• Nenhum resultado encontrado

CAPITULO III: IMAGINAÇÃO, PERCEPÇÃO E CULTURA: A CONSTRUÇÃO DA

3.3 CULTURA E ESCRITA: UMA TRADIÇÃO DE OLHAR REGIONAL

Chegamos agora à terceira etapa na qual se discute a paisagem em Oswaldo Lamar- tine de Faria. Esta via é direcionada teoricamente pela obra de Simon Schama, Paisagem e

Memoria (1990). Nesse livro o autor nos mostra seu argumento de que a paisagem é cultura

antes de ser natureza, ou seja, são os anseios e referências culturais que vão direcionar nosso olhar para um determinado cenário natural reconhecendo nele elementos de beleza, identidade, ou mesmo de desolação e tragédia. Em seu estudo Schama se aprofunda nas variadas paisagens

da história ocidental a partir de diversas formas de arte tais como pintura, escultura, arquitetura, além da literatura.

Na primeira parte do livro, Schama se dedica a um estudo da mata, ou das grandes e pequenas formações de árvores nas quais diversas culturas e sociedades encontraram uma espécie de lócus da sua identidade onde se concentram as essências e suas características mais nobres. Seria o ponto zero da ancestralidade de seus habitantes, estes sujeitos “rústicos” seriam representantes de um estágio primitivo no qual homem e natureza comungavam de uma verda- deira paz.

Em seu texto Schama fala das florestas da Lituânia e de seus bisões que represen- tavam o sentimento de liberdade e voracidade daquele povo diante dos constantes ataques que sofreram durante sua história, sobretudo os perpetrados pela Rússia. Ele analisa ainda a impor- tância dos bosques ingleses para uma afirmação de liberdade no século XV ao XVIII. Além da tradição das matas germânicas que presenciaram o encontro explosivo entre os povos germâni- cos e os romanos.

Dentre todos os outros tipos de apreciação da paisagem, está é a que mais se so- bressai na obra de Oswaldo Lamartine uma vez que, muito do que está em suas páginas sobre o meio sertanejo vem de um processo de leitura de livros a respeito desta temática, que tem seu auge no período em que vive no Rio de Janeiro e fara dos sebos cariocas seus lugares de apren- dizado.

No livro Em alpendres d´Acauã: Uma conversa com Oswaldo Lamartine de Faria

(2001), Lamartine é perguntado sobre seus livros fundamentais, sua resposta foi esta:

Amigo, prefiro citar o que imagino de mais importante para o Nordeste, prin- cipalmente o sertão da caatinga. Os sertões (Euclides), Terra do Sol (Gustavo Barroso), Vaqueiros e cantadores, Civilização e cultura e Tradições da Pecu- ária nordestina (Cascudo), Capítulos da história colonial (Capistrano), Vidas secas (Graciliano), Guerreiros do sol (Frederico Pernambucano), paisagens das secas (Mauro Mota), A pedra do reino (Ariano Suassuna) e mais para perto das pancadas do mar, Casa grande e senzala (Gilberto Freyre) – lá se vão onze. (LAMARTINE DE FARIA, 2001, p.67-68).

Aqui podemos observar uma boa quantidade de obras citadas como fundamentais o que impõe a necessidade de escolha por eliminação daqueles que mais nos ajudam a trabalhar a temática dos espaços em Lamartine. A partir da leitura de todos estes livros chegamos à con- clusão de que os textos de Luís da Câmara Cascudo, Capistrano de Abreu, e Frederico Per- nambucano de Melo e Ariano Suassuna tem pouco a acrescentar a este estudo sobre uma cultura de percepção da paisagem sertaneja que buscamos aqui.

Nos textos de Cascudo, estes citados acima por Lamartine, temos a temática cultural se sobressaindo onde o autor explorou aspectos como o criatório, e a cultura popular dos can- tores assim como em Civilização e Cultura (1973) ele toma para si a tarefa monumental de estudar toda a trajetória humana em seus aspectos mais variados desde da domesticação dos animais e plantas até chegar nas tradições do folclore popular. Desta forma, apesar de colocar em muitas passagens o Sertão como uma região de seu bem querer, berço de mais bela cultura nacional, ele oferece poucas descrições sobre esse meio ambiente.

