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Capítulo 2: Crônica e literatura de viagem

2.3 O cronista Macedo e seu leitor-modelo

A Semana estreou em dezembro de 1852, no espaço destinado ao folhetim,

seu primeiro redator foi Francisco Otaviano. Dois anos mais tarde, Otaviano migrou para o Correio Mercantil deixando vago o seu lugar. A procura de um substituto à altura, a folha teria recusado a indicação de José de Alencar – nesse momento ainda um jovem escritor – porque prefeririam um literato com mais prestígio. Optaram, portanto, por Justiniano José da Rocha, que logo abdicou da tarefa, deixando-a, provavelmente, para Firmino Rodrigues da Silva que também não abraçou o ofício por muito tempo e logo foi substituído por Macedo que, nesta ocasião já era um autor respeitado. Ao assumir a coluna, ele manteve o anonimato, mas a ausência de seu nome – ou pseudônimo – ao final do texto não significava que os leitores não soubessem que os textos eram de sua autoria. Em alguns momentos, os temas – sobretudo políticos – tratados em A Semana apareciam em seus outros textos literários que eram publicados no mesmo período, porém, em outros jornais113.

Macedo optou pelo anonimato em suas crônicas dominicais, no entanto, certamente, o escritor poderia ser reconhecido por seu estilo literário. A ironia com que tratava as questões políticas era um traço característico de sua escrita e, provavelmente, reconhecível para o público-leitor. Apesar de o gênero cronístico ater-se, sobretudo, aos fatos ocorridos em um determinado período, os temas abordados na série d’A Semana eram semelhantes aos de A carteira do meu tio. Desse modo, o leitor de A carteira que lesse as crônicas hebdomadárias, provavelmente, perceberia que os textos eram do mesmo autor. Entretanto, a maior preocupação de Macedo talvez fosse expor suas críticas ao sistema político brasileiro para diferentes públicos, uma vez que o Jornal do Commercio e A

Marmota, em virtude de seus perfis editoriais, atendiam a leitores distintos.

O Jornal do Commercio foi fundado, em 1º de outubro de 1827, pelo francês Pierre Plancher, sendo o jornal diário mais antigo da América Latina. Plancher

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pretendia lançar uma publicação que estaria preocupada – como o próprio nome sugere – com as questões mercantis. No primeiro número, os objetivos da nova folha foram apresentados ao público-leitor:

De hoje por diante continuará-se-há a publicação deste JORNAL DO

COMMERCIO. Esta folha exclusivamente dedicada aos senhores

Negociantes conterá diariamente tudo o que diz respeito ao Comércio, tanto em Anúncios, como em Preços Correntes exatos de Importação e Exportação, entrada e saída de Embarcações, etc.114

A fim de cumprir sua “vocação mercantil”, o jornal veiculava informações sobre o embarque e desembarque de navios no porto carioca, anúncios, dados da movimentação comercial, leis relacionadas ao comércio, publicadas nas cerca de 20 seções115. Plancher contava com a colaboração do inglês Hunt, do médico francês João Francisco Sigaud e dos ilustres brasileiros Francisco de Paula Brito e Evaristo Ferreira, entre outros escritores.

O alijamento das questões políticas não duraria por muito tempo, duas semanas após o número inaugural, o periódico homenageava a monarquia e conclamava os brasileiros a reconhecerem sua importância e a cooperarem com ela:

A Nação Brasileira não pode sem o mais vivo, sem o mais verdadeiro entusiasmo deixar de publicar sua gratidão, cobrindo de flores o Berço do Jovem Augusto, que na crise da regeneração das Monarquias e das Nações veio elevá-la a uma categoria já de muito tempo proporcionada com o estado físico de suas forças e de seus recursos. [...]; no momento [...] em que a Nação Brasileira não tiver mais do que um só modo de pensar, ver-se-ão os frutos da regeneração, que mudou e transformou a existência política do Brasil.

Decidamo-nos a ser o que devemos ser por uma sincera, e mutua cooperação com o Augusto Criador do Império; e saudemos com transportes de prazer o dia em que apareceu no Trono de Portugal Aquele que devia erguer um Trono no Brasil; reúnam-se os nossos corações, e formem o monumento de nossa gratidão.116

A aproximação com a política ficou evidente em julho de 1828, quando Plancher, atendendo aos pedidos de seus assinantes, decidiu alterar o nome do

114

JORNAL DO COMMERCIO, 01 out. 1827.

