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Das teorias da modernidade avançada ao estudo das redes sociais

Parte I – Referencial teórico

Capítulo 3 Das teorias da modernidade avançada ao estudo das redes sociais

Das teorias da modernidade avançada ao estudo das redes sociais

3.1. As teorias da modernidade avançada (ou reflexiva)

No centro das teorias da modernidade reflexiva foi discutido o poder, constantemente, crescente dos atores societais ou da ‘agência’ comparativamente à estrutura (Beck, Giddens e Lash, 2000). A tese destas teorias teve como afirmação essencial a progressiva independência da agência relativamente à estrutura, ou melhor, a imposição da estrutura para que a agência seja livre (Beck, Giddens e Lash, 2000). Segundo Ulrich Beck, Anthony Giddens e Scott Lash (2000, 189): “Na modernização reflexiva, as mudanças estruturais forçam a agência a libertar- se da estrutura, forçam os indivíduos a libertar-se das expectativas normativas das instituições da modernidade simples e a envolver-se na monitorização reflexiva dessas estruturas, assim como numa automonitorização na construção das suas próprias identidades.”.

Beck, Giddens e Lash (2000, 108) confrontaram, nestas mesmas teorias, a modernidade reflexiva com outras duas fases da história das sociedades19, de acordo com este confronto: “O que está aqui em questão já não é a justaposição directa e dicotómica de tradição e modernidade, tão querida pelos grandes clássicos da teoria sociológica – Weber, Durkheim, Simmel e Tönnies. O que está em questão é uma concepção em três fases da mudança social – da tradição à modernidade (simples), e daí à modernidade reflexiva.”20. Deste modo, segundo Beck (1999, 10):

19 À semelhança de Beck, Giddens e Lash, também Toffler (1980) propôs a ramificação da história das sociedades em três vagas (primeira vaga, segunda vaga e terceira vaga).

20 Giddens (1996) apresentou as fases da história das sociedades e descreveu os seus traços mais marcantes. As sociedades tradicionais ou as sociedades pré-modernas foram constituídas pela divisão estrutural entre ‘cidade’ e ‘zona rural’. As cidades foram locais particulares onde as estruturas políticas e económicas diferenciadas tiveram o seu centro, mas as zonas rurais foram o eixo da produção agrícola e foram estruturadas em redor de comunidades aldeãs autónomas, que apresentaram bastantes semelhanças com as das sociedades tribais, sendo a vida nas cidades

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“No que nós temos chamado a primeira modernidade, o problema de quem tem e quem não tem o direito à liberdade foi respondido com recurso a certos assuntos como a ‘natureza’ do género e da etnicidade; contradições entre os direitos universais e as realidades particulares foram estabelecidas por uma ontologia da diferença. Deste modo, até o princípio dos anos 1970, mesmo nos países ocidentais, às mulheres foram negados direitos civis, como os da propriedade e os dos seus próprios corpos. Na segunda modernidade, a estrutura da comunidade, do grupo, da identidade perdeu o seu cimento ontológico. Depois da democratização política (o Estado democrático) e da democratização social (o Estado de bem-estar) uma democratização cultural está a mudar os alicerces da família, das relações de género, do amor, da sexualidade e da intimidade.”.