Capistrano de Abreu por sua vez tem em Capítulos de História Colonial (2000) uma preocupação de, como o nome do seu livro indica, narrar aspetos da colonização do Brasil. Entre os capítulos está um que se refere a ocupação dos sertões, termo usado aqui para definir as áreas não exploradas na colonização que seriam desbravadas pelos bandeirantes. Dentro desse amplo território estavam os sertões secos que compreendiam a região que muito tempo depois seria chamada de Nordeste. Então ao analisarmos seu texto, especialmente neste capitulo observamos que sua atenção é voltada para a narração de fatos e acontecimentos utilizando-se para isso os relatos dos homens daquele período não sendo possível notar alguma investigação mais ampla sobre o tema da paisagem sertaneja a não ser sobre breves comentários a respeito das dificuldades impostas pelo meio como a falta de recursos alimentares entre outros a serem adquiridos a grande custo.

Já mostramos no primeiro capítulo desta pesquisa quão forte e importante foi a re- lação de amizade entre Ariano Suassuna e Oswaldo Lamartine, ficou claro para nós que os dois dividiam sofrimentos semelhantes e uma mesma perspectiva a respeito do passado, da família e do Sertão. É importante lembrar, contudo, que os dois escrevem suas obras quase que em concomitância o que dificulta pensar em como a leitura de um poderia ser percebida no texto do outro.

No caso do romance A pedra do reino (2012), publicado originalmente em 1971, é possível verificar que neste momento Oswaldo Lamartine já havia publicado várias de suas obras como Notas sobre pescaria de açudes (1950), A caça nos sertões do Seridó (1961), e

Conservação de alimentos nos sertões do Seridó (1965). Isto de forma alguma descarta o fato

de que ambos estão alinhados a uma tradição de olhar e narrar a paisagem sertaneja, fato que se pode confirmar facilmente na leitura de A pedra do Reino (2012) na qual pudemos observar elementos correntes desta tradição como a descrição da terra esturricada, do sol, das plantas retorcidas e do meio cinzento. Portanto, em um sentido de prioridade vamos ter que deixa-lo de lado em detrimento de outros autores que identificamos ter contribuído mais para a construção de paisagem em Lamartine.

Por último o texto de Frederico Pernambucano, um dos mais jovens escritores den- tre estes citados por Lamartine. Em Guerreiros do sol (2011) ele investiga o cangaço de Lam- pião e seu bando buscando entre outras coisas demonstrar que a tese de que o banditismo desta e de outras figuras da mesma natureza não se indispunha com o poder dos coronéis, mas em muitos casos, era um de seus mais violentos colaboradores. Sobre o espaço, apesar de haver sim algumas considerações sobre o Sertão, poucas delas podem ser aproveitadas para nosso estudo já que julgamos não serem tão relevantes para se compreender a questão da paisagem em Lamartine, basicamente, não consideramos que este seja um livro referencial para Lamar- tine neste aspecto de sua obra.

Selecionamos entre essas obras que Lamartine leu ou sobre as quais escreveu, cinco livros que, segundo nossa perspectiva, são importantes para perceber certos aspectos da paisa- gem sertaneja apresentada por esse autor. São eles: Os sertões (2002) de Euclides da Cunha25 publicado originalmente em 1902; Terra do Sol (1962) de Gustavo Barroso26 com primeira

25 Seu nome de batismo é, Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha, nasceu em Cantagalo, Rio de Janeiro,

em 20 de janeiro de 1866, e faleceu no Rio de Janeiro em 15 de agosto de 1909. Foi engenheiro militar, jornalista, ensaísta e historiador. Frequentou a Escola Militar da Praia Vermelha um dos centros de irradiação de ideias republicanas localizada no Rio de Janeiro. Foi professor e jornalista escrevendo regularmente para vários jornais como A Província de S. Paulo. Foi em função de um desses artigos onde explanava sobre a questões da Guerra de Canudos que ele foi chamado por José de Mesquita para ser o enviado do jornal Estado de São Paulo para cobrir em 1897 a última das quatro excursões ao povoado de Canudos quando se realizou um dos maiores massacres militares da História do Brasil (BETTIOL; HOHLFELDT, 2011).