115

Das 20 seções, destacamos as seguintes: Notícias marítimas; Preços correntes dos gêneros de

importação, Exportações, Câmbios, entre outras, cujos títulos remontam ao caráter comercial da

folha.

116

periódico para Jornal do Commercio: Folha Comercial e Política. Na ocasião, o editor justificou a mudança:

Os redatores do Jornal do Commercio em consequência das reiteradas petições de muitas pessoas, [...] de hoje em diante, tomarão as medidas necessárias para dedicar parte de seu jornal às questões políticas, sem, contudo, prejudicarem em nada a parte comercial. Os redatores sempre solícitos em tornar a sua publicação de mais a mais útil, e considerando a grande vantagem que resulta ao público pela publicação, na madrugada do dia seguinte, das notícias de todos os acontecimentos políticos chegadas até a tarde da véspera, não hesitarão a aproveitar mais esta ocasião para provar aos seus assinantes a gratidão pela proteção com que até agora horaram a sua folha.117.

Com o respaldo dos leitores, a publicação optava por um jornalismo informativo e de opinião, que participasse da vida política do país e contribuísse para a construção social da nação brasileira. Desse modo, a publicação passaria a atuar nos debates políticos da época e intervir na formação da esfera pública. Com a mudança, quatro novas seções foram introduzidas na folha, a saber: Decretos,

Correspondência, Notícias estrangeiras e Rio de Janeiro. O editor francês atribuía à

imprensa o papel de formadora de uma opinião pública e considerava que a imparcialidade fazia parte do veículo, mas os jornalistas deveriam tomar partido e advogar em torno de uma causa, com a qual se identificassem.

O escritor era visto como um intérprete da “voz do povo”, cuja responsabilidade era com a verdade, expressa com coerência e coragem. Por representar os desígnios da maioria é que a imprensa tornava-se essencial e deveria ter a atenção dos governantes.118

117

Idem, 16 jul. 1828.

118

Dada a importância dos profissionais da imprensa, os governantes deveriam levar as opiniões veiculadas por ela. Esta ideia aparece em um artigo, no qual o redator analisava a situação política da Espanha, a saber: “[A Espanha] hoje é um Reino pobre, desunido, percorrido em todos os sentidos por quadrilhas de ladrões, dominada por frades, ávidos e ociosos. O soberano em lugar de assinar ordens, que se executam desde o Báltico até o Missouri, acha-se reduzido a autorizar, para satisfazer a vingança de uma facção que desagrada o país, a prisão, os suplícios e a morte dos bravos, que o socorreram nos dias de seu cativeiro. Foi ele quem produziu este estado de servidão, em que se acha abismado com seu povo; tem sido a sua funesta persistência nas estreitas ideias antigas do governo; é o seu estado de obediência a entes perigosos, que tem sempre levado a miséria, e a guerra civil aos países em que tem sido admitidos. Em lugar de seguir cegamente os conselhos, ou antes, as ordens do Padre Cyrillo, agente das sanguessugas da Espanha, se tivesse escutado a voz do povo, que pedia a reforma, e as dos corajosos escritores, que eram seus intérpretes, teria podido encontrar a felicidade pessoal e um poder respeitado. Ver: Jornal do Commercio, 30 jul. 1828, grifo nosso.

No primeiro aniversário da folha, os editores agradeceram aos leitores e referendaram a preocupação política e o maior espaço que confeririam ao tema no jornal:

Os editores do Jornal do Commercio mereceriam a nota de ingratos, se no dia em a publicação completa um ano, não oferecesse humildemente ao iluminado público desta Corte, e em particular ao

honrado Corpo do Comércio os seus mais expressivos

agradecimentos pela proteção e benevolência com que tem sido tratados e, querendo tornar-se mais e mais devedores de tão preciosa aceitação, observando por outro lado o quanto a maior

extensão que ultimamente deram à parte política e miscelânea promoveram o concursos dos assinantes e sua satisfação, eles