Conforme defenderam Beck, Giddens e Lash (2000, 2): “Se a modernização simples (…) significa, no fundo, primeiro o descontextualizar e segundo o recontextualizar das formas sociais tradicionais pelas formas industriais, então, a modernização reflexiva significa primeiro a descontextualização e segundo a recontextualização das formas sociais industriais por outro tipo de modernidade.”. Consequentemente, Beck, Giddens e Lash (2000, 13) vieram defender, igualmente, que: “‘Individualização’ significa, primeiro, a descontextualização, e segundo, a recontextualização dos modos de vida da sociedade industrial substituindo-os por outros novos, nos quais os indivíduos têm que produzir, encenar e montar eles próprios as suas biografias.”. A individualização foi considerada o fautor da mudança social (Beck, Giddens e Lash, 2000). Segundo este contorno, a modernidade simples existiu enquanto moderna, no sentido em que a individualização já quebrou, grandemente, as antigas estruturas tradicionais – a comunidade aldeã, a família extensa, a igreja – da sociedade tradicional (Beck, Giddens e Lash, 2000). No entanto, ainda não existiu, completamente, como moderna, já que o processo de modernização percorreu apenas uma fração do caminho, porém, as novas estruturas típicas da modernidade simples – classes sociais, burocracia governamental, Estado de bem-estar, regras de trabalho taylorista, sindicatos – ocuparam a posição das estruturas tradicionais (Beck, Giddens e Lash, 2000). A completa modernização só emergiu quando, no âmbito da modernização seguinte, a agência também foi libertada, até dessas (simples) estruturas sociais modernas (Beck, Giddens e Lash, 2000).

Se quanto à modernidade simples foi notada uma subjugação, na modernidade reflexiva foi incluída uma capacitação dos indivíduos, se quanto à modernidade simples foi, igualmente, atribuído o cenário de normalização e atomização de Foucault, então, ao contrato reflexivo foi

independente da vida das zonas rurais (cf. Scott, 1995). A mudança das sociedades tradicionais para as sociedades modernas aconteceu no Ocidente com a transferência do feudalismo para o capitalismo (cf. Scott, 1995). Os finais do século XX eclipsaram certos aspetos da modernidade anterior, que têm sido substituídos por outros aspetos, e são observados como uma fase de modernidade tardia, radicalizada ou avançada ou, ainda, reflexiva (cf. Scott, 1995). Para Beck (1997, 15), modernização reflexiva “(…) é suposto significar a autotransformação da sociedade industrial (…), a desinserção e a re-inserção das suas dicotomias, certezas básicas, de facto, das suas antropologias; isto é, a mudança das fundações sociais da modernização da sociedade industrial pela modernização da sociedade industrial.”.

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conferida a individualização genuína ou a possibilidade de uma subjetividade independente dos enquadramentos naturais, sociais e psíquicos (Beck, Giddens e Lash, 2000).

Segundo Beck, Giddens e Lash (2000), é fulcral chamar à discussão a natureza bastante diferenciada das tradicionais estruturas sociais e das simplesmente modernas. Mesmo que em ambas tenha acontecido uma individualização não absolutamente desenvolvida, o seu conjunto de estruturas foi, extremamente, dissemelhante (Beck, Giddens e Lash, 2000). Noutros termos, enquanto das sociedades tradicionais decorreram estruturas comunais (na aceção giddensiana de ‘regras e recursos’), as sociedades da modernização simples supuseram estruturas coletivas, no interior das quais as relações comunais foram quebradas e o ‘nós’ já foi transformado num grupo de indivíduos atomizados e abstratos. Tratou-se, então, de uma coletividade que presumiu já o anonimato (Beck, Giddens e Lash, 2000). A individualização da modernidade avançada, ou reflexiva, libertou os indivíduos dessas estruturas coletivas e abstratas, tais como a família nuclear, a classe social, a nação e a crença integral na veracidade da ciência (Beck, Giddens e Lash, 2000).

