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CAPÍTULO 2 METODOLOGIA DE PESQUISA: UMA TRAJETÓRIA TEÓRICO-

2.3. Documentos de pesquisa: Elementos Provocadores e Roteiros de Interação da

2.3.2. Descrição de Procedimentos e Métodos de Tratamento de Dados

Partimos do pressuposto de que quando fazemos pesquisa documental, estamos lidando com dados pré-existentes. Então, neste caso, trata-se de procedimentos de organização e categorização dos dados, a partir da seleção dos materiais e do estabelecimento de critérios que orientarão a análise dos documentos.

Consideramos os EP’s e os Roteiros de Interação como documentos de análise, sendo caracterizados como fontes primárias de dados.

Estabelecemos os seguintes critérios para a seleção do corpus, tendo como fundamentação teórica para essa escolha o aspecto cronológico (LE GOFF, 1996) como intrínseco da pesquisa documental.

Os Elementos provocadores e seus respectivos Roteiros de Interação são documentos de acesso público, disponíveis na plataforma online Acervo Celpe-Bras128.

Os critérios elencados para a seleção dos documentos foram:

 Data: selecionamos EPs dos últimos anos de aplicação do Exame Celpe-Bras, sendo eles de 2015 e 2017. Essa escolha se justifica pelo fato de serem, primeiramente, aplicações recentes, podendo assim, proporcionar discussões mais atuais com relação às representações. Optamos por fazer uma seleção aleatória, para que não haja interferência de temas das representações como parte da seleção.  Representações de Brasil e/ou brasileiros: selecionamos EPs que apresentavam

indicações (implícitas e explícitas) de representações sociais de Brasil e/ou brasileiros. Para tanto, realizamos uma pré-seleção analítica dos EPs com base nas imagens e textos que constituem esses documentos.

Dessa forma, temos a seguinte configuração do corpus de análise, totalizando 11 EPs e RIs:

 4 EPs e RIs da segunda aplicação de 2015;  7 EPs e RIs da segunda aplicação de 2017:

É valido reforçar que as interações são de vinte minutos e estruturadas em quatro etapas de 5 minutos cada. Os primeiros cinco minutos constituem uma conversa inicial informal, em que o objetivo é propiciar ao examinando que ele se sinta em ambiente seguro e confortável para interagir em língua portuguesa, para fins avaliativos. Os três momentos subsequentes, de cinco minutos cada, são mediados por elementos provocadores e perguntas com base em um Roteiro de Interação, sendo esses documentos o foco de análise.

A análise de documentos que norteiam as interações aconteceu em quatro dimensões, sendo elas: a) análise e seleção dos EPs que indicavam certa representação de Brasil e/ou povo brasileiro; b) categorização dos temas percebidos na etapa anterior; c) interpretação dos temas categorizados segundo a teoria das representações sociais (Moscovici, 1978, 2015); d) análise das representações pela perspectiva da interculturalidade e interação no âmbito da Linguística Aplicada. McCulloch (2004, 109) defende que a pesquisa documental é necessária para que “aumente a apreciação pela

dimensão histórica da educação e sociedade”129. Nesse sentido, concordamos que a

pesquisa documental pode contribuir para maior conexão entre sociedade e educação, levando em conta suas historicidades, uma vez que pode apresentar encaminhamentos para questões relacionadas ao ensino-aprendizagem de LE.

No que tange ao processo de análise, atuamos no caminho inverso do processo de construção das representações sociais. Assim, partimos das representações e fomos desdobrando-as em temas, símbolos culturais, características, “desobjetivamos” e “desancoramos” conceitos para chegar às categorias e subtemas. Para Moscovici (2015) objetivar significa concretizar, materializar uma ideia/concepção através da linguagem. Quando “desobjetivamos” representações, buscamos suas essências, desmembramo-las em elementos que as constituem, tais como memórias, símbolos, aspectos culturais, afetos, entre outros.

Elaboramos o seguinte diagrama para ilustrar o esquema de análise dos dados extraídos dos documentos:

129 Tradução nossa: More than this, it has also been to try to assert a place for documentary studies for

researchers of the twenty-first century. Here too there are connections to be made, especially to enhance appreciation for the historical dimension of education and society. (MCCULLOCH, 2004, 109)

Figura 4 - Diagrama elaborado pela pesquisadora: processo esquemático para análise dos dados

Partimos, assim, dos documentos que compõem os materiais de análise, sendo eles: Elementos Provocadores (EP’s) e o Roteiro de Interação. O corpus de análise é composto por representações oriundas desses materiais da segunda aplicação de 2015 e da segunda aplicação de 2017. Justificamos a escolha desse recorte temporal devido ao caráter cronológico intrínseco à pesquisa documental. Além disso, o critério para seleção desses documentos foi a temporalidade, uma vez que são de aplicações recentes.

Para a seleção do corpus, realizamos uma verificação inicial geral dos EPs, a fim de identificar representações que estariam vinculadas ao Brasil e à cultura brasileira, ou seja, para seleção dos EPs, tendo como base a teoria das representações sociais e interculturalidade foi necessária uma observação prévia, atenta à identificação de elementos em que aspectos de cultura do Brasil poderiam indicar representações referentes ao Brasil e/ou ao povo brasileiro.