26 Gustavo Barroso nasceu em 29 de dezembro de 1888 em Fortaleza estudou em instituições como o

Paternon Cearense e o Liceu do Ceará e ao concluir os estudos básicos ingressou na Faculdade de Direito do Ceará em 1907 da onde saiu em 1912. Como nos relata Moreira (2006), é bem cedo que Barroso desenvolve atividade intelectual ligada sobretudo ao jornalismo escrevendo para O Jornal do comercio em 1911 para a revista Fon – Fon em 1910 e para A República em 1906. Participou da Academia Bra- sileira de Letras a partir de 1923 e no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1931. Além disso merece destaque seu período como diretor do Museu Nacional em 1922. Contudo, o aspecto mais co- nhecido de sua biografia seja talvez a sua participação no Movimento integralista durante a década de 1930. Gustavo Barroso foi também um dos componentes do movimento folclorista que teve maior rele- vância a partir do século XX como relata Albuquerque Junior (2013).

publicação em 1912; Paisagem das secas (1952) de Mauro Mota27 e por fim Calvário das secas

(2009) de Eloy de Souza28 primeiro publicado em 1938.

Oswaldo Lamartine adentra nesta tradição de olhar da paisagem sertaneja a partir especialmente de seus livros Sertões do Seridó (1980) e Notas de Carregação (2001) duas com- pilações de textos originalmente publicados em separado sendo o primeiro composto por en- saios e o segundo por artigos de jornais como o Tribuna do Norte.

Os textos presentes nestas publicações foram escritos em um período de sete déca- das, de 1941 até 2000, contudo, a produção de Lamartine não foi uniforme, pois, as décadas mais prolificas de seu trabalho foram as de 60 70 e 80. São as décadas que passa em seu “exilio” no Rio de Janeiro frequentando os sebos em companhia de amigos, colegas livreiros e bibliófi- los além de suas constantes lembranças dos amigos e familiares que se foram levados pela moça caetana. É a partir deste estado e coisas que nosso autor foi capaz de criar imagens do seu Sertão encontrando-o entre suas memorias de criança e as constantes leituras.

Ao compararmos os textos de Lamartine ao dos autores por ele citados, semelhan- ças importantes podem ser encontradas no modo de abordar a paisagem e a relação do humano com esta. Euclides da Cunha, é relevante por ser justamente um dos primeiros e mais impor- tantes referenciais sobre essa temática. Segundo Lamartine seu contato com o texto Euclidiano se dá já com “barba na cara” o que pode ter sido no começo de sua vida adulta uma vez que o livro figura entre as referências mais frequentes em seus escritos. Gustavo Barroso é outra grande referência de Lamartine presente em abundância em seus livros. Seu contato com o autor

27 Seu nome completo é Mauro Ramos Mota de Albuquerque nascido em 1911 no Recife, Pernambuco

passou sua infância no município de Nazaré da mata localizado na região da zona da mata pernambucana onde entrou em contato com a cultura dos engenhos (NETO, 2004). Segundo sua biografia, disponível no site da Academia Brasileira de Letras teve formação nas escolas Dom Vieira e Colégio Salesiano e Ginásio do Recife. Concluindo os estudos básicos vai para a Faculdade de Direito do Recife. Em sua carreira intelectual Mota atuou nos jornais pernambucanos Diário da Manhã e Diário de Pernambuco a partir de 1941 (AMARAL, 2018). O perfil mais conhecido da carreira de Mota é a sua produção poética onde destaca-se suas Elegias publicadas em 1950.

28 Eloy de Souza, político e intelectual norte-rio-grandense. Nasceu no dia 04 de março de 1873. Sua

carreira política começou com o mandato parlamentar de 1894, e daí por diante foram mandatos conse- cutivos alternado entre a Câmara dos Deputados e o Senado. Nestes ambientes Eloy de Souza vai de- senvolvendo sua oratória, elemento indispensável para políticos de sua natureza sobretudo nos aprofun- dados debates em plenário como aponta Ítala Silva (2018). Da tribuna, ele proclamou discursos que acenavam ao problema das secas no Sertão nos quais empenhou sua oratória e conhecimentos a favor de um projeto que pudesse dar fim aos problemas que se conferiam em decorrência desse fenômeno climático. Para além da atividade política, Eloy de Souza também produziu alguns escritos entre os quais estão, Costumes Locais (1909) e em Memorias de um velho (1975). Eloy de Souza tornou-se membro da Academia Norte-rio-grandense de letras na cadeira número 15 que tinha como patrono, seu mestre e amigo Pedro Velho. Além disso teve grande participação no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte do qual foi um dos membros fundadores em 1902.

cearense se deu ainda bem jovem quando estudava no Ginásio do Recife durante a década de 1930.

