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Desconstrução do modelo agrícola mesorregional

No documento 2013Clovis Tadeu Alves (páginas 100-103)

No desenvolvimento da agricultura na mesorregião Noroeste, tem-se a década de 1950 como um ponto em que a agricultura mesorregional sofria um processo transitório, saindo da preponderância produtiva da cultura do trigo e iniciando o que seria seu novo e mais destacado produto, a soja. O processo transitório da agricultura mesorregional coincide com o início da atuação das fundações filantrópicas americanas, como a Fundação Rockefeller e a Fundação Ford (esta atuou a partir da década de 1960) na agricultura brasileira. É certo, pelo já visto, que o governo brasileiro teve um papel importantíssimo no desenrolar da modernização agrícola mesorregional, mas não haveria Revolução Verde sem a presença marcante dessas duas instituições filantrópicas. No conjunto, governo e instituições atuaram de forma associativa no desenvolvimento agrícola brasileiro, principalmente a partir do governo de Juscelino Kubitschek, que influenciaram na modernização agrícola mesorregional. A conciliação dos interesses geopolíticos americanos e dos interesses econômicos brasileiros moldou a implantação da Revolução Verde no país. Para os Estados Unidos, por um lado, não era interessante auxiliar a independência brasileira na cultura do trigo, por outro, era necessário dar apoio tecnológico a um país aliado, estratégico, populoso e importante no cenário sul-americano, afastando, assim, a “ameaça” comunista do Brasil. Já para o governo brasileiro, desistir do trigo nacional não era de todo um problema, sendo até mais barato (acordos internacionais do trigo) comprar o trigo importado do que continuar incentivando o nacional. Equacionando todas essas variáveis, surgem as instituições filantrópicas auxiliando

o governo brasileiro para desenvolver o setor agrícola brasileiro. Portanto, a partir de Juscelino, o governo brasileiro continuou criando políticas quantitativas para o setor agrícola, enquanto as instituições filantrópicas auxiliavam na criação e atuavam em desenvolver ações qualitativas.

A origem da cooperação entre as fundações filantrópicas americanas e o governo brasileiro, segundo Oliveira, tem seu início na organização da política externa do presidente norte-americano Harry Truman.

Para seu segundo mandato (1949-52), Truman organizaria sua política externa em três pontos. Os dois primeiros seriam a continuação de ações do primeiro mandato e o terceiro apontaria para um esforço conjunto voltado para a segurança internacional, traduzindo-se numa aliança militar de tempos de paz com poderes transoceânicos.

Durante os preparativos para a formação dessa política externa, Ben Hardy, assessor de Departamento de Estado, impressionado com os resultados que Nelson Rockefeller vinha obtendo com suas AIA e Ibec, sugeriu ao presidente Truman a inclusão de um programa de ajuda técnica para o mundo subdesenvolvido, o que daria um toque de idealismo à política externa e serviria de contraponto à dureza do terceiro ponto, sugestão aceita na última hora (OLIVEIRA, 1999, p. 103-104).

A proposta generosa de ajuda técnica para o desenvolvimento de países subdesenvolvidos ficou conhecida como “Ponto IV” e a Revolução Verde era uma derivação direta dessa proposta. Com o Ponto IV, Nelson Rockefeller, que já atuava na América Latina, direcionou seus esforços para o desenvolvimento agrícola, em especial o desenvolvimento agrícola brasileiro. Isso significava que Nelson Rockefeller direcionaria a Fundação Rockefeller e organizações coligadas, como a AIA e o Ibec, para atuarem na agricultura brasileira. As organizações associadas a Nelson Rockefeller acreditavam nas premissas elaboradas pelo economista norte-americano Walt Rostow,55 autor de The stages of economic

growth, a non-communist manifesto. Propagava que o desenvolvimento econômico poderia

ocorrer com a adoção de linhas capitalistas básicas. “A formula era bastante simples: pequenos proprietários de terras poderiam usar rotação de culturas, sementes híbridas, fertilizantes e máquinas para aumentar a produtividade e baixar os preços dos alimentos nas áreas urbanas” (COLBY; DENNETT apud OLIVEIRA, 1999, p. 105). Com o aumento da oferta derrubaria a inflação, contribuindo para a estabilidade política e de mercado, baixando também os custos para a contratação de trabalhadores. Denota-se que foi a partir do governo

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Assessor do presidente americano Kennedy, conselheiro sobre a segurança nacional, ferrenho anticomunista acreditava na eficácia do capitalismo e da livre iniciativa (OLIVEIRA, 1999).

de Juscelino que houve uma maior aproximação com a Fundação Rockefeller, representando, assim, o início da implantação da Revolução Verde no país como um todo.

