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5. Análise dos dados

5.1 Movimento Tradicionalista Gaúcho

5.1.1 Departamento de Concursos Culturais

De acordo com Ferreira (2016), historicamente o ingresso de jovens no movimento tradicionalista estava ligado a vivência de um ideal e do desejo de estar rodeado pela atmosfera cultural de um CTG, contudo, novas gerações não compartilhavam deste mesmo sentimento, reduzindo, assim, o número de novos adeptos aos galpões. Neste ponto surgem os concursos culturais com a finalidade de ser a motivação de ingresso de jovens no tradicionalismo e assim despertar o desejo de ali permanecer. Segundo o autor, ainda hoje o apelo competitivo se torna a porta de entrada de muitos jovens no tradicionalismo, sendo considerada uma área de grande relevância dentro do MTG.

No contexto de competições culturais, o departamento de concursos culturais apresenta-se como principal agente de regulação das competições culturais oficiais do MTG, tendo como principal atribuição a organização da Ciranda Cultural de Prendas e do Entrevero Cultural de Peões. Apesar da denominação de concurso, segundo o MTG, ambos eventos têm como finalidade despertar e incentivar o estudo da cultura sul-rio-grandense entre os jovens tradicionalistas.

Ambos concursos culturais são estruturados em três fases distintas, sendo a primeira a escolha das representantes das entidades tradicionalistas sob

responsabilidade destas, a segunda fase é de responsabilidade conjunta entre a Coordenadoria regional e o MTG para escolha dos representantes regionais, e a última fase de responsabilidade do MTG através do departamento de concursos culturais para a escolha dos representantes estaduais. Os eventos possuem sede itinerante, sendo realizado, preferencialmente, na cidade do detentor do título estadual.

O Concurso Estadual de Prendas, etapa final da Ciranda Cultural de Prendas, é realizado anualmente na segunda quinzena de maio, tendo como finalidade eleger 1º, 2º e 3º Prendas do Rio Grande do Sul, nas categorias adulta, juvenil e mirim. O concurso originou-se no ano de 1959 a partir de uma iniciativa conjunta da Rádio Gaúcha, do Jornal Última Hora e da VARIG. A primeira edição contou com a participação de trinta e uma prendas e ofereceu o título de “Mais Linda Prenda do Rio Grande do Sul (MALLMANN, 2009).

Conforme Mallmann (2009, p.11), “desde o início do concurso, os tradicionalistas não viam com bons olhos este evento, pela maneira como era feita a escolha”, assim durante o 15º congresso tradicionalista, no ano de 1970, o concurso passou a ser responsabilidade do MTG. O primeiro concurso, após a institucionalização, foi realizado no ano de 1971, durante o 16º congresso Tradicionalista, na cidade de Quaraí -RS.

De acordo com o regulamento do Concurso Cultural de Prendas (MOVIMENTO TRADICIONALISTA GAÚCHO, 2015d), a finalidade do concurso é despertar o gosto pelas tradições, engajando todos os envolvidos no estudo dos assuntos da cultura do Estado. Além disso, o concurso busca elevar o nível cultural e intelectual das prendas das entidades tradicionalistas desenvolvendo o interesse pelo estudo e pesquisa dos

temas abordados nas provas culturais24, assim como o aperfeiçoamento dos dotes

artísticos25 e desenvolvimento da comunicação oral26.

Com a institucionalização do concurso de prendas o MTG regulamentou e centralizou os critérios que determinam a “Prenda ideal”. A escolha da campeã leva em consideração uma série de atributos que a tornam uma representação análoga a memória inventada da mulher gaúcha. E nesse sentido Dutra (2002) escreve que esta construção da prenda enaltece uma figura da mulher dentro de “limites estipulados para ela”.

A prenda aparece como uma figura importante para o CTG e para o Movimento, seu papel é tido como fundamental, mas não é o central, é o secundário: ela está por trás cooperando e não à frente coordenando. Seu espaço segue reduzido à condição de mulher resignada, de boa esposa e mãe, pois o objetivo não é destacar-se no espaço público; ela participa apenas para auxiliar os homens que conduzem o Movimento, cumprindo o papel de ornamento ou de educadoras das novas gerações, que têm acesso ao conhecimento para transmitir aos futuros líderes do Movimento. (DUTRA, 2002, p.7)

A representatividade feminina, dentro do tradicionalismo, existe somente em relação ao seu par masculino, figuras inventadas sob valores patriarcais que determinam papeis específicos para homens e para mulheres. O concurso cultural de prendas acaba por reproduzir e limitar o papel da Prenda aos valores e significados que remetem ao gaúcho como identidade e fundador daquilo que se considera cultura gaúcha.

