• Nenhum resultado encontrado

PROTOCOLO DE PESQUISA II 7) Verificação da disponibilidade dos informantes privilegiados

4. Investigação da prática da melhoria contínua

4.3 Descrição das organizações investigadas

As organizações A, B e C investigadas são empresas de grande porte, multinacionais e fornecedoras de primeiro nível na cadeia da indústria automotiva. A Empresa A pertence à uma corporação que produz um sistema completo para montagem no motor. A planta estudada é a maior do grupo em que ela faz parte, com aproximadamente dois mil colaboradores. As Empresas B e C desenvolvem como produto o sistema de distribuição elétrica automotivo.

As três empresas apresentam programas corporativos específicos relacionados à MC, como elemento específico vinculado ao que se denomina sistema de gestão do negócio. A Empresa A possui uma definição corporativa das competências organizacionais consideradas essenciais para a melhoria contínua. As Empresas B e C fundamentam-se nos pressupostos do Sistema Toyota de Produção. Os projetos são diferenciados nos três níveis organizacionais, sendo o nível operacional vinculado às características técnicas de ações corretivas e manutenção; e os níveis de supervisão e gerencial relacionados às características estratégicas de ações preventivas e de inovação. No nível operacional, a prática MC baseia-se nos princípios e característica dos Círculos de Controle da Qualidade (CCQ) (IMAI, 1994), com a finalidade de motivar a participação de todos. Assim, nas Empresas A e B observa-se os programas de sugestões, com o apoio do departamento de Recursos Humanos, nos quais é buscado realizar premiações para manter o nível de participação dos funcionários. Já na Empresa C, há um departamento específico para desenvolver, monitorar e incentivar as práticas MC na organização. Observa-se nas três organizações, que apesar do exercício de motivação ao uso do conhecimento na atividade real dos colaboradores, a prática MC é orientada, principalmente, por quadros de gestão à vista que explicitam os indicadores da qualidade, produtividade e segurança. Esses são considerados os mais expressivos canais de informação formalizados nas organizações, uma vez que para além dos números, apresentam o vínculo e a proximidade entre os níveis gerencial e operacional, intermediada pela supervisão.

As Empresas D e E são pequenos fornecedores da cadeia automotiva. A Empresa D é certificada nos requisitos ISO 9001 desde 2000 e realiza a revisão anualmente. A Empresa E afirma não possuir recursos financeiros para certificar-se e, por conseguinte, não consegue atrair e manter clientes. Tais empresas não possuem projetos específicos relacionados à MC.

A Empresa D, manifesta uma prática formalizada de MC, enfatizando a medição do desempenho organizacional. A Empresa E, por sua vez, não possui o conhecimento de tal prática. Contudo, realiza atividades arbitrárias de solução de problemas.

COMPETÊNCIAS MC EMPRESAS

Habilidade

organizacional Comportamentos constitutivos A B C D E

Compreensão da MC

• Indivíduos de todos os níveis compartilham o valor de passos

pequenos e de que todos podem contribuir, por meio do envolvimento ativo na tarefa de melhorias por incremento.

• Quando algo vai mal, a reação natural, dos indivíduos de todos

os níveis, é procurar as razões, em vez de culpados.

• Os indivíduos fazem uso formal de algum método de resolução

de problema. X X X X X Hábito da MC

• As pessoas usam técnicas e ferramentas para apoiar a MC.

• Indivíduos (individualmente ou em grupo) iniciam e desenvolvem atividades de MC e participam do processo.

• Sugestões são respondidas rapidamente: ou implementadas, ou

justificada a não-implantação, para definir claramente as mudanças. X X X X X X X X X Foco na MC

• Todos são capazes de explicar qual a estratégia de operações e

quais são os objetivos.

• Indivíduos e grupos monitoram e mensuram os das atividades

de melhoria e verificam o impacto nos objetivos estratégicos.

• Atividades de MC são parte integrante do trabalho, individual e

em grupos, não uma atividade paralela.

X X X X X X Condução da MC

• Gerentes apóiam o processo de MC por meio da alocação de

recursos.

• Gerentes reconhecem de maneira formal (mas não, necessariamente financeira) a contribuição dos funcionários para MC.

• Gerentes conduzem por meio do exemplo, tornando-se ativamente envolvidos na implementação da MC.

• Gerentes apóiam experimentos não punindo erros; ao contrário,

incentivam que se aprenda com eles.

X X X X X X X X X X X X X X X X Alinhamento da MC

• O sistema de MC é projetado para que seja assegurada a relação entre a estrutura e infra-estrutura da organização, suportando e reforçando um ao outro constantemente.