Eloy de Souza, por sua vez foi, de todos eles, uma figura mais próxima de Lamar- tine por ser amigo e colega político de seu pai Juvenal Lamartine. Os dois autores compartilha- vam de amor profundo pelo Sertão eloquentemente expressado em obras como Costumes Lo-

cais (1909) e Sertões do Seridó (1980). Lamartine ajudou no processo de reedição do livro Memorias (2008) de Souza e foi ele que em um sebo do Rio de Janeiro encontrou Costumes Locais (1909) e possibilitou sua publicação pela Coleção Mossoroense em 1982. Lamartine

ainda o cita em Sertões do Seridó para falar da importância dos açudes, temática régia defendida por Eloy de Souza em sua carreira política e intelectual. Isto posto passamos a elencar os pontos de aproximação entre os textos destes autores e os de Oswaldo Lamartine de Faria.

O primeiro aspecto recorrente na tradição de olhar regional, que estará presente na escrita de Lamartine, é o que chamaremos de ‘percurso de entrada’, ou seja, é aquele momento em que o autor descreve as primeiras impressões de um dado território geralmente em contra- posição a seu ponto de partida. Sendo assim o Sertão é desvendado em sua profunda diferença para com as paisagens mais próximas ao litoral. Um exemplo icônico disto é o que faz Euclides da Cunha em seu livro Os Sertões.

Está sobre um socalco do maciço continental, ao norte. Demarca-se de uma banda, abrangendo dois quadrantes, em semicírculo, o rio São Francisco; e de outra, encurvando também para sudeste, em uma normal a direção primitiva, o curso flexuoso do Itapicuru-açu. Segundo a mediana, correndo quase para- lelo entre aqueles, com o mesmo descambar expressivo para a costa, vê-se o traço de um outro rio, o Vaza –Barris, o Irapiranga dos tapuias, cujo trecho de Jeremoabo para as cabeceiras é uma fantasia de cartógrafo. De fato, no estu- pendo degrau, por onde descem para o mar ou para jusante de Paulo Afonso as rampas esbarrancadas do planalto, não há situações de equilíbrio para a rede hidrográfica normal. Ali reina a drenagem caótica das torrentes, imprimindo naquele recanto da Bahia fácies excepcional selvagem. (CUNHA, 2002, p.36).

Além de Cunha outros autores se utilizam desse artificio como por exemplo Gus- tavo Barroso em Terra do Sol (1912)29. Cunha trabalha em seu texto com o percurso que vai do planalto central do Brasil para o alto Sertão da Bahia, Barroso conduz sua narrativa a partir das praias do Ceará rumando para o Sertão.

Lamartine usa esse modelo para descrever uma viagem que sai da cidade do Natal, no litoral norte-rio-grandense, e vai se afastando até chegar no Sertão do Seridó.

29 (BARROSO, 1962.p. 17).

Quem sai da cidade do Natal pelo Bairro das Quintas e dá as costas para o mar tomando o rumo do Sertão – segue a velha estrada – tronco na qual os técnicos, de tempos em tempos, fazem a plástica das curvas, das rampas e do piso, ba- tizando-a cada vez com siglas ou nomes estrangeiros aqueles mundos. Ro- dando no asfalto que se espicha léguas adentro, cobrindo os primitivos cami- nhos de terra solta ou piçarrados, vai-se comendo chão. Para trás, fica o cheiro das vacarias e, depois, o da maresia do Potengi. De banda vão ficando dunas, o rio, os tabuleiros de mangueiras, para mais adiante se cortar a cidade de Macaíba. Daí, em direção de As Marias, o chão vai ficando mais barrento e mais trancado com a vegetação agreste – é o marmeleiro, a sarjadeira, o ve- lame e a macambira fazendo a saia das raras essências de maior porte que escaparam, só Deus sabe por que, ao gume do machado e á coivara. Os fachei- ros se destacam ... De as Marias a Bom Jesus de panelas é um pulo. Vem depois Caiada de baixo e o chão se despindo na caatinga nos arredores de Serra Caiada. A encruzilhada de outro caminho fez nascer o Riacho. Sobe –se em procura de Santa Cruz do Inharé; ali, em quilômetros, a estrada é um cor- redor de paredes verdes pela cor do aveloz que tampa, ladeira acima e abaixo, as cercas divisórias. (...). (LAMARTINE DE FARIA, 2001, p.51).