Em seguida, após identificar EPs com elementos relevantes à análise de representações sociais, realizamos a análise dos Roteiros de Interação correspondentes aos EPs selecionados. Para isso, nos baseamos na teoria das representações sociais de Moscovici (2015) e em conceitos de interculturalidade, no sentido de compreender as interações como forma de discutir implicações para o ensino de PLE, para a produção de materiais, bem como encaminhamentos relacionados ao exame Celpe-Bras.

Os documentos referentes às aplicações de 2015 e 2017 computam 40 Elementos provocadores e 40 Roteiros de Interação130, respectivamente. Desse total, 11 indicavam

alguma representação social de Brasil e/ou brasileiros. Verificamos, portanto, que essa é uma quantidade pequena, em relação ao total de documentos. Desses 11 selecionados, 8 apresentam uma perspectiva estereotipada de Brasil e/ou brasileiros. Essa verificação corrobora estudos anteriores envolvendo os EPs do Exame Celpe-Bras, como nos estudos de Ponciano e Longordo (2014).

130 A denominação “Roteiro de Interação” é dada ao conjunto de materiais que compõem cada aplicação do Exame Celpe-Bras, no sentido de que em cada aplicação há 1 Roteiro de Interação, caderno que contém perguntas e orientações correspondentes a cada elemento provocador, que norteia a interação face-a-face. Isso posto, optamos por utilizar a denominação no plural (Roteiros de Interação) pois remetem aos roteiros individuais correspondentes aos EPs selecionados para análise. O número 40, anteposto a “Roteiros de Interação”, refere-se a todos os roteiros (individualizados) referentes a cada EP da segunda aplicação de 2015 e da segunda aplicação de 2017. Assim, os RIs analisados são aqueles correspondentes aos EPs.

Essa quantificação também pode nos indicar uma tendência com relação ao lugar da cultura no ensino de línguas estrangeiras: a de que os conteúdos de materiais de ensino apresentam, geralmente, representações de Brasil e/ou povo brasileiro de maneira estereotipada ou reforçando um estereótipo, conforme observado nos estudos com foco em interculturalidade de Galelli e Rocha (2003), Barbosa (2015), Paiva (2009), Kawachi (2011). Ademais, conforme problematizado por Almeida Filho (2002), aspectos culturais da língua-alvo são postos em um lugar secundário em sala de aula de LE, sendo tratados como franja.

Documentos e Categorias para análise

Nesta subseção apresentaremos os documentos, bem como a proposta de categorização para análise dos dados que compõem o corpus desta investigação.

Para a análise, utilizaremos as seguintes fontes de dados:

 Elementos provocadores utilizados em interações face-a-face;  Roteiros de Interação do Celpe-Bras.

A partir de uma apreciação inicial dos documentos, verificamos que algumas representações sugeriam temas relacionados ao povo brasileiro e suas relações interpessoais na sociedade, relações com a comida brasileira, hábito de tomar café, e símbolo do futebol. Outros EPs apresentavam imagens de Brasil, que, muitas vezes eram generalizadoras ou estereotipadas. Diante dessa verificação, optamos por categorizar esses temas, de maneira que pudéssemos tratá-los individualmente em análise posterior. Dessa forma, selecionamos os seguintes eixos temáticos:

 O Brasil

 O povo brasileiro

Elaboramos a seguinte tabela, que resume as fontes de dados, o objetivo pretendido com cada uma delas e o método de análise:

Tabela 2 - Fontes de dados, seus objetivos e métodos de análise

Fonte de dados Objetivos Método de análise

Elementos provocadores Identificar indícios de representações sobre o Brasil e/ou povo brasileiro.

Interpretar e analisar

segundo a teoria de

representações sociais e interculturalidade.

Perguntas orientadoras das interações contidas no Roteiro de Interação.

Analisar as perguntas que orientam a interação e discutir em que medida

elas dialogam com

representações nos EPs.

Interpretar e analisar as perguntas tendo como base as teorias de interação,

interculturalidade e

representações sociais.

Fonte: elaborado pela pesquisadora

Para análise dos dados, utilizaremos como base fundamentadora a teoria das representações sociais de Moscovici (2015), considerando que:

(...) toda representação é composta de figuras e de expressões socializadas. Conjuntamente, uma representação social é a organização de imagens e linguagem, porque ela realça e simboliza atos e situações que nos são ou que nos tornam comuns. (MOSCOVICI, 2015, 25).

É sob o espectro das representações sociais de Moscovici (1978, 2015) que analisaremos EPs e RIs que norteiam as interações face-a-face do Celpe-Bras. Buscamos, dessa forma, identificar, interpretar e analisar concepções, “imagens e linguagem” sobre o Brasil e o povo brasileiro que subjazem esses materiais da parte oral do exame. Com isso, buscamos mobilizar possíveis desdobramentos para o exame e para o ensino de PLE, uma vez que representações sociais contidas em EPs podem sugerir uma perspectiva intercultural, podendo, por sua vez, levar a uma interação significativa, justamente pelo fato de que o avaliador-interlocutor não conhece o "outro" lado e pode(rá) descobri-lo no espaço interacional do exame.

Essa pode ser uma hipótese oriunda da análise dos EPs e RIs, que seria melhor aprofundada com a análise dos áudios das interações face-a-face. Desse modo, advogamos que o acesso a gravações da parte oral do exame será, como proporemos nas

considerações finais, um possível desdobramento relevante para ampliação do escopo deste estudo, em investigação futura.

Em seguida, passaremos ao capítulo 3, correspondente à apresentação e análise dos dados.