Giddens usou, por conseguinte, o termo ‘distanciamento’ para traçar os processos que relacionam a agência e a estrutura com o desenvolvimento dos sistemas sociais (Parker, 2000). Quando os indivíduos usam as estruturas acionam, ou tornam presente, as interações e relações sociais, que, de outro modo, eram inexistentes ou virtuais (Parker, 2000). As regras e os recursos simplificam a relação entre as propriedades das situações de ação momentâneas, imediatas e proximais com o que é mais remoto no tempo-espaço (Parker, 2000). Os agentes não usam, simplesmente, as estruturas, mas usam as estruturas para alargar o seu poder de fazer a diferença no contexto do ‘distanciamento’, fugindo às condições que restringem as interações íntimas (Parker, 2000). Como argumentou Giddens (1996, 84): “As relações pessoais, cujo objectivo principal é a sociabilidade, informadas pela lealdade e pela autenticidade, tornam-se tanto parte das situações sociais da modernidade quanto as instituições globalizantes do distanciamento espacio-temporal.”. Noutro livro o autor explicou um dos aspetos desta questão: “Quando falo de solidariedade nas sociedades actuais, o termo não se pode referir a uma identidade nós/eles, ou simplesmente a uma inclusão erigida a partir de um sentimento de ‘nós’ da comunidade em relação ao país. A solidariedade ou a coesão social deve referir-se agora a redes, por vezes centradas nas localidades, mas amiúde mais dispersas (…)” (Giddens, 2007, 145).

Por conseguinte, no âmbito da discussão de reflexividade, Giddens e Beck estudaram a autorreflexividade (por meio da qual a agência se reflete sobre si mesma e o controlo prévio e heterónomo dos agentes é substituído pelo autocontrolo) na transição para o controlo autónomo

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das biografias (individualização) e das relações amorosas (sentimentalização) (Beck, Giddens e Lash, 2000). Giddens (1994), por exemplo, debruçou a sua atenção, particularmente, sobre os modos como os agentes pretendem readquirir controlo nas suas vidas, por meio das construção e reconstrução de um ‘projeto reflexivo do self’, concretizadas com recurso ao ambiente-chave da ‘relação pura’ (cf. Beck e Beck-Gernsheim, 1995; Scott, 1995). Estas mesmas necessidades emergiram, em parte, uma vez que com “(…) o progresso da democratização quotidiana, a deferência para com a autoridade, mas também a tradição e o costume, passaram a ter um papel menor na vida das pessoas” (Giddens 2007, 146), tendo surgido uma destradicionalização, com a perda de importância da tradição, a par de uma secularização, com a emergência de regras seculares, mas tendo surgido, igualmente, uma maior insegurança.

Ambos os autores consideraram ser importante a questão da insegurança, mas Giddens orientou a preocupação para a ordem social, enquanto a preocupação de Beck foi orientada para a mudança social (Beck, Giddens e Lash, 2000). Para ambos, a minimização da insegurança é um objetivo da reflexividade (Beck, Giddens e Lash, 2000). Neste contexto, Beck, Giddens e Lash (2000, 73) assinalaram: “Muitas das nossas actividades quotidianas tornaram-se abertas à escolha, ou melhor (…) a escolha tornou-se obrigatória (…) Analiticamente, é mais exacto dizer que todas as áreas da atividade social se tornaram governadas por decisões (…)”. Em grande medida, as teorias da modernidade avançada ou reflexiva expuseram um programa consistente de individualização, segundo a aceção de que ‘eu sou eu’, em que o ‘eu’ se encontra mais liberto das relações comunais e mais apto para construir a própria biografia (Beck, Giddens e Lash, 2000). Para Beck (1992, 135):

“Individualização, neste sentido, significa que a biografia de cada pessoa é removida de determinações dadas e colocada nas suas próprias mãos, aberta às e dependente das decisões. A proporção das oportunidades de vida que são fundamentalmente fechadas à tomada de decisão está a decrescer e a proporção da biografia que é aberta e tem que ser construída pessoalmente está a aumentar.”.

Com fundamento nas mesmas noções, Ulrich Beck e Elisabeth Beck-Gernsheim (2001) afirmaram que a vida pertence aos próprios indivíduos (life of one’s own), o que significa que as biografias estandardizadas se transformaram em ‘biografias faça você mesmo’ ou biografias preferidas, biografias de risco, que podem ser, igualmente, biografias interrompidas e biografias destruídas ou biografias bem-sucedidas.