• Indivíduos responsáveis por um processo particular realizam continuamente revisões para avaliar se este e o sistema de MC permanecem compatíveis.

• Quando uma grande mudança organizacional é planejada, seu

impacto potencial sobre MC é avaliado e ajustes são feitos se necessários. X X X X X X X X X Participação na resolução de problemas

• As pessoas colaboram em grupos interfuncionais.

• As pessoas entendem e compartilham uma visão holística (entendimento e propriedade do processo).

• As pessoas são orientadas pelos clientes internos e externos em suas atividades de MC.

• Há projetos específicos com atores externos (clientes, fornecedores, etc.).

• Atividades de MC relevantes envolvem os representantes de níveis organizacionais hierárquicos diferentes.

X X X X X X X X X X X X X X X X X Sistema de MC

• Há um processo de planejamento cíclico em que o sistema de

MC é regularmente revisado e alterado.

• Há uma revisão periódica do sistema MC em relação a toda a

organização. X X X X X Aprendizagem organizacional

• Indivíduos procuram oportunidade para aprendizado e desenvolvimento pessoal.

• Mecanismos organizacionais são usados para empregar o que

foi aprendido em toda organização.

X X

X X

Quadro 4.1 Síntese das habilidades organizacionais para melhoria contínua nas empresas A, B, C, D e E. Fonte: Adaptado de Mesquista e Alliprandini (2003); Bessant et al. (2001)

Uma síntese, obtida a partir da aplicação do “Guia para verificação da melhoria contínua na organização”, das características organizacionais quanto à prática da melhoria contínua em cada uma das organizações investigadas pode ser observada no Quadro 4.1. A primeira coluna lista as habilidades organizacionais para melhoria contínua. Para compor as competências organizacionais para melhoria contínua, relacionados a cada uma das habilidades básicas, estão listados na segunda coluna, os comportamentos constitutivos. Estes representam os padrões de comportamentos que devem estar presentes na organização. A terceira coluna é subdivida nas empresas investigadas, na qual é assinalado por um ‘X’ a presença do comportamento constitutivo correspondente. Observa-se, portanto, quais competências organizacionais estão presentes nas organizacionais, contudo, não é possível expressar em qual nível de cada uma delas é desempenhada.

4.3.1 Empresa A

Na Empresa A, de acordo com o supervisor de recursos humanos, “a visão de melhoria contínua não fica só no discurso”. Nesse contexto, para todos os informantes privilegiados da organização, o determinante para melhoria contínua é a satisfação do cliente, o qual indica os alvos de investimento e a postura estratégica organizacional frente a essa prática.

Para o gerente de produção da Empresa A, a melhoria contínua relaciona-se com a redução de custo, indicando o valor agregado da qualidade, em termos de menos refugo, menor prazo e menor uso de recursos. Segundo ele, a melhoria contínua refere-se principalmente a forma do gerenciamento de recursos, denominada “4M”: Máquina, Material, Método e Medição. Essa visão é compartilhada também nos níveis operacional e de supervisão.

Reduzir custos... Hoje em dia você não ganha mais mercado. Você toma a fatia dos outros... Constantemente tentando melhorar o processo para baixar custo. Essas são as diferenças que a gente percebe no dia a dia. Porque às vezes a gente bate de frente com um processo estável (Encarregado de produção).

Para o supervisor da qualidade há uma “obsessão por melhoria contínua” na organização, em termos do equilíbrio entre o técnico e o comportamental e de corresponder o normativo ao cumprido. Essa “pressão constante por mudança”, relaciona a “melhoria contínua à otimização, a uma busca de algo que satisfaça cada vez mais” (Analista de processos).

A melhoria contínua é o que a palavra fala: você tem que melhorar. Tem que estar buscando melhorar. Para você melhorar, você tem que criar um mecanismo que a coisa faça por si só, que ela continue alavancando como se fosse um ciclo. Você não precisa forças. Ou seja, se a coisa parar, aí você

tem que dar corda. Não. Ela tem que fluir por si só. O que eu acho bastante interessante disso. É a empresa focante. Se ela focar o resultado e o resultado foi atingindo, positivo. Ela tem que estar sempre procurando meios para que seja alcançado esse resultado. Quando você alcança aquele resultado que ela deseja, aquilo já não basta mais. Ela precisa de uma nova meta, um novo desafio. E precisa melhorar de novo. E o seu ciclo, o seu trabalho tem que ter o melhor desempenho. É isso que faz a melhoria (Supervisor de recursos humanos).

