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Este capítulo apresenta os resultados das análises desenvolvidas, em um primeiro momento, quantitativamente e, em um segundo momento, qualitativamente. Tais análises suscitam uma série de reflexões sobre o objeto desta pesquisa e também sobre o sistema verbal latino.

4.1- Ocorrências de verbos estativos

Mostramos, neste item, os números referentes às ocorrências de verbos formados pelo sufixo –ē nas três peças. Elas possuem pouco mais de 3180 versos. Ao todo, encontramos 413 ocorrências de verbos estativos em todas elas. Procuramos, além disso, analisar verbos derivados do mesmo modo que seus primitivos, como condecet, composto de decet (de significado semelhante – ser conveniente), que apresenta as mesmas características do que lhe deu origem.

Na primeira classificação dos dados, é importante lembrar-se da flexão verbal latina. Nela, a categoria flexional mais importante é o aspecto, a partir da qual ocorrem as demais flexões. Por essa razão, primeiramente, categorizamos as ocorrências pelo aspecto do verbo. Do total de 413, foram encontrados 389 verbos de valor estativo no infectum e apenas 24 no perfectum.

Gráfico 1 - Aspecto do Verbo

É evidente a grande disparidade entre a quantidade de ocorrências dos temas aspectuais nos verbos estativos. Tal diferença, de certo modo, é previsível, em face dos estudos diacrônicos sobre o desenvolvimento do Latim, que apontam que a ideia de prolongamento no tempo, própria desse tipo de verbo, se opõe a um aspecto concluído, correspondente aos temas de perfectum.

Outra característica marcante das orações com verbos estativos é o número de seus argumentos. Vimos, anteriormente, que o sufixo –ē servia, originalmente no indoeuropeu, para formar aoristos intransitivos; assim também, o Latim inova ao usá-lo no infectum, mas mantém sua intransitividade original. 255 orações com verbos estativos são monoargumentais, enquanto que 158 são biargumentais.

Gráfico 2 - Número de argumentos

389 24

Infectum Perfectum

Apesar da diferença, não podemos considerá-la tão significativa, ao menos não tanto quanto a diferença dos temas aspectuais, representada pelo gráfico 1.

Das ocorrências, notamos diversos subesquemas, tanto monoargumentais quanto biargumentais, que se repetem com uma frequência marcante.

Notemos o primeiro deles, as construções impessoais com verbos estativos (cf. p. 35). Trata-se de períodos construídos com um determinado grupo de verbos, como oportet, decet, licet, libet, pudet (respectivamente: é preciso, é conveniente, é permitido, é agradável, é vergonhoso), bem como seus compostos como condecet,que tem um sujeito oracional. Observe-se, nos exemplos a seguir, um construto com vários exemplos de uso de verbos estativos impessoais e sujeito oracional:

(1)

VIR. At, meo si liceat modo,

sapienter potius facias quam stulte.

SAT. Lubet. (Persa, 373-6)

VIR. Lubere per me tibi licere intellego; uerum lubere hau lubeat, si liceat mihi.

Vir – Mas se for permitido para meu jeito,

Antes,que faças mais sabiamente, que estupidamente. Sat – É bom!

255 158

Monoargumentais Biargumentais

Vir – Entendo que ser bom para mim é ser permitido para ti:

Na verdade, que jamais seja bom ser bom, se for permitido para mim.

Há ainda verbos como placeo (ser agradável), que podem figurar tanto em construções pessoais quanto em construções impessoais, e que, no entanto, por aparecerem em formas pessoais, não consideramos como verbo impessoal. Observemos o exemplo (2) que contém um uso pessoal desse verbo, enquanto que (3) mostra um uso impessoal do mesmo verbo:

(2)

PHILEM. Volo me placere Philolachi, meo ocello, meo patrono. (Mostellaria, 167) Filem – Desejo que eu seja agradável a Filolaques, meu querido, meu patrono.

(3)

SOS. Apage, non placet me hoc noctis esse: cenaui modo; (Amphitryon, 310)

Sós – Para trás, não é agradável que eu coma a essa hora da noite: acabei de jantar.

Diante dessas duas possibilidades, é possível concluir que o verbo placeo se encontra em um espaço intermediário, numa possível trajetória de mudança de construção com sujeito nominal, para construção com sujeito oracional. Um estudo diacrônico poderia revelar se esse verbo tornou-se impessoal como os demais mencionados, ou se permanece nesse espaço intermediário.

