• Nenhum resultado encontrado

Da importação, pelo Direito Administrativo, da eficiência da Ciência da

CAPÍTULO 1. EFICIÊNCIA

1.1. Introdução da eficiência no ordenamento jurídico pátrio

1.1.3. Eficiência na Ciência da Administração

1.1.3.2. Da importação, pelo Direito Administrativo, da eficiência da Ciência da

A administração do Estado recebe do ordenamento jurídico a indicação de seus objetivos, mas sua atuação se desenvolve por meio da utilização de numerosas técnicas, que buscam a eficácia na obtenção e no emprego dos recursos adequados para a satisfação das necessidades coletivas.

Nessa atuação existe uma zona metajurídica de atividades política e técnica na qual os órgãos administrativos se movem com liberdade, “consoante as conveniências e as oportunidades inspiram ou as regras de eficácia determinam”83.

A normatização da eficiência foi extraída dessa atividade metajurídica. A eficiência, como conceito, há muito tempo já existia nos estudos da ciência administrativa. Em linhas gerais, é expressada como a melhor forma de utilização dos recursos disponíveis, isto é, como a otimização da relação meio-fim.

80CAETANO, Marcello. Manual de direito administrativo. 10. ed. 8. reimp. Coimbra: Livr. Almedina, 2005.

v. 1, p. 58-59 e 60.

81RIVERO, Jean. op. cit., p. 24.

82ARAÚJO, Edmir Netto de. Do negócio jurídico administrativo. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,

1992. p. 60.

A partir do momento que determinada técnica ou instituto ingressam no ordenamento jurídico, tornam-se obrigatórios, de forma que a análise de seu conteúdo passa a ter importância jurídica na medida em que parametriza uma conduta exigível.

As técnicas existentes na Ciência da Administração, embora importantes, foram desenvolvidas para serem aplicadas no âmbito de mercado privado e, por isso, não podem ser aplicadas ou simplesmente transferidas para o âmbito da Administração Pública. Existem diferenças intransponíveis entre os dois segmentos que merecem ser destacadas. A forma de auferir recursos para a consecução dos seus respectivos fins, por exemplo, é completamente diferente em um e outro setor. No âmbito privado, extraem-se recursos diretamente do mercado, por meio de seus clientes, por meio do processo de intercâmbio entre bens ou serviços por dinheiro, da relação entre oferta e demanda. No âmbito público, a obtenção de recursos se realiza por meio do sistema tributário, no qual nem sempre quem paga é quem vai utilizar o bem ou o serviço; toda a coletividade contribui para o financiamento dos objetivos do Estado84.

Observa, ainda, José Afonso da Silva:

Na Administração Pública as condições de eficiência são diferentes porque, em relação aos bens públicos, vale o princípio de não exclusão, isto é, o consumo da parte de um agente econômico não exclui a possibilidade que outros consumam contemporaneamente o mesmo bem; enquanto no caso dos bens privados cada um consome diversas quantidades ao mesmo preço, no caso dos bens públicos (p. ex., a defesa nacional), todos consomem a mesma quantidade atribuindo-lhes valores diferentes.85

Na atividade privada, na qual a finalidade principal é a obtenção de lucro, o instituto da eficiência possui como conteúdo o aumento no número de clientes e a redução do custo da produção. Tais finalidades em nada se relacionam com os objetivos do Estado que visam o alcance do bem comum e uma atuação que garanta o mínimo suficiente para o desenvolvimento das personalidades e a convivência em sociedade, mediante o atendimento de diversas finalidades públicas ramificadas. O critério para a verificação da eficiência pública seria, então, a medida da satisfação dada ao bem comum, isto é, o nível de atendimento dos objetivos constantes do ordenamento jurídico, algo impassível de ser

84Nesse sentido: SANCHO ROYO, David. Gestión de servicios públicos: estrategias de marketing y calidad.

Madrid: Tecnos; Universitat Pompeu Fabra, 1999. p. 24.

85SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 32. ed. rev. e atual. (até a Emenda

mensurado ou avaliado objetivamente86.

Assim é que, dadas as diferenças entre os dois segmentos, não se pode concluir em hipótese alguma que o conceito de eficiência foi transplantado integralmente para a norma, não devendo tal instituto ser utilizado na forma e nos termos em que desenvolvido na Ciência da Administração. Nesse sentido, Onofre Alves Batista Júnior:

Na realidade, o que a Constituição juridicizou foi o Princípio Constitucional da Eficiência, de contornos jurídicos; entretanto, isso não quer dizer que o Direito tenha absorvido in totum as regras técnicas da Ciência da Administração em seu âmago. Os referenciais de eficiência não foram rigidamente juridicizados, e da mesma forma as regras de organização e administração da Ciência da Administração não foram incorporadas tal e qual ao mundo jurídico.87

Tal autor, com o qual concordamos, registra, ainda, que não é possível a utilização dos princípios e regras de organização e administração desenvolvidos pela Ciência da Administração para traçar o alcance de princípios jurídicos (de eficiência), também porque a própria Ciência da Administração reconhece a impossibilidade de se desenvolver princípios e regras infalíveis ou que tenham vetores exatos88.

Por outro lado, não há como afastar a aplicação, ao âmbito público, das conquistas e dos avanços da Ciência da Administração, que podem, sem dúvida, contribuir muito para o aperfeiçoamento da atuação administrativa. Nesse sentido, o ideal é que haja a internalização das ideias privadas, sem que haja a transferência da integralidade desse regime para o âmbito estatal, adequando-o a suas peculiaridades, até porque, é bom lembrar, o direito privado sempre sofre parcial derrogação quando aplicado à Administração Pública.

No caso do instituto da eficiência, uma vez originado da Ciência da Administração, é certo que a acepção que possui naquela área possui relevância para sua compreensão. No entanto, deve-se extrair daquela ciência o aspecto geral que orientou a sua normatização com o fim de conferir o sentido mínimo para o instituto que se tornou jurídico.

Resumindo, uma vez que passa a ser objeto de norma jurídica, a técnica normatizada deixa a ciência administrativa para integrar o direito administrativo. Enquanto isso não

86Nesse sentido: BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Princípio constitucional da eficiência administrativa.

Belo Horizonte: Mandamentos, 2004. p. 201.

87BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. op. cit., p. 417. 88Id. Ibid., p. 416-417.

ocorre, é apenas objeto da ciência administrativa. É certo, entretanto, que a diferença não é tão simples, já que a ciência inspira o direito com suas regras e princípios e o direito inspira a ciência, também com suas regras e princípios. Trata-se de uma simbiose. Mas, quando as regras não são incorporadas ao ordenamento por opção política ou técnica e, por conseguinte, não são obrigatórias, não são, também, objeto de estudo do direito administrativo, sendo apenas diretrizes para o comportamento dos agentes, que podem escolher, dentro das melhores técnicas igualmente válidas, aquela que entender a melhor para a solução do caso.

Nesse campo, o que se observa é que, quando não incorporada ao direito, a escolha da técnica nada mais é que opção discricionária dos agentes. Depois de incorporada, passa a ser uma opção parametrizada.

Portanto, não cabe, neste trabalho, eleger a técnica mais eficiente para o desempenho das funções do agente público, cuja não observância acarretaria sua responsabilidade, porque isso se inseriria na Ciência da Administração, e não no Direito Administrativo. O que se pretende é estabelecer o conteúdo mínimo e alguns parâmetros que devem conduzir o exercício da função do agente público na busca da eficiência.

1.1.3.3. Conteúdo da eficiência na Ciência da Administração: eficiência, eficácia e

Documentos relacionados