Culturas políticas e práticas culturais características da cibercultura

A hipótese principal desta pesquisa é a de que estão sendo produzidas culturas políticas, no sentido de políticas culturais (DAGNINO et all, 2001), características da era cibercultural, especialmente, aquelas que emergem das relações horizontais que as redes hiperconectadas, no mais profundo e amplo sentido do termo, representam. Diante dessa premissa de pesquisa, resta procurar delimitar a cultura política emergente, em especial, na constelação política pesquisada com mais intensidade: os Novads.

Diante da riqueza empírica que o campo de pesquisa possibilitou, a questão central que norteia o processo investigativo, situa o olhar do pesquisador sobre o campo da sociologia política, impondo a necessidade de, num esforço de artesanato intelectual, compor o entendimento de cultura política em rede, que vem sendo construído pelas práticas e saberes das constelações políticas, ainda sem a necessária sistematização por parte desta verdadeira teia contemporânea de movimentos sociais que hibridiza e amplia a experiência política da vida social ao mundo virtual .

Assim, para configurar a cultura política comum a mais de uma constelação, que compõem a rede de movimentos, se faz necessário estabelecer alguns parâmetros e elementos comuns entre as constelações pesquisadas, entre as quais estão os Novads, o 15-M e o Ocupa Sampa. Como a netnografia e a convivência como membro do grupo se deu com os Novads, os elementos culturais produzidos pelo grupo serviram de parâmetro para se estabelecer correlações possíveis daquilo que poderia caracterizar uma cultura política mais geral compartilhada entre as constelações heterogêneas que fazem parte dessa rede de movimentos.

A configuração atual e o modus operandi dos atores sociais contemporâneos é a articulação em redes descentralizadas e interativas, que surgem no cenário internacional, no início do século XXI, constituindo grupos organizados por conexões transnacionais e multiculturais. Uma das características da forma organizacional nessas redes é a formação em

células autônomas que, ao sinal de ameaça, se “desprendem” da rede, inspiradas nas estratégias

utilizadas por grupos islâmicos anticapitalistas. Estes pequenos grupos, que aqui assumem a denominação de constelações podem também assumir relacionamentos interorganizacionais análogos a uma tecnologia descentralizada de arquivamento e distribuição de dados, denominada de “ponto-a-ponto” ou peer-to-peer, em inglês, cuja abreviatura é P2P.

Processos sociais peer-to-peer são interações com uma dinâmica ponto-a-ponto, sendo esses pares seres humanos, indivíduos, grupos ou computadores. Este é um termo que se originou a partir do conceito popular da arquitetura de aplicativo de computador distribuído que divide tarefas ou cargas de trabalho entre pares. Esta estrutura de aplicação foi popularizada por sistemas de compartilhamento de arquivos como o Napster54, o primeiro de seu tipo no final de 1990. O conceito tem inspirado novas estruturas e filosofias em muitas áreas de interação humana. A dinâmica humana ponto-a-ponto proporciona um olhar crítico sobre as estruturas sociais autoritárias e centralizadas atuais. P2P é também um programa político e social para aqueles que acreditam que, em muitos casos, os modos de peer-to-peer são uma opção preferível de sistema decisório e de relações políticas horizontalizadas.

No campo da matemática, mais especificamente da teoria dos conjuntos, a interseção é um conjunto de elementos que, simultaneamente, pertencem a dois ou mais conjuntos. As interseções e características comuns das principais constelações da rede, especialmente as constelações políticas OWS, 15M e Ocupa Sampa ‒ que no âmbito das ciências sociais e do objeto de estudo corresponderiam analogamente aos conjuntos ‒ apresentam convergências e de características comuns, formas e dinâmicas organizacionais, a despeito da imensa heterogeneidade dos atores e do amplo espetro político que as definem.

As características gerais e comuns dessa cultura política emergente foram, até aqui, apontadas na medida em que as questões que afetam a todos o nodes da rede, que correspondem a diversas camadas que se interpõem na análise: a indivíduos, em última instância (ativistas e suas subjetividades); a constelações políticas em uma segunda camada (grupos sociais como os Novads, por exemplo, que formam o primeiro nível da rede, um cluster de nível zero), a movimentos sociais, na camada seguinte (movimento feminista, por exemplo) e as suas correlações com correntes de pensamento político ou ideológico numa camada mais superficial e geral (marxismo, anarquismo, etc.); e, por último, as camadas das redes de movimentos (Occupy Wall Street, 15M, Ocupa Sampa, etc.).

Sendo que esta última camada pode estar sobreposta a outras constelações de redes de movimentos em uma escala maior, como a que venho denominando redes de movimentos

54 _{Napster, criado por Shawn Fanning e seu co-fundador Sean Parker. Foi o programa de compartilhamento de}

arquivos em rede P2P criado em 1999, que protagonizou o primeiro grande episódio na luta jurídica entre a indústria fonográfica e as redes de compartilhamento de música na Internet. Compartilhando, principalmente, arquivos de música no formato MP3, o Napster permitia que os usuários fizessem o download de um determinado arquivo diretamente do computador de um ou mais usuários de maneira descentralizada, uma vez que cada computador conectado à sua rede desempenhava tanto as funções de servidor quanto as de cliente. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Napster.

sociais antissistêmicos, que é composta por todas as constelações, movimentos e redes de

movimentos que estão ligados por um ato fundacional histórico e que se manifestam nas formas

rizoma, ocupação, diáspora e constelações. A rede de movimentos sociais antissistêmicos,

designa a rede que une todas essas camadas que partilham geneticamente aos eventos fundacionais, especialmente as formas ocupações que ocorreram no Zuccotti Park, (OWS), nos Estados Unidos, na Puerta del Sol (15M) em Madri, na Espanha e no viaduto do Vale do Anhangabaú (Ocupa Sampa e outros) ou as revoltas juninas (MPL e outros) no Brasil.

4.2. Os movimentos da modernidade e as perspectivas do hibridismo cultural na ótica de