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Definibilidade em Circunscri¸c˜ao

No documento Modelos minimais e hierarquia de (páginas 75-81)

Nesta se¸c˜ao, estudaremos a definibilidade de um s´ımbolo predicativo atrav´es da Circunscri¸c˜ao. Isto ´e, estudaremos os casos em que uma circunscri¸c˜ao define o predicado circunscrito.

Em [Doy85] ´e levantada a quest˜ao de quando uma circunscri¸c˜ao define implicitamente o predicado circunscrito. Doyle examina o problema no con- texto da Circunscri¸c˜ao de primeira-ordem [McC80]. Podemos transferir o

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 62 problema para o contexto da Circunscri¸c˜ao de segunda ordem como apre- sentada aqui. De agora em diante, assumiremos que apenas um predicado ´e circunscrito em cada circunscri¸c˜ao a fim de simplificar a exposi¸c˜ao do pro- blema. Vejamos o seguinte lema a respeito dos casos em que a Circunscri¸c˜ao define o predicado circunscrito.

Lema 3.13 Seja α(P, Z) uma S ∪ {P } ∪ {Z}-senten¸ca de primeira-ordem. Circ[α(P, Z); P ; Z] define implicitamente o s´ımbolo predicativo P se, e so-

mente se, para toda S-estrutura A existe no m´aximo uma S ∪ {P } ∪ {Z}- expans˜ao Aque ´e modelo de α(P, Z) minimal com rela¸c˜ao a ≤P;Z.

Prova. Direto da defini¸c˜ao de defini¸c˜ao impl´ıcita.

Doyle lan¸ca a seguinte quest˜ao: quando a circunscri¸c˜ao define implicita- mente o predicado circunscrito, ser´a poss´ıvel substituir o esquema de circun- scri¸c˜ao4 pela defini¸c˜ao expl´ıcita do predicado circunscrito (que, pelo Teorema

de Beth, sempre existe em primeira-ordem) junto com a f´ormula circunscrita? Podemos reformular essa quest˜ao para a Circunscri¸c˜ao de segunda ordem: quando Circ[α(P, Z); P ; Z] ´e equivalente a uma teoria de primeira-ordem e define implicitamente o predicado P , ser´a que Circ[α(P, Z); P ; Z] ´e equiva- lente α mais a defini¸c˜ao expl´ıcita do predicado P ?

Em termos precisos, a quest˜ao de Doyle ´e: se Circ[α(P, Z); P ; Z] ´e equi- valente a uma teoria de primeira-ordem e

Circ[α(P, Z); P ; Z] |= ∀x(P (x) ↔ φ(x)), onde P n˜ao ocorre em φ(x), ser´a que temos

Circ[α(P, Z); P ; Z] ≡ α(P, Z) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x))? (3.2) Doyle afirma que isso n˜ao ´e verdade. No entanto, o contra-exemplo que ele apresenta n˜ao ´e realmente um contra exemplo. Abaixo, exibiremos um contra-exemplo real, demonstrando a resposta de Doyle.

Exemplo 3.2 Seja φ(<) uma f´ormula de primeira-ordem afirmando que <

´e uma ordem linear na qual todo elemento, exceto o menor, possui um pre- decessor e todo elemento, exceto o maior, possui um sucessor (entretanto,

φ(<) n˜ao determina se < possui maior ou menor elemento). Seja c uma

constante. Seja ψ(c) uma f´ormula de primeira-ordem que afirma que se < possui um menor elemento ent˜ao c ´e o menor elemento de <. Seja P um

4Doyle trabalha com a Circunscri¸c˜ao de Primeira-Ordem, na qual a circunscri¸c˜ao de um

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 63

predicado un´ario. Seja θ(P ) a f´ormula de primeira-ordem que afirma que P ´e n˜ao vazio, P possui um maior elemento5 com rela¸c˜ao a < e P ´e “fechado para

baixo” com rela¸c˜ao a < (isto ´e, se P (a) e b < a ent˜ao P (b)). Observe que em todo modelo (A, P) de Circ[φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P ); P ] a ordem < possui menor elemento (caso contr´ario seria sempre poss´ıvel escolher uma interpreta¸c˜ao para P menor, pois bastaria escolher um subconjunto pr´oprio de P “fechado para baixo”). Analogamente, se < possui um menor elemento em uma es- trutura A, ent˜ao existe um modelo (A, P) de Circ[φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P ); P ]. Facilmente se observa que Circ[φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P ); P ] ´e equivalente a

Γ = {φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P ),

“< possui menor elemento”,

∀x(P (x) ↔ “x ´e o menor elemento de <”)}.

E f´acil ver que

Γ |= ∀x(P (x) ↔ x = c ∨ x < c).

Entretanto,

Circ[φ(<)∧ψ(c)∧θ(P ); P ] 6≡ φ(<)∧ψ(c)∧θ(P )∧∀x(P (x) ↔ x = c∨x < c).

( ´E f´acil ver que existe um modelo de

φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P ) ∧ ∀x(P (x) ↔ x = c ∨ x < c)

no qual a ordem < n˜ao tem menor elemento.)

