O direito à intimidade genética encontra seu fundamento em nível internacional, através de declarações, resoluções, recomendações e convenções, na forma a seguir exposta.
3.8.1 Resolução sobre Problemas Éticos e Jurídicos da Manipulação Genética – 1989
O Parlamento Europeu baixou uma resolução proibindo a utilização de análises genéticas prévias à contratação de seguros e empregados.
O artigo 1º da referida resolução de 16 de março de 1989 prevê que "deve ser proibida juridicamente a seleção de operários baseada em critérios genéticos".
3.8.2 Recomendação do Comitê de Ética Francês – 1990
Na mesma linha, o Comitê Nacional de Ética Francês proibiu a terceiros, em especial, seguradoras e empregadores, o acesso a registros de informações genéticas dos segurados ou de empregados.
3.8.3 Declaração de Bilbao – 1993
Em 1993, a Reunião Internacional sobre Direito ante o Projeto Genoma Humano, ocorrida em Bilbao (Espanha), fixou as seguintes premissas:
- A intimidade pessoal/genética é patrimônio exclusivo de cada pessoa;
- Impossibilidade de utilização de dados genéticos que originem qualquer discriminação no âmbito laboral, de seguro ou qualquer outro.
3.8.4 Convenção Européia dos Direitos do Homem e da Biomedicina – 1996
Esta Convenção proíbe toda e qualquer forma de discriminação da pessoa em razão do seu patrimônio genético (artigo 11º) e determina que os testes médicos de predição só podem ser feitos por motivos de saúde (artigo 12º).
3.8.5 Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos - 1997
As discussões envolvendo o genoma humano têm demonstrado uma grande amplitude e elevada relevância para a humanidade.
Tais fatos ensejaram a proclamação, em 11 de novembro de 1997, da Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos, o qual estatui em seus artigos 1º e 2º, o respeito à dignidade humana, como se vê de sua transcrição abaixo:
Artigo 1º.
O genoma humano subjaz à unidade fundamental de todos os membros da família humana e também ao reconhecimento de sua dignidade e diversidade inerentes. Num sentido simbólico, é herança da humanidade.
Artigo 2º.
a) Todos têm direito ao respeito por sua dignidade e seus direitos humanos, independentemente de suas características genéticas.
b) Essa dignidade faz com que seja imperativo não reduzir os indivíduos a suas características genéticas e respeitar suas singularidade e diversidade.
Portanto, em um primeiro momento, pode-se ter como premissa que, na investigação e na manipulação do genoma humano, ou melhor, na tratativa dos dados genéticos obtidos, deve-se respeitar o ser humano enquanto pessoa, e, como parte da espécie humana, deve-se preocupar com esta e com a relação com as futuras gerações, além de se atentar para formas de proteção aos direitos fundamentais do homem (liberdade, intimidade, etc.).
Os dados genéticos obtidos em pesquisas e experimentos realizados com o genoma humano não podem servir a objetivos meramente econômico-financeiros, mas precipuamente ao desenvolvimento do homem e da sociedade. Os direitos fundamentais do
ser humano, reconhecidos pela Organização das Nações Unidas, não podem ser desprezados, ou mesmo, minimizados, em virtude do progresso científico.
É neste ponto que se encontra hoje a ciência, especificamente no que diz respeito aos dados genéticos que podem desvendar o passado do ser humano e permitir visualizar sua condição futura. Desenvolvimento e respeito aos direitos do homem não são aspirações contrapostas ou inconciliáveis, desde que não se submeta o segundo ao primeiro.
3.8.6 Declaração Ibero-Latino-Americana sobre Direito, Bioética e Genoma Humano - 2001
Em 29 de agosto de 2001, na cidade de Santiago, República do Chile, foi revisada a Declaração de Manzanillo de 1996, através da qual os países participantes estabeleceram, quanto ao direito à intimidade genética, as seguintes diretrizes a serem implantadas nos seus respectivos países:
Quarto: Os princípios éticos que devem guiar as ações da genética médica são:
[...] d) as provas genéticas e as ações que derivam delas têm como objetivo o bem- estar e a saúde do indivíduo, sem que possam ser utilizadas para imposição de políticas populacionais, demográficas ou sanitárias, nem para a satisfação de requerimentos de terceiros;
[...] f) a informação genética individual é privativa do indivíduo do qual provém e não pode ser revelada a terceiros sem seu consentimento expresso.
3.8.7 Declaração Internacional sobre Dados Genéticos Humanos da Unesco – 2004
No dia 16 de Outubro de 2004, no decurso da sua 32ª sessão, a Conferência Geral da UNESCO aprovou, por unanimidade e aclamação, a Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos, ratificando a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos de 1997.
O objetivo da Declaração era garantir o respeito da dignidade humana e a proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais em matéria de recolha, tratamento, utilização e conservação de dados genéticos humanos, em conformidade com os imperativos de igualdade, justiça e solidariedade.
No que tange especificamente ao direito à intimidade genética, prevê o artigo 14, alínea “b”, in verbis:
(b) Os dados genéticos humanos, os dados proteômicos humanos e as amostras biológicas associados a uma pessoa identificável não deverão ser comunicados nem tornados acessíveis a terceiros, em particular empregadores, companhias de seguros, estabelecimentos de ensino ou família, se não for por um motivo de interesse público importante nos casos restritivamente previstos pelo direito interno em conformidade com o direito internacional relativo aos direitos humanos, ou ainda sob reserva de consentimento prévio, livre, informado e expresso da pessoa em causa, na condição de tal consentimento estar em conformidade com o direito interno e com o direito internacional relativo aos direitos humanos.
A vida privada de um indivíduo que participa num estudo em que são utilizados dados genéticos humanos, dados proteômicos humanos ou amostras biológicas deverá ser protegida e os dados tratados como confidenciais.
3.8.8 Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos - 2005
Em 2005, tendo como escopo as questões éticas relacionadas à medicina, às ciências da vida e às tecnologias associadas quando aplicadas aos seres humanos, levando em conta suas dimensões sociais, legais e ambientais, foi apresentada à comunidade internacional a Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos.
Essa Declaração foi um verdadeiro marco no que diz respeito às questões bioéticas, estabelecendo princípios a serem observados pela comunidade internacional.
A respeito da proteção à intimidade genética, o artigo 16 estabelece:
O impacto das ciências da vida nas gerações futuras, incluindo sobre sua constituição genética, deve ser devidamente considerado.