduos e outros‖ no gráfico), como: mortgage companies, real estate investment trusts, private mortgage

pools, noninsured pension funds, agências de crédito estaduais e municipais, fundos de

aponsentadoria estaduais e municipais, cooperativas de crédito, companhias financeiras e agências menores associadas ao governo.

Gráfico 6: Hipotecas por emissor, EUA, 1950-2010, em trilhões de dólares de 2010

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Federal Reserve,disponível em: http://www.federalreserve.gov/releases.

Assim, deve ser destacado o impacto da securitização na promoção das operações de empréstimos hipotecários, pois tal processo permitiu aos bancos comerciais explorarem esse mercado, tanto por conta da pressão competiviva enfrentada em suas operações tradicionais,

0 1 2 3 4 5 6 7 1950 1954 1958 1962 1966 1970 1974 1978 1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010

Instituições de poupança Agências federais e relacionadas

Bancos Indivíduos e outros

~ 93 ~

quanto pelo barateamento dos custos destas operações. Por outro lado, as instituições de poupança, desde os anos 1970, passaram a enfrentar o descasamento de prazos de seus portfólios e a se defrontar com o risco de refinanciamento introduzido pela elevação das taxas de juros. Como destaca Minsky (2008c, p.3), ―The interest rates of the monetarist experiment destroyed

the funding capabilities of the thrift „industry‟ in the United States by undermining the value of mortgages and thus impairing their net worth”. Além disso, estas instituições passaram a

enfrentar a fuga de depósitos para formas mais atrativas de alocação de recursos por parte dos investidores institucionais. Desse modo, estas instituições, progressivamente, foram perdendo espaço no mercado imobiliário, viabilizando suas operações por meio de uma mudança profunda na forma de intermediação, isto é, utilizando-se (e especulando) com crédito securitizado, pelo menos até a Financial Institutions Reform, Recovery and Enforcement Act de 1989 (bailout bill).

Numa reação à derrocada das instituições de poupança (crise das saving loans), o governo passou a formar um amplo mercado secundário para as hipotecas135, securitizando estes créditos, sobretudo através da Fannie Mae, Freddie Mac e Ginnie Mae. Com isso, permitiu o funcionamento e ampliação do mercado imobiliário, dando condições para emergência de novos agentes credores, como os bancos comerciais, instituições financeiras, fundos mútuos de investimento imobiliário e demais originadores de hipotecas. Além disso, as medidas de desregulamentação e liberalização financeira têm um importante papel nesta expansão, pois a partir do Depository Institutions Deregulation and Monetary Control Act de 1980 (DIDMCA) foram removidos os limites de taxa de juros que as instituições financeiras sob regulação poderiam cobrar nas operações de empréstimo ao consumo e nas hipotecas. Por sua vez, o

Alternative Mortgage Transactions Parity Act de 1982 (AMTPA) permitiu novas formas de

hipotecas, como as adjustable rate mortgages (ARM), ballon-payment mortgages e interest-only

mortgages, rompendo com a institucionalidade das hipotecas tradicionais de 30 anos.

Neste quadro de transformações, a próxima seção se propõe a discutir a evolução do comportamento das famílias, tendo como referência a análise de sua estrutura financeira e de seus rendimentos, ao longo do périodo 1945-2010. O objetivo é mostrar como as mudanças do ambiente institucional inseriram as famílias num espaço de decisões cada vez mais amplo e complexo, no qual estas participaram ativamente.

135

Inclui Government National Mortgage Association (Ginnie Mae), Federal Housing Administration, Public Housing

Administration, Homeowners Loan Corporation, Federal Deposit Insurance Corporation, agências relacionadas ao governo,

como: Federal National Mortgage Association (Fannie Mae), Federal Home Loan Mortgage Corporation (Freddie Mac); e hipotecas emitidas ou garantidas por estas agências.

~ 94 ~