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A CRIAÇÃO DA CAPITANIA-GERAL DO RIO GRANDE DE SÃO PEDRO E A CHEGADA DA FAMÍLIA REAL PORTUGUESA EM SOLO AMERICANO

Desde o final do século XVII, especialmente com a fundação da Colônia do Santíssimo Sacramento, em frente ao porto espanhol de Buenos Aires, na margem setentrional do Rio da Prata, em janeiro de 1680, e quatro anos depois, e com a fundação da vila de Laguna, na costa do atual estado de Santa Catarina, é possível afirmar que as relações entre luso-brasileiros e hispano-americanos foram, cada vez mais sendo alteradas pelas interdependências com o exterior, principalmente com a Europa e, ao longo do tempo, com a África, de onde eram trazidos os escravos amplamente comercializados na América. A relação tensa que se formou naquela região, ainda indefinida em sentido demarcatório, ligava- se especialmente à iminente conquista que uma ou outra Coroa ibérica poderia levar adiante a partir do incentivo dado aos atores sociais que ali se encontravam.73

Valia ainda naquele período o Tratado de Tordesilhas e, consequentemente, a Bula Papal de 1493, que definia a linha imaginária que demarcaria as fronteiras dos reinos ibéricos. Porém, como assinala Miguel do Espírito Santo, auxiliada pela inexatidão das longitudes e nas variáveis medidas utilizadas para as léguas,

Portugal traçou a raia de Tordesilhas a oeste da colônia do Sacramento e sustentava sua legitimidade em avançar até a margem do Prata; a Espanha se contrapunha a essas medidas e localizações, fazendo passar a linha imaginária na altura do Rio Grande de São Pedro.74

73 De acordo com a análise realizada por Martha Daisson Hameister e Tiago Luís Gil, essas duas fundações fizeram parte de dois projetos diferenciados de expansão, não excludentes, mas que tinham características distintas. O primeiro caso, da Colônia, fora realizado mediante ordem expressa da Coroa portuguesa, que enviou o recém-nomeado governador do Rio de Janeiro, dom Manuel Lobo para sua realização. Já o segundo caso, de Laguna, seria uma expansão realizada pelos paulistas, no movimento comum para a época, no qual as famílias ou parcelas delas migravam para regiões onde ainda abundavam recursos, em razão de não fracionar demasiadamente as propriedades. Ver mais em HAMEISTER, Martha Daisson; GIL, Tiago Luís. “Fazer-se elite no extremo-Sul do Estado do Brasil: uma obra em três movimentos. Continente do Rio Grande de São Pedro (século XVIII)” in: FRAGOSO, João Luís Ribeiro; ALMEIDA, Carla Carvalho de; SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de (org.). Conquistadores e negociantes: histórias de elites no Antigo Regime nos trópicos. América lusa, séculos XVI a XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. p. 267-268.

74ESPÍRITO SANTO, Miguel Frederico do. “Fundamentos da incorporação do Rio Grande do Sul ao Brasil e ao espaço português” in: BOEIRA, Nelson; GOLIN, Tau [et. al.] (coord.). Colônia. Passo Fundo: Méritos, 2006. (Coleção História Geral do Rio Grande do Sul, vol. I). p. 25.

Com isso, foram abertas as dissensões num espaço, que passaria mais de um século sendo disputado palmo a palmo pelas Coroas ibéricas. Assim, em agosto de 1680, a Colônia portuguesa localizada no extremo meridional da América foi atacada e tomada pelos espanhóis com o auxílio de índios guaranis destacados nas missões jesuíticas da Companhia de Jesus. Estas, instaladas ao longo dos principais rios que corriam pelo território espanhol de norte a sul durante o século XVII, funcionavam como entraves à entrada dos portugueses, assim como reconduziam mão-de-obra indígena e produtos para as principais zonas de comercialização da América espanhola.