Observamos aqui tanto uma atenção na construção de um cenário quanto uma pre- ocupação sensorial ao descrever alguns dos cheiros que se pode esperar daqueles espaços. A linha narrativa é bem evidente e seque para além deste trecho destrinchando em minucias os diversos aspectos destes três ambientes, o litoral, o agreste e por fim o Sertão. Também perce- bemos em nossa leitura, que a medida que se distancia das “bandas do mar” a terra torna-se menos dadivosa, ela é desnuda e emergem as grandes pedras características da paisagem do Sertão seridoense, como Lamartine nos diz, este é o espaço onde “domina o espinho” atestando assim a dureza do meio ambiente narrado.

Outro ponto marcante das narrativas sobre a paisagem sertaneja é referente aos ex- tremos do clima na região. A seca é um dos elementos que, comumente, mais caracteriza o meio ambiente do Sertão nordestino, é ela que dá ao cenário a aridez e produz nos homens e animais uma das maiores calamidades naturais que se pode observar no Brasil. Não é à toa portanto, que autores como Euclides da Cunha30, Gustavo Barroso31 e Mauro Mota32 e Eloy de Souza tenham dado bastante ênfase nas descrições sobre a seca por motivos diversos.

Para Souza, narrar as agruras do meio fazia parte da construção de um discurso político que pretendia, efetivamente, angariar recursos para obras públicas na região das secas, enquanto também servia para produzir uma unidade em torno dos estados afetados pelo evento climático dando os primeiros passo para a formação da região Nordeste (SILVA,2018). Para

30(CUNHA, 2002.p.69-70). 31 (BARROSO, 1962, p.39). 32 (MOTA, 1958, p.41).

Cunha observamos o espanto do viajante ao se deparar com uma nova realidade. Em Mota e Barroso por sua vez o que se destaca é a elaboração de uma escrita poética que busca transmitir a tragédia daquele espaço.

Barroso é exemplar neste sentido, ele nos apresenta um quadro detalhado o drama telúrico e suas principais consequências para a vida do sertanejo. Sua escrita narra sobre a de- solação da paisagem e sobre a deterioração dos animais tanto os silvestres quanto os domésti- cos. Sua linguagem possui um tom poético e sensível a tudo que descreve.

Todo o sertão é duma grande tristeza, na cor, no silencio, no aspecto; e essa tristeza em tudo se infiltra e impregna tudo; um galho que range de encontro a outro lembra um gemer de moribundo; o estalar crepitante dos gravetos pi- sados por qualquer animal parece um soturno falar de avantesmas; um canto de pássaro, um alto pio de ave de rapina, um guincho de pixuna, tudo é triste e tudo é melancólico. Qualquer som que quebra o silencio parece mais triste que o próprio silêncio. Da terra cor de oca, avermelhada, da argila granitada de grossa sílica. Dos granitos rompendo a terra em pontas que se adunam e deteiam desajeitadas, esparsas, ás vezes rubras, outras branquicentas, outras sujas, turvas, quase sempre inclinadas para resistirem à erosão das águas, de- preende-se um bafo da quentura armazenada; e o barro de louça, o tijolo, o massapê cinzento das várzeas, já todo estriado, abre-se (BARROSO, 1962, p.18).

Ao refletir sobre este fenômeno tão presente na vida sertaneja Lamartine se apro- xima muito destes autores é uma descrição do meio ambiente sertanejo, de sua natureza, em uma dinâmica cíclica em dois extremos bem definidos, a seca e o inverno. Nestes dois polos são observados fenômenos impactantes tanto para o belo quanto para o feio. Este ponto é com- partilhado por Euclides da Cunha33 e Gustavo Barroso34 e por Mauro Mota.

A vegetação é espinhenta, retorcida, agressiva, parecendo mesmo torturada, no dizer euclidiano. Dominam as cactáceas outras formas xerófilas que estam-