De Todas as 255 construções monoargumentais, 137 são construções impessoais, enquanto 118 são construções com sujeitos nominais, como podemos observar abaixo (gráfico 3). Consideramos esse número importante, frente a todas as ocorrências de construções estativas. Isso mostra como o padrão construcional [Sor+Vē]

estava convencionalizado no Latim Arcaico de Plauto.

De modo geral, entre as construções que não possuem objeto, são notáveis também as ocorrências dos verbos ualeo (estar bem de saúde), com 27 ocorrências e taceo (estar calado), com 35 ocorrências. É possível observar que esses dois verbos são próprios de diálogos da oralidade (sobretudo ualeo) e do gênero cômico (sobretudo taceo). Observamos que o verbo ualeo é frequente em diálogos, nas situações de cumprimentos e despedidas, o que servia para dar uma coerência ao fluxo da conversa entre os personagens, bem como era mais um fator que aproximava o texto cômico do falar cotidiano.

(4)

TR. O Theopropides, ere, salue, saluom te aduenisse gaudeo. usquin ualuisti? (Mostellaria, 446-9)

Tr – Oh Teopropides, meu senhor, salve! Alegro-me de teres chegado salvo. Passaste suficientemente bem?

Já taceo tem uma função mais propriamente cômica, servindo para que personagens ordenem uns aos outros ―calarem a boca‖, utilizado, sobretudo em cenas que manifestam o que Bergson (1900, p. 20) chama de cômico de gestos, nas quais esse tipo

118

137 Demais monoargumentais

de discurso injuntivo cômico costuma ser acompanhado de cenas de xingamentos, pancadaria e correria.

(5)

TOX. Tacen an non taces? numquam ego te tam esse matulam credidi. (Persa, 533)

Tox – Acaso te calas ou não te calas? Nunca cri que fosses tão imbecil.

Pelas funções a que servem, esses dois verbos aparecem frequentemente na forma de imperativo uale! Tace!.

Passemos agora às construções biargumentais. Como vimos no gráfico 2, elas são minoria entre os usos de verbos estativos, porém a diferença entre o número de ocorrências dos dois tipos de construção não é tão acentuada, como foi a diferença apontada pelo primeiro gráfico.

O Gráfico 4 mostra como, dentre um total de 158 ocorrências, a grande maioria é construída com um número restrito de verbos. Trata-se dos verbos habeo e teneo (ambos, ter), bem como seus compostos, como prohibeo, adhibeo e pertineo (proibir, empregar, concernir). Esses verbos, de um modo geral, ao longo de toda a história da língua latina são usados com complementos em acusativo, o que configura uma construção biargumental. Nos itens seguintes, quando das análises de transitividade, veremos as características que permanecem e as que se alteram entre ambas as construções.

Esses dois verbos, como já dissemos, possuem trajetórias bastante peculiares e mereceriam estudos próprios. No entanto, um fato muito interessante se salienta na análise desses verbos.

Um dos compostos de teneo, o verbo attineo (ter algo a ver, dizer respeito), com nove ocorrências, se opõe fortemente a seu verbo de origem ao não se construir com objeto em acusativo, o que o faz figurar no conjunto das construções monoargumentais. Ele se constrói com a preposição ad (a). Sobre esse tipo de complementação, é interessante observar que a preposição é também o prevérbio que dá origem ao verbo attineo (<adtineo). Segundo Rubio (1969, p. 123), esse tipo de complemento não teria nenhuma diferença de um objeto em acusativo como qualquer outro.

Consideramos que o verbo attineo também é um recurso para provocar comicidade no texto. Ele serve a situações de pequenas brigas, geralmente entre escravos, nas quais se diz ―não é da sua conta!‖.

(6)

PHAN. Heus senex, quid tu percontare ad te quae nihil attinent? (Mostellaria 940) TH. Nihil ad me attinet?

Ph – Ei, velho! Por que tu perguntas coisas que em nada te dizem respeito? Th – Em nada me dizem respeito?

29

129

Demais biargumentais Habeo e Teneo

É oportuno também notar o número de ocorrências de acordo com cada uma das peças. O que vimos foi um número ligeiramente menor de ocorrências no Amphitryon. Pelo que observamos, podemos atribuir esse fato à principal diferença dessa para as outras duas obras. Entendemos que o fato de o Amphitryon ser uma tragicomédia, intercalando diálogos trágicos e cômicos, diminui a quantidade de momentos de comicidade de gestos, ambientes propícios para a ocorrência de verbos como ualeo e taceo, bastante comuns nas peças de modo geral.

