• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3- INTERPRETAÇÃO DOS DADOS E ANÁLISE

2. Categoria 2 – O Povo Brasileiro

2.2. O hábito de tomar cafezinho

Conte com o herói que ajuda a ajudar o Brasil. Beba café (EP 15, BRASIL, 2015)

Verificamos que o elemento provocador (EP 17 – Supercafé136) ancora representações sociais sobre o café no Brasil e o hábito dos brasileiros em relação a tomar café. O EP 17 traz a informação de que o café brasileiro é o que move a economia do Brasil: “Conte com ele para ganhar folego extra. A economia brasileira já faz isso há séculos. Conte com o herói que ajuda a ajudar o Brasil. Beba café”, conforme pode ser observado na imagem a seguir:

136 Anexo 6

Figura 10 - EP 17: Supercafé

O EP funciona como um gatilho para a manifestação de representações (nesse caso, a de que o café é o motor principal da economia do Brasil) e além disso, traz uma

representação de brasileiro como aquele que toma café todos os dias e é só com ele que o Brasil pode ser ajudado.

No que tange às informações contidas no EP 17, reforçamos que se trata de material de circulação nacional, e assim, pode promover representações que, de certo modo, podem não condizer com a realidade da maioria de brasileiros. Desse modo, argumentamos que é fato histórico que a economia brasileira é também movida pelo café. Porém, pode ser generalizador afirmar que o café é herói. A imagem no EP sugere a representação de que o café estaria relacionado à “concentração”, “desempenho”, “humor”, “folego” e “disposição”, remetendo ao hábito de tomar café do brasileiro. Desse modo, é como se o brasileiro fosse caracterizado como o indivíduo que toma café todos os dias (ou após as refeições como sugerido na pergunta 6 do RI137) para poder ter boa concentração, bom desempenho, humor, folego e boa disposição. A apresentação da imagem do grão de café vestido de super-herói se sobressai no material, o que também pode indicar uma representação que coloca o café como central no Brasil, tanto como produto da economia, como bebida e suas particularidades na sociedade brasileira.

Na história do Brasil, o café aparece como protagonista quando se tem a crise das monoculturas em meados de 1850, em que as plantações de café constituíram a grande força econômica brasileira. Para Ribeiro (1995:159) “o café (...) viria rearticular toda a força de trabalho para um novo modo de integração no mercado mundial e de reincorporação dos brasileiros na condição de proletariado externo”. Desse modo, concordamos que o café pode ser considerado símbolo de uma prática social no Brasil, uma vez que faz parte de sua constituição histórica e representa, além de sua constituição simbólica, uma organização econômica que se desdobrou em um ato social.

É válido ressaltar que o EP 17 já traz a informação de que o café brasileiro é o que move a economia do Brasil: “Conte com ele para ganhar folego extra. A economia brasileira já faz isso há séculos. Conte com o herói que ajuda a ajudar o Brasil. Beba café.” Nesse sentido, podemos inferir que o EP funcionaria como um agente de construção das representações sociais sobre o café, no Brasil, bem como direcionaria para uma possível abordagem intercultural, uma vez que o EP deixa implícita a relação do Brasil com o café, abrindo caminho, assim, para uma discussão que envolveria a história,

137Pergunta 6 (EP17): “Em seu país, existe o hábito de tomar café após as refeições? Comente” (BRASIL, 2015).

os porquês de se conceber o café como força propulsora do trabalho, ou seja, direcionando a interação para uma abordagem intercultural, que tem como princípio a problematização de representações (KAWACHI, 2015). Essa visão de interculturalidade se associa ao que Candau (2010) e Walsh (2010) apontam como uma prática embasada em princípios Freireanos138, em que a prática pedagógica deve ser crítica e questionadora.

No RI, a pergunta número 3: “Porque essa propaganda trata o café como herói?” pode proporcionar uma discussão que se alinharia com uma perspectiva intercultural (CANDAU, 2010; FLEURI, 2003; PAIVA, 2015), pois sugere um questionamento, podendo ser compreendida como gatilho para aprofundar discussões que remetem à uma noção de herói, relacionando-a com a predominância do café no Brasil.

No que concerne às representações do material, argumentamos que a pergunta 6 do RI: “Em seu país, existe o hábito de tomar café após as refeições? Comente” já pressupõe uma representação de que é hábito do brasileiro tomar café após as refeições. A pergunta sugere uma comparação com o país do examinando, o que possibilitaria uma discussão dessa representação já posta pelo material por uma perspectiva de interculturalidade.

Assim, retomamos o mecanismo da comparação como necessário para a construção de representações (MOSCOVICI, 2015). Afirmamos, nesse sentido, que tal mecanismo não é apenas necessário para as representações, mas que ele pode conduzir para o estabelecimento de uma representação que critica formas já concebidas, ou seja, a comparação nesse caso, pode ser um caminho para se atuar na interculturalidade, levando em consideração o viés crítico e problematizador/questionador da comparação. Entretanto, argumentamos que comparar não é suficiente se ficar em níveis de igualdade e/ou superioridade, mas vislumbramos a comparação como impulso para avaliar o que se conhece, porquê se concebe tal representação, podendo, assim, contribuir para a constituição de um viés intercultural das representações.

As representações contidas no EP e possivelmente induzidas pelo respectivo RI sobre a cultura de tomar café no Brasil e no país de examinandos são construídas pelo mecanismo da comparação, que é inerente à atividade humana, conforme se verifica na perspectiva de Moscovici (1988), quando o autor afirma que as “representações sociais podem nos levar a uma psicologia social do conhecimento, tornando-nos capazes de

comparar grupos e culturas”139 (MOSCOVICI, 1988, 217). Nesse sentido, podemos inferir que representações sociais podem emergir em interações a partir do fenômeno da ancoragem e objetivação (MOSCOVICI, 2003), em que se busca aproximar o objeto/conceito de uma concepção familiar para poder reconstruir uma imagem e uma definição, respectivamente, levando em consideração as relações sociais que permeiam as construções de representações.

Moscovici (2015) afirma que o ato de representar significa mobilizar formas de conhecimento por mecanismos cognitivos e sociais, nos quais estão presentes elementos que constituem o indivíduo (sendo eles, percepções, imagens, imaginários, conceitos, crenças, culturas), bem como as representações. Com isso, podemos inferir que a construção de representações sociais pode estar alinhada à uma atuação intercultural, no sentido de imbuir crenças e concepções pré-estabelecidas que podem ser modificadas e re-apresentadas na interação social. É nesse viés que buscamos pensar a prática de PLE, no sentido de se pensar a interculturalidade como encaminhamento para o ensino e a institucionalização da área.

Nesta subseção, abordamos as representações que o EP 17 e o RI apresentam, como a de que o café é herói no Brasil e o café como prática social (sobre o hábito de tomar café do brasileiro). Nesse sentido das relações sociais estabelecidas com esse símbolo que representa e constitui o Brasil daremos continuidade à temas que estão relacionados às relações interacionais de brasileiros, como trataremos nas próximas subseções, respectivamente, Brasileiro: o povo indisciplinado e características interacionais de brasileiros.