Mesmo em face dessa resposta negativa, para a classe das senten¸cas bem- fundadas e em circunscri¸c˜oes sem objetos variantes n´os provamos que a equivalˆencia vale. Abaixo definimos a classe das senten¸cas bem fundadas (veja [Lif94]).

Defini¸c˜ao 3.8 Seja α(P, Z) uma senten¸ca da l´ogica de primeira-ordem. N´os

dizemos que α(P, Z) ´e bem-fundada com rela¸c˜ao a ≤P;Z se, e somente se,

para todo modelo A de α(P, Z) existe um modelo B de α(P, Z) P ; Z-minimal e tal que A ≤P;Z B.

Teorema 3.14 Se α(P ) ´e bem-fundada com rela¸c˜ao a ≤P, a circunscri¸c˜ao

Circ[α(P ); P ] ´e equivalente a uma teoria de primeira-ordem e define implici-

tamente o s´ımbolo predicativo P , ent˜ao Circ[α(P ); P ] ´e equivalente a α(P ) mais a defini¸c˜ao expl´ıcita de P .

5Com essa condi¸c˜ao, esse contra-exemplo se aplica tamb´em `a Circunscri¸c˜ao de primeira-

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 64 Prova. Seja α(P ) como no enunciado do teorema. Seja φ(x) tal que

Circ[α(P ); P ] |= ∀x(P (x) ↔ φ(x)). Obviamente todo modelo de Circ[α; P ] ´e modelo de

Γ := α(P ) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x))).

Seja A modelo de Γ. Como A |= α e α(P ) ´e bem-fundada, existe um modelo A′ P AP -minimal de α(P ). Logo A|= Circ[α(P ); P ]. Mas nesse caso A|=

Γ e, como Γ define P explicitamente, e portanto tamb´em implicitamente, temos PA′

= PA

e portanto A tamb´em ´e minimal com rela¸c˜ao a ≤P, logo

A|= Circ[α(P ); P ].

Vamos relembrar o Exemplo 3.2. N´os exibimos uma f´ormula α(P ) := φ(<) ∧ ψ(c) ∧ θ(P )

tal que Circ[α(P ); P ] define P implicitamente e tal que Circ[α(P ); P ] |= ∀x(P (x) ↔ φ(x)), onde P n˜ao ocorre em φ(x), mas

Circ[α(P ); P ] 6≡ α(P ) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x)).

Agora, chamamos aten¸c˜ao ao seguinte fato. Uma teoria pode admitir v´arias defini¸c˜oes expl´ıcitas para um s´ımbolo definido implicitamente. Se ao inv´es da defini¸c˜ao φ(x) utilizarmos a defini¸c˜ao φ′(x) := (x = c), n´os temos

Circ[α(P ); P ] ≡ α(P ) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ′(x)).

Fica a pergunta: ser´a que, quando Circ[α(P, Z); P ; Z] define P implici- tamente, existe uma defini¸c˜ao expl´ıcita φ(x) tal que a equivalˆencia 3.2 seja satisfeita? N´os vimos no Teorema 3.14 que se α(P ) for bem-fundada e a cir- cunscri¸c˜ao n˜ao envolver objetos variantes, ent˜ao qualquer defini¸c˜ao expl´ıcita φ(x) para P satisfaz a equivalˆencia 3.2. Mostraremos abaixo que a resposta a essa pergunta ´e afirmativa para qualquer f´ormula α(P, Z).

Primeiramente, vamos demonstrar o seguinte lema a respeito de Circun- scri¸c˜ao quando esta pode ser escrita em primeira-ordem, isto ´e, quando uma circunscri¸c˜ao ´e equivalente a uma teoria de primeira-ordem.

Lema 3.15 Seja α(P , Z) uma S ∪ {P } ∪ {Z}-f´ormula de primeira-ordem, P = P1, . . . , Pn e Z = Z1, . . . , Zm tuplas de s´ımbolos relacionais. Se

M od(Circ[α(P , Z); P ; Z])

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 65 Prova. Suponha que existe Circ[α(P , Z); P ; Z] tal que

Circ[α(P , Z); P ; Z] ≡ T hFO(Circ[α(P , Z); P ; Z])

e T hFO(Circ[α(P , Z); P ; Z]) n˜ao ´e equivalente a nenhuma f´ormula φ de pri-

meira-ordem. Sejam P′ = P

1, . . . , Pn′ e Z′ = Z1′, . . . , Zm′ tuplas de s´ımbolos

relacionais tais que a aridade de Pi ´e igual `a de Pi′ e a aridade de Zi′ ´e igual

`a de Zi, 1 ≤ i ≤ n. Considere a teoria

Θ := T hFO(Circ[α; P ; Z]) ∪ {α(P′, Z)}.