se resolveram a não poupar trabalhos, nem despesas para que no inicio do seu segundo ano seu Jornal apresente novo grau de aperfeiçoamento, ora confiado a vários redatores da melhor fama e probidade literária os diversos ramos que esta folha abrangia, com a admissão da Política Nacional, o mais interessante para nós e até o dia de hoje pouco contemplado, acrescentando um folhetinho de

duas ou quatro pequenas colunas para estabelecer a perfeita divisão entre os artigos sérios e de interesse dominante com o Teatro e de Literatura, não deixando de aplicar os mais desvelados

cuidados à parte comercial e dos anúncios, sempre a fundamental, e de mestrança da publicação, esperando tornar-se dignos por estes melhoramentos, e outros que o tempo indicará sempre crescente boa opinião com quem têm sido favorecidos.119

Além do maior espaço conferido à política, uma nova seção dedicada ao teatro e à literatura foi prometida aos leitores do periódico. Em seu segundo ano o jornal aproximava-se do campo literário e garantia que a redação do impresso estaria sob a responsabilidade dos melhores escritores do Império.

Em agosto de 1830, a folha se envolveu em uma polêmica depois da publicação de uma nota em defesa de uma “política de colonização discriminatória aos portugueses”, assinada pelo jornalista Julio César Muzzi. O texto gerou a fúria dos portugueses que viviam no país e forçou Plancher a tomar algumas medidas drásticas: primeiro, demitiu Muzzi e, em seguida, decidiu mudar o título do periódico e prometeu abandonar os temas políticos, retornando, desse modo, à proposta inicial de uma folha voltada às questões comerciais:

Os Proprietários do Jornal do Commercio ouvindo o parecer de muitos Comerciantes desta Praça, e penhorados da verdade, e utilidade, que lhes provêm do são acordo deles, se decidiram logo a fazer diversas mudanças ao seu estabelecimento, começando pela do Redator; e, [...] convieram definitivamente em mudar o título do

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mesmo Jornal, restituindo-o ao de – DIÁRIO MERCANTIL, ou NOVO

JORNAL DO COMMERCIO – ao qual, e às suas operações, e a tudo

que lhe respeita, é exclusivamente dedicado, recusando-se de todo a artigos de Política, quaisquer que sejam, e de polêmica com os mais Jornais.120

Mas, pela segunda vez, o editor descumpriu sua promessa. Os assuntos políticos voltaram às páginas do periódico e às críticas ao imperador, bem como referências a assuntos polêmicos, como a questão escravista121 foram temas abordados pela folha. Em 1831, o jornal apoiou o movimento que exigia a abdicação de D. Pedro I, pois, apesar de reconhecer e respeitar o governo do monarca português, questionava os atos autoritários de sua gestão. Em 06 de abril, por exemplo, às vésperas da abdicação, o editor reafirmou a importância do conhecimento das leis pelo povo, para que o mesmo não aceitasse o despotismo monárquico:

A tipografia de Emile Seignot Plancher acaba de imprimir uma obra, que sem dúvida será apreciada pelo público brasileiro, a Biblioteca Constitucional Brasileiro, que constará de 15 volumes no pequeno formato das folhinhas. Estes volumes, dos quais 4 já saíram à luz, conterão todas as Leis eu interessam particularmente ao povo, tais, como a Constituição do Estado, o Código Criminal, as Leis sobre os Munícipios, as Buscas ou Visitas Domiciliares, Juízos de Paz, Liberdade de Imprensa, Arrecadação da Décima, etc. porquanto é necessário que o povo saiba, quais são os seus deveres para com a Pátria, e o Monarca, que conheça os direitos civis, que lhe outorga o liberal sistema, que os rege, e nenhum outro meio é mais condizente à um tal fim, do que familiarizar o povo com as leituras das Leis do Estado. [...]. Nós esperamos que os Srs. Redatores das folhas políticas, tanto na Capital, como das províncias, reconhecendo as vantagens, que se podem tirar desta publicação, a recomendem aos cidadãos de todas as classes, certos, de que com isso farão um relevante serviço à Pátria. Quanto menos instruído é um povo, tanto mais sujeito está a cair nas garras do hediondo despotismo.122

Catorze dias após a abdicação de D. Pedro I, Plancher anunciou que mudaria novamente o nome do jornal. O editor primeiro excluiu o Novo, ficando então Diário

Mercantil ou Jornal do Commercio, mas em setembro do mesmo ano, uma nova

mudança foi realizada: caiu a denominação Diário Mercantil, fato que fez com que o jornal voltasse a adotar o título original.

