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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.2 Estudo 2 – O funcionamento de linguagem e do processo de amadurecimento

4.2.1 Díade M1-B1

No quadro 19, sintetizam-se as ocorrências da díade M1-B1 partindo das categorias enunciativas desenvolvidas para esta Tese.

Categoria 1ª Etapa (21 dias) 2ª Etapa (80 dias) 3ª Etapa (111 dias)

Narrativa materna partindo da demanda do bebê Homologia Mãe-bebê

Interpretância - 2 7

- 2 7

Narrativa materna com gesto homólogo 6 1 2

Fala com bebê: com manhês sem manhês

5 - 2

4 - -

Fala sobre o bebê 8 3 5

Interpretação não verbal - - 1

Contato não verbal - 2 2

Vocalização NI, NII, NIII - - -

Gesto/choro do Bebê - 2 8

Observa-se em M1 que, no transcorrer das etapas, houve uma redução da narrativa materna com gesto homólogo, e o aumento da homologia entre sistema semiótico verbal materno e sistema semiótico não verbal do bebê, fato que pode advir do aumento do repertório de expressões não verbais do bebê, relativos ao seu processo de amadurecimento. Por essa razão, a interpretância também aumenta, já que depende da homologia e da expressão do bebê.

Mesmo nas filmagens em que M1 não fala com o bebê (2ª Etapa) ou fala pouco (3ª Etapa), ela fala sobre o bebê e mantém contato não verbal, o que demonstra que ela permanece atenta e interessada. O contato não verbal e a interpretação não verbal são caros a esta Tese, ainda que não envolvam a fala, por representarem a sintonia da mãe com o bebê, a dedicação dela e o cuidado que ela está disposta a prover. O primeiro se refere às situações em que a mãe interpreta o comportamento do bebê e responde gestualmente, e o segundo as situações em que a mãe interage gestualmente com o bebê, sem que ele tenha demandado, fazendo carinho, beijando ou arrumando a roupa, por exemplo. Todos esses elementos demonstram o comportamento adaptativo da mãe com relação ao bebê e compõem a experiência mãe-bebê de mutualidade.

Retomando a história do caso, lembra-se que M1 é uma jovem mãe que sofria por condições precárias de moradia, financeiras e dificuldades em sua relação conjugal. Na coleta da primeira etapa, M1 estava emocionada com o nascimento do seu filho e parecia não se incomodar com os sérios problemas que já enfrentava. Aparentemente, o bebê havia nascido para renovar as suas esperanças e ajudá-la a superar a morte recente de sua mãe.

Já na segunda etapa da coleta M1 aparentava apatia, desesperança e mencionava a sua tristeza pelo fracasso na sua relação conjugal e medo de não conseguir prover o cuidado necessário a B1. Nesse encontro, ela permaneceu mais tempo calada, o que é representado pelos números no quadro 19. Na última etapa, M1 falou muito sobre a falta que sentia de sua mãe, sobre como era difícil não ter para onde ir quando ela se desentendia com P1 e ponderou a possibilidade de ir residir com uma tia sua que morava na região metropolitana do estado. Somente depois de relatar sobre a sua tristeza e sensação de desamparo, ela conseguiu voltar- se para o bebê e seguiram-se os três minutos de filmagem analisados. O bebê estava mais ativo e sorridente e todos os seus gestos eram interpretados por M1. Percebeu-se, portanto, que a cena analisada sofreu os efeitos da escuta que o pesquisador pode dar a mãe, ou seja, ela pode voltar-se mais ao bebê depois de ser escutada e acolhida em sua angústia.

No quadro apresentado, a seguir, está a síntese dos comportamentos do bebê e da mãe, partindo da escala de Saint-Georges et al. (2011):

Bebê 1ª Etapa (21 dias) 2ª Etapa (80 dias) 3ª Etapa (111 dias)

Comportamentos com objetos - - -

Orientação a pessoas - 2 1

Receptividade a pessoas - 1 3

Busca pessoas - - -

Intersubjetividade - - -

Vocalização - - -

Mãe 1ª. Etapa 2ª. Etapa 3ª. Etapa

Gestos e demonstrações - - -

Regulação excitando - - -

Regulação excitando verbal - - 1

Regulação excitando não verbal - - 1

Regulação acalmando - - -

Regulação acalmando verbal - - -

Regulação acalmando não verbal - - -

Toque - - -

Vocalização 9 - 2

Quadro 20 – Síntese dos comportamentos da Escala Mãe-Bebê (SAINT-GEORGES et al., 2011), M1B1.

Na primeira etapa, B1 ainda não havia completado 1 mês de idade e M1 fala com B1 e sobre ele, por sete vezes, mas o bebê não gesticula, nem chora. Já na segunda etapa de análise, B1 havia completado 2 meses e 20 dias de idade e estava mais ativo, olhando para as pessoas que o rodeavam. A cena analisada inclui a amamentação e um minuto posterior a ela. Na última etapa, B1 estava com 3 meses e 21 dias e a cena analisada contemplou 1 minuto de amamentação e dois de interação. Nos últimos minutos, M1 segurou o bebê em pé, em seu colo, e o bebê aparentou vivacidade e interesse pelos sons e pelas pessoas.

Em todas as cenas o bebê estava no colo de M1, portanto, o toque não foi observado como forma de chamar a atenção do bebê. Além disso, B1 não chorou, tampouco demonstrou desconforto ou sono durante as filmagens, o que justifica o não uso da regulação para acalmar o bebê. Do mesmo modo, não há o registro de comportamento do bebê com objetos, porque esses não foram espontaneamente oferecidos ao bebê pela mãe.

Portanto, pode-se perceber nesse quadro, que a orientação e receptividades a pessoas estão presentes desde os 80 dias do bebê, demonstrando que o interesse pelo outro humano estava presente nesse bebê desde cedo. Chama a atenção que as vocalizações ainda estão ausentes no bebê, mesmo na terceira etapa, quando ao menos vocalizações de Nível I já seriam esperadas. Quando questionada a respeito das vocalizações do bebê, M1 respondeu que ele conversa bastante e exemplificou dizendo que ele fala “Aaaa, anguuuu”, o que não foi

observado pela pesquisadora. Ainda assim, o bebê demonstrou-se muito receptivo às pessoas, sorrindo para a pesquisadora nos três momentos em que foi provocado por ela.

Já a mãe demonstrou comportamentos que indicam a experiência mãe-bebê de mutualidade, como a homologia, interpretância, interpretação não verbal, contato não verbal, a fala sobre o bebê e com o bebê (expostos no quadro 19), a regulação e a vocalização (expostos no quadro 20). Observa-se que ocorrência de comportamentos do quadro 19 é grande, o que sugere que as categorias de análise inferidas, partindo dos conceitos propostos nesta Tese podem ser efetivas para a identificação de comportamentos que se referem à sintonia e experiência de mutualidade na relação mãe-bebê, que se manifestam em cenas enunciativas.