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3 de julho de 2001 R esum o

No documento Ensaios em economia da saúde (páginas 93-99)

Este artigo analisa os impactos da presença de externalidades difusas sobre a eÞciência do provimento privado de bens e serviços de saúde. Exter- nalidades difusas ocorrem quando o bem estar de cada agente é afetado pelo comportamento médio dos demais agentes na economia, pois a probabili- dade de Þcar doente depende tanto da decisão individual como da decisão média da sociedade. Um exemplo tipico é o caso de vacinas. Modelamos este problema em um ambiente de uma economia com um grande número de agentes. O principal resultado encontrado no trabalho é mostrar que na presença de externalidades difusas entre os indivíduos no consumo de vacinas , dependendo da tecnologia de produção da vacina, o provimento privado pode ser ineÞciente.

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I nt r odução

O mercado de bens e serviços de saúde apresenta diversas particularidades em relação aos demais mercados, presentes tanto na tecnologia de produção como na tecnologia de consumo. Neste trabalho, abordamos especiÞcamente a presença de externalidades difusas geradas no consumo destes bens. Muito embora a pre- sença de externalidades na saúde seja um fato estilizado na literatura econômica, (Arrow, 1963; Laffont, 1985) poucos estudos abordam as consequências sobre o bem estar social do provimento privado destes bens.

Neste trabalho a introdução de externalidades altera a probabilidade de ocor- rência dos estados da natureza individuais. Um indivíduo gera externalidades sobre os demais quando decide se irá ou não se vacinar alterando a probabilidade destes Þcarem doentes. A probabilidade de um indivíduo Þcar doente depende tanto da decisão individual de se vacinar como do nível de vacinação média da so- ciedade. Nesse sentido, as externalidades geradas pelos agentes são caracterizadas como externalidades difusas, cada agente individualmente não é capaz de alterar o nível de vacinação média da economia. Este tratamento das externalidades segue o arcabouço proposto por Hammond (1995) que modela este problema em um ambiente de uma economia com um grande número de agentes.

A análise é desenvolvida em dois contextos: economia com restrição ao crédito e economia com mercados completos. O modelo com restrição ao crédito equivale a situações em que o bem-estar dos indivíduos depende de outros parâmetros além do consumo individual. Por exemplo, quando os indivíduos estão doentes, independente do nível de consumo, os indivíduos têm uma perda de utilidade. No modelo com mercados completos, a hipótese de existência do seguro pleno supõe que se os indivíduos conseguem manter o mesmo nível de consumo nos estados da natureza, a utilidade é a mesma.

O principal resultado do trabalho é mostrar que na presença de externalidades difusas entre os indivíduos no consumo destes bens, dependendo da tecnologia de produção da vacina, o provimento privado pode ser ineÞciente. Este resultado independe da existência de mercados de seguros. A diferença entre os resultados encontrados nos dois contextos é que no modelo com restrição ao crédito, para determinado intervalo de custo de produção da vacina, a alocação de equilíbrio eÞciente suporta desigualdade entre indivíduos de um mesmo tipo. Como não existe mercado de seguros perfeito, se a alocação eÞciente de vacinas for vacinar uma fração de indivíduos de um mesmo tipo, estes indivíduos vão auferir nível de utilidade desigual.

Embora o argumento deste artigo tenha sido construído para analisar especi- Þcamente o provimento de vacinas, a análise desenvolvida pode ser aplicada para diversas situações em saúde. É o caso por exemplo de serviços de saneamen- to, limpeza urbana, e alguns serviços relacionados ao cuidado preventivo. Em todos esses casos a probabilidade de um indivíduo Þcar doente depende do seu comportamento individual e do comportamento médio dos demais agentes. Nos

ativemos ao exemplo da imunização por este ser um exemplo clássico da literatura em externalidades na saúde. O resultado encontrado tem implicações de política pública importantes uma vez que delineia o espaço de intervenção do estado.

O trabalho está estruturado em cinco seções além desta. As seções 1 e 2 tratam da apresentação e caracterização da economia. Na seção três deÞnimos os conceitos de equilíbrio utilizados e na seção quatro analisamos a eÞciência da alocação de equilíbrio competitivo. Na seção cinco, à titulo de ilustração, apresentamos um exemplo particular onde além da análise de eÞcência propomos um pacote de política pública capaz de restaurar a alocação de equilíbrio eÞciente.