Por um lado, para os autores das teorias da modernidade avançada, os indivíduos são mais individualizados, o que traz consigo um maior distanciamento nas relações sociais, mas, para outros autores, os indivíduos formam e desenvolvem redes de relacionamentos, tanto mais distantes como mais proximais; os últimos autores apresentaram uma alternativa ao conceito de

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individualização. Os mesmos autores consideraram, também, que os indivíduos sentem vontade (e desejo) de estar em rede (por exemplo, Wellman e Berkowitz, 1991) ou que se acham mais entrosados civicamente quando as redes são densas (Putnam, 2000). Neste contexto, assistimos ao reconhecimento, cada vez maior, da importância do capital social e das redes para a coesão e integração sociais. Como consequência da evolução tecnológica, da interligação entre países e da globalização, a sociedade em rede (Castells, 2002) entrou, ainda, na discussão sociológica. Por outro lado, Mark Granovetter (1985, 487) considerou ser benéfico evitarmos os contrastes teóricos assentes na sub e sobressocialização:

“Uma análise frutífera da ação humana requer que evitemos a atomização implícita nos extremos teóricos das conceções sub e sobressocializado. Os atores não se comportam ou decidem como átomos no exterior de um contexto social, nem aderem servilmente a um argumento escrito para eles pela particular interceção de categorias sociais que por acaso ocupam. As suas tentativas de ação intencional estão, em vez disso, embebidas num sistema de relações sociais contínuo e concreto.”.

De acordo com as teorias da modernidade avançada (ou reflexiva), os indivíduos fazem tomadas de decisão para construírem as suas biografias. Os mesmos indivíduos refletem, acham e constituem redes sociais, conscientemente, pensadas? Os mesmos indivíduos alimentam laços sociais apenas com os familiares ou têm margem de manobra para decidir quem integram nas suas redes sociais? Os mesmos indivíduos têm capacidade de agir no quadro de outros domínios do seu contexto social e espacial?

3.2. O estudo do capital social

De acordo com Pires (2007), a construção relacional de estrutura social fragmenta-se em duas subvariantes, que têm origem em tradições sociológicas diferentes: a tradição marxista e a sociologia formal de George Simmel. Na tradição marxista, a estrutura relacional remete para as consequências da padronização originada pelas desigualdades, sendo a mesma estrutura considerada uma ordem distributiva. Por conseguinte, o enunciado fundamental deste conceito de estrutura relacional pode ser sintetizado do modo seguinte: a posições idênticas nos sistemas das desigualdades correspondem, tendencialmente, comportamentos individuais semelhantes e interesses partilhados, estes comportamentos e interesses não apenas aclaram as probabilidades acrescidas de similaridade da ação individual, como constituem, igualmente, os fundamentos da ação coletiva (Pires, 2007). Já na sociologia formal de George Simmel, embora possa ainda ser referida a abordagem de Émile Durkheim (cf. Pires, 2007), “(…) o conceito de estrutura remete para o conjunto de propriedades formais do sistema social, isto é, para o modo como as relações sociais são morfologicamente ordenadas.” (Pires, 2007, 31). No contexto da Sociologia

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contemporânea, esta construção formalista de estrutura relacional acha-se, de acordo com Pires (2007), expressa nas inúmeras correntes da análise de redes, quer seja nas correntes que se desenvolvem com base na teoria da troca, quer seja nas correntes que se desenvolvem no quadro da sociologia económica. Nas mesmas correntes destacam-se, sobretudo, dois conceitos: o de capital social, enquanto recurso relacional, e o de rede, enquanto configuração sistémica (Pires, 2007). Com o uso do conceito de capital social, um entendimento morfológico da estrutura faz- se articular com um entendimento distributivo dessa, não obstante, os recursos a que dá acesso a posição social no sistema não são externos ao mesmo sistema, uma vez que são definidos enquanto recursos relacionais, associados ao tipo de rede e à localização dos indivíduos na rede (Pires, 2007).

