• Nenhum resultado encontrado

Com a análise de todos esses dados, conseguimos ter uma visão mais clara do que deve estar ocorrendo na nossa máquina.

Devido ao espesso filme de titânio nas paredes da câmara, formado pelo uso de sublimadores, há uma grande quantidade de hidrogênio adsorvido. Analisando a descarga com He, observamos que existe uma considerável emissão de hidrogênio, com um perfil temporal diferente, indicando que realmente ele é originário das paredes.

As descargas de limpeza mostraram-se eficientes na remoção de carbono, tanto pela análise do espectrômetro durante as descargas, como pelo analisador de gás residual após estas. Isto acontece, pois o carbono está presente principalmente na forma de hidrocarbonetos que conseguem ser facilmente dessorvidos das paredes com as descargas. Já o oxigênio, em sua maioria presente nas moléculas de água, não consegue ser eliminado eficientemente.

O grande diferencial das descargas de He não é então na remoção do oxigênio, mas sim, na remoção de parte do hidrogênio adsorvido no filme. A queda lenta do sinal de Lβ na

Figura 3.19c, ou a medida Hα em plasma de He mesmo após dois dias de operação nessas

condições (Fig. 3.15), indica que a quantidade de hidrogênio adsorvido é extremamente grande. Como o filme de titânio é bastante espesso, mesmo que se remova hidrogênio

superficial com as descargas, há uma quantidade enorme de hidrogênio adsorvido no filme que pode se difundir para a sua superfície.

Ainda assim, notamos que a remoção apenas da camada superficial de hidrogênio após 100 descargas com o He, melhorou consideravelmente o nosso plasma ao retomarmos em seguida a operação com H, permitindo uma maior porcentagem de OIV. Nessas descargas, com menos hidrogênio na superfície do filme, deve ter havido um menor fluxo de hidrogênio para o plasma (comprovado pelo baixo sinal de Lβ), melhorando a

reciclagem e assim o controle do plasma.

No entanto, vemos que rapidamente o hidrogênio volta a saturar a superfície do filme, aumentando o fluxo de hidrogênio das paredes durante a descarga (aumentando o sinal de Lβ), piorando assim as condições do plasma (reduzindo a emissão de OIV). Após

umas 50-70 descargas de limpeza, a saturação de hidrogênio do filme já atingiu os mesmos níveis de antes das descargas com He.

Assim, não conseguimos obter boas descargas tokamak com H após operação com He como visto na Figura 3.12, pois o hidrogênio já saturou as paredes após algumas descargas de limpeza.

É interessante notar que a descrição aqui apresentada, com um grande fluxo de hidrogênio para o plasma devido à saturação da superfície, pode aparecer também tokamaks com o uso da carbonização [Stangeby & McCraken (1990) e Winter (1987)]. Nesta situação, contudo, descargas de limpeza podem melhorar condições de vácuo e permitir melhores descargas.

Concluímos assim, que a solução para melhoria das descargas do nosso tokamak deve ser a limpeza ou ainda a troca da câmara de vácuo, eliminando o filme de titânio presente. Em outros trabalhos [Stangeby & McCracken (1990)], também foi discutido que para espessuras de filme maiores que 10-100 microns, pequenos pedaços do filme se soltam durante a descarga, aumentando a contaminação do plasma. Analisando uma seção da câmara do tokamak, observamos que a espessura do filme parece exceder esses valores, de modo que a sua remoção mostra-se extremamente importante.

Vemos assim que, apesar da sublimação de Ti ser considerada como uma boa solução para uma melhoria rápida das condições de vácuo, o seu uso por um tempo prolongado pode levar a efeitos indesejáveis como o observado em nossa máquina.

Dessa forma, para grupos pequenos como o nosso, nos quais é difícil fazer uma manutenção completa de todo o conjunto do tokamak regularmente, seria desejável não utilizar a sublimação de Ti, tentando por outro lado outros métodos como a carbonização.

Especificamente para a nossa máquina, acreditamos que a boronização (realizada de maneira similar à carbonização) talvez seja mais útil, já que as superfícies boronizadas possuem baixa afinidade a água (nossa principal contaminação) [Stageby & McCracken (1990)]. Devido a isso também, a contaminação após a abertura da câmara é reduzida, o que seria muito interessante para nós, já que muitas vezes é necessária a quebra de vácuo para instalação e ou manutenção dos diagnósticos.

Capítulo 4 - Montagem e Calibração Absoluta dos

Espectrômetros

Utilizamos em nosso trabalho dois espectrômetros que analisaram diferentes faixas do espectro: o visível e o ultravioleta no vácuo (UVV). A seguir, iremos expor as diferenças na utilização dos aparelhos nessas regiões do espectro, enfatizando os cuidados requeridos na espectroscopia UVV.

