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Vamos utilizar uma situação real para ilustrar o que acontece quando decidimos romper algum estado emocional memorizado e mudar nossa mente. Penso que todos nós podemos nos identificar com um estado de ser comum: culpa. Assim, vou usá-la para ilustrar em termos práticos como esse ciclo de pensamento e sentimento funciona contra nós. Em seguida, identificaremos alguns dos esforços que o sistema cérebro-corpo fará para permanecer no controle e preservar esse estado de ser negativo.

Imagine que você frequentemente sinta-se culpado por uma coisa ou outra. Se alguma coisa dá errado em um relacionamento – uma simples falha na comunicação, uma pessoa despejando errônea e injustificadamente a raiva dela sobre você, ou o que seja –, você acaba assumindo a culpa e se sentindo mal. Veja-se como uma daquelas pessoas que repetidamente dizem ou pensam: foi culpa minha.

Depois de vinte anos fazendo isso consigo mesmo, você se sente culpado e automaticamente tem pensamentos de culpa. Você criou um ambiente de culpa para si mesmo. Outros fatores contribuíram para isso, mas de momento vamos ficar com essa noção de como seu pensamento e seu sentimento criaram seu estado de ser e seu ambiente.

Cada vez que você tem um pensamento de culpa, sinaliza a seu corpo para que produza as substâncias químicas específicas que constituem o sentimento de culpa. Você fez isso com tanta frequência que suas células estão nadando em um mar de substâncias químicas de culpa.

Os pontos receptores de suas células adaptam-se para poder assimilar e processar melhor essa expressão química particular de culpa. A enorme quantidade de culpa que banha as células começa a parecer normal para elas, e, no fim, o que o corpo percebe como normal começa a ser interpretado como prazeroso. É como viver anos a fio próximo de um aeroporto. Você fica tão acostumado com o barulho que não mais o ouve conscientemente, a menos que um jato voe mais baixo do que o habitual e

o rugido do motor seja tão mais forte que chame sua atenção. Acontece o mesmo com suas células. Como resultado, elas ficam literalmente insensíveis ao sentimento químico de culpa; exigirão uma emoção mais forte, mais poderosa – um limiar mais alto de estímulo – para se ativar da próxima vez. E, quando esse “pico” mais forte de substâncias químicas de culpa consegue a atenção do corpo, suas células se “animam” com o estímulo, de forma muito parecida com o que uma xícara de café Java causa em quem bebe café.

E, quando cada célula se divide no final de sua vida e forma uma célula filha, os pontos receptores externos da nova célula exigirão um limiar mais alto de culpa para serem ativados. Agora o corpo exige um fluxo emocional mais forte de sentimentos ruins para se sentir vivo. Você fica viciado em culpa por suas próprias ações.

Quando qualquer coisa dá errado ou entorta em sua vida, você automaticamente presume que seja o culpado. Mas isso agora lhe parece normal. Você nem tem de pensar em se sentir culpado – você é. Não apenas sua mente não está consciente de como você expressa seu estado de culpa por meio das coisas que diz e faz, como seu corpo quer sentir esse nível costumeiro de culpa porque você o treinou o para fazer isso. Inconscientemente, você tornou-se culpado na maior parte do tempo – seu corpo tornou-se uma mente de culpa.

Apenas quando, digamos, uma amiga comenta que você não precisava pedir desculpas ao caixa da loja por ele ter lhe dado o troco errado, você percebe o quanto esse aspecto de sua personalidade está disseminado. Digamos que isso deflagra um daqueles momentos de iluminação – uma epifania –, e você pensa: ela está certa. Por que eu me desculpo o tempo todo? Por que assumo a responsabilidade pelas falhas de outras pessoas? Após refletir sobre o histórico de “se declarar culpado” constantemente, você diz para si mesmo: hoje vou parar de me culpar e de pedir desculpas pelo mau comportamento dos outros. Vou mudar.

Por causa dessa decisão, você não vai mais pensar os mesmos pensamentos que produzem os mesmos sentimentos e vice-versa. E, caso

vacile, você fez um trato consigo mesmo de parar e lembrar da sua intenção. Passam-se duas horas, e você se sente realmente bem consigo mesmo. Você pensa: uau, isso está mesmo dando certo.

Infelizmente, as células de seu corpo não estão se sentindo tão bem. Ao longo dos anos, você treinou-as para exigirem mais moléculas de emoção (culpa, neste caso) a fim de satisfazer suas necessidades químicas. Você treinou seu corpo para viver como uma continuidade química memorizada, mas agora está interrompendo isso, negando as necessidades químicas e indo contra os programas subconscientes dele.

O corpo fica viciado em culpa ou em qualquer emoção da mesma forma que ficaria viciado em drogas.8 A princípio você só precisa de um pouco de emoção/droga para sentir; depois o corpo fica insensível, e as células exigem mais e mais apenas para sentir a mesma coisa de novo. Tentar mudar seu padrão emocional é como passar pela retirada de uma droga.

Quando suas células não mais obtêm os sinais usuais do cérebro para sentir culpa, começam a expressar preocupação. Antes, corpo e mente trabalhavam juntos para produzir o estado de ser chamado culpa; agora você não está mais pensando e sentindo, sentindo e pensando do mesmo modo. Sua intenção é produzir pensamentos mais positivos, mas o corpo ainda está muito no embalo de produzir sentimentos de culpa baseados em pensamentos de culpa.