De acordo com o supervisor de recursos humanos, sua área tem um papel fundamental nesse processo “porque são as pessoas que fazem isso. Nós trabalhamos com pessoas [...] O nosso desafio hoje é transformar o RH num departamento mais estratégico, agregado ao negócio da empresa”.

Nesse sentido, o encarregado de produção expressa em relação à prática da melhoria contínua, que “estamos sempre querendo melhorar. Isso é o básico. Quanto à operação não tem diferença nenhuma. Não importa se você está no Amazonas ou em Itajubá. O problema são as pessoas”.

Toda mudança provoca uma reação ou efeito. E sempre encontramos pessoas que reagem de forma negativa a mudanças. A dificuldade está mais na quebra de paradigmas. Quando as pessoas estão acostumadas a trabalhar de certa forma, mesmo que você costume colocar várias melhores maneiras para a pessoa trabalhar, existe uma resistência (Analista de processos).

Existe sempre aquele que quer fazer a massa do bolo desandar. A gente sempre tenta trabalhar a pessoa, mas se não é possível... Nós vamos deixar a batata podre estragar o resto? Mas, primeiro a gente faz de tudo... Isso sempre teve e sempre vai ter, mas temos que dar um jeito de melhorar... Às vezes, a pessoa não se adapta ao local simplesmente... Mas, não dá para passar a mão na cabeça o tempo todo (Encarregado de produção).

Para o desenvolvimento da melhoria contínua, na Empresa A, observou-se que os valores envolvidos nessa prática são expressos de uma forma bem definida, por nível hierárquico. No nível operacional, busca-se enxergar a melhoria contínua sempre como um desafio e atenta-se para a responsabilidade do colaborador. No nível de supervisão, destaca-se o comprometimento do colaborador. No nível gerencial, enfatiza-se a educação para melhoria contínua.

Para alavancar a melhoria contínua, a organização desenvolve mecanismos para o envolvimento de todos os atores organizacionais. É destaque o que são denominados: SIMPLIQUE, PDI, API e Pesquisa de Clima. O primeiro refere-se ao programa de sugestões, destinado, especialmente ao nível operacional. O segundo trata-se do Plano de Desenvolvimento Individual no qual são avaliadas o desenvolvimento das competências

individuais definidas corporativamente (Quadro 4.2). O terceiro é o Aproveitamento Profissional Interno no qual se avalia o potencial dos colabores. Por fim, o quarto é aplicado como ferramenta para avaliar o que tange a satisfação dos colabores.

O PDI e o API expressam o sistema de qualificação técnica e comportamental do colaborador, no qual as competências são medidas. Tais programas são utilizados para reconhecer a contribuição do funcionário e definir as necessidades de treinamento, de uma forma, segundo os informantes, simples, transparente e flexível. Na Empresa A, segundo o manual de treinamento e desenvolvimento (T&D), tais atividades tem como principio o foco nas pessoas e nos resultados que elas podem oferecer para a empresa e para si mesmas, buscando a satisfação pessoal e profissional. Considera-se que, para que isso aconteça, o colaborador precisa estar preparado e qualificado para cada situação e evolução tecnológica. Assim, a Empresa A “só não exige de seu colaborador como oferece mecanismos para sua qualificação” (Manual T&D) em habilidades específicas e desenvolvimento educacional.

Além disso, os programas de avaliação PDI e API apresentam as seguintes vantagens, listadas pelos informantes: direcionamento e otimização dos investimentos no desenvolvimento profissional; flexibilidade do modelo para adaptar-se às mudanças de estrutura, organização do trabalho e tecnologia; equilíbrio entre remuneração e agregação de valor; estímulo ao auto-desenvolvimento e à ampliação do espaço de atuação; horizontes profissionais claros e com critérios de acesso definidos; remuneração compatível com a complexidade das atribuições e das responsabilidades e com o mercado; condições claras e objetivas para a mobilidade entre as carreiras abrangidas pelo modelo.

Treinamento tem que ser feito constantemente. Você fala uma coisa hoje. Na semana que vem, você tem que repetir. No mês que vem. E por aí vai. Não tem como fugir disso (Encarregado de produção).

Eu tenho que andar na mesma linha que a melhoria. Simplesmente conversando, eu tento convencer que a concorrência é grande até mesmo dentro da empresa. Numa conversa de bom samaritano. A gente conversa para mostrar o nosso impacto geral para a empresa. Ou você ganha o mercado ou empresa fecha as portas e aí quem se dá mal somos nós mesmos (Encarregado de produção).