• Nenhum resultado encontrado

O Estado Democrático de Direito, a submissão da matéria ao plenário para votação e a democracia deliberativa: a importância das audiências

4 O PROTAGONISMO DA FUNÇÃO LEGISLATIVA DO PODER ESTADUAL EM RELAÇÃO À DESPESA PÚBLICA COM PESSOAL: O caso do Estado

4.2. O Estado Democrático de Direito, a submissão da matéria ao plenário para votação e a democracia deliberativa: a importância das audiências

públicas

Tramitada a matéria naquelas comissões, o natural é que a mesma seja submetida ao plenário para que enfim possa ser apreciada pelos parlamentares e, se for o caso de aprovação, ser remetida novamente para a função executiva do Poder.

A depender da estruturação do regimento interno, pode o parlamento, antes da apreciação, submeter o assunto a uma audiência pública onde possa escutar todos os membros da sociedade, desde o servidor público ao cidadão que não é afetado diretamente pela expansão da política remuneratória.

Além de garantir maior transparência em relação à gestão fiscal, a promoção de audiências públicas também proporciona a possibilidade de um controle mais universal em relação ao aumento da despesa pública com pessoal.

293Ivana Souto Medeiros observa que “O orçamento público revela-se como importante aliado

na tarefa redistribuitiva empreendida pelo Estado. É no seio da elaboração orçamentária que será travado o debate sobre a definição de prioridades e identificação dos segmentos sociais mais carentes de recursos, subsidiando as decisões políticas atinentes às escolhas das necessidades que serão contempladas pelos gastos públicos. Esta é uma oportunidade crucial para que o Estado atue na correção das distorções de renda geradas pelo sistema capitalista, redistribuindo riquezas de forma equitativa entre os mais diversos setores da sociedade.” MEDEIROS, Ivana Souto. O Papel do Orçamento Público na realização do desenvolvimento nacional. Revista Constituição e Garantias de Direito, v.8, n. 1, 2015. Disponível em https://periodicos.ufrn.br/constituicaoegarantiadedireitos/article/view/8157/5895 acesso em 12/11/2017

As audiências públicas são vetores que proporcionam a educação político e o desenvolvimento cívico da população, muito embora esta não tenha

ainda despertado para o seu verdadeiro papel social294.

Se o poder emana do povo, conforme assevera a Constituição Federal, logo o mesmo deve garantir o seu exercício por todos os meios que lhe são ofertados pelo ordenamento jurídico vigente e as audiências públicas são um excelente canal de comunicação entre qualquer política pública, o parlamento e a sociedade.

A educação política e o desenvolvimento cívico da população são ações

primordiais para o desenvolvimento da democracia deliberativa295,

característica do Estado Democrático de Direito296 a qual possibilita a pressão

popular no processo de tomada de decisão da administração pública.

294

Caroline Leal Ribas anota que “As audiências públicas consistem em reuniões para se debater questões de âmbito público, o que se requer a participação ativa da sociedade civil durante processos de elaboração de planos orçamentários e na tomada de decisões. Segundo Carvalho Filho apud Felipe (2014, p. 59), a audiência pública destina-se a obter manifestações orais bem como provocar debates em sessão pública especificamente destinada para o debate acerca de determinada matéria. Frisa-se a necessidade de haver uma divulgação prévia e ampla do local, data e horário das audiências, para que sejam debatidos certos pontos acerca de uma determinada questão, abrindo-se a palavra a todos os interessados, de forma que a autoridade presente esteja aberta para aceitar críticas e propostas oriundas dos membros da sociedade (Medauar, 2012, p. 189). RIBAS,Carolline Leal. Equilíbrio Democrático e Controle Social: O Controle dos Atos de Gestão da Administração Pública por Meio da Participação Popular. Revista Direito Público. V. 12, n. 64, 2015. Temas Atuais de Jurisdição Constitucional e Controle de Constitucionalidade. Disponível em https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/2398/pdf acesso em 12/11/2017