Na mesma linha que a brasileira, mas com algumas particularidades, a Revolução Verde foi implantada na mesorregião Noroeste. De acordo com autores Colby, Dennett56 (1998), Fonseca57 (1985), Olinger58 (1996) e Oliveira59 (1999), a atuação da Fundação Rockefeller no Brasil na década de 1950 tinha o objetivo de colonizar extensas áreas de terra, como o Oeste paranaense, a região Centro-Oeste e a região Norte do Brasil. Concomitantemente à colonização, já seria inserido o novo modelo agrícola preposto pela Revolução Verde. Na mesorregião Noroeste, não sendo mais possível a colonização de novas áreas, optou-se pela desconstrução do modelo existente (baseado na produção tritícola), como já visto, e a transformação (utilizando as bases do modelo existente) do sistema agrícola mesorregional, num sistema capitalista baseado num novo e dinâmico produto, a soja. Na década de 1950, com a retirada do amplo apoio estatal no trigo, a cultura entra em crise e a agricultura mesorregional, que vinha de um relativo período longo de expansão e consolidação, inicia um processo de reestruturação, que culmina com a modernização do sistema agrícola mesorregional.

A desconstrução da agricultura mesorregional na década de 1950 se deu com a crise do trigo, onde estava o apoio de todo o sistema agrícola mesorregional, mesmo os setores da agricultura dada como não capitalista. Nesse momento transitório, onde a agropecuária colonial continuava plantando trigo de forma subsistente e também embrionava a cultura da soja como uma forma alternativa de produzir proteína para a criação de suínos, a agricultura capitalista ficou sem o apoio estatal, e de certa forma interrompeu seu período de crescimento. A desconstrução da agricultura mesorregional teve, de forma direta ou indireta, a participação da Fundação Rockefeller atuando como “conselheira” de política agrícola nacional. Ao auxiliar na produção de uma nova estrutura agrícola nacional, indiretamente afetou a agricultura mesorregional. Nesse sentido, algumas políticas associativas do governo federal,

56 O livro Seja feita a vossa vontade. A conquista da Amazônia: Nelson Rockefeller e o evangelismo na idade do

petróleo, de Gerard Colby e Charlotte Dennett, trata da colonização e da modernização agrícola do centro- oeste e norte do Brasil.

57 O livro A extensão rural no Brasil, um projeto educativo para o capital, de Maria Teresa Lousa da Fonseca,

trata do surgimento da extensão rural e aborda alguns aspectos da proposta de colonização e da modernização agrícola do centro-oeste e norte do Brasil.

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O livro Ascensão e decadência da extensão rural no Brasil, de Glauco Olinger, trata da extensão rural e aborda alguns aspectos da proposta de colonização e da modernização agrícola do centro-oeste e norte do Brasil.

59 O artigo “As circunstâncias da criação da extensão rural no Brasil”, de Mauro Márcio de Oliveira, trata da

extensão rural e aborda alguns aspectos da proposta de colonização e da modernização agrícola do centro-oeste e norte do Brasil.

em conjunto com a Fundação Rockefeller, auxiliaram na implantação da Revolução Verde em nível mesorregional na década de 1950, ao passo que a contribuição da Fundação Ford se deu na década de 1960. Essas duas fundações, junto com o governo federal, transformaram a agricultura brasileira, e não seria diferente na agricultura mesorregional. As ações dessas duas instituições serão mais bem explicitadas a seguir.

No documento 2013Clovis Tadeu Alves (páginas 100-103)