Já o concurso cultural de peões teve origem a partir de proposta apresentada no Congresso Tradicionalista do ano de 1988, com a denominação de “Concurso Troféu Farroupilha. Segundo Bastos (2016), inicialmente o evento era realizado em paralelo ao concurso de prendas, passando a ser realizado em conjunto com o

24 As provas culturais versam sobre geografia, história, folclore, tradição e tradicionalismo do Rio Grande do Sul, além de temas da atualidade, e uma redação.

25 As provas artísticas são compostas pela avaliação das habilidades em tocar um instrumento musical ou cantar ou declamar um tema gaúcho, executar uma dança tradicional e uma dança gaúcha de salão. 26 O objetivo da prova de comunicação oral é verificar a capacidade da candidata em se expressar com naturalidade e fluência. Para isso, nas categorias adulta e juvenil um tema é sorteado minutos antes da apresentação, enquanto na categoria mirim, o tema é livre.

FECARS a partir do ano de 1991. A denominação “Entrevero Cultural de Peões” foi adotada no ano de 2002 por iniciativa da Diretoria do MTG.

Segundo o regulamento do Entrevero Cultural de Peões (MOVIMENTO TRADICIONALISTA GAÚCHO, 2015c), o concurso tem a finalidade de elevar o nível cultural dos participantes27, criando condições para o desenvolvimento do espirito de

liderança, além de despertar o interesse pelo estudo dos temas ligados ao tradicionalismo e criar condições para o desenvolvimento de habilidades artísticas28,

campeiras e artesanato campeiro29. O formato do concurso cultural dos Peões

evidencia os valores patriarcais ressaltados anteriormente.

As diferenças atribuídas entre homem e mulher são evidenciadas pelos próprios objetivos do concurso cultural, no qual o peão deve desenvolver o espírito de liderança (Art.2º Parágrafo único, b – Regulamento do Entrevero Estadual de Peões), enquanto a prenda deve representar “as virtudes, a dignidade, a graça, a cultura, os dotes artísticos, a beleza, a desenvoltura e a expressão da mulher gaúcha” (Art.2º, IV – Regulamento da Ciranda Cultural de Prendas). Nesse sentido, Silva e Cirne (2013, p. 12) destacam que “o gaúcho é retratado como forte, desbravador”, enquanto as mulheres “se tornavam responsáveis pela sobrevivência e na manutenção da vida familiar”. Existe um reforço por parte do MTG em relação a divisão do trabalho de acordo com o gênero, sendo perpetuado através dos concursos culturais de peão e de prenda.

Assim, o departamento de concursos culturais perpetua uma visão que foi construída em relação ao peão e a prenda, valorizando habilidades enraizadas em um passado tido como glorioso pelo movimento. Visão que permeia não só as regras e avaliações dos concursos culturais, mas também é reproduzido nos cursos de

27 As provas culturais versam sobre os conteúdos de história do Rio Grande do Sul e do Brasil, geográfica, tradicionalismo, tradição e folclore do Rio Grande do Sul.

28 A prova artística exige do candidato a apresentação de uma dança de salão gaúcha, uma dança tradicional e declamar ou tocar ou cantar ou trovar temas tradicionais gaúchos.

29 A prova campeira é composta por três partes: A primeira uma prova sorteada entre: fazer churrasco, charquear, cevar o mate ou emalar capa/poncho. A segunda uma prova a pé (trançar, tosquiar ou tosar um animal) e uma prova a cavalo (laçar, apartar ou prova de rédeas). A terceira etapa consiste em encilhar, montar e cavalgar demonstrando os vários andaduras do cavalo.

formação tradicionalistas oferecidos pelo movimento. E nesse sentido, a próxima subseção apresenta como se organiza a formação tradicionalista.