Nessa tragicomédia, o verbo ualeo, com diversas ocorrências, em apenas três momentos (versos 499, 928 e 1037) aparece em situações de cumprimentos e despedidas. Já o verbo taceo ocorre apenas cinco vezes, no total, em cenas que favorecem bastante seu aparecimento, como o confuso encontro entre Sósia e Mercúrio, que estão com aparência idêntica e o litígio de Anfitrião e Alcmena, devido ao adultério provocado pelo deus.

Já em Persa e em Mostellaria, o autor lança mão de um número muito maior de cenas de comicidade de gestos e situações de cumprimentos e despedidas, o que é enfatizado pelo destaque que dão a escravos, personagens tipicamente envolvidos nesses tipos de cena. Em Persa, inclusive, o senhores dos escravos em questão nem mesmo aparecem em cena.

Gráfico 5 - Ocorrências por peça

0 20 40 60 80 100 120 140 160

Persa Mostellaria Amphytruo

Perfectum Biargumentais Monoargumentais

4.2- Para uma análise qualitativa

No capítulo seguinte, abordaremos o tema da pesquisa de modo distinto. Para além desta análise fria e quantitativa, há fenômenos que provocam dificuldade na compreensão do comportamento dos verbos estativos latinos.

De modo geral, estas análises mostram dados interessantes para a pesquisa. Das 410 ocorrências, mais da metade são de subesquemas das duas macroconstruções (com um argumento e com dois argumentos), respectivamente as mesoconstruções impessoais (139) e as mesoconstruções com os verbos habeo e teneo (129), resultando em 268. Isso afasta as ocorrências do tipo de esquema que havíamos estabelecido como prototípico, baseando-nos em estudos de morfologia diacrônica do Latim, que previam um sujeito determinado que está em certo estado, intransitivamente, isto é, sem transferência do estado.

Mesmo entre as construções que se enquadram no esquema [S+Vē], uma

importante parcela, 62 ocorrências, se constrói com dois verbos – ualeo e taceo – cujo uso é claramente motivado pelas situações pragmáticas em que seus enunciadores se encontram e também pelo gênero literário das obras analisadas.

Por esses motivos, podemos concluir que o uso de verbos estativos não era um fenômeno comum no falar corrente da República Romana, restringindo-se a algumas microconstruções, como as que aqui frisamos. Assim também, quando observamos o morfema, podemos concluir que ele é bem mais flexional que derivacional. Corrobora-o o fato de que não encontrarmos inovações no corpus, o qual, já vimos, era um espaço importante para a inovação e a experimentação com a língua.

Os fatos linguísticos, em muitos aspectos, se afastaram do que prevíramos. É necessário, na próxima etapa, demorar-se sobre cada um desses aspectos, sob pontos de vista diferentes, a fim de mostrar quais aspectos são mais mutáveis pelo uso e quais são mais duros, permanecendo mesmo quando o valor estativo for débil.

4.3- Reflexões sobre as análises dos dados

Este item parte dos aspectos mais concretos em direção aos mais abstratos. Está organizado desse modo, porque consideramos que a compreensão dos aspectos formais do fenômeno é fundamental para as reflexões mais abstratas. Assim também, para esses

aspectos, será necessário retomar a história do morfema, o que serve de base para esta pesquisa como um todo.

4.3.1- Processos de formação dos verbos estativos

Relembremos a descrição do sistema verbal latino e de sua comparação com o sistema verbal indoeuropeu. Vimos que a principal característica desse sistema é o aspecto verbal. Cada verbo latino possui dois principais temas aspectuais, infectum e perfectum, que servirão como base para as flexões de tempo e modo, número e pessoa e voz para, respectivamente, tempos dinâmicos, progressivos e tempos estáticos, concluídos (cf. p. 18). Podemos registrar também, em um estágio indoeuropeu, um terceiro aspecto, nem dinâmico nem progressivo, chamado ―aoristo‖. O Latim não mantém o tema de aoristo em seus verbos, mas apenas alguns vestígios.

Quando observamos, tanto na bibliografia prévia quanto no corpus, as ocorrências de verbos estativos no perfectum, pudemos traçar um comportamento morfológico desses verbos relativamente ao aspecto. Em uma observação quantitativa, vimos que o uso de verbos de estado em tempos perfeitos é bastante incomum no corpus analisado, fenômeno compreensível pelas noções semânticas distintas contidas no tema de perfectum e no sufixo estativo.