295 Sobre democracia deliberativa eis o ensinamento de Luiza Christmann: “Na medida em que

a política deliberativa visualiza a discussão e a decisão de temas públicos como um processo em que os indivíduos virtualmente atingidos devem participar e, nesse ínterim, estão potencialmente orientados para a formulação cooperativa de pretensões de validade, identifica- se a proposta de um processo democrático complexo e rico. A democracia deliberativa, nesse sentido, não se mostra limitada aos mecanismos de eleições e representação, incorporando outras esferas em que deliberações direcionadas à formação da opinião acontecem. Dessa maneira, tematizações realizadas na esfera pública informal devem ser consideradas na tomada de decisão final, pelo Poder Público, a fim de que o exercício do poder político seja legítimo. Diante do exposto, entende-se que a democracia deliberativa se constitui em um modelo analítico suficientemente promissor para a atuação da população. CHRISTMANN, Luiza Landerdahl. Democracia Deliberativa e Participação Popular no Licenciamento Ambiental do OSX-Estaleiro/SC: desafios e possibilidades. Revista Veredas do Direito: Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Belo Horizonte/MG: v. 10, n. 20, p. 111, abril

de 2014. Disponível em

http://www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/view/282/364 acesso em 12/11/2017.

296 O Estado Democrático de Direito proporciona o preenchimento de lacunas na administração

pública e sobre isso escreve Caroline Muller Bitencourt e Eduarda Simonetti Pase que “a administração precisa ser vista (tanto pela sociedade civil como por seus representantes legítimos) como espaço onde a participação social seja livre e igualitária, de forma a permanentemente se propiciar o controle no que tange a administração e gestão dos interesses dessa sociedade. Daí porque se falar em democracia “não-amadurecida”, isto é, não

O exercício da democracia está diretamente relacionado à participação popular e a construção concomitante da administração pública que é determinada pela constituição federal: eficiente cuja racionalização dos recursos públicos é imperiosa.

Determina a Constituição Federal que economicidade na gestão do Erário em relação às despesas correntes inclusive deve resultar em destinação orçamentária para aplicação em ações como desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de

adicional ou prêmio de produtividade297.

Além da imposição da LRF em se ter controle do gasto público em relação à despesa com pessoal, o próprio texto constitucional, influenciado pela positivação do princípio da eficiência administrativa, fomenta a racionalidade na expansão da política remuneratória como forma de insumo a própria melhoria na prestação dos serviços públicos.

O incentivo a concessão de prêmios e até mesmo de gratificação por produtividade em virtude da economia em relação às despesas correntes é um convite que é feito para o gestor público no sentido de que o mesmo deve planejar sistematicamente as suas ações.

A economia das despesas correntes remete ao custeio da máquina pública, que vai desde ações simples como a determinação de impressão se

se pode admitir que o exercício da cidadania se reduza apenas a configurar um eleitorado temporário, por exemplo. Ou que venha esporadicamente ser suscitado a atuar em pesquisas de opinião política. Requer-se, ao invés que seja visto como “ator de política, mesmo não podendo sempre decidir de forma direta, pois a democracia direta não é nem a única forma nem a forma legitimamente superior. Também não se tem a visão romântica de que tudo se resolverá proporcionando esses espaços de participação à comunidade, até porque estes espaços existem e via de regra são apenas formalmente ocupados. O que se busca indicar como essencial para a realização da democracia em países em desenvolvimento como o Brasil, é a qualificação desses espaços de discussão, onde a participação deliberativa ocorra de forma espontânea, livre e igualitária, sem que se empregue meios tão somente formais de realização.” BITENCOURT, Caroline Muller; PASE, Eduarda Simonetti. A necessária relação entre democracia e controle social: discutindo os possíveis reflexos de uma democracia “não amadurecida” na efetivação do controle social da Administração Pública. Revista de Investigações Constitucionais. V. 2, n. 1, 2015. Disponível em http://revistas.ufpr.br/rinc/article/view/43663/26575 acesso em 12/11/2017.

