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2 OS REFLEXOS DA REFORMA DO PODER

2.4 DEMOCRATIZAÇÃO, FUNÇÃO

ADMINISTRATIVA E FORMAS DE CONTROLE

No período anterior à Constituição de 1988 - ditadura e transição democrática - a autonomia do administrador público

lhe permitia desenvolver agendas próprias independentemente das demandas sociais, facilitando assim a introdução de práticas patrimonialistas em relação às instituições.

Assim, a Constituição de 1988 buscou enfrentar esses problemas pelo reforço do Poder Legislativo; criação de instâncias de participação social, instrumentos e instituições de proteção à sociedade civil; e detalhamento da agenda do Estado a ser executada pelo Executivo (PIRES, 2011).

O cenário atual de ampla disputa política, diante das transformações sociais do final do século XX e início do século XXI, tem exposto as fragilidades dos modelos existentes. Assim, as mudanças necessárias no controle devem caminhar na direção de ampliação e consolidação da democracia no Brasil, tendo em vista que o controle social na aplicação dos recursos públicos colocados à disposição do Estado é um tema extremamente importante para ser discutido (SILVA, 2002).

Nos últimos anos, constatou-se que o país tem se defrontado com inúmeros casos de desvios e impropriedades na execução do gasto público. Muitas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI´s) foram criadas a fim de esclarecer casos de corrupção e desmandos na Administração Pública por práticas neopatrimoniais. Esses fatos impõem a urgência de uma discussão profunda sobre o tema controle, pois se acumula um elevado custo social pela má utilização de recursos públicos.

Além disso, a democratização das instituições do Estado brasileiro foi acompanhada por ampla discussão sobre o papel e as virtudes imanentes à adoção de mecanismos de controle social sobre a gestão pública, sobre os controles burocráticos administrativos e os controles judiciais. Percebeu- se que houve a consolidação das instituições políticas democráticas e a revalorização do ativismo da sociedade civil e que estes potencializaram as demandas por participação nas políticas por parte de um número crescente de organizações civis (LOPEZ e ALENCAR, 2011).

O foco principal da Constituição de 1988 foi a estruturação de formas institucionais de controle da administração pública para combater tais desvios. São exemplos deste movimento o aumento dos poderes do Tribunal de Contas da União (TCU), a intensificação da ação do Ministério Público Federal (MPF) e a estruturação do controle interno do Poder Executivo.

Os três poderes do Estado: Legislativo, Executivo e Judiciário exercem a função administrativa do Estado e seus atos estão sujeitos a controle, tendo vem vista que tais atos são subordinados à Constituição Federal e às normas infraconstitucionais.

Assim, os poderes Executivo e Legislativo em conjunto definem as grandes diretrizes nacionais, traduzidas em leis, planos, projetos, quem irá executá-los, que metas deverão perseguir, entre outros. Em todas essas situações as decisões técnicas podem ter forte impacto social, seja por realizar ou por postergar o atendimento de uma demanda da sociedade (PIRES, 2011).

Surge nesse cenário o controle social da função administrativa do Estado, que se mostra necessário em virtude de ser consequência necessária, imediata e inafastável do princípio republicano, o qual alicerça o sistema constitucional brasileiro. E, mais do que isso, advém da própria ideia de soberania popular, que determina que o administrador deve responder por seus atos e omissões perante o Legislativo, o Judiciário e o Executivo mas, sobretudo, perante o próprio povo – verdadeiro titular da res publica (SIRAQUE, 2005).

Sobre o assunto, devem-se destacar os ensinamentos de Meirelles (2007, p. 664) que mostram a necessidade de controle na Administração Pública:

A Administração Pública, em todas as suas manifestações, deve atuar com legitimidade, ou seja, segundo as normas pertinentes a cada ato e de acordo com a finalidade e o interesse

coletivo na sua realização. Até mesmo nos atos discricionários a conduta de quem os pratica há de ser legítima, isto é, conforme as opções permitidas em lei e as exigências do bem comum.

Assim, se tal controle não for exercitado, normas poderão ser infringidas e os atos administrativos poderão se desviar da sua finalidade, o que poderá levar à anulação desses atos.

Para Pires (2011) o controle da administração pública é, essencialmente, institucional, e incide a posteriori sobre os atos administrativos, desempenhado por órgãos cujo foco é o controle da lei, por exemplo: Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público e tribunais. São tênues mecanismos que privilegiam o controle social efetivo da ação, exercido ex ante.

É importante destacar que o conceito de controle no âmbito da Administração Pública se reveste da “faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro.” (MEIRELLES, 2007, p. 665).

As principais características que devem ser destacadas do termo “controle” são: parcialidade, pessoalidade, subjetividade e o exercício de um direito subjetivo ou de um dever de ofício (SIRAQUE, 2005).

Quanto aos tipos e formas de controles existentes nesse cenário da Administração Pública, deve-se levar em conta que irão variar em decorrência do Poder, do órgão ou da autoridade que o exercita, como explica Meirelles (2007, p. 666):

[...] o controle da própria Administração sobre seus atos e agentes (controle administrativo ou executivo) e, a seguir, o do Legislativo sobre determinados atos e agentes do Executivo (controle legislativo ou parlamentar) e, finalmente, a correção dos atos ilegais de

qualquer dos Poderes pelo Judiciário, quando lesivos de direito individual ou do patrimônio público (controle judiciário ou judicial). Referidos controles, quanto ao fundamento, são considerados hierárquicos ou finalísticos. Já quanto à localização do órgão que os realiza, podem ser internos ou externos (MEIRELLES, 2007).

