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Exames Médicos na Fase Pré-contratual

4.4 ACESSO À INFORMAÇÃO GENÉTICA

4.4.1 Exames Médicos na Fase Pré-contratual

No momento da contratação, deverá ser observado o princípio geral de direito à igualdade no acesso ao emprego, para evitar a ocorrência de discriminação genética, numa lógica empresarial de rentabilidade econômica e ponderação do risco, detectando nesta fase a existência de problemas genéticos hereditários ou predisposições patológicas para vir a contrair certas doenças ou vir a padecer de certa incapacidade.

Neste momento pré-contratual, a realização de testes genéticos poderá implicar a exclusão do candidato, mantendo-o na situação de desemprego na qual se encontra. Embora, de fato, não exista uma previsão legal ou constitucional garantindo um direito subjetivo à obtenção de um posto de trabalho, devemos reconhecer que a prática de mecanismos que

evidenciem situações de discriminação, subvertendo o princípio de igualdade, previsto no caput do artigo 5º, da CF/88, deverá ser exemplarmente reprimida pelos órgãos competentes, em especial, pelo Judiciário Trabalhista.

A possibilidade de realização de testes genéticos fundamentada, exclusivamente, no interesse econômico do empregador, para fins de não contratação de pessoas que possam vir a contrair determinadas doenças ocupacionais e/ou desenvolver outras de forma hereditária, é suficiente para violar o direito à intimidade genética, importando, ainda, em manifesta violação à dignidade da pessoa humana.

Em termos de ponderação de direitos fundamentais – autonomia e iniciativa econômica privada versus proteção à intimidade genética - pensamos que o princípio da proporcionalidade determina, nesta fase, uma prevalência do direito à intimidade genética do candidato. Justifica-se tal opção pela inexistência de lesão concreta ao empregador, sendo que a solução contrária importaria em exterminar o direito à intimidade genética dos candidatos ao emprego, sem que houvesse razões plausíveis ou suporte legal relevante que justificasse tamanho sacrifício.

Analisando esta questão, embora sobre outro viés, qual seja, o do abuso do direito do empregador em contratar, Edilton Meireles (2005, p. 174) sustenta que não haveria, na obrigatoriedade de realização de exames médicos na fase de seleção, uma violação ao direito à intimidade do empregado, ocorrendo, sim, um abuso do direito do empregador em contratar, in verbis:

Exigir, por sua vez, a prévia realização de exames médicos, como condição para a contratação do trabalhador, não viola, outrossim, o direito à intimidade deste. Violação ocorreria se o empregador forçasse (obrigasse) o trabalhador a realizar o exame. No processo de seleção, no entanto, o empregador apenas exige como condição para contratação a realização dos referidos exames, ficando ao critério do candidato ao emprego a satisfação ou não dessa exigência. Não há obrigação do candidato em realizar o exame, mas sim simples faculdade de agir. E a não satisfação da exigência não gera qualquer conseqüência para o trabalhador, salvo a não contratação, não constituindo a contratação em si, um direito.

Essa exigência, sim (de realização de exames médicos), em verdade, é que constitui abuso ao direito de contratar. Isso porque, ao condicionar a contratação à prática de ato que se insere na intimidade de outrem, o empregador está abusando no seu direito de celebrar contrato, faltando com a função social inerente ao mesmo. Em suma, ninguém pode condicionar a celebração de contrato à quebra de intimidade de outrem. Ao assim agir, estará o individuo abusando do seu direito de contratar (ou não contratar).

Na verdade, ter-se-ia que falar em limites da solicitação da informação, seja ela genética ou qualquer outra que seja, por parte do empregador. Esta amplitude de poderes na solicitação de exames passa pela análise do princípio da boa-fé que deverá nortear a relação de emprego a ser firmada, assim como o respeito à dignidade dos candidatos.