O conceito de capital social é, profundamente, analisado desde o final do século XX, segundo diferentes perspetivas. Houveram autores que acentuaram o significado difuso que o conceito detém, por razão do seu uso em doses excessivas (cf. DeFilippis, 2001; Lin, 1999; Portugal, 2007a), designadamente, pelo senso comum (Portes, 1998). Por isso, Alejandro Portes (1998) observou que as suas capacidades heurísticas e o seu significado original estão a ser postos, severamente, à prova. Outros comentários a respeito do capital social manifestaram ser difícil comprovar as suas capacidades heurísticas para a teoria sociológica e entender se conduz a questões frutuosas ou, pelo contrário, se representa “(…) apenas uma reinvenção de ‘velhas ideias’ num novo contexto histórico.” (Portugal, 2007a, 14).

É importante, sinteticamente, apresentarmos as definições do conceito de capital social e mencionarmos a sua relação com outras ideias sobre este conceito, criadas por aqueles que foram considerados os pais do capital social: Pierre Bourdieu, James Coleman e Robert Putnam (cf. Adam e Roncevic, 2003). Entretanto, fazemos também um confronto crítico a estes autores nas palavras de alguns outros autores que se ocuparam do mesmo tópico.

Pierre Bourdieu (1980, 1984, 1997) foi um sociólogo importante para o estudo do capital social, uma vez que foi o primeiro a construir uma análise sistemática do capital social e fê-lo interagir com uma teoria das práticas sociais. Bourdieu (1980, 2), no seu emblemático artigo “Le capital social. Notes provisoires”, definiu-o como elaborado em torno de “(...) o conjunto dos recursos atuais ou potenciais que estão relacionados com a posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e inter-reconhecimento (...)”.

Bourdieu (1980) considerou que o volume de capital social de um indivíduo depende do volume de capital (económico e cultural) possuído por aqueles com quem este se relaciona, juntamente com a extensão das redes de relacionamento que este indivíduo consegue mobilizar.

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Deste modo, os indivíduos relacionam-se segundo as proximidades no volume de capital social, capital cultural e capital económico (de acordo com o reconhecimento de uma homogeneidade ‘objetiva’), detidos por cada um daqueles que constitui o relacionamento. Para Nan Lin (1999), este autor problematizou o capital social como o investimento dos elementos de certos grupos ou de certas redes, incluídos em reconhecimentos recíprocos, e, sendo assim, o fechamento e a densidade das redes ou dos grupos são requeridos.

James S. Coleman (1988) publicou outro importante artigo denominado “Social capital in the creation of human capital”. À época, as teorias a respeito da ação social dividiram-se em duas correntes fulcrais (Coleman, 1988). Por um lado, relevou-se a importância das obrigações, regras e normas para a condução da ação social, sendo esta ação, então, produzida, constrangida e reencaminhada pelo contexto social. Por outro lado, o enfoque foi posto nos atores enquanto indivíduos centrados em si e detentores de objetivos e ações independentes. O capital social de Coleman articulou as duas correntes numa orientação teórica em Sociologia. Coleman (1988, S98) construiu outra definição de capital social: “O capital social é definido pela sua função. Ele não é uma entidade isolada, mas uma variedade de diferentes entidades com dois elementos em comum: todas estas consistem em alguns aspetos das estruturas sociais e estas facilitam certas ações aos atores – quer pessoas ou atores corporativos – dentro da estrutura.”. Do mesmo modo, o capital social é frutífero, permite o cumprimento de objetivos que não são cumpridos na sua ausência e possibilita, por meio de certos aspetos das estruturas sociais, que os indivíduos realizem o que lhes interessa. De acordo com Lin (1999), não importa rejeitar que uma relação funcional produz a hipótese (por exemplo, os recursos embebidos nas redes permitem aumentar as probabilidades de encontrar melhores empregos), mas os dois conceitos devem ser tratados separadamente e medidos independentemente (por exemplo, o capital social é um investimento nas relações sociais e melhores empregos são apresentados por estatuto profissional e posição na supervisão).