297 Art. 38 Omissis [...] §7º Lei da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

disciplinará a aplicação de recursos orçamentários provenientes da economia com despesas correntes em cada órgão, autarquia e fundação, para aplicação no desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de adicional ou prêmio de produtividade.

utilizando da configuração “frente e verso” até mesmo a estruturação de uma política remuneratória que incentive o aumento remuneratório vinculado ao desenvolvimento técnico da carreira.

Este último cenário inclusive incentiva a competitividade no âmbito do serviço público sem prejuízo da defesa ao princípio da isonomia. Assim, uma vez investido em um cargo público, fica facultado ao servidor público se capacitar no âmbito da sua área institucional condicionado a concessão de um adicional por titulação.

Para isso, no âmbito da função executiva do Poder, o próprio texto constitucional determina a criação de escolas de governo que são responsáveis pela formação e aperfeiçoamento dos servidores públicos, sendo

a participação nos cursos um dos requisitos para a formação na carreira298.

A capacitação do serviço público, que deve ser contínua, é um critério que deve ser levado em consideração quando do aumento remuneratório e vale lembrar que aumento remuneratório é completamente diferente de reajuste para recomposição das perdas inflacionárias, instituto previsto nos

termos da revisão geral anual prevista expressamente no art. 37, X299 inciso da

Constituição Federal.

Caso a avaliação em relação à capacitação dos servidores não tenha sido feita no processo de planejamento no âmbito da função executiva do Poder, cabe à população, durante o trâmite da matéria no parlamento, averiguar se a classe de servidores que postula o aumento remuneratório tem se capacitado ao longo dos anos, porquanto a sociedade como um todo também é intérprete da Constituição.

O conceito de gestão fiscal responsável deve levar em consideração critério técnico para o aumento remuneratório no âmbito do serviço público, pois o próprio texto constitucional resguarda a recomposição inflacionária anualmente.

298

Art. 39. Omissis [...] §2º A União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento de servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados.

299 Art. 37 Omissis [...] X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o

§4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.

Assim, é defeso ao serviço público postular aumentos remuneratórios sem a apresentação de dados empíricos que legitimem o aumento daquele tipo de despesa pública com base na melhoria do serviço público conforme determina o texto constitucional.

Dessa forma devem ser reinterpretados os critérios para o aumento remuneratório e a pressão que deve ser exercida é do serviço público e da sociedade para os servidores públicos e não o contrário conforme é feito atualmente inclusive com a utilização de greves para constranger o administrador público a conceder aumentos remuneratórios.

A definição do gasto público possui relevância que ressoa a uma visão

sistêmica da administração pública300 e esta é alicerçada na eficiência da

prestação dos seus serviços. Logo, se não há eficiência na prestação dos serviços públicos, não há razões para a concessão de aumento remuneratório para os servidores que integram a sua carreira.

A título de exemplificação, se não há aumento de arrecadação em virtude de problemas técnicos correlatos à gestão do fisco, não se vê possível a concessão de aumento remuneratório para a classe dos auditores fiscais em virtude da ausência de critérios técnicos.

Por outro lado, quando não se possa mensurar critérios correlatos à arrecadação como forma de termômetro para a concessão de aumento remuneratório, deve o gestor público observar a qualidade dos serviços ofertados por determinada classe de servidores.

O Ministério da Educação possui uma diretriz chamada Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, o qual possibilita o