Apesar do tratado, chamado de Provisional, acordado na Europa, ter devolvido a Colônia do Sacramento para os portugueses em 1681, a constante vigilância espanhola impossibilitava qualquer outra ação mais ousada que visasse à consolidação dos projetos expansivos lusitanos na região. Assim, os espanhóis, por sua vez, a fim de garantirem a posse dos campos abaixo de Laguna, de onde já extraíam boa parte da produção animal do período – a carne e os substratos do gado vacum espraiado por aquelas coxilhas – passaram novamente representantes da Companhia de Jesus para que estes fixassem definitivamente novas missões.75 De acordo com Júlio Quevedo, mesmo depois da algumas décadas de estabelecimento, “A expansão portuguesa preocupava sobremaneira os missionários. Nas correspondências dos jesuítas da década de 1740, sobressai a preocupação com a presença portuguesa e a missão dos povoados de defender a fronteira espanhola na Zona do Rio da Prata”76, o que teria feito com que os jesuítas trabalhassem no sentido de forjar nos indígenas

uma “identidade espanhola” para defender os interesses da Coroa, com ênfase no resguardo da fronteira espanhola na América Meridional. Contudo, cabe mais uma vez salientar que, naquele período, não se pode afirmar que existisse uma identidade espanhola – talvez até hoje seja complicado localizar uma única identidade nesse sentido –, mas sim uma lealdade ao rei de Castela.

Na Europa, morto o rei Carlos II de Espanha, em 1700, iniciava-se a conturbada “Guerra de Sucessão” (1702-1714), na qual, além da disputa entre as principais potências do período, Inglaterra, Áustria, França, e a própria Espanha, estavam em jogo questões territoriais que podiam favorecer Portugal, principalmente em território americano. Assim, apesar de um breve apoio aos intentos de Felipe de Anjou, que colocaria definitivamente a

75 Ver mais em ESPÍRITO SANTO in: BOEIRA; GOLIN (coord.), 2006, p. 27-28.

dinastia dos Bourbon no trono espanhol, em 1703 o acordo luso-hispânico foi anulado e Portugal passava a apoiar as pretensões de Carlos de Habsburgo. O motivo para tal posicionamento, segundo registra Eugénio dos Santos, foram as “muchas compensaciones territoriales, ya fuera en la Península Ibérica o en América, siéndole prometida, en cuanto a esta última, la ampliación de los domínios de Brasil hasta la margen norte del Río de la Plata.”77

A Inglaterra, já desde o século XII, mantendo relações estreitas com Portugal, o arrastava cada vez mais para sua esfera direta de influência. Com isso, após a morte do imperador do Sacro-Império romano-germânico José I, em 1711, demonstrou-se claramente a ideia de que Felipe V fosse mantido no poder em Madrid. Em 1713, a Coroa portuguesa assinaria o primeiro tratado de Utrecht, com a França, garantindo vastas porções de terras ao norte da colônia americana em troca da aceitação de Felipe V no trono espanhol. Em 1715, dom João V assinaria outro tratado, agora com a Espanha, pelo qual ficava assegurada a Colônia do Sacramento, mas eram perdidas partes da fronteira lusitana na Península ibérica.78

O rei português passaria, então, a defender a neutralidade de Portugal nas questões que envolvessem suas relações exteriores. Assim, consubstanciado pelo grande impulso ao sistema financeiro dado pela descoberta do ouro nas Minas Gerais, colônia luso-brasileira, foi possível a dom João V organizar as finanças e iniciar a modernização do reino. Já, na América Meridional, a finalidade era garantir as fronteiras para evitar o acesso dos espanhóis às minas.

Na década de 1730, fora dado início à doação de sesmarias na região abaixo do rio Mampituba, como forma de garantir as terras para Portugal por meio do uti possidetis, que fazia parte dos novos aportes postos em voga pelo direito natural moderno. Assim, tentava-se garantir uma fronteira que se tornasse cada vez mais concreta para um espaço até então de penetração multifacetada. Logo em seguida, em 1737, dava-se início à fundação do Forte Jesus-Maria-José, que acabou sendo a base para o povoamento ao sul da lagoa dos Patos com a formação da primeira vila no Rio Grande.79

77 SANTOS in: TANDETER, 2002, p. 34.

78 SANTOS in: TANDETER, 2002, p. 35-36; ESPÍRITO SANTO in: BOEIRA; GOLIN (coord.), 2006, p. 32- 33.

79 Através de Carta Régia de 1747 o povoado do Rio Grande foi elevado a vila, sendo definitivamente instalado em 16 de dezembro de 1751. Cf. SANTOS, Corcino Medeiros dos. “Importância da Capitania do Rio Grande para o Brasil” in: BOEIRA; GOLIN (coord.), op. cit., p. 66.