Observamos, então, quais tipos de formação de perfectum podemos encontrar com verbos estativos. As referências bibliográficas para morfologia histórica do Latim prevêem os seguintes tipos:

a) formações sigmáticas, como em frigeo, frixi (estar frio). Essas formações são continuidades do aoristo indoeuropeu, isto é, são temas de aoristos emprestados ao perfeito. Por essa razão, são chamados perfeitos aorísticos. No verbo usado como exemplo, a forma frixi pressupõe que o sufixo formador do tema aspectual, -s, foi acrescido à raiz sem o intermédio do sufixo estativo. O grafema X representa um grupo consonântico /ks/, que certamente tem origem no encontro GS, no qual o /g/ sofre uma assimilação parcial ao /s/, incidindo sobre seu traço de sonoridade (cf. NIEDERMANN, 1991, p. 128; FARIA, 1957, p. 53). Portanto, o sufixo de estado não aparece nesses tipos de perfectum. Dos verbos estativos com perfeito sigmático, não encontramos nenhuma ocorrência em nosso corpus.

b) formações em redobro, como em pendeo, pependi (estar pendurado). Essas formações, ao contrário das anteriores, são continuidades do próprio perfeito

indoeuropeu. De modo geral, ela é a menos comum entre os verbos estativos. Quando analisamos a forma de perfectum pependi, constatamos que as desinências se ligam a um tema sem sufixo (-i é a desinência característica de pretérito perfeito tal como os verbos latinos são notados nos dicionários, cf. p. 22). Nesses tipos de formação, não ocorre o sufixo estativo. Também não encontramos ocorrências nas comédias analisadas.

c) formações sonânticas, como em taceo, tacui (estar calado). Esse tipo de formação é próprio do Latim, ausente mesmo nas línguas mais aparentadas ao Latim – Osco e Umbro (cf. ERNOUT, 2002 [1953], p. 204; MONTEIL, 1974, p. 312). Consiste no acréscimo de uma sonante –u à raiz. Portanto, é seguro afirmar que esse é o tipo mais recente de formação de temas de perfectum. A produtividade, como já mencionado, fez a formação sonântica se sistematizar como processo formador de perfeitos no Latim Vulgar e nas línguas neolatinas (cf. VÄÄNÄNEN, 1967, p. 151). Todos os perfeitos de verbos estativos encontrados no corpus são de formação sonântica. Notemos os perfeitos dos verbos ualeo, ualui; habeo, habui; e teneo, tenui, os mais frequentes. Além desses, também ocorre com o verbo oleo, olui (exalar odor). Nos verbos estativos, as formações sonânticas também não possuem o sufixo –ē.

d) Verbos que não possuem perfectum, como tumeo (estar inchado), em virtude de sua própria significação. Um dos vestígios da independência dos temas aspectuais indoeuropeus no Latim é a ausência de um desses temas (cf. p. 24). Econtramos alguns exemplos de verbos estativos sem perfectum, como tumeo (cf. p.18) e torpeo (estar entorpecido).

Diante dos estudos de morfologia histórica e da observação dos dados, é seguro afirmar que os verbos estativos, originalmente, não possuem perfectum, tendo tomado emprestado de outras formações verbais com mesma raiz, mas sem o sufixo (como frixi, certamente proveniente de frigo, e não frigeo). Não encontramos verbos estativos que mantenham o sufixo –ē no tema de perfectum.

Outro fator importante sobre os temas aspectuais dos verbos estativos é sua proveniência do aoristo indoeuropeu. Já vimos como o Latim inova ao usar o sufixo estativo, formador de temas de aoristo, nos temas de presente. O aoristo correspondia a um aspecto nem dinâmico, nem progressivo, sem a noção de telicidade, própria do aspecto indoeuropeu que continua no Latim.

Podemos encontrar, no entanto, uma proximidade entre os verbos estativos e a noção aorística de ausência de telicidade. Isso ocorre porque tais verbos designam

estados que se prolongam no tempo, sem impor-lhes noção de acabamento (perfectiva) ou dinamismo (imperfectiva). Quando, na língua latina, é necessário recorrer ao perfectum desses verbos, o sufixo é inexistente, pois se afasta da telicidade de uma ação concluída.

Assim como alguns temas de perfectum são chamados de ―perfeitos aorísticos‖ por algumas gramáticas, devido ao fato de serem uma continuidade do aoristo indoeuropeu, poder-se-ia dizer, do mesmo modo, que os verbos estativos são presentes aorísticos, porque, tanto do ponto de vista morfológico quanto do ponto de vista semântico, são continuidades desse antigo tema. O aoristo não se enquadra com exatidão em um paradigma flexional binário de telicidade – acabado ou inacabado, fato respaldado morfologicamente pelas suas formações.