Depois deste artigo, que deu o mote aos mais essenciais conteúdos sobre o capital social, Coleman (1990) publicou Foundations of Social Theory. Para este mesmo autor, existem cinco formas de capital social, que representam o que os relacionamentos sociais possuem de frutuoso para os recursos individuais de capital: obrigações e expetativas, informação, normas e sanções, relações de autoridade, organizações intencionais. Coleman (1988, 1990) adicionou que certos tipos de estruturas sociais são mais importantes para a motivação de algumas formas de capital social: o fechamento da rede social (as normas que são concebidas limitam os efeitos nefastos externos e ampliam os efeitos positivos internos) e a organização social conveniente. Para Lin

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(1999), os requisitos de fechamento e densidade das redes sociais, que visam uma existência de capital social (profícuo), não constituem os únicos requisitos necessários, porque é importante acolhermos os (benefícios dos) relacionamentos com conhecidos (cf. Granovetter, 1973, 1983). Frane Adam e Borut Roncevic (2003, 158) viram “o capital social como um genótipo com muitas aplicações fenotípicas”, sendo possível encontrar um ‘genótipo’ naquela definição de Coleman – alguns aspetos da estrutura social que fomentam a ação social – defendida pela maioria dos autores, mas a formulação é demasiado ampla para um programa de pesquisa mais unificado. Opcionalmente, os mesmos autores notaram que, na investigação científica do social, há um grande (e crescente) conjunto de ‘fenótipos’ nas aplicações do capital social, porque este é, extremamente, dependente do contexto.

A obra Bowling Alone: The Collapse and Revival of American Community, de Robert Putnam (2000), passou além do mundo académico e penetrou no quotidiano político, como foi manifesto nos discursos de George W. Bush e William Hague. Segundo Putnam (um cientista político), certos autores haviam evidenciado uma transformação do capital social na sociedade americana. Ao usar a metáfora dos capitais físico e humano, a ideia de capital social pautou-se pelo valor que contêm as redes sociais. Putnam (2000, 19) definiu o capital social como as “(…) relações entre os indivíduos – redes sociais e normas de reciprocidade e confiança que resultam das mesmas.”. Para o autor, o capital social apresenta-se segundo diversas formas e tamanhos e tem diversos usos, identicamente ao capital físico. Entre os diversos processos, relacionados com o capital social, uma distinção foi útil para Robert Putnam e Lewis Feldstein (2003): capital social bonding, ou seja, a formação de relacionamentos entre indivíduos similares em aspetos cruciais, que tendem a pertencer à intimidade uns dos outros; e capital social bridging, ou seja, a formação de relacionamentos entre indivíduos diferentes, que tendem a ser estranhos.

Putnam (2000) investigou qual o motivo por que os americanos deixaram de se entrosar civicamente. Porque é que ocorreu um desligamento cívico? Com diversos indicadores propôs demonstrar que os americanos não se juntam tanto, não confiam tanto, não dão tanto e também não falam tanto, amigavelmente e informalmente, a respeito de assuntos sem importância (cf. Putnam e Feldstein, 2003). Por conseguinte, segundo Putnam e Feldstein (2003), a implicação em associações cívicas, a sociedade em igrejas, clubes e federações, a participação em assuntos públicos, o tempo passado com a família, os vizinhos e os amigos, os presentes baseados na filantropia e, até, a confiança em outras pessoas – tal como a participação nos clubes eponímicos de bowling – sofriam nas últimas três décadas uma grande diminuição (de 25 para 50 por cento). A pluralidade de mudanças económicas e sociais – como sejam a banalização da televisão, a

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realização de trabalho profissional por ambos os cônjuges, o alastramento urbano (e, sobretudo,

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