120

JORNAL DO COMMERCIO, 12 ago.1830.

121

Idem, 05 fev. 1831.

122

Na década de 1850, o jornal já não pertencia mais a Plancher123, mas a Junius Villeneuve e Francisco Antônio Picot, no entanto, o periódico ainda mantinha os objetivos de seu idealizador: contribuir para o desenvolvimento material do país. A grande novidade nesse período foi criação d’A Semana, em 1852, inicialmente sob a responsabilidade de Francisco Otaviano, como dito anteriormente, e depois de Joaquim Manuel de Macedo.

No período em que Macedo escreveu A Semana as questões políticas predominaram. Nesse espaço o autor emitiu suas criticas à conciliação, defendeu o projeto de reforma eleitoral, analisou o perfil dos políticos do Império, além de comentar a importância de datas oficiais como o 7 de setembro e 12 de outubro. A vida cultural da capital também foi tema das crônicas macedianas, era comum o escritor tecer apreciações sobre as novas peças teatrais e livros recém-publicados, bem como discutir o estado dos teatros e as iniciativas do poder público para o desenvolvimento intelectual da nação; praticamente nada escapava da “pena imparcial e severa do incorruptível escritor da Semana”124

. Macedo definia sua “pobre crônica” como uma “colcha de retalhos”.125

Ao assumir A Semana, Macedo fez questão de imprimir aos textos o seu estilo irônico e debochado, abdicando de uma linguagem mais apurada, característica dos cronistas que o antecederam. Seu texto “inaugural” tem um tom incisivo, que também encontramos em A carteira do meu tio.

Um discurso sem exórdio é como um sobrado sem escada, como uma companhia sem badalo, como uma frota sem bandeira, como uma sumaca126 sem cachorro, como um potentado eleitoral sem comando, como um turco sem turbante, como um alemão sem cachimbo, como um italiano sem macarrão, como um inglês sem calças brancas, como um francês sem retrato de Napoleão, como um

123

Plancher vendeu a tipografia do Jornal do Commercio, em 1834, para Junius Villeneuve e Réol Antonie de Mougenot. Nesse mesmo ano, o tipografo francês retornou à França, mas mantinha contato com os novos responsáveis pela publicação, mediando a aquisição os direitos dos folhetins de Alexandre Dumas e Eugène Sue. Plancher morreu em 1844, na capital parisiense. Pouco depois, Villeuneuve fez de Francisco de Antônio Picot seu braço direito. Somente em 15 de outubro de 1890, José Cardos Rodrigues adquiriu a Villeneuve e Picot, proprietária do jornal. In: SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, p. 126-127.

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MARMOTA FLUMINENSE, 09 jun.1857.

125

JORNAL DO COMMERCIO, 08 abr. 1855. Nas palavras de Macedo: “[...] esta minha pobre semana está pela própria natureza condenada a sempre parecer certa colcha de pobre que se compõem de retalhos de trinta mil chitas e riscados de padrões diferentes”.

126

Barco pequeno, de dois mastros, muito usado, antigamente, na América do Sul. In: Dicionário online de Português. Disponível em: http://www.dicio.com.br/sumaca/. Acesso em 04/09/2014.

espanhol sem fidalguia, como um chim sem rabicho, como um russo sem of, como um holandês sem von.[...]

Mas... (tornando ao exórdio) eu queria saudar o dia festivo, glorioso, político, e altamente significativo, que dá começo ao mês de Abril, com um preâmbulo de deixar todos de queixo caído; no primeiro ímpeto peguei na pena, e escrevi uma tirada digna de um deputado novo que prepara o seu discurso três meses antes de se abrirem as câmaras; estava um exórdio sublime, principiava assim:

Brilha pomposo e rutilante Febo.