Logicamente não se está aqui defendendo a inexistência por completa de qualquer tipo de informação a ser prestada pelo candidato. Não. O que se pretende é discutir os limites de acesso ao conhecimento por parte do empregador, para evitar hipóteses de discriminação.

Há de existir uma correlação entre a informação necessária naquilo que no plano jurídico corresponde à formação do contrato e a necessidade de defesa dos candidatos a qualquer tipo de violação.

Para evitar abuso por parte do empregador, importando em violação ao direito correlato do empregado, aponta Bernardo Xavier (2005, p. 147) as seguintes diretrizes:

1º) Adequação das solicitações de informação e sua obtenção, que não pode ir para além do directamente relevante para a execução das funções que se têm em vista na admissão;

2º) Reserva ou sigilo quanto a essas informações, que não podem ser utilizadas por outrem;

3º) Transparência em que a norma deve ser a da possibilidade de conhecimento dos resultados pelo candidato e dos objectivos;

4º) Fiabilidade, para que o candidato não seja sujeito a provas ou testes exóticos, não aferidos e que às vezes podem relevar da superstição. Tem-se prestado a discussão animada a quiromância, a observação do “carma”, a grafologia, testes psicológicos, principalmente projectivos.

Para não se pensar que estamos aqui sustentando hipóteses absurdas, de total desinformação do empregador nesta fase pré-contratual, faz-se necessário distinguir os testes genéticos de saúde daqueles relativos à personalidade dos candidatos (temperamento agressivo, etc)

Da mesma forma, nos testes relativos à saúde, haverá de se distinguir aqueles que envolvem diagnóstico (atual) e prognóstico (probabilidade). Quanto a estes, distinguir-se,

ainda, os que têm correlação com o meio ambiente do trabalho e aqueles que, envolvendo futura incapacitação, são estranhos aos fatores laborais.

No que se refere ao teste de diagnóstico, entendemos pela sua licitude, tendo em vista que neste caso, na colisão entre o direito à intimidade genética e o direito à saúde coletiva (meio ambiente de trabalho), prevalece este, pois, ponderados os direitos envolvidos, deve-se afastar o da intimidade para assegurar saúde coletiva dos demais funcionários.

Já no que tange aos testes médicos de prognóstico, a situação é diversa. Isto porque, embora a CLT e a NR – 07 estabeleçam determinadas competências na prevenção e proteção à saúde do trabalhador, tanto de forma individual quanto coletiva, tais “poderes” têm de ser compatibilizados com ações destinadas especificamente ao atendimento a tais competências, evitando-se uma discriminação e intrusão ilegítima por parte do empregador.

Cumpre ser destacado que a alegação do empregador concernente à necessidade de preservação da saúde coletiva dos demais empregados, para fins de acesso aos dados genéticos do candidato/empregado, poderá ser falaciosa, desde que seja possível alcançar o mesmo objetivo (segurança e saúde coletiva) mediante a utilização de recursos apropriados para tal fim, a exemplo dos EPI’s (Equipamento de Proteção Individual), assim como na aplicação de normas internas de higiene e segurança do trabalho (a exemplo do Diálogo Diário de Segurança – DDS) previstos na legislação mineral brasileira, para evitar acidentes no ambiente de trabalho mineral.

Assim, embora os testes genéticos possuam um papel importante, quiçá, determinante, na segurança do ambiente de trabalho, deverão ser buscados mecanismos outros para evitar um acesso indiscriminado às informações genéticas do candidato e/ou empregado.

O empregador tem o direito a ter acesso a determinadas informações, mas dentro de limites. Tais limites jamais poderão ser fundamentados em fins econômicos ou na garantia de contratação de um empregado saudável em relação ao qual não venha o empregador sofrer prejuízos.

Dessa maneira, à exceção de testes para fins de segurança, higiene e saúde no trabalho do empregado e de terceiros, todos os demais devem ser banidos, para evitar, repita- se, qualquer tipo de discriminação baseada em tendências ou predisposições.