Obviamente, para qualquer S ∪ {P , Z, P′, Z}-estrutura

C:= (A, P, Z, P, Z),

temos que

C|= Θ sss (A, P, Z) |= Circ[α(P , Z); P ; Z] e (A, P, Z) |= α(P, Z),

onde P e P′ s˜ao tuplas de predicados em A que interpretam P e P. Con-

sidere a teoria Θ′ := Θ ∪ {P′ ( P }. Obviamente, Θ′ ´e inconsistente, pois, caso contr´ario, haveria um modelo C = (A, P, Z, P′, Z) de Θe nesse caso

(A, P′, Z) P;Z (A, P, Z), contrariando (A, P, Z) |= Circ[α(P , Z); P ; Z].

Por Compacidade da l´ogica de primeira-ordem, seja Θ0um subconjunto finito

de Θ tal que Θ0∪ {P′ (P } ´e inconsistente. Seja

Cα P;Z :=

^

{Θ0∩ T hFO(Circ[α(P , Z); P ; Z])}

uma f´ormula de primeira-ordem. Por defini¸c˜ao de Cα

P;Z, todo modelo P ; Z-

minimal de α(P , Z) ´e modelo de α(P , Z) ∧ Cα

P;Z. Seja (A, P, Z) um modelo

de α(P , Z) ∧ Cα

P;Z. Suponha que (A, P, Z) n˜ao ´e modelo P ; Z-minimal de

α(P , Z). Ent˜ao existe um modelo (A, P′, Z) de α(P , Z) tal que

(A, P′, Z) P;Z (A, P, Z).

Mas nesse caso C := (A, P, Z, P′, Z) ´e modelo de Θ

0∪ {P′ (P }. Absurdo.

Portanto, (A, P, Z) ´e modelo P ; Z-minimal de α(P , Z). Isso significa que Circ[α(P , Z); P ; Z] ≡ α(P , Z) ∧ CPα;Z.

Logo, M od(Circ[α(P , Z); P ; Z]) ´e elementar.

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 66 Teorema 3.16 Seja α(P, Z) uma S∪{P, Z}-senten¸ca em l´ogica de primeira-

ordem tal que Circ[α(P, Z)] ´e equivalente a uma teoria de primeira-ordem Γ e P ´e definido implicitamente por Circ[α(P, Z)]. Ent˜ao existe uma defini¸c˜ao expl´ıcita φ(x) de P —onde, obviamente, P n˜ao ocorre—tal que

Circ[α(P, Z)] ≡ α(P, Z) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x)).

Prova. Pelo Teorema 3.15, existe uma S ∪ {P, Z}-senten¸ca de primeira- ordem γ(P, Z) tal que Circ[α(P, Z)] ≡ γ(P, Z). Como Circ[α(P, Z)] define implicitamente P , pelo Teorema de Beth existe uma defini¸c˜ao expl´ıcita ψ(x) de P tal que

γ(P, Z) |= ∀x(P (x) ↔ ψ(x)). (3.3) Seja γ′ := γ(ψ, Z) uma S ∪ {Z}-senten¸ca de primeira-ordem, onde γ(ψ, Z) ´e obtido a partir de γ(P, Z) substituindo ´atomos da forma P (t) por ψ(t). Se A´e um S ∪ {Z}-modelo de γ, ent˜ao existe um predicado P tal que (A, P) ´e modelo de γ(P, Z)—basta fazer P := {a ∈ A|A |= ψ(x)[a]}. Por outro lado, se (A, P) |= γ(P, Z), ent˜ao A |= γ′—por 3.3. Logo

(A, P) |= γ(P, Z) sss A |= γ′ e P := {a ∈ A|A |= ψ(x)[a]}. (3.4) Seja φ(x) := γ′ ∧ ψ(x). Como γ(P, Z) |= γ′—veja 3.4—ent˜ao

γ(P, Z) |= α(P, Z) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x)).

Seja (A, P) um modelo de α(P, Z) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x)). Se P = ∅, ent˜ao (A, P) ´e modelo P ; Z-minimal de α(P, Z). Se P 6= ∅, ent˜ao existe a ∈ An tal

que (A, P) |= P (x)[a]. Mas como (A, P) |= ∀x(P (x) ↔ φ(x)), ent˜ao existe a ∈ Antal que (A, P) |= γ∧ψ(x). Logo (A, P) |= γe, como P n˜ao ocorre em

γ′, A |= γ. Utilizando novamente o fato de que (A, P) |= ∀x(P (x) ↔ φ(x)),

temos P := {a ∈ A|A |= ψ(x)[a]}. Mas como A |= γ′, ent˜ao P := {a ∈

A|A |= φ(x)[a]} = {a ∈ A|A |= ψ(x)[a]}. A partir de 3.4 temos que (A, P) ´e modelo de γ(P, Z) e portanto modelo P ; Z-minimal de α(P, Z). Portanto

Circ[α(P, Z)] ≡ α(P, Z) ∧ ∀x(P (x) ↔ φ(x)).

Na pr´oxima se¸c˜ao, investigaremos o poder expressivo das NATs de Lifs- chitz, que s˜ao generaliza¸c˜oes da Circunscri¸c˜ao.

CAP´ITULO 3. CIRCUNSCRIC¸ ˜AO 67

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