Quanto ao momento em que são exercidos, podem ser: prévio, concomitante e a posteriori. Quanto à forma, podem-se dividir os instrumentos de fiscalização e monitoramento da administração pública em tradicionais/institucionais (interno/externo) e em controle social (TORRES, 2012, p. 279).

Para Meirelles (2007, p. 666) a classificação dos controles quanto ao “momento em que são feitos, consideram- se prévios, concomitantes ou subsequentes, ou, por outras palavras, preventivos, sucessivos ou corretivos.” Já quanto ao aspecto controlado continua o referido autor: “podem ser de legalidade ou de mérito.”

É importante deixar claro que a necessidade da discussão em torno do tema controle se impõe, não somente por causa das impropriedades e corrupção existentes na Administração Pública, mas fundamentalmente a fim de garantir que existam elementos e dispositivos, dentro do ciclo de gestão, que propiciem os ajustes necessários nas políticas públicas para uma aplicação mais eficiente e transparente dos recursos públicos (SILVA, 2002).

Para Siraque (2005, p. 94) o “controle sobre a função administrativa do Estado é o gênero que poderá ser classificado em duas espécies: 1) controle institucional; 2) controle social”.

Deste modo, o controle institucional pode ser dividido em interno e externo. O controle institucional interno seria uma autofiscalização voltada para preparação de prestação de contas, por exemplo. Já o controle institucional externo seria

aquele que é realizado por órgão estatal diverso daquele que emite o ato administrativo, por exemplo, (SIRAQUE, 2005).

Siraque (2005) ainda destaca:

O controle institucional interno é a alma do plano de organização da Administração Pública. Sem ele não é possível garantir transparência da atividade administrativa e os objetivos constitucionais da República. Podemos afirmar que o controle institucional interno é a viga mestra do controle institucional externo e do controle social dos atos da Administração Pública (SIRAQUE, 2005, p. 95).

Partindo dessa afirmação, cabe conceituar e caracterizar o controle social.

O controle social ganha força no cenário brasileiro e mundial à medida que os cidadãos clamam por maior transparência dos atos e maior prestação de contas.

Deve-se levar em conta que o controle social tem emergido de um processo de reestruturação democrática e que, há vinte e seis anos ganhou o primeiro impulso com o advento da Constituição de 1988. Assim destaca Pires (2011, p. 61):

O controle social visa pressionar as instituições a serem mais ágeis e transparentes, e também propiciar um suporte de legitimidade às decisões de direção. Trata-se de instância política da comunidade de usuários de um serviço público. Para poder bem exercer este papel é essencial que sua composição abrigue o contraditório das partes interessadas. Não é um conselho de apoiadores, mas de críticos interessados de modo objetivo num determinado padrão de resultado da organização, e legitimados por um conjunto de atores sociais.

Constata-se, portanto que o termo controle social tem se referido à possibilidade de atuação dos grupos sociais (sociedade civil) por meio de qualquer uma das vias de participação democrática no controle das ações do Estado e dos gestores públicos.

O controle social para o autor Siraque (2005, p. 105) pode assim ser caracterizado:

O controle social está classificado na categoria dos direitos e garantias individuais, mas não visa a atender somente o interesse individual das pessoas enquanto tais, mas ao interesse público, ao bem comum, ao interesse da sociedade, da coletividade, da cidadania e das próprias finalidades do Estado. O interesse finalístico do controle social é, na prática, o controle das ações dos governos, dos agentes da Administração Pública, tendo como interesse maior o objetivo de fiscalizar as autoridades administrativas do Estado para saber se estão agindo conforme as normas constitucionais, especialmente as dos art. 37 da Carta Magna. Já a finalidade do controle social é a de verificar se as decisões que estão sendo tomadas pelo Estado estão sendo executadas de acordo com o cronograma de atividades previamente aprovado, se os atos estão em consonância com o que prescreve a Constituição Federal de 1988 e com as normas infraconstitucionais (SIRAQUE, 2005).

O reconhecimento de um espaço público não estatal e a necessidade de organizações de controle social se tornaram muito importantes no momento em que a crise do Estado intensificou a dicotomia entre Estado e mercado. Assim explana Pereira (2009, p. 197):

Na verdade, a forma pública não-estatal de propriedade é uma alternativa cada vez mais significativa, não só porque as organizações

públicas não-estatais de serviço prestam serviços sociais e científicos, mas especialmente porque as organizações de controle social tornam responsáveis os funcionários governamentais e mais representativa a democracia participativa. No entanto, que o controle social aqui explanado, referente à função administrativa do Estado, pode sofrer limitações em virtude de diversos fatores, tais como o tráfico de influências, clientelismo político, dificuldades de acesso ao Poder Judiciário, dificuldades de acesso às informações públicas, ausência de cultura participativa e fiscalizatória, corrupção, entre outros.

Logo, tais limitações criam uma cultura política que desagrega a sociedade, desarticula a cidadania, não promove a cidadania nem a participação política. Tais práticas colocam então a Administração e o cidadão comum numa relação de soberano e súdito (MELLO, 2002).

2.5 A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004 E A

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