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Parte I Enquadramento Teórico

1. Conceito de luto

1.6. Determinantes na superação do processo de luto

A experiência do luto é influenciada por um conjunto de determinantes (ou variáveis), importantes para se compreender os processos de superação e elaboração do luto, como a (1) idade, o (2) género, os (3) antecedentes históricos, a (4) natureza e qualidade da ligação, as (5) condições socioeconómicas, as (6) variáveis de personalidade, as (7) variáveis sociais, as (8) circunstâncias da morte e o (9) stresse concorrente.

No que diz respeito à (1) idade, as pessoas em idade adulta avançada que, geralmente já vivenciaram várias perdas, tendem a adaptar-se melhor à perda, o que lhes permite aceitar a morte como algo natural (Galicioli et al., 2012; Rebelo, 2013a). Já as faixas etárias mais novas tendem a não pensar acerca da morte ou a formarem uma nova ligação de vinculação, o que é frequente em pessoas adultas (Rebelo, 2013a). Alguns estudos sugerem que diante uma perda significativa as pessoas idosas têm mais dificuldades em aparecer em locais públicos sozinhas e socializar, sendo, deste modo, mais propensas à solidão (Naef et al., 2013).

Relativamente ao (2) género, diferentes autores encontraram diferenças significativas relativas à superação do luto (Baldin & Fortes, 2008; Rebelo, 2009; Galicioli et al., 2012). As mulheres são mais propensas à experiência do luto do que os homens devido ao aumento da expetativa de vida, sendo a proporção de mulheres viúvas, segundo o Instituto Nacional Estatístico (INE), é significativamente maior em comparação com a dos homens viúvos (Carrilho & Craveiro, 2015). No que se refere à expressão do luto, a sociedade espera que o homem controle mais os seus sentimentos, expressando pouco o que sente (Worden, 2009). As mulheres estão mais disponíveis para exprimir as suas emoções e sentimentos referentes à dor que sentem (Worden, 2009). Perante uma perda significativa, como a perda do cônjuge, uma das maiores mudanças é a necessidade de assumir papéis e responsabilidades que outrora eram desempenhados pelo cônjuge (os homens mais velhos tendem ainda a exercer atividades administrativas e financeiras e as mulheres atividades domésticas (Rebelo, 2009). As distintas reações a esta modificação no quotidiano podem estar relacionadas com a ligação entre a pessoa em luto e a figura de vinculação perdida (Galicioli et al., 2012; Machado, 2013). No caso dos homens tende a existir um sentimento de falta da companheira, que lhe proporcionava cuidados pessoais e cuidava das tarefas domésticas (Galicioli et al., 2012; Rubio et al., 2012). Em relação às mulheres, as que tiveram um casamento de pouca proximidade e de obediência manifestam sentimentos de liberdade e, as que viveram uma relação baseada no amor e no respeito, expressam tristeza (Rubio et al., 2012; Galicioli et al., 2012). Os homens viúvos enfrentam geralmente a perda por períodos mais breves do que as mulheres (Naef et al., 2013). A necessidade de companhia e de manter relações sexuais pode levar à criação de uma nova relação de vinculação (Rebelo, 2009). Segundo a literatura, os homens tendem a estabelecer relações com mulheres mais novas (Baldin & Fortes, 2008; Rebelo, 2009; Both et al., 2012). Mas uma vez que o padrão das relações conjugais está em mudança, existindo uma maior igualdade de papéis e um menor investimento nos casamentos duradouros, a superação do luto no futuro poder-se-á processar de forma diferente da descrita.

Quanto aos (3) antecedentes históricos, estes estão relacionados com a existência de processos de luto não resolvidos, o que pode afetar um atual processo de luto. É importante que antes de se dar apoio a alguém ou passar-se por uma perda, ter-se presente se existem perdas anteriores e se foram resolvidas (Worden, 2009).

No que diz respeito à (4) natureza e qualidade da ligação, salienta-se: (i) a estabilidade da relação, pelo que a reação à perda pode ser determinada pela intensidade da ligação afetiva; (ii) a segurança do apego, na medida que deve-se ter presente que em casos de relações de vinculação fortes a pessoa enlutada vai sentir mais dificuldades em superar a dor; (iii) a ambivalência no relacionamento, ou seja, numa relação em que os sentimentos negativos coexistem com igual proporção nos sentimentos positivos, conduz a uma reação à perda mais complicada; (iv) a presença de conflitos com a pessoa perdida não só no momento da morte, mas também conflitos anteriores na ligação conjugal; e (v) os relacionamentos dependentes, que podem afetar a adaptação à perda se a pessoa foi muito dependente, uma vez que, nestes casos, os ajustes externos são maiores; nos casos de menor dependência, os ajustes externos são menores, podendo permitir a superação do luto (Worden, 2009; Nave, 2013).

Em relação às (5) condições socioecónomicas, as pessoas com um nível económico baixo tendem a apresentar mais dificuldades diante uma perda, o que, consequentemente pode afetar o estado emocional da pessoa enlutada (Goldstein, 1993; Rebelo, 2009) e por isso dificultar o processo de superação do luto. Já as (6) variáveis da personalidade estão associadas com o modo como as pessoas lidam com os fatores de stresse que surgem com a perda (Worden, 2009). Por exemplo, as pessoas tímidas e com baixa autoestima tendem a manifestar reações negativas à perda, o que pode levar a um processo de superação do luto mais delongado (Neto, 2000). Nas (7) variáveis sociais, destaca-se o apoio emocional e social recebido dos familiares, amigos, entre outros, bem como a participação ativa na sociedade podem ser significativos no processo de superação do luto (Worden, 2009).

Na variável (8) circunstâncias da perda, sabe-se que na morte esperada a pessoa tem mais tempo para se preparar para a morte, e que na morte súbita tem mais dificuldade em aceitar a realidade (Worden, 2009). No caso das mortes prematuras, violentas ou inesperadas, a pessoa em luto necessita de mais tempo para aceitar a perda, sendo que as últimas tendem a conduzir a um processo de luto complicado ou um transtorno depressivo maior (Worden, 2009; Nave, 2013; Penman et al., 2014). Por último, menciona-se o (9) stresse concorrente como determinante no processo de superação do luto, ou seja, as crises ou as mudanças simultâneas que possam surgir na sequência da perda (Worden, 2009; Nave, 2013).

É fundamental o conhecimento dos determinantes expostos que permitem identificar os fatores que podem influenciar a reação à perda e conduzir a reações negativas e positivas na superação do luto, sobretudo para evitar o desenvolvimento de um luto complicado.

II CAPÍTULO - LUTO POR PERDA DO CÔNJUGE

Neste capítulo procura-se compreender o luto por perda do cônjuge e o seu impacto na vida e no bem-estar das pessoas idosas, sendo um evento frequente na fase da velhice. Neste contexto, será abordado o fenómeno da viuvez em mulheres viúvas, destacando-se a viuvez em mulheres viúvas institucionalizadas. De seguida, expõem-se algumas estratégias de superação do luto em mulheres viúvas e, em particular, em idosas viúvas institucionalizadas. Por último, aborda-se a revinculação, acontecimento que pode decorrer no fim da realização do processo de superação do luto por perda do cônjuge.