Conforme Fabio Kuhn, a criação dos caminhos que interligavam o sul da América portuguesa diretamente ao centro da colônia advinha das motivações econômicas, especialmente demandando o abastecimento de alimento e transporte aos novos centros mineradores do sudeste da colônia. Isso teria motivado, dentre outras ações, a criação de postos de Registro visando a arrecadação de impostos sobre a mercadoria transportada, no caso o gado, possibilitando também que os novos passos e registros fossem arrematados em troca de favor de particulares, os quais, participando de um sistema já há muito tempo utilizado na Europa, garantiam seus lucros por meio do excedente cobrado sobre os impostos.80

As teses que tratam do tema reforçam a ideia de que, mais que uma fronteira aberta naquele período, o espaço que seria aos poucos ocupado pelos luso-brasileiros, ao mesmo tempo em que permanecia servindo a muitos hispano-americanos, estava “intimamente ligado aos interesses dos homens de negócio da praça do Rio de Janeiro no comércio daquela região e no da Colônia do Sacramento, bem como em novas oportunidades de negócio”.81

Permeada por diversas idas e vindas de um e outro súdito ibérico, o espaço em questão apresentou-se bastante dinâmico, especialmente até a primeira metade do século XIX, pois definir a fronteira política era tarefa hercúlea em uma região onde as diferenças físicas eram quase inexistentes. O que foi iniciado por Alexandre de Gusmão, na metade do século XVIII, todavia, colocando em xeque as disposições do Tratado de Tordesilhas, resultou na assinatura do Tratado de Madri, em 13 de janeiro de 1750, que tentava dar contornos políticos reais aos domínios dos dois Impérios ibéricos na América.

Não é de se estranhar que, com o Tratado de Madri, as expedições para demarcação dos limites acarretaram em diversas batalhas, como a chamada Guerra Guaranítica (1752-

80 Em torno desse tema há, desde a década de 1990, um crescente número de obras, especialmente vinculadas aos grupos de pesquisa desenvolvidos por João Luís Ribeiro Fragoso. Assim, a produção que analisa a participação dos homens de grosso trato na economia do continente e depois capitania de São Pedro, em vinculação com o governo central na Colônia e mesmo na Metrópole, podem ser encontrados especialmente em: FRAGOSO, João Luís Ribeiro. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil do Rio de Janeiro (1790- 1830). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. FRAGOSO; ALMEIDA; SAMPAIO (org.), 2007; FRAGOSO; BICALHO; GOUVÊA (org.), 2001; FRAGOSO, “Potentados coloniais e circuitos imperiais: notas sobre uma nobreza da terra, supra capitanias, no Setecentos” in: GONÇALO MONTEIRO, Nuno F.; CARDIM, Pedro; CUNHA, Mafalda Soares (org.). Optima Pars –Elites ibero-amaricanas do Antigo Regime. Lisboa: ICS, 2005. p. 133-168. FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do comércio nas minas setecentistas. São Paulo: Hucitec, 1999. OSÓRIO, 2007. KÜHN, Fábio. “A fronteira em movimento: relações luso-castelhanas na segunda metade do século XVIII” in: Estudos ibero-americanos. PUCRS, vol. XXV, n. 2, dezembro 1999. pp. 91-112.

1756), já bastante revisitada pela historiografia. Os embates, dessa vez, não seriam entre os exércitos ibero-americanos, mas de uma força conjunta contra os indígenas das Missões dos Sete Povos, que teriam de transladar-se ao outro lado do rio Uruguai, tendo em vista que eram súditos espanhóis.82 E o problema nesse momento talvez não tenha sido de ordem política para os ocupantes daquele espaço, mas principalmente de caráter sócio-cultural e econômico. Afinal, deixar para trás um espaço já culturalmente construído e as riquezas pessoais que eram impossíveis de transladar, implicava alterar profundamente a vida daqueles povos.

Nesta conjuntura, em 1750, subia ao poder dom José I como rei de Portugal. Com ele dava-se continuidade ao acentuado poder interventor do Estado, consolidando a supremacia do rei frente às demais instituições e, em diversos aspectos, tentando fazer com que Portugal entrasse no hall dos reinos, dentre os da Europa, mais desenvolvidos política, econômica, cultural e socialmente, dentre os da Europa. Para auxiliá-lo nessa tarefa – que ao passar do tempo demonstraria que seria mesmo o comandante da imensa nau chamada Império português – foi nomeado para o cargo de ministro de Estado do Reino, equivalente a um primeiro-ministro, com poderes bastante extensos, e que se estenderiam ainda mais depois de iniciar diversas reformas, Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro conde de Oeiras (1759) e, depois, marquês de Pombal (1770).