Pense nisso como uma espécie de linha de montagem altamente especializada. Seu cérebro programou o corpo para esperar uma peça que se encaixa no todo. De repente, você enviou outra peça que não se encaixa no espaço onde cabia a antiga peça de “culpa”. Um alarme dispara, e toda a operação é paralisada.

Suas células estão sempre espionando o que está acontecendo no cérebro e na mente; seu corpo é o melhor intérprete da mente de todos os tempos. Portanto, todas as células param o que estão fazendo, erguem o olhar para o cérebro e pensam:

O que você está fazendo aí em cima? Você insistiu em ser culpado, e nós seguimos suas ordens fielmente durante anos! Subconscientemente memorizamos um programa de culpa a partir de seus pensamentos e sentimentos repetitivos. Alteramos nossos pontos receptores para refletir sua mente – modificamos nossa química a fim de que você pudesse se sentir culpado automaticamente. Mantivemos nossa organização química interna, independentemente de quaisquer circunstâncias externas em sua vida. Estamos tão acostumadas à mesma organização química que seu novo estado de ser parece desconfortável, não familiar. Queremos o familiar, o previsível, o que parece natural. De repente você vai mudar? Não aceitaremos isso!

Aí as células se aglomeram e dizem: vamos enviar uma mensagem de protesto para o cérebro. Mas temos de ser sorrateiras, pois queremos que pense que na verdade ele é o responsável por esses pensamentos. Não queremos que ele saiba que partiu de nós. As células então enviam uma mensagem marcada com URGENTE diretamente medula acima até a superfície do cérebro pensante. Chamo essa de “pista rápida”, pois a mensagem vai diretamente para o sistema nervoso central em questão de segundos.

Ao mesmo tempo em que isso está acontecendo, a química do corpo – a química da culpa – está em um nível baixo, pois você não está pensando e sentindo do mesmo modo. Mas essa queda não passa despercebida. Um termostato no cérebro denominado hipotálamo também emite um alarme que diz: os índices químicos estão caindo. Precisamos fabricar mais!

O hipotálamo então sinaliza o cérebro pensante para que reverta ao antigo esquema habitual. Essa é a “pista lenta”, pois demora mais tempo para as substâncias químicas circularem pela corrente sanguínea. O corpo quer que você retorne ao eu químico memorizado; por isso, influencia-o para pensar de forma familiar, rotineira. Assim, o corpo ativa as redes correspondentes de neurônios que dispararam e estiveram conectadas por anos, que são iguais à mente daquele sentimento.

Essas respostas celulares de “pista rápida” e “pista lenta” ocorrem simultaneamente. E em seguida você começa a ouvir a seguinte tagarelice de pensamentos em sua cabeça: você está cansado demais hoje. Você pode começar amanhã. Amanhã é melhor. Sério, você pode fazer isso mais tarde. E a minha favorita: isso não parece estar certo.

Se isso não funciona, ocorre um segundo ataque sorrateiro. O corpo- mente quer ficar no controle outra vez, por isso começa a implicar um pouco com você:

É compreensível que você se sinta um pouco mal neste momento. A culpa é do seu pai. Você não se sente mal por causa do que fez no passado? De fato, vamos dar uma olhada no seu passado para você poder lembrar por que é desse jeito. Olhe para você – você é um desastre, um perdedor. Você é patético e fraco. Sua vida é um fracasso. Você nunca vai mudar. Você é muito parecido com a sua mãe. Por que você simplesmente não desiste?

Enquanto você continua nessa “terrivelização”, o corpo tenta seduzir a mente para voltar ao estado inconscientemente memorizado. Em nível racional, isso é absurdo. Mas, obviamente, em algum nível é bom sentir-se mal.

No momento em que ouvimos essas subvocalizações, acreditamos nesses pensamentos e respondemos sentindo os mesmos sentimentos familiares, instala-se uma amnésia mental e esquecemos nosso objetivo original. O engraçado é que realmente começamos a acreditar no que o corpo está falando ao cérebro para nos dizer. Imergimos novamente naquele programa automático e retornamos a ser nosso antigo eu.

A maioria de nós consegue identificar esse cenário. Não é diferente de nenhum hábito que tentamos romper. Quer sejamos viciados em cigarro, chocolate, álcool, jogo, fazer compras ou roer as unhas, no instante em que cessamos a ação habitual, irrompe o caos entre o corpo e a mente. Os pensamentos que adotamos estão intimamente identificados com os sentimentos de como seria experimentar a indulgência. Quando cedemos

aos desejos, continuamos a produzir os mesmos resultados em nossa vida, pois mente e corpo estão em oposição. Nossos pensamentos e sentimentos trabalham um contra o outro, e, se o corpo tornou-se a mente, sempre seremos presas de como nos sentimos.

Enquanto usarmos sentimentos familiares como barômetro, como o retorno de nossos esforços para mudar, sempre nos dissuadiremos de novas possibilidades. Jamais seremos capazes de pensar maior do que nosso ambiente interno. Jamais seremos capazes de visualizar um mundo de possíveis resultados diferentes dos resultados negativos de nosso passado. Nossos pensamentos e sentimentos têm todo esse poder sobre nós.