300

Para Evandro José Bilyz de Camargo, Andréa da Silva Pereira e Janaína Rigo Santin “A definição de gastos públicos encontra-se alicerçada na movimentação das contas públicas e, dentro do que se refere à Lei de Responsabilidade Fiscal, normas de finanças voltadas para a responsabilidade, equilíbrio e sustentabilidade fiscal. Desta forma, ao olhar mais diretamente para tal definição é necessário que se entenda a relevância e a importância de uma gestão fiscal responsável dentro da administração pública como um todo, pois em um momento como o atual, onde a crise atinge economicamente a toda a sociedade e todos os entes federativos, a preocupação com os gastos está na primeira ordem. O administrador público deve estar preparado para o gerenciamento das variáveis que compõem um dos fatores de maior importância dentro do Estado brasileiro e que guarda a sua relevância para a boa gestão. Aliado a isso, o gasto público é visto sob a ótica das escolhas políticas a que os governos se propõem, as quais devem estar sempre atreladas a uma visão constitucional da receita e da despesa.” CAMARGO, Evandro José Bilyz de; PEREIRA, André da Silva; SANTIN, Janaína Rigo. Administração Pública Municipal e Lei de Responsabilidade Fiscal: gastos e receitas públicas. Revista de Direito Brasileira. V. 17, n. 7, 2017. Disponível em http://www.rdb.org.br/ojs/index.php/rdb/article/view/587/353 acesso em 13/11/2017.

monitoramento da qualidade da educação pela população por meio de dados

concretos, com o qual a sociedade pode se mobilizarem busca de melhorias301.

É aí onde se enquadra a participação popular em audiências públicas que devem ser promovidas pelo parlamento.

Caso o gestor público, pressionado pela classe de professores que ameaça entrar em greve caso não seja concedido aumento remuneratório além dos valores previstos no reajuste em relação ao piso nacional, envie projeto de lei que contemple aumento remuneratório, pode a população, se convidada pelo parlamento através de uma audiência pública, colaborar emitindo a sua opinião sobre o mérito daquele ato administrativo.

A consecução da administração pública democrática deve ser oportunizada diariamente e para isso é necessária a efetiva ampliação dos

canais de participação entre o Estado e a sociedade civil organizada302.

O direito administrativo deve se moldura ao interesse público da sociedade e para isso nada mais justo do que escutá-la durante o processo legislativo, pois, se o poder emana do povo, este realmente deve exercê-lo de forma plena.

A função administrativa deve ser constitucionalizada em todos os seus termos e para isso não deve o gestor se ater especificamente ao seu múnus público em relação ao exercício da administração do Erário e dos serviços públicos que lhe são correlatos.

Deve o mesmo planejar as suas ações com uma estratégia participativa além do espaço moldurado pelos gabinetes. Com a constitucionalização do direito administrativo o seu desafio é democratizar o exercício da do exercício

301

Para melhores informações deve o leitor consultar o endereço eletrônico do Ministério da Educação: http://portal.mec.gov.br/conheca-o-ideb acesso em 13/11/2017

302

José Sérgio da Silva Cristóvam anota que “A participação popular da sociedade civil na formulação, acompanhamento da execução e controle das decisões do Poder Público acerca de uma série de políticas públicas, apresenta-se como um dos mais fecundos traços de consolidação de um modelo de Administração Pública democrática. Isso reclama, inclusive, a efetiva ampliação dos canais de diálogo entre os governos e a sociedade civil, assecuratórios da participação social na atividade e na decisão administrativa, pela via instrumental das audiências públicas, consultas públicas, fóruns de debate etc. , com o fortalecimento da atuação de comissões e conselhos sociais e populares e a aproximação da sociedade civil ao debate democrático sobre as políticas públicas que impactam na vida da comunidade política.” CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. O Estado Democrático de Direito como Princípio Constitucional estruturante do direito administrativo: uma análise a partir do paradigma emergente da administração pública democrática. Revista de Direito Administrativo e Gestão Pública. Curitiba/PR. V.2, n. 2. Jul/Dez 2016. Disponível em http://www.indexlaw.org/index.php/rdagp/article/view/1302/1728 acesso em 13/11/2017.

da função administrativa e para isso escutar a população é de fundamental

importância303.

Para se instruir no processo de preparação das eventuais audiências públicas, a sociedade possui como referencial um órgão técnico que assessora o próprio parlamento, que é o tribunal de contas.

4.3. O tribunal de contas: do papel pedagógico ao parecer pela