Após assumir a pasta, o primeiro grande embaraço que este sofrera talvez tenha sido o devastador terremoto que destruiu Lisboa na manhã do dia 1º de novembro de 1755. Contudo, foi nas ações que tomou posteriormente para o reerguimento da cidade que sua fama correu os quatro cantos da Europa. Além disso, os promotores do golpe levado a cabo em 1758 (que ficaria conhecido como o “Caso Távora”), quando o rei sofreu um atentado, foram severamente punidos, legando um golpe mortal aos privilégios da nobreza e acarretando, também, um motivo a mais para a expulsão dos jesuítas dos territórios portugueses no ano seguinte, que acabaria por convergir com o próprio projeto laicizante pombalino.83

82 O Tratado estipulava que as terras delimitadas a oeste pelo rio Uruguai e ao sul pelo rio Ibicuí passavam a pertencer a Portugal, que entregava a Colônia do Sacramento à Espanha. Nessa região, então espanhola, as reduções jesuíticas dos Sete Povos agiam como baliza às investidas portuguesas. Entretanto, foram um dos maiores exemplos da incompatibilidade de interesses entre colônia e metrópole. As Guerras Guaraníticas, como ficaram conhecidas as batalhas para a demarcação dos novos limites impostos pelo Tratado de Madri, podem ser melhor compreendidas a partir de alguma obras como QUEVEDO, Júlio. Guerreiros e Jesuítas na Utopia do Prata. Bauru, SP: EDUSC, 2000; AZANHA, Gilberto; VALADÃO, Virginia Marcos. Senhores destas Terras: os povos indígenas no Brasil: da colônia aos nossos dias. São Paulo: Atual, 2000; SANTOS, Julio R. Quevedo. As Missões: Crise e Redefinição. São Paulo: Ática, 1993; REICHEL, Heloisa Jochims; GUTFREIND, Heloísa. As raízes históricas do Mercosul: a região platina colonial. São Leopoldo: Unisinos. 1996.

Outra árdua tarefa a ser superada era a relação com França e Espanha durante a Guerra dos Setes Anos (1756-1763). Como as possessões portuguesas encontravam-se quase todas em regiões de disputa entre Inglaterra e França, para a diplomacia portuguesa, como afirma Maria Fernanda Bicalho, “era impossível, deflagrada a Guerra [...], eximir-se de uma tomada de posição”84. Em 1761, a França exigia a adesão de Portugal ao Pacto de Família dos

Bourbon, firmado em 15 de agosto daquele ano entre aquela, a Espanha, os reinos de Nápoles e de Parma. Portugal, provavelmente pesando na balança militar e econômica os problemas que acarretariam indispor-se com a Inglaterra, negou-se a assinar o dito tratado. Assim, o reino português chegou a ser invadido, mas contava com a forte presença inglesa que o auxiliou a expulsar as tropas franco-espanholas, contribuindo para a dependência portuguesa com relação à Inglaterra.

Em 12 de fevereiro de 1761, anulava-se o Tratado de Madri por meio do de El Pardo85, não só influenciado pela guerra, mas também pelo fracasso nas demarcações das fronteiras entre os reinos na América Meridional. Assim, as missões na porção oriental do rio Uruguai passavam novamente ao controle espanhol. Porém, logo sobreveio o Tratado de Paris, de 1763, pelo qual Portugal garantia novamente a posse sobre a Colônia do Sacramento.

Na porção meridional, no ponto de contato entre os Impérios Ibéricos na América, as disposições ocorridas na Europa se fariam sentir prontamente. Com isso, os espanhóis invadiram as terras do Continente de São Pedro, desde 1742, dependente administrativamente da Capitania-geral do Rio de Janeiro. De 1763 a 1776, os hispano-americanos fizeram-se novamente senhores das terras meridionais na América; era um “tempo de confusão, e corrida”, como registrava o vigário do Rio Grande, Manuel Francisco da Silva86.

Outra importante medida adotada fora a transferência da capital do Vice-reinado do Brasil, de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763. Essa medida, “nunca satisfatoriamente explicada pela historiografia”87, como aponta Maria Fernanda Bicalho, deveu-se

especialmente às ameaças que a Colônia como um todo vinha sofrendo por parte da França,

84 BICALHO, Maria Fernanda. A cidade e o Império: o Rio de Janeiro no século XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 57.

