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Desafios das famílias com crianças portadoras de SAF/PEAF

No documento TESE SAF DINA TINOCO (páginas 41-46)

Parte I: FUNDAMENTOS CONCETUAIS E TEÓRICOS

Capítulo 1: A SÍNDROME DE ALCOOLISMO FETAL

6. Desafios das famílias com crianças portadoras de SAF/PEAF

Tendo em conta toda a literatura revista, e a participação em grupos fechados nas redes sociais, uma família onde há uma criança portadora de SAF/PEAF é uma família com desafios acrescidos.

Dadas as características típicas destas crianças/adolescentes, a família, qualquer que seja o tipo, ver-se-á a braços com situações que exigem uma grande preparação psicológica. As crianças e os jovens nascidos com deficiências relacionadas com o álcool e as suas famílias têm que se debater não só com essas deficiências, mas também com a falta de compreensão e as expetativas irrealistas das pessoas que não compreendem o impacto dessas deficiências (Blackburn et al., 2012, p. 22). Em muitos países, há mesmo programas de apoio às famílias que acolhem/adotam bebés ou crianças pequenas que padecem de SAF/PEAF; esses programas incluem terapia familiar, instrumental ou terapia diática, na qual se lida com questões de relacionamento entre pais e cuidadores e o bebé/criança, bem como apoio domiciliar por parte de enfermeiros, terapeutas ocupacionais e/ou da fala, entre outros, que se afigurem necessários nesta fase. Estas famílias estão expostas a um elevado grau de stress, e por vezes a um esforço económico acrescido, o que poderá resultar num agravamento da saúde mental dos seus membros.

6.1. A família e a relação mãe/filho

Acerca disto, Davis (1994) sublinha o problema central que está na origem do nascimento de crianças cujas mães ingerem bebidas alcoólicas durante a gravidez, apontando para a falta de formação das mesmas, bem como a negação ou desvalorização do problema, quer por parte delas, quer por parte dos próprios médicos.

O ambiente em que uma criança com SAF/PEAF vem ao mundo é, em regra, desfavorável, principalmente quando a mãe ainda é dependente do álcool. O futuro da criança, bem como o da mãe, dependem em larga medida da continuação ou da não ingestão da bebida. Assim, a situação da família pode desenrolar-se de duas formas:

a) A mãe não consegue abster-se:

Segundo Löser (1995), as mães alcoólicas não gostam menos dos seus filhos que as mães saudáveis e gostariam de cuidar deles igualmente. No entanto, negligenciam geralmente os cuidados de alimentação e higiene, bem como o dever de contribuir para o bem-estar dos seus descendentes. O recém-nascido depende em primeira linha da sua mãe que, por sua vez, depende do álcool. É o álcool que constitui o ponto central na vida da mãe e não o recém- nascido. Mesmo que ela ame o seu bebé, os seus pensamentos concentram-se primeiramente na bebida devido à sua dependência e não consegue atender às necessidades de cuidados primários da criança. A disposição da mãe é, desta forma, afetada e alterada pelo álcool. O problema é que o bebé se apercebe das mudanças emocionais da mãe, nota que algo não está bem e esta incompreensão e instabilidade da situação podem originar medo na criança. Para além disto, a mãe também não constitui a pessoa responsável para a criança, o que impede o estabelecimento de uma verdadeira relação entre mãe e filho(a).

É precisamente uma criança portadora de SAF/PEAF quem mais precisa de atenção, amor e paciência para o seu desenvolvimento físico e emocional, principalmente para evitar ainda mais efeitos da bebida. Será consensual que a falta de atenção e de carinho podem agravar o atraso mental da criança, para além do estado do seu SNC.

b) A mãe consegue deixar de beber:

Segundo alguns dos autores revistos, nos E.U.A. muitas mães conseguiram recuperar-se, melhoraram a sua escolaridade e dedicaram-se à prevenção do alcoolismo e ao aconselhamento de outras mães sobre a SAF/PEAF.

É difícil admitir a sua dependência e procurar ajuda profissional. Porém, este primeiro passo constitui a base para conseguir cuidar e educar o seu bebé. Se a mãe não considerar o álcool como origem dos seus problemas e da situação do seu bebé, recusa o diagnóstico de SAF/PEAF e atribui o atraso no desenvolvimento do seu filho a outros fatores, como a

prematuridade, o baixo peso à nascença, as hospitalizações, o divórcio, etc. Se a mãe reconhecer a sua dependência e aceitar o diagnóstico de SAF/PEAF, terá também que se preparar para lidar com os sentimentos de culpa, preocupação e vergonha. SAF e PEAF são uma condição para toda a vida; as mães têm que estar seguras disso e fazer o seu melhor para estarem presentes quando os seus filhos necessitam e para ensiná-los a serem fortes e confiantes. A mãe deverá ter o apoio de alguém e poder, ela própria, apoiar outras vítimas, de modo a sentir-se mais segura e útil. Várias medidas terapêuticas podem ajudar as mães a ultrapassar a sua dependência e criar a base da aceitação do seu filho, o que contribuirá para o estabelecimento de uma relação mãe/filho suficientemente segura. Os autores Löser e Bierstedt (1998) são mesmo da opinião que uma gravidez pode ter um efeito positivo sobre mães alcoólicas e levar a uma mudança de atitude, já que elas veem o bebé como oportunidade e esperança de uma vida diferente. A criança torna-se pa aàelasàu à segu do te apeuta ,à ueàd um novo sentido de vida, que a dependente tentara, até ali, encontrar na bebida. Além disso, as mães deverão ter em mente que vários estudos comprovaram que o número de doenças causadas pelo álcool aumenta com o número de vezes que a mulher engravida. No entanto, e segundo Löser e Bierstedt (1998), caso a mãe consiga abdicar do vício, tem todas as hipóteses de vir a ter uma criança perfeitamente saudável, mesmo que isso aconteça durante apenas uma gravidez posterior.