2

Car act er ização da econom ia

Seja uma economia com dois períodos, um conjunto Þnito de tipos, T, e dois bens de consumo, um bem privado e a vacina. No segundo período para cada tipo de agente existem dois estados da natureza individuais: doente e saudável. A incerteza individual não resulta em incerteza agregada. Cada tipo contém um contínuo de indivíduos e constitui uma fração ρt da população.1 Os indivíduos

se diferenciam pela dotação orçamentária.

A decisão de se vacinar é uma escolha discreta: 1 se o indivíduo decide se vacinar e 0 se o indivíduo decide não se vacinar. Além dos bens privados temos um bem público denotado de v. O bem público é resultado do efeito das exter- nalidades geradas pelos indivíduos sobre os demais agentes. Ao consumirem a vacina os indivíduos geram externalidades sobre os demais na medida em que a probabilidade de um indivíduo Þcar saudável depende do nível de vacinação média da economia. Como estamos em um ambiente de uma economia grande, as externalidades são caracterizadas comoexter nalidades difusas pois o compor-

tamento de um agente individualmente não pode inßuenciar o nível de vacinação média da economia. Supondo que uma fração αt dos indivíduos do tipot decide

se vacinar, o nível de vacinação média v é dado por:

v=

T

X

t= 1 ρtαt

onde, ρt é a fração de cada tipo de agente no total da população.2

1O ambiente de uma economia com um contínuo de agentes é o adequado para a modelagem de externalidades difusas, na medida em que os agentes supõem como dado o nível de vacinação média da economia. Além disso, esse arcabuço nos permite trabalhar com a escolha de vacina discreta o que torna o modelo mais realista e analiticamente mais simples.

2 v ≡ T X t= 1 R At di PT t= 1 R At di R At vt(i)di R At di = T X t= 1 ρtαt 3

Para cada tipo de agente com as características descritas pelo par ordenado (Ut, wt) associam-se:

- um conjunto de consumo Xt = R2+ + × {0, 1} aberto, não vazio e convexo. Este conjunto de consumo é deÞnido pela quádrupla (x0t, x1t, x2t, vt).

- uma função utilidade no consumo dos bens privados u(x) satisfazendo as seguintes hipóteses: i) ut: R2 + + →R ∈ C2; ii)∂ut ∂xit >0 e ∂ 2u t ∂x2 it <0; i = 0, 1, 2. iii) limx→0 ∂ut ∂xit = ∞ e limx→∞ ∂ut ∂xit = 0.

- uma função de utilidade esperada Ut: R2+ + × {0, 1} → R, deÞnida por 3: Ut(x0t, x1t, x2t, vt) = πt(vt, v) ut(x0t, x1t) + (1 − πt(vt, v)) ut(x0t, x2t)

As hipóteses i) e ii) garantem que a função utilidade é continuamente difer- enciável, estritamente crescente e estritamente côncava no consumo dos bens privados. A hipótese iii) corresponde às condições de Inada que garantem que o consumo desses bens será estritamente positivo.

2.1

Per iodização do Econom i a

A cada período os agentes recebem dotação do bem privado x. No primeiro

período não existe incerteza e no segundo período podem ocorrer dois estados da natureza individuais que caracterizam o estado de saúde de cada indivíduo. Existem dois ativos na economia: um ativo de renda Þxa, b, que permite aos

indivíduos transferirem renda do período zero para o período 1, pagando uma unidade do bem privado em cada estado da natureza. O outro ativo é um seguro saúde que permite aos indivíduos transferirem renda entre os estados da natureza. O seguro saúde é um contrato assinado no primeiro período. O agente irá pagar

Sunidades do seguro ao preço ps se ocorrer o estado 1 da natureza e irá receber Sunidades do bem privado no estado 2 se ocorrer este estado. O seguro-saúde é

ofertado a preço justo por empresas seguradoras em concorrência perfeita.