Para medidas de comprimentos de onda inferiores a 1850 Å é necessário construir uma tubulação como guia ótico entre o espectrômetro e o tokamak e manter todo o conjunto em vácuo, devido à forte absorção da radiação pelo oxigênio presente no ar [Zaidel & Shreider (1970), Daltrini (1999)]. Também, uma forte absorção da luz entre 300Å e 900 Å, devido principalmente à fotoionização dos gases do ar e impurezas, dificulta as medidas nessa faixa do espectro [Zaidel & Shreider (1970)].

Além disso, a refletância dos materiais tende a diminuir no UVV. Dessa forma, para reduzir a absorção, esses espectrômetros em geral possuem poucas superfícies ópticas. Para isso, utiliza-se uma rede de difração côncava, que além de dispersar a luz, funciona como elemento colimador e focalizador. Para tentar melhorar mais a refletância, geralmente é feito um revestimento (coating) sobre a rede de difração.

Para comprimentos de onda inferiores a 500 Å, a refletância dos materiais diminui ainda mais. Neste caso é mais apropriado o uso de espectrômetros de incidência rasante, aumentando a potência da radiação refletida pela grade.

Outro fator importante é manter a rede de difração sempre limpa. Caso esta esteja coberta mesmo que por uma camada bem fina de óleo, a refletância diminui bastante [Zaidel & Shreider (1970), Daltrini (1999)], não permitindo a medida de comprimentos de onda muito pequenos.Por tudo isso, vemos que a espectroscopia UVV é mais difícil de ser empregada que a espectroscopia no visível, já amplamente utilizada em tokamaks no Brasil e no mundo. Contudo, como apontamos no capítulo 1, a região do UVV é muito útil para o estudo de impurezas mais ionizadas e assim, a espectroscopia UVV desempenha um papel muito importante no estudo de plasmas a altas temperaturas.

Por esse motivo, durante este trabalho, concentramos boa parte dos esforços na modernização da espectroscopia UVV por meio da instalação de novos equipamentos [Machida (2001-2003)]. O principal deles foi um detector multicanal consistindo de uma placa MCP para detectar, amplificar e transforma o sinal UVV em visível, acoplado a um CCD, para leitura do sinal. Adquirimos também uma nova grade para permitir medidas mais acuradas no UVV.

A espectroscopia com multicanal, apesar de perder a evolução temporal do plasma em um único disparo, facilita bastante o nosso trabalho, uma vez que consegue detectar de uma vez só uma grande faixa do espectro, além de poder medir a temperatura iônica de impurezas em uma única descarga. Assim, durante este trabalho, realizamos medidas tanto com o canal simples como com o detector multicanal com o espectrômetro no UVV.

No entanto, cada um dos equipamentos, espectrômetro no visível, espectrômetro no UVV com canal simples e espectrômetro no UVV com detector muticanal, devido às suas peculiaridades, tem de ser empregado de uma forma diferente, não só nas medidas com o plasma, mas também com os seus ajustes iniciais.

Apresentamos, dessa maneira, neste capítulo, as principais diferenças entre os aparelhos em vários aspectos como: alinhamento, focalização, medida da largura instrumental e calibração absoluta.

A calibração é um dos tópicos mais difíceis da espectroscopia UVV, existindo vários métodos que podem ser empregados, dependendo do aparelho e do plasma em estudo. Portanto, descrevemos em detalhes os diferentes processos que tivemos de realizar para a calibração dos nossos equipamentos.

A calibração consiste basicamente em calcular o ganho do espectrômetro, ou seja, saber a relação entre o sinal do aparelho e o número de fótons que chega ao detector.

Na Figura 4.1 é possível observar a região do espectro que foi calibrada com cada espectrômetro. A calibração por lâmpada padrão já é bem comum na região do visível e foi utilizada por nós em nosso espectrômetro. Já para a calibração no UVV, nos valemos do método de branching ratio. Diferentemente da calibração por lâmpada, tal método não permite calibração de qualquer ponto do espectro, mas sim, só aqueles em que há emissão de uma linha de um par espectral.

Fig. 4.1: Regiões calibradas para cada montagem do espectrômetro. Diferentes calibrações - vermelho: lâmpada padrão, azul: branching ratio e verde: densidade iônica (método exposto mais adiante).

Devido principalmente à utilização do detector multicanal, foi necessário aplicarmos um outro método de calibração, menos restrito que o branching ratio, para traçar uma curva satisfatória do ganho do espectrômetro.

Assim, devido ao uso do novo detector multicanal e principalmente da dificuldade da calibração no UVV, acreditamos que as informações e os processos expostos neste capítulo e no anexo 2 (que apresenta a modernização do espectrômetro e a montagem do novo detector), podem ser de grande utilidade para os interessados em espectroscopia de plasmas no país.