6.2. A atitude social

Embora a Síndrome de Alcoolismo Fetal tenha sido reconhecida, e designada como tal, por Jones e Smith em 1973, constata-se que o tema das crianças com SAF é ainda, em muitas comunidades, quase um tabu ou simplesmente desconhecido pela generalidade das pessoas. As próprias mães dessas crianças continuam a ser apontadas pelo meio ambiente. Dedicou-se à SAF o dia 9.9.99, tendo grandes nações que têm a língua inglesa como oficial – E.U.A., Canadá, Grã- Bretanha, África do Sul e a Austrália –, ou a Alemanha e a Itália, (entre outras) organizado postos de informação e palestras profissionais sobre o assunto. De há uns anos a esta parte, há vários organismos a realizar encontros, seminários, workshops, conferências e cimeiras dedicadas à problemática relacionada com as consequências da ingestão de álcool na gravidez; basta procurarmos na internet, preferencialmente em inglês, para encontrar, todos os anos, eventos subordinados a este tema.

A vida da família da criança com SAF/PEAF é ainda mais árdua quando o aspeto ou o comportamento são visíveis. Nestes casos, a família depara-se com atitudes de rejeição, preconceito e acusação. No caso de crianças com aspeto/comportamento pouco identificáveis

com a síndrome, os pais são acusados de terem falhado na educação da criança e até de utiliza e àoàdiag sti oà “áF/PEáF à o oàdes ulpaàpa aàosàseusàe os.àHu e à àa es e taà ainda que, em qualquer dos casos, as famílias são muitas vezes marginalizadas e alvos da opinião pública.

A SAF e as PEAF devem ser um tema de debate generalizado entre as populações e não apenas para os especialistas ou objeto de estudo de alguns curiosos. Para se poder mudar esta situação é necessário confrontarmo- osà o à te asà o oà aà g idaà eà aà depe d ia ,à asà ia çasà o à “áF/PEáF à ouà ajudaà pa aà asà fa íliasà ati gidas .à Masà à espe ial e teà deà p e e ç o à ueàseàde eàfala .

Da mesma forma, a intervenção deve ter a participação de profissionais de vários ramos, segu doà u à p i ípioà deà oope aç oà ultidis ipli a .à Juntamente com os pais, também os médicos das várias especialidades (geneticista, pediatra, oftalmologista, psiquiatra, ortopedista), os psicólogos, os assistentes sociais, os terapeutas e os educadores/professores têm um papel relevante na educação e estimulação da criança com SAF/PEAF. Quanto mais nova for esta, maior é a importância da participação de profissionais especializados em intervenção precoce, terapia ocupacional e/ou da fala, consoante as necessidades da criança em questão, numa perspectiva de unicidade e de individualidade constantes. Os profissionais envolvidos devem evitar falar em da osà e e ais à ua doàfala à o àosàpais,àso àpe aàdeàpassa e àu aài age àdeàpessi is oà ou de incutirem neles um sentimento de culpa. A atitude a tomar será a de envolvimento de todos em estratégias de intervenção, como a repetição de determinados exercícios em ambiente naturalista. Agindo desta forma, e colocando de lado qualquer discriminação, os técnicos ganham aliados e compreendem melhor as circunstâncias familiares em que a criança se insere, nomeadamente os fatores que poderão atuar como barreiras. Para muitos pais, a cooperação com profissionais é mais uma fonte de stress, principalmente quando rejeitam o diagnóstico e reagem de forma incompreendida e despreocupada. Neste contexto, é por vezes desejável a intervenção de um psicólogo, que ajude não só a criança a entender as suas diferenças, mas também os pais/cuidadores a lidar com a situação. Apesar de as causas das Perturbações do Espetro do Alcoolismo Fetal serem físicas, os sintomas denotam-se mais ao nível comportamental e podem ter um impacto profundo na aprendizagem e, consequentemente, na vida diária as famílias. Os psicólogos educacionais podem não só ajudar os pais e as escolas a definir quais os comportamentos associados às PEAF que terão uma origem nos danos cerebrais em detrimento de escolhas erradas por parte do aluno, mas também a estipular estratégias pedagógicas que devem ser utilizadas junto do discente afetado.

Para além da cooperação com profissionais, há grupos de auto-ajuda dedicados a esta temática por todo o mundo. Mais uma vez, os países de língua inglesa estão na linha da frente no que concerne ao trabalho voluntário e de entreajuda e aos sítios de organizações governamentais que disponibilizam gratuitamente materiais e organizam eventos frequentes. Nas redes sociais há diversos grupos, abertos e fechados, de diálogo onde a troca de opiniões, informações e desabafos pessoais se avultam diariamente. Por exemplo, no Reino Unido, os grupos mais conhecidos e conceituados são: NOFAS-UK (http://nofas-uk.org); FASD Trust (http://fasdtrust.co.uk) e FASAware (http://fasaware.co.uk).

No documento TESE SAF DINA TINOCO (páginas 41-46)