O aoristo teria tido uma formação posterior ao presente e ao perfeito, o que lhe conferia características singulares, bem como desenvolvimentos distintos nas diversas línguas indoeuropeias, sobretudo o tipo aoristo sigmático, como, há muito, já observado (cf. MEILLET in SAUSSURE, 1908, p. 100-1).

A importância do aoristo para os verbos estativos é, do ponto de vista formal, a marca morfológica da continuidade de uma flexão de aoristo e também, do ponto de vista semântico, a manutenção de uma noção de ausência de telicidade. Esta é diretamente operada pelo morfema – o sufixo estativo -ē.

Voltando ao tema de perfeito, vimos que os verbos estativos não possuem perfeito em sua origem, tendo tomado emprestado a outras formas verbais. A princípio, parece incoerente conciliar a noção de prolongamento de um estado no tempo com um aspecto télico, finalizado. As poucas ocorrências de verbos estativos no perfectum, que encontramos, mostram que não era impossível conciliar essas duas noções, fato demonstrado, com melhor clareza, pelos usos do verbo ualeo:

(7)

TOX. O Sagaristio, di ament te. SAG. O Toxile, dabunt di quae exoptes. utuales? TOX. Vt queo. SAG. Quid agitur? TOX. Viuitur.

[...] SAG. Satin tu usque ualuisti? TOX. Hau probe. (Persa, 16-25)

TOX – Oh Sagaristião, que os deuses te amem! SAG – Oh Tóxilo, os deuses darão o que desejas.

[...] SAG – Acaso passaste bem então? TOX – Não muito bem.

Os usos desse verbo no perfectum mostram estados que, ao mesmo tempo em que se estendem no tempo, possuem uma conclusão. Esperamos esclarecer a questão dos valores semânticos associados aos temas aspectuais nos itens seguintes.

4.3.2- Transitividade oracional

Após considerações sobre aspectos morfológicos das construções com verbos estativos, versamos agora sobre aspectos sintáticos. Compreendemos, retomando Hopper & Thompson (1980), que transitividade é uma propriedade da oração e não apenas no verbo; assim também, ela se estende em um contínuo de maior ou menor transitividade, e não apenas de modo binário – transitivo/intransitivo.

Os 10 parâmetros de transitividade oracional, bem como o modo com que cada um afeta a transitividade da oração, foram descritos no capítulo sobre pressupostos teóricos, mas é necessário apenas mencioná-los novamente:

1- Participantes 2- Cinese 3- Aspecto 4- Pontualidade 5- Intencionalidade 6- Afirmação 7- Modo 8- Agentividade 9- Afetamento do objeto 10- Individuação do objeto

Analisamos construtos com verbos estativos sob cada um desses parâmetros, com auxílio das reflexões de Furtado da Cunha e Souza (2007) e, sobretudo, Abraçado & Kennedy (2014).

Após as análises, observamos, não apenas o comportamento sintático das construções, como também quais dos parâmetros se relacionam com fatores amplos e funcionais, como as necessidades pragmáticas ou a carga semântica do próprio verbo, e quais se relacionam a fatores formais, como o comportamento morfológico do verbo. Tivemos especial atenção ao sufixo estativo –ē, objeto desta pesquisa. Na explanação,

partiremos daqueles parâmetros que observamos ter menos relação com aspectos formais e chegaremos àqueles que têm maior relação com esses aspectos, sobretudo com o sufixo em questão.

O primeiro parâmetro – número de participantes – já foi abordado aqui anteriormente (cf. p. 55), como vimos no gráfico 2. Observamos que há poucos casos em que um verbo estativo aparece nas duas construções, com um ou com dois argumentos. Com base nos gráficos, de todos os exemplos de construções com verbos estativos 129 são de construções de posse (com habeo e teneo) e 137 são construções impessoais, isto é, 266 de 412 são construções que se fixaram em relação ao número de argumentos. Além dessas, mais numerosas, outras ocorrências importantes são fixas em relação ao número de participantes, como as ocorrências com os já mencionados verbos taceo e ualeo, sempre monoargumentais.

Entre os verbos que figuram nas construção com um ou com dois participantes, destacam os verbos gaudeo (estar alegre), com alguns exemplos no segundo capítulo (cf. p. 36) e o verbo oleo (exalar odor), e também seus compostos como oboleo (estar fedendo) com algumas ocorrências.

(8)

MERC. Olet homo quidam malo suo. SOS. ei, numnam ego obolui? (Amphitryon, 321)

MERC – Certo homem cheira por causa de seu mal. SOS – EI, por acaso eu fedi?

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