Que aos beijos se arrancou da rósea aurora... 127

No final, Macedo decidiu não escrever o tal exórdio e afirmou que sua primeira crônica em A Semana estaria como um “corpo sem cabeça”. O autor se mostrava completamente indiferente ao julgamento do público em relação à sua decisão, talvez porque, a esta altura de sua carreira literária, não precisasse mais “bajular” o leitor que, apesar do anonimato da coluna, certamente saberia que aquele tom irônico pertencia ao célebre escritor de A Moreninha. Nas palavras de Macedo:

E ainda que o público se desgoste e leve a mal o meu procedimento, que importa isso?... Hoje não há mais receio de desgostá-lo, porque Charton e a Casaloni128 não tem privilégio exclusivo de estar em cima do público, e quem tem medo de pateada, ou de sinais de reprovação, pode muito bem agarrar-se com a polícia do Provisório, e uma vez apadrinhado por ela diga que quem for capaz abra a boca.129

É claro que Macedo abusa da retórica ao dizer que não se preocupava com a opinião do público, por mais famoso e respeitado que ele fosse entre os homens de letra e os leitores, certamente havia uma preocupação em agradar aos assinantes de domingo, caso contrário não seria necessário tantas explicações acerca da ausência do famigerado exórdio. Macedo imaginava um leitor exigente para suas crônicas, que não se contentava com qualquer “artiguinho”. Em certa ocasião, ele

127

JORNAL DO COMMERCIO, 01 abr. 1855.

128

Nesse período, as cantoras Anne Charton e Anetta Casaloni disputavam a preferência do público carioca, nos concertos de ópera que aconteciam no teatro S. Pedro de Alcântara. Lira Neto, em seu livro O inimigo do rei, conta que os “[...] fãs não se contentavam em apenas atirar flores e ramalhetes ao palco ou mandar enormes buquês aos camarins. Ao final das apresentações, organizavam barulhentos cortejos, que conduziam as prima-donas da saída do teatro até a porta de casa. Os mais exaltados chegavam a orquestrar um coro de vais, assobios e batidas de pés em meio aos espetáculos, para demonstrar desagrado a esta ou aquela, conforme a sua preferência. Muitas vezes tais manifestações – as chamadas “pateadas” – acabavam nas vias de fato, em pancadaria reprimida pela polícia”. Cf. NETO, Lira. O inimigo do rei: uma biografia de José de Alencar, ou a mirabolante aventura de um romancista que colecionava desafetos, azucrinava D. Pedro II e acabou inventando o Brasil. São Paulo: Globo, 2006, p. 96.

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afirmou que caso não apresentasse a cada semana “um estirado artigo que tenha suas semelhanças com [...] a coleção de leis do Império”, os leitores do Jornal do

Commercio iam “por a boca no mundo, e começar a gritar por essas ruas afora: ‘hoje

não tivemos a semana’”.130

Em outubro de 1855, o escritor de Itaboraí reconheceu a pressão que o público-leitor exercia sobre sua escrita e a necessidade de agradar aos leitores, atendendo aos seus pedidos:

Escreve!

Escreve sim; o relógio marcou a hora: escreve, e escreve de tal modo que prendas a atenção de seus leitores durante uns vinte minutos, pelo menos.

O público é senhor despótico: é uma espécie de Luiz XIV de todos os tempos, que quer sempre ser obedecido, e não admite nem desculpas nem explicações.

O pensamento de um escritor de semana deve obedecer ao ponteiro do relógio com a mesma prontidão com o carpinteiro ou o pedreiro obedece ao malho que bate o prego na sua obra.131

Estando há um mês à frente d’A Semana, o escritor se dirigiu ao seu público- leitor de forma muito respeitosa, através de pronomes de tratamentos como “ilustre” e “digníssimos”, utilizados para designar “um nobre, esclarecido por nascimento, ou méritos”132

, aplicados, sobretudo, em documentos oficiais. Nessa ocasião, o escritor reclamou da ausência (ou não podia tratar?) de temas relevantes naquela semana que se encerrava, Macedo comparava seu texto com um relatório – o que justificaria a utilização da expressão ilustre para designar o leitor – e esperava que, dada a falta de assuntos polêmicos, o texto tivesse um efeito tranquilizante:

Ilustres e digníssimos senhores leitores do Jornal do Commercio: Eu desempenho a árdua tarefa que tomei sobre mim, venho hoje apresentar-vos o quadro das novidades da semana que acaba de tocar o seu termo, e muito feliz me julgarei se a leitura deste relatório