2.1.1 P r im eir o p er íodo:

Neste período cada indivíduo de cada tipo t realiza quatro decisões: 1) Decide se irá ou não consumir a vacinavt (vt∈{0, 1}) .

2) Decide quanto consumir do bem privado (x0t ∈R).

3) Decide o volume de ativos que irá comprar ou vender para transferir renda entre os períodos (b).

3A concavidade da função de utilidade esperada depende da parametrização sobre a dis- tribuição de probabilidades da economia.

4) Decide quanto irá comprar de seguro-saúde (St) para transferir renda entre

os estados da natureza individuais no segundo período.

2.1.2 Segundo p er íodo:

1) Neste período os agentes apenas consomem o bem privado,x1t, x2t ∈R.

2) Existem dois estados da natureza para cada indivíduo: estado “saúdável” e estado “doente”. A caracterização destes estados da natureza é determinada através da dotação de renda dos indivíduos: w1t> w2t, com w ∈R.

A probabilidade do estado saudável, πt(vt, v) , depende do nível de vacinação

média da economia, v, e da decisão individual de cada agente em se vacinar. A probabilidade do estado saudável é estritamente crescente na decisão individual de se vacinar e no nível de vacinação média.

∂πt(vt, v)

∂vt

> 0 ∂πt(vt, v)

∂v > 0

2.2

A Função de P r odução da Vacina

A vacina é produzida no período zero por Þrmas competitivas utilizando como insumo o bem privado, isto é, v= f(x). Esta função de produção é uma função

com retornos constantes de escala, isto é:

f(λx) = λf (x), ∀λ ≥ 0.

Sem perda de generalidade podemos escrever a função de produção da vacina como v = ax0

O preço da vacina será dado pelo inverso do produto marginal da produção de vacinas, isto é: pv = µ ∂f ∂x(x ∗ 0) ¶−1 × p0

Para a função de produção especiÞcada, o preço da vacina é descrito como: pv =

1 a

2.3

A ofer t a de Segur o-saúde

No primeiro período o indivíduo contrata o seguro-saúde ofertado por Þrmas seguradoras em concorrência perfeita. O seguro-saúde permite aos indivíduos transferirem renda do estado saudável para o estado doente. O preço do seguro

é determinado de forma que as Þrmas obtenham lucro zero. As Þrmas têm in- formação completa sobre os indivíduos, isto é, conhecem os tipos de indivíduos e observam se cada tipo de indivíduo decide se vacinar. O lucro da seguradora é dado por:

πtpsSt+ (1 − πt) (−St) = 0 (1)

⇒ pst(vt, v) =

(1 − πt)

πt

O preço do seguro reßete a razão das probabilidades dos estados da natureza individuais e portanto é uma função direta da decisão de cada tipo sobre se vacinar e do nível de vacinação média da economia. Entretanto, os indivíduos ao comprarem o seguro-saúde consideram apenas o efeito da decisão individual de se vacinar sobre o preço do seguro.

2.4

Condição de Fact ibili dade das A locações de Consum o

D efi nição 1 A locação Fact ível Uma alocação (x,v) é factível se: i) (xt, vt) ∈ Xt, ∀ t ∈ T;

ii)o efeito das exter nalidades geradas pelos agentes é captado pela média da econo- mia, isto é : v =

T

P

t= 1 ρtαt.

iii) os mercados de bens estão em equilíbr io:

T X t= 1 ρt £ αtx10t+ (1 − αt)x00t ¤ + x0(v) ≤ T X t= 1 ρtwt (2) T X t= 1 ρt © αt £ π1tx11t+ (1 − π1t) x12t ¤ + (1 − αt) £ π0tx01t+ (1 − π0t) x02t ¤ª = T X t= 1 ρt{αt[π1tw1t+ (1 − πt) w2t] + (1 − αt) [π0tw1t+ (1 − π0t) w2t]} (3) onde, x0(v) = f −1 (v)

isto é, x(v) é igual ao montante do bem pr ivado per capita que é utilizado na produção de vacinas na economia e

xvit = consumo do bem i se o indivíduo do tipo t escolhe o nível de vacina v

π1t = π (1, v)

π0t = π (0, v) .

No documento Ensaios em economia da saúde (páginas 93-99)