85 Para ter acesso a uma transcrição do Tratado de El Pardo, de 1761, consultar: <http://domjoseprimeiro.blogspot.com/2008/05/tratado-do-pardo-1761.html>. Acessado em 5 abril, 2009. 86 ADPRG, 1º livro de batismos de Estreito, 1763-1776.

interessada diretamente na fundação de uma colônia francesa a partir do Rio de Janeiro.88 Ou ainda, o que especialmente interessa à presente análise, o avanço espanhol em direção às terras portuguesas, chegando até a Ilha de Santa Catarina, em fevereiro de 1777, por meio da expedição coordenada pelo vice-rei do Rio da Prata dom Pedro Cevallos.89

Neste contexto das disputas ocorridas na América, talvez ainda como reflexo da Guerra dos Sete Anos, há uma retração bastante significativa de súditos espanhóis registrados na Paróquia da freguesia de Viamão, como apresenta Fábio Kuhn.90 Com isso, percebe-se que provavelmente houve ações coercitivas por parte das autoridades portuguesas e até mesmo espanholas, coibindo a efetivação dos laços que antes eram comuns. Por isso, ainda relacionadas às políticas implementadas desde a Europa, assim como outras ações levadas a cabo na América, em 1773, como registra Luís Fernando Rhoden, “o governador José Marcelino de Figueiredo transferiu a sede da capitania e a Câmara de Rio Grande, instalada em Viamão, desde 1763, para Porto Alegre, então somente uma freguesia.”91

Alguns fatores foram preponderantes para as alterações que seriam implementadas a partir disso, pois:

morto el-rei, cahia Pombal, o maior adversario da paz com Castella. Subiam á tona todos os perseguidos e inimigos do despota; em primeira linha, D.ª Maria I e seu marido D. Pedro, a rainha-viuva D.ª Marianna Victoria, contrarios todos elles aos rumos pombalinos.92

A Espanha, ciente da oportunidade, não podia perder tempo enquanto o momento fosse propício para a execução dos planos de garantir o controle total da região do Rio da Prata. Para esse feito, houve a primordial participação da rainha-viúva Dona Marianna Victoria, irmã de Carlos III, que foi a Madri tentar a reconciliação entre os reinos na tentativa

88 Conforme uma “Memória Política” escrita pelo ex-Ajudante de ordens da capitania de Santa Catarina, Paulo Jose Miguel de Brito, as fronteiras da mesma no período colonial eram: “O seu extremo pela parte septentrional he o rio Sahí, que conflúe no Oceano em o primeiro dos sobreditos Parallelos e pouco ao norte do segundo conflúe no mesmo mar o rio Mampituba que he o extremo da Capitania pelo seu lado meridional, por este confina com a Capitania do Rio-Grande de São Pedro e pelo lado septentrional com a de São Paulo: pelo lado d‟oeste com ambas, servindo lhe de limite a Serra Geral, que nestas paragens corre do sul para o norte, mais proxima á costa do Brasil o limite da Capitania pela parte de leste em toda a sua extensão de 74 legoas he Oceano Atlantico meridional.” BRITO, Paulo Jose Miguel. Memória política sobre a Capitania de Santa Catharina escripta no Rio de Janeiro em o anno de l8l6, por Paulo Joze Miguel de Brito. Ajudante de Ordens que foi ao Governo da mesma Capitania, Governador e Capitão-General de Moçambique e Correspondente da Academia Real das Sciencias. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1829. p. 27.

89 BICALHO, 2006, p. 66 e passim.

90 KÜHN in: Estudos ibero-americanos, p. 103-105.

91 RHODEN, Luís Fernando. “Os traçados urbanos” in: BOEIRA; GOLIN (coord.), 2006, p. 263. 92 CALÓGERAS, J. Pandiá. A política exterior do Império. Brasília: Senado Federal, 1998. p. 231.

de livrar-se de vez das péssimas impressões deixadas pelas políticas anticastelhanas de Pombal.93

Após a queda de Pombal, Portugal concordou com a assinatura de um novo tratado com a Espanha. Em 10 de outubro de 1777, foi ratificado o Tratado Preliminar de Limites de Santo Ildefonso, o qual devolvia a Ilha de Santa Catarina aos portugueses em troca da Colônia do Sacramento e das Missões, garantindo totais poderes espanhóis sobre as duas margens do Prata, desde aquela Colônia até o rio Uruguai, cuja